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Avaliação da capacidade de enraizamento e desenvolvimento vegetativo (página 2)

C. V. Pommer

 

 

Introdução

Desde o final do século XIX, a filoxera (Daktulosphaira vitifoliae) trouxe graves prejuízos à viticultura e os estudos visando seu controle passaram a ser muito intensos.

De acordo com Boubals (1991), existem três possibilidades para efetivação desse controle: 1) tratamento do solo, utilizando-se fumigantes; 2) irrigações abundantes durante todo o período de vegetação e 3) utilização de porta-enxertos resistentes.

As características inerentes das espécies silvestres americanas de videiras, como sua adaptabilidade aos solos, climas e outras condições ambientais e sua habilidade em formar, com sucesso, união com variedades de Vitis vinifera, têm sido utilizadas em programas de melhoramento e seleção de porta-enxertos quanto a resistência à filoxera (Lider, 1958).

Ribas & Conagin (1957) destacaram, dentre as práticas culturais em viticultura, a plantação de bacelos de videiras americanas e/ou híbridas, para servirem de cavalo a outras variedades americanas ou viníferas, com melhores características comerciais.

A propagação por enxertia proporciona à videira européia, ou aos seus híbridos, um sistema radicular resistente à filoxera. Todavia, Santos Neto (1955) afirmou que, além da resistência à filoxera, um bom porta-enxerto deve possuir adaptação ao terreno, facilidade de enraizamento, afinidade com o enxerto, bom desenvolvimento vegetativo, grande longevidade e resistência a outras pragas e moléstias.

O porta-enxerto ideal deve combinar várias características. Einset & Pratt (1975) citaram que a planta deve ser vigorosa, resistente ao frio, a doenças e a pragas; deve produzir grande quantidade de ramos para estacas, as quais devem enraizar rápida e profusamente e promover forte união com o garfo do cultivar enxertado. As raízes devem ser resistentes às injúrias causadas por filoxera, nematóides e outras pragas de solo, bem como às condições adversas do solo, como alcalinidade, salinidade e seca.

Considerando a expansão da viticultura no Estado de São Paulo e sua difusão em regiões que apresentam variabilidade de condições de clima e solo, bem como a possível utilização de cultivares que apresentem diferentes níveis de afinidade, é recomendável a viabilização de novos porta-enxertos que possam atender às finalidades da diversificação.

O objetivo deste trabalho foi avaliar os genótipos existentes no campo de seleção localizado no Centro Experimental de Campinas, do Instituto Agronômico (IAC), resultante de hibridações efetuadas de 1983 a 1985, quanto à possibilidade de se tornarem novos porta-enxertos para videira.

 

Material e métodos

O trabalho foi realizado na Seção de Viticultura do Instituto Agronômico, localizada no Centro Experimental de Campinas, SP, com as coordenadas 23o08'S e 46o55'W e altitude de 674 m.. Foram utilizados 29 genótipos resultantes de cruzamentos realizados naquela Seção entre 1983 e 1985 e escolhidos pelo seu vigor e exuberância vegetativa.

Esses genótipos foram comparados com quatro porta-enxertos comumente utilizados nas regiões vitícolas do Estado de São Paulo: IAC 766, IAC 572, Ripária do Traviú e Kober 5BB.

Durante a poda das plantas matrizes, foram coletadas estacas com três gemas, sendo feito o corte basal rente à última gema. As estacas foram reunidas em feixes identificados, e a base das estacas imersas em água, por um período de 24 horas para propiciar seu enraizamento, conforme metodologia indicada por Terra et al. (1981). A seguir, foram plantadas ao ar livre, em sacos de polietileno com dimensões de 29 cm de altura X 15 cm de diâmetro, contendo substrato composto de solo, superfosfato simples e torta de mamona, na proporção de 10 kg de superfosfato e 20 kg de torta de mamona para cada m3 de solo.

Foram implantados cinco experimentos em blocos ao acaso, com quatro tratamentos comuns, os porta-enxertos citados, conforme relação a seguir. Neles foram observados os seguintes parâmetros: enraizamento (percentagem de estacas enraizadas, comprimento e peso da matéria seca de raízes), desenvolvimento vegetativo (peso da matéria seca da parte aérea).

Devido às diferentes disponibilidades de material de propagação, os tratamentos foram divididos nos experimentos, que puderam ser analisados conjuntamente graças aos tratamentos comuns.

