"Hiperesplenismo" em hipertensão porta por esquistossomose mansônica

Enviado por Andy Petroianu


RESUMO

INTRODUÇÃO: Durante anos, as alterações hematológicas que ocorrem na esquistossomose mansônica hepatoesplênica vêm sendo definidas como hiperesplenismo. Inicialmente, acreditava-se que apenas a remoção do baço normalizava os valores hematológicos, entretanto, em cirurgias para o tratamento da hipertensão porta nas quais o baço era preservado, observou-se normalização dos valores hematimétricos. Cabe correlacionar o quadro clínico e laboratorial para definir a real existência de hiperesplenismo.

MÉTODO: Foram estudados 51 doentes portadores de hipertensão porta por esquistossomose mansônica distribuídos em cinco grupos: Grupo 1- pacientes não operados e em controle clínico, Grupo 2— pacientes submetidos a anastomose esplenorrenal distal, Grupo 3 — pacientes com esplenectomia subtotal e anastomose esplenorrenal proximal, Grupo 4 — pacientes com esplenectomia total e anastomose esplenorrenal proximal e Grupo 5 — pacientes com esplenectomia total e desconexão porta-varizes. Sinais clínicos de hiperesplenismo foram pesquisados em todos os doentes. Os valores hematológicos e as contagens das imunoglobulinas do pré e do pós-operatório foram comparados pelos testes de Friedman e t para amostras emparelhadas. Os grupos foram comparados pelo teste de Kruskal-Wallis, com significância p< 0,05.

RESULTADOS: As médias dos valores hematimétricos dos doentes mostraram leucopenia, plaquetopenia e elevação do tempo de protrombina no período pré-operatório. Esses pacientes apresentavam eventuais episódios de sangramento pelas varizes esofágicas e gástricas. Nenhum deles teve sinais de coagulopatia ou sepse, apesar de os valores hematológicos estarem alterados. Em todos os grupos operados, os valores da hematimetria, da leucometria, o número de plaquetas e o tempo de protombina do período pós-operatório melhoraram em relação ao período pré-operatório. No pós-operatório, a contagem das imunoglobulinas IgM, IgG e IgA foi normal.

CONCLUSÃO: Pacientes com hipertensão porta esquistossomática e citopenia periférica não podem ser classificados como portadores de hiperesplenismo, mas de pancitopenia por esplenomegalia conseqüente ao represamento sangüíneo, por dificuldade na drenagem sangüínea porta.

Palavras-chave: Hiperesplenismo; esplenomegalia; hipertensão porta; esquistossomose; hematimetria; tratamento cirúrgico.

ABSTRACT

For many years, the hematologic changes occurring in hepatosplenic Manson's schistosomiasis have been defined as hypersplenism. Initially, the belief was that removal of the spleen would normalize the hematologic values. However, hematimetric normalization was observed in surgeries for the treatment of portal hypertension in which the spleen was preserved. In view of these findings, it is necessary to verify the clinical and laboratory profile of these patients in order to define the real presence of hypersplenism. This study was conducted on 51 patients with Manson's schistosomatic portal hypertension divided into five groups: Group 1, non-operated patients under clinical control; Group 2, patients submitted to distal splenorenal shunt; Group 3, patients with subtotal splenectomy and central splenorenal shunt; Group 4, patients with total splenectomy and central splenorenal shunt; Group 5, patients with total splenectomy and portal-variceal disconnection. Clinical signs of hypersplenism were assessed in all patients. Hematologic values of the pre- and postoperative periods were compared. Immunoglobulin counts of the patients were verified in the late postoperative period. The five groups were compared by Kruskal-Wallis test. The pre- and postoperative values were compared using Friedman and paired t tests, with significance for p< 0.05. In all operated groups, hematimetric values, leukocyte counts, platelet number and prothrombin time were higher during the postoperative period. With respect to the immunoglobulins, the postoperative values of IgM, IgG and IgA were normal. Patients with schistosomatic portal hypertension and peripheral cytopenia cannot be classified as having hypersplenism, but rather as having pancytopenia due to splenomegaly caused by difficulty of portal blood drainage.

Key words: Hypersplenism; portal hypertension; Manson's schistosomiasis; hematimetry; surgical treatment.

