Divulgação Científica: Efeitos de sentidos na escrita de bilhetes



Resumo

Realizamos uma atividade escolar com leitura em classes de Ensino Médio com o objetivo de compreender a diversidade de sentidos produzidos pelos estudantes no funcionamento da leitura escolar de livros de divulgação científica. A análise dos discursos dos estudantes permite apontar a abertura de espaços para suas manifestações como uma das maiores contribuições da leitura de divulgação científica em ambiente escolar. A leitura contribuiu para que os estudantes se pronunciassem, expressando-se mais livremente que o habitual em sala de aula, dando oportunidade para que eles falassem de onde se situam e com isso trouxessem assuntos de fora da escola, ou seja, levassem o seu cotidiano para a sala de aula.

Palavras chaves: Ensino; Ciência; Leitura; Divulgação Científica.

Leitores e escola

Iniciamos este estudo tendo como preocupação a formação de leitores de ciência. Ou seja, leitores com conhecimento suficiente para compreender e questionar a ciência de seu tempo, que tenham consciência da necessidade de relacionar os avanços tecnológicos ao contexto histórico-social em que vivemos, leitores que entendam notícias de teor científico e saibam lidar com informações do campo científico como é necessário que lidem com as de qualquer outra área. E pensamos na escola como uma instituição privilegiada para sua formação, e no texto de divulgação científica como recurso formador.

Os livros Isaac Newton e sua maçã e Albert Einstein e seu universo inflável, respectivamente de Kjartan Poskitt e Mike Goldsmith, ambos da coleção Mortos de Fama, da editora Companhia das Letras, foram escolhidos para a pesquisa por termos considerado que esses livros, de divulgação científica, tratam a ciência de uma maneira que seria atraente para os leitores com os quais a atividade foi realizada.

Pressupondo também que livros diversificados e diferentes dos usados habitualmente em sala de aula, ou seja, livros diferentes dos didáticos, possam contribuir para a formação de leitores, escolhemos os referidos livros de divulgação científica. Esses livros são biografias dos cientistas, que narram, respectivamente, a vida de Newton e Einstein, desde o nascimento, os processos de formulação de leis da física e repercussões das descobertas científicas desses cientistas.

Diferentemente dos textos didáticos, os textos de divulgação científica podem circular na escola, mas circulam principalmente fora dela. Em princípio, qualquer pessoa pode usufruir a sua leitura, desde que tenha adquirido um certo hábito de leitura, tenha interesse pelas temáticas que os textos abordam, saiba de sua existência e tenha acesso a bibliotecas que os possuam ou condições financeiras para adquiri-los. Por outro lado, a ciência que circula nas livrarias, na TV, nas bancas de jornais, no rádio, no cinema, na internet e nas conversas informais forma a opinião pública sobre essa instituição e serve como subsídio para que os cidadãos assumam posições em relação à sua produção.

Já no que se refere à escola, essa instituição, não está isolada da sociedade, e como outras instituições não é neutra, ou seja, há um papel político na sua existência e em tudo que nela ocorre. Dessa forma, o planejamento do ensino não pode deixar de levar em conta as características da sociedade em que a escola está inserida. Assim, admitimos que a leitura escolar precisa estar associada a outras leituras possíveis no dia-a-dia do cidadão.

Sabemos que a instituição escolar não é o único lugar onde convém estimular a leitura, no entanto é um dos mais apropriados. Afinal, nessa instituição os indivíduos passam muito tempo e nela deve haver trocas culturais que lhes propiciem o aprofundamento e a reflexão sobre variados saberes. Além disso ali devem ser oferecidos mecanismos para que o estudante possa relacionar os diversos conhecimentos a fim de alcançar uma maior compreensão do mundo em que vive.

Outro fato que torna a escola local privilegiado para se pensar o estimulo à leitura é que muitos estudantes só têm acesso a livros no ambiente escolar. A maioria das famílias brasileiras não tem condições econômicas para adquirir livros, o que faz com que os estudantes, em muitos casos, só leiam o material disponível em sala de aula. Especificamente, sobre a leitura científica, a dependência com a escola ainda é maior por ser ela o lugar institucional de ensino da ciência.

No estudo aqui apresentado, partimos do pressuposto de que ao incentivar na escola leituras de divulgação científica estamos estimulando nessa instituição situações que podem ocorrer fora dela e que, na maioria das vezes, influenciam a idéia que os estudantes têm sobre a ciência.

Para tal, provocamos a leitura escolar de livros de divulgação científica em condições que, além de levarem em conta o fato de que, mesmo no âmbito da escola o contato dos estudantes com a ciência não poderia se restringir ao que usualmente é considerado ensino escolar da ciência, também supuseram que a escola necessita aceitar a premissa de que os estudantes são produtores de sentido, dentro e fora das aulas, e que a circulação desses sentidos ocorre simultaneamente.

Com essas suposições, colocamos em prática uma atividade escolar pensada com o objetivo de podermos compreender a diversidade na produção de sentidos dos estudantes ao lerem textos de divulgação científica.

O referencial teórico que orientou o trabalho foi a Análise do Discurso, da escola francesa. A importância que a análise de discurso dá às condições de produção na atividade discursiva, fez com que considerássemos esse referencial adequado para se buscar compreender o funcionamento da leitura de divulgação científica em determinadas situações escolares. Como estratégia para obtenção dos discursos pelos estudantes, pedimo-lhes que após a leitura dos textos escrevessem bilhetes manifestando suas opiniões sobre a leitura. Bilhetes dirigidos a alguém que eles poderiam escolher.

 


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