Após uma semana de instalação, iniciaram-se observações diárias quando se verificou o início da brotação das estacas e, posteriormente, em observações semanais, o desenvolvimento vegeta-tivo. Ao atingirem 113 dias, as plantas de uma das repetições dos experimentos 1 e 2, foram enxertadas com garfos do cultivar Niagara Rosada. O mesmo foi realizado com as plantas de uma das repetições do experimento 5, quando o mesmo atingiu 98 dias, empregando-se garfos do cultivar Itália.

As plantas que não receberam enxertos foram retiradas dos recipientes e transportadas para o laboratório onde, após lavagem e secagem à sombra, foi avaliado o comprimento de raízes pela sua maior extensão. Em seguida, procedeu-se à secagem do material em estufa com ventilação forçada a 60oC até peso constante, para obtenção do peso da matéria seca das raízes e da parte aérea.

Quando necessário, os dados obtidos foram transformados conforme recomendações de literatura e todos submetidos à análise de variância, aplicando-se, posteriormente, o teste de Tukey para comparação entre as médias dos tratamentos. Para facilidade de entendimento, as tabelas foram montadas com os dados originais.

 

Resultados e discussão

1. Rapidez de desenvolvimento vegetativo: Elaborou-se um resumo dos resultados mostrando a rapidez com que as plantas se desenvolveram, medida em dias para início da brotação e dias para alcançar o pleno desenvolvimento nos experimentos onde ocorreram diferenças significativas, considerando os genótipos que mais se destacaram, ou seja, os que tenham mais rapidamente iniciado a brotação e alcançado o pleno desenvolvimento vegetativo, o que consta das TABELAS 1 e 2.

 

Os porta-enxertos IAC 572, IAC 766 e Ripária do Traviú apresentaram ótimo desempenho na rapidez do desenvolvimento vegetativo. O desenvolvimento vigoroso desses porta-enxertos foi relatado por diversos autores (Alvarenga & Fortes, 1976; Pereira et al., 1976; Terra et al., 1988; Pires et al. 1989; Terra et al., 1990 e Pires et al., 1992, entre outros). Entre os genótipos testados, alguns apresentaram desempenho semelhante aos porta-enxertos nesta característica, não diferindo significativamente na média de dias e destacando-se entre os melhores em diferentes experimentos. Desse modo, podem ser relacionados os seguintes: 237-24, 183-16, 204-5, 202-6, 202-18, 202-2, 202-1, 202-3, 202-10, 238-16, 288-383, 202-7, 300-43, 202-9 e 300-92.

2. Enraizamento: Para avaliação do enraizamento, três variáveis foram consideradas: percentagem de estacas enraizadas, comprimento e peso da matéria seca de raiz. Elaborou-se um resumo dos resultados encontrados, considerando os genótipos que tenham obtido as maiores médias em cada experimento onde foram verificadas diferenças significativas, o que consta das TABELAS 3, 4 e 5.

 

 

 

Os porta-enxertos IAC 572, Ripária do Traviú e IAC 766 obtiveram os melhores resultados de enraizamento de estacas, seguidos pelo porta-enxerto Kober 5BB, coincidindo com os encontrados por Alvarenga & Fortes (1976) quando destacaram o IAC 572 e IAC 766 por apresentarem maior número de plantas enraizadas.

Pereira et al. (1976) verificaram que os porta-enxertos IAC 766 e Ripária do Traviú apresentaram maior peso da matéria seca de raízes do que Kober 5BB. Da mesma forma, estudando a formação de mudas de videira, Mendonça (1994) comprovou o ótimo enraizamento do porta-enxerto IAC 766 em recipientes, sob ripado. Os dados aqui apresentados são concordantes com essas observações, comprovando a elevada produção de raízes pelos porta-enxertos utilizados.

Pommer et al. (1994) caracterizaram o porta-enxerto IAC 572 como possuidor de ótimo enraizamento e Ripária do Traviú por suas estacas apresentarem ótimo pegamento. IAC 766 e Kober 5BB, segundo os autores, produzem estacas com bom índice de pegamento.

De acordo com o que se pode observar nos resumos dos experimentos, alguns genótipos não diferiram significativamente dos porta-enxertos e, por isso, podem ser considerados, também, como naturalmente dotados de bom potencial para enraizamento. Entre eles, destacaram-se, pela ordem: 202-7, 202-21, 202-27, 202-10, 202-1, 202-9, 183-16, 202-2, 202-18, 224-10, 202-12, 237-24, 204-5, 301-704, 202-30 e 202-6.

