Signos do corpo: Réquichot, Barthes e nós, os outros



RESUMO

Ao refletir sobre a imagem do corpo e o corpo da imagem, este ensaio promove uma leitura semiológica da análise que Roland Barthes opera em torno da obra de Bernard Réquichot: qual a imagem do corpo que, segundo o teórico de Elementos de semiologia (1965), a obra do artista dos Reliquaires (1955) estrutura? O corpo do artista fricciona-se no corpo do texto, desenhado pelo semiólogo, amador de signos.

Palavras-chave: Bernard Réquichot, Roland Barthes, semiologia, corpo, imagem.

ABSTRACT

Studying the image of the body and the body of image, this essay does a semiological reading of the Roland Barthes's analysis of Bernard Réquichot's works: which is the image of body that, according to the author of Eléments de sémiologie (1965), the work of the artist of the Reliquaires (1955) structures? The artist's body plays in the body of the text, drawned by the semiologist, amateur of signs.

Keywords: Bernard Réquichot; Roland Barthes; semiology; body; image.

RÉSUMÉ

En réfléchissant sur l'image du corps et sur le corps de l'image, cet essai réalise une lecture sémio-logique de l'analyse que Roland Barthes a effectuée au sujet de l'ouvre de Bernard Réquichot: quelle est l'image du corps que, selon le théoricien des Eléments de sémiologie (1965), la production de l'artiste des Reliquaires (1955) structure? Le corps de l'artiste joue dans le corps du texte, dessiné par le sémiologue, amateur de signes.

Mots-clé: Bernard Réquichot; Roland Barthes; semiologie; corps; image.

É preciso pintar, não para se fazer uma obra, mas para se ver até onde uma obra pode ir.*1

Bernard Réquichot

O mental é apenas o corpo levado a um outro nível de percepção: o que Réquichot chama o 'metamental'*2

Roland Barthes

Artista pouco conhecido, tanto do público não especializado quanto do mundo crítico das artes, Bernard Réquichot nasceu em 1º de outubro de 1929, em Asnières-sur-Vègre, na França, e se suicidou em Paris no dia 4 de dezembro de 1961. Em seu corpo trágico, reinscreveu, portanto, o adágio latino Vita brevis, ars longa ["A vida é breve, a arte, longa"], na medida em que, morto com apenas 32 anos, não legou uma ampla arte, antes produziu algo plasticamente complexo e, sem dúvida, voltado para um fatal hermetismo que talvez, merecesse um desdobramento, não lhe tivesse a tragédia sido um último gesto, na cena do desespero. Depois de ter pintado, de 1941 a 1946, quadros com inspiração exclusivamente religiosa, Réquichot se orientou, em 1953, influenciado por Jacques Villon, para o pós-cubismo, rompendo, todavia, a partir de 1955, com o desmantelamento da forma, quando passa a compor seus primeiros relicários – Le reliquaire de la forêt (1957-58), La maison du manège endormi (1958-59), Nokto keda taktafoni (1960), Reliquaire de l'Armoire de Barbe-bleue (1961) –, que são aglomerados de pintura e de pedaços de telas já pintadas, cortadas e coladas em uma caixa de madeira, em cujo espaço asfixiante proliferam a cor e a matéria. Imensos vermes solitários que formigam em um corpo, esses relicários evocam vísceras febris. Em 1957, o inquieto artista, que também era poeta, cria, com Traços gráficos [Traces graphiques], sua "escritura ilegível" (écriture illisible), emblema de toda uma arte, essencialmente incomunicável, cujo refúgio final só poderia ser o relicário da morte, buscada no abismo do suicídio. No fundo, o suicida procura, no além, uma comunicação impossível na sociedade humana; paradoxalmente, o gesto suicida se vinca de uma transcendênica inimaginável. Uma espiritualidade às avessas. Aliás, no posfácio a Às avessas [A rebours], de 1884, Joris-Karl Huysmans (1848-1907) considera a mais adequada crítica a essa sua obra aquela traçada por Jules-Amédée Barbey d'Aurevilly (1808-1889), que, em resenha publicada no Constitucional, em 28 de julho de 1884, escreveu: "Depois desse livro, não resta ao autor senão escolher entre a boca de uma pistola e os pés da cruz"*3.

Depois do livro vertiginoso, bíblia do decadentismo e evangelho do mais puro estericismo, Huysmans, criador do paradigmático de Des esseintes, recolheu-se, definitivamente, a uma tebaida, tornando-se oblata de São Bento. Bernard Réquichot, esteta estranho, optou, por sua vez, pela religiosidade, ou perversidade, do suicídio.

Difícil de ser nomeada, a arte de Réquichot, que viveu e trabalhou na vertigem insustentável da experimentação, sintoniza-se com a personalidade do artista, facilmente classificado por alguns como esquizofrênico, neurótico, psicótico, valores, como muito bem observa José Paulo Paes a respeito do herói-esteta, "negativos na escala do bom senso burguês, mas tornados positivos por Huysmans numa irrepetível equação às avessas"*4.


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