Introdução

Estima-se que a esquistossomose mansônica, como doença endêmica, atinja de 10 a 12 milhões de pessoas no Brasil. Entre suas manifestações clínicas, a mais grave é a forma hepatoesplênica, que pode ser causa de hipertensão porta e acompanha-se de um quadro hematológico laboratorial denominado "hiperesplenismo".1,2 De acordo com a literatura, o "hiperesplenismo" associado à hipertensão porta de qualquer etiologia ocorre em uma porcentagem que varia entre 30% e 70% dos casos.3

A idéia de hiperesplenismo começou em 1866, quando Gretsel correlacionou o baço com alterações hematológicas em pacientes portadores de esplemegalia, a qual denominou de anemia esplênica. Posteriormente, Banti (1882) verificou a existência de leucopenia, plaquetopenia e anemia na presença de baços aumentados de tamanho.4,5 O termo hiperesplenismo foi introduzido por Chauffard,4,5 em 1907, para definir as relações do baço com a redução de elementos figurados do sangue.

Quase quarenta anos depois, Doan (1946)4,5 considerou que o hiperesplenismo é conseqüente ao aumento da atividade hemocaterética decorrente da hiperplasia estrutural do baço. Segundo Damesheck (1955),4 essa doença seria relacionada a uma substância humoral anômala produzida nas células esplênicas hiperplasiadas, que dificultaria a liberação de células da medula óssea.6 Ainda nessa linha de idéias, Ramback (1962) considerou que o hiperesplenismo seria decorrente de um mecanismo auto-agressivo imunitário voltado aos elementos sangüíneos.4,5 Mais recentemente, Bowdler (1970), trabalhando com isótopos radioativos, observou que doentes com esplenomegalia aumentavam o volume plasmático, com conseqüente anemia por hemodiluição e não apenas por maior armazenamento esplênico. 4,5

Hiperesplenismo é atualmente conceituado como sendo a associação de esplenomegalia, anemia, plaquetopenia e leucopenia junto com hiperplasia da medula óssea, para compensar a pancitopenia do sangue periférico. O diagnóstico se completa, com segurança, nos casos em que ocorre normalização do quadro sangüíneo e medular apenas após a remoção do baço.5

Entre os muitos exemplos da literatura de operações conservadoras do baço, Félix e cols (1974) verificaram que, após anastomose portacava, os doentes com "hiperesplenismo" melhoravam os valores dos elementos figurados no sangue periférico e reduziam o tamanho do baço.4,5 Já Guerra e cols (1980) 4,5 constataram que a anastomose esplenorrenal distal, portanto sem a remoção do baço, para tratar pacientes portadores de varizes esofagogástricas por hipertensão porta esquistossomática, melhorava o quadro hematológico do chamado "hiperesplenismo".

Diante da diversidade de interpretações relacionadas ao hiperesplenismo, constata-se a necessidade de uniformização dos conceitos sobre essa afecção. Durante anos, o "hiperesplenismo", na esquistossomose mansônica hepatoesplênica, foi definido como citopenia decorrente de esplenomegalia com medula óssea hiperplásica. Inicialmente, acreditava-se que apenas a remoção do baço normalizava os valores hematológicos. Todavia, mesmo na anastomose esplenorrenal distal, com a preservação de todo o baço, aumentam os valores dos elementos figurados do sangue.

Até o momento, a etiopatogenia do hiperesplenismo permanece desconhecida, contudo, a esplenomegalia pode ser dividida em seis categorias7:

— hipertrofia pelo aumento da resposta imune (endocardite bacteriana subaguda, mononucleose infecciosa, etc.);

— destruição de eritrócitos, levando a hipertrofia esplênica por aumento de sua função (esferocitose, talassemia maior, etc.);

— congestão, por dificuldade na drenagem venosa (esquistossomose, cirrose hepática, etc.);

— infiltração por elementos produzidos em decorrência de distúrbios metabólicos (sarcoidose, amiloidose, doença de Gaucher, etc.);

— neoplasias próprias do baço ou hematológicas (sarcoma, linfoma, leucemia, etc.);

— outras causas próprias do baço ou sistêmicas (trauma, cisto esplênico, hemangioma, etc.).

O objetivo deste estudo foi avaliar se pacientes portadores de hipertensão porta decorrente de esquistossomose mansônica e citopenia periférica podem ser classificados como portadores de hiperesplenismo.

 


Página seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.