1. Trabalho apresentado à Comissão "Centro vs. Periferia: Dimensões Econômicas, Culturais e Ideológicas do Conflito Territorial", do Nono Congresso Mundial da Associação Internacional de Ciência Política. Montreal, 19 a 25 de agosto, 1973. Publicado em Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, IUPERJ, n 10, 1973, 1-20.
The historical experience of Canada, Australia and New Zealand, among other countries, led to the "staple theory" of development, according to which countries industrialize and modernize thanks to the comparative advantages of a single or a few export products. The failure of countries like Argentina, producer of meat, wool and cereals, and Brazil, producer of coffee, to achieve the same results, led to the notion that the theory of comparative advantages does not hold. The alternative theory, used to explain the lack of development of Latin American countries, holds that the classic theory of international division of labor leads to economic dependence, progressive worsening of the terms of trade between primary and industrialized products, social and institutional in differentiation due to the "plantation" type of economic organization, and so on. According to this view, the export sectors tend to become a conservative, traditional and anti-industrialist power group which would forestall all attempts to shift the country and its economy to modern industrialized patterns. Only external crises could influence this status quo, giving opportunities for import substitution, to the rise of middle sectors to positions of political influence, and ultimately to industrialization. What this "crisis theory" does not explain is why it presumably worked in Latin America but not in the "new" agricultural countries of the Commonwealth. This inquiry leads ultimately to the reformulation of the crisis theory; to the notion that the factors that stimulated, in some cases, and inhibited, in others, the process of industrialization, are related to the staple product and the economic system created by it are placed in the political and social context of the country. In the case of Brazil, the coffee industry developed in a State which was relatively marginal to the national political system, which was patrimonialistic in nature and not geared to defend and support the expansion of a dynamic export product. he duality between the economic and the political centers of the country was not a simple matter of group differentiation, but acquired the characteristics of regional imbalances and geographic cleavages. A proper understanding of the relationships between the more capitalist, export sector of the economy and the patrimonialistic organization of the political system is essential if the conceptual deadlock between staple vs. crisis theories of development is to be overcome.
Depois de aproximadamente um século de estagnação econômica, o volume das exportações brasileiras quase sextuplicou de 1860 até a Primeira Guerra Mundial. Este surto econômico se deveu principalmente à expansão das colheitas de café, que se tornaram, desde a segunda metade do século XIX, responsáveis por quarenta a oitenta por cento das exportações do país. O objetivo deste artigo é discutir as implicações políticas deste surto econômico, do ponto de vista das divisões regionais e das diferenciações estruturais.(2)
Certamente este crescimento econômico não foi um fenômeno isolado, pois que ocorreu num contexto de rápida expansão do mercado internacional. Na conhecida "First Wiksel Lecture", de abril de 1959, Ragnar Nurske apresentou algumas estimativas da expansão do comércio internacional durante o século XIX, comparadas com as do período contemporâneo, tratando especificamente de um padrão de "crescimento pelo comércio". De 1850 a 1880, o comércio mundial aumentou em 270 por cento, de acordo com suas estimativas; de 1880 a 1913, teve um aumento de 170 por cento; mas o crescimento de 1928 a 1958 foi de apenas 57 por cento. "O foco central da expansão econômica", diz Nurske, "foi inicialmente a Grã-Bretanha, cuja população, apesar da elevada emigração, triplicou no século XIX, enquanto a renda nacional parece ter decuplicado e o volume das importações ter-se multiplicado vinte vezes."(3) Os países que mais diretamente se beneficiaram desta expansão foram "os de colonização recente", notadamente Canadá, Argentina, Uruguai, África do Sul, Austrália, Nova Zelândia e, é claro, os Estados Unidos. Segundo Nurske, a quota destes "novos países" (Canadá ,Argentina, África do Sul, Austrália e Nova Zelândia) nas importações britânicas subiu de 8% em 1857-59 a 18% em 1911-13. A quota de investimentos britânicos que se dirigiram a estas áreas elevou-se de 10% em 1870 a 45% em 1913.
O Brasil pertencia, se bem como sócio menor, a este clube de "novos" países que receberam o impacto da expansão econômica inglesa. O Brasil tivera que pagar caro pelo reconhecimento internacional de sua independência, e pelo acordo econômico imposto pela Inglaterra ao Brasil em 1827, "a transferência dos privilégios especiais de que gozava a Inglaterra, durante séculos, no seu comércio com Portugal, foi garantida e a continuidade da preeminência inglesa na vida econômica de seu velho aliado europeu foi assegurada na América Portuguesa, a despeito da separação da colônia da metrópole. A linha da continuidade é notoriamente clara, vigente desde os séculos XVII e XVIII e presente durante os anos de transição de 1810-1827, nas relações anglo-portuguesas."(4)
A Inglaterra não permaneceria como o principal mercado para os produtos agrícolas brasileiros nos fins do século XIX, mas era certamente o principal provedor de empréstimos e de investimentos de capital. Como salienta Manchester, "A Grã-Bretanha... nunca se empenhou em manter sua supremacia inicial no campo das exportações brasileiras; seu interesse primordial no Brasil era enquanto mercado para os produtos ingleses, e não como supridor de matérias primas para consumo local."(5) Os Estados Unidos tornaram-se o principal mercado para os produtos brasileiros depois da Guerra Civil, e, no decorrer da Primeira Guerra, suplantaram a Inglaterra como principal fonte de investimentos de capital no país.
O desenvolvimento dos "novos países" obedeceu o que os historiadores econômicos chamam stapIe theory , segundo a qual a economia se desenvolve com base em um produto principal de exportação, que se beneficia de vantagens internacionais relativas, devido à abundância de terras e à imigração de mão-de-obra.(6) Terras virgens para a produção de novos produtos absorvidos por um mercado internacional em expansão, disponibilidade de capital estrangeiro para financiar o transporte e a infra-estrutura comercial dos novos produtos, e a imigração de recursos humanos europeus, provocaram um surto que bastaria para criar, a longo prazo, uma economia auto-suficiente e diferenciada. O que é difícil explicar é porque a teoria de mercado se aplica tão bem a alguns países e não a outros; porque alguns dos "novos" países, com a expansão do comércio internacional nos fins do século XIX, encontram-se agora entre os sócios do clube dos desenvolvidos, ao passo que outros ficaram para trás. Há informações e discussões abundantes sobre este problema, e não seria apropriado introduzir aqui este material. O que é importante, neste contexto, é verificar como esta dificuldade de transformar o impulso econômico do produto de exportação em crescimento auto-suficiente e diversificado prende-se aos tipos de diferenciações e divisões regionais e institucionais internas, que constituem o nosso centro de interesse. Principiamos pelo exame de uma comparação internacional bem conhecida entre a Argentina e a Austrália, e passamos, em seguida, à análise de como esta se aplica ao caso brasileiro.(7)
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