3.Desenvolvimento vegetativo: Elaborou-se um resumo dos resultados encontrados, considerando os genótipos que obtiveram maiores médias em cada um dos experimentos, o que consta da TABELA 6.

 

As maiores médias dos experimentos foram alcançadas pelos porta-enxertos IAC 572, IAC 766 e Kober 5BB que obtiveram o maior desenvolvimento vegetativo, seguidos pelo porta-enxerto Ripária do Traviú.

Alvarenga & Fortes (1976), estudando o desenvolvimento de alguns porta-enxertos para videira, destacaram o IAC 572 e IAC 766 por apresentarem maior peso da matéria seca das hastes. Kober 5BB e Ripária do Traviú ocuparam, respectivamente, a quinta e a nona colocações entre os onze testados. Também nos resultados obtidos por Pereira et al. (1976), verifica-se que o porta-enxerto IAC 766 mostrou maior peso da matéria seca de folhas e ramos (parte aérea) do que Kober 5BB e Ripária do Traviú, e foi superado apenas pelo porta-enxerto IAC 571-6. Os resultados encontrados concordam com essas observações, comprovando a elevada capacidade de produção de órgãos vegetativos pelos porta-enxertos utilizados.

Ao descrever cultivares de videira, Pommer et al. (1994) caracterizaram os porta-enxertos IAC 572 e IAC 766 como vigorosos e Kober 5BB com vigor médio. Ripária do Traviú, segundo os autores, apresenta bom desenvolvimento, porém sem muito vigor. Os resultados relacionados ao desenvolvi-mento vegetativo dos porta-enxertos, coincidem rigorosamente com a descrição desses autores.

Como se verifica no resumo dos experimentos, os genótipos que não se diferencia-ram significativamente dos porta-enxertos em relação ao desenvolvimento vegetativo poderão ser considerados também vigorosos. Entre eles, desta-caram-se: 224-10, 202-56, 202-7, 202-1, 202-9, 202-21, 237-24, 202-6, 202-12, 202-18, e 202-10.

Uma classificação do desempenho dos genótipos nas variáveis estudadas pode ser, então, elaborada e é apresentada na TABELA 7.

Verifica-se que sete genótipos alcançaram bom desempenho nas três características, podendo ser considerados como os de melhor potencial para porta-enxertos, sendo eles: 237-24, 202-6, 202-18, 202-1, 202-10, 202-7 e 202-9.

Mostrando boa aptidão para velocidade de brotação e enraizamento, situaram-se os genótipos: 183-16, 204-5 e 202-2. Por outro lado, mostraram boa capacidade para enraizamento e desen-volvimento vegetativo, os genótipos: 202-21, 202-12 e 224-10.

 

Conclusões

Os resultados obtidos em comparação com os porta-enxertos tradicionais, permitiram destacar os seguintes grupos de genótipos:

a) os que apresentaram bom desempenho apenas em velocidade de brotação: 202-3, 238-16, 288-383, 300-43 e 300-92;

b) os que mostraram bom desempenho em enraizamento: 202-27, 202-30 e 301-704;

c) o que apresentou bom desempenho apenas em desenvolvimento vegetativo: 202-56;

d) os que apresentaram, concomitantemente, maior velocidade de brotação e melhor enraizamento: 183-16, 204-5 e 202-2;

e) os que apresentaram melhor enraizamento e melhor desenvolvimento vegetativo: 202-21, 202-12 e 224-10;

f) os que demonstraram bom desempenho nas três características, consideradas conjuntamente: 237-24 , 202-6, 202-18, 202-1, 202-10, 202-7 e 202-9.

 

Referências bibliográficas

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J. C. Da S. M. De Barros2; C. V. Pommer3,4; I. R. Da S. Passos3; M. M. Terra3,4; J. C. Sabino3; I.J. A. Ribeiro3; E.J. P. Pires3
2PESAGRO-RIO, C.P. 119.371, CEP: 27901-970 - Macaé, RJ.
3Instituto Agronômico-IAC, C.P. 28, CEP: 13001-970 - Campinas, SP.
4Bolsista do CNPq.
pommer[arroba]unb.br



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