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A utilização da telemática na construção do pensamento autônomo do aluno na educação especial: um re (página 2)

Teófilo Alves Galvão Filho

O primeiro momento importante foi todo o processo de construção das páginas. Nesta etapa, houve uma dificuldade inicial decorrente da falta de uma noção mais clara, por parte dos alunos, sobre o que realmente significava e quais as possibilidades e alcances da Internet.

Embora todos os alunos envolvidos no projeto, uns mais, outros menos, já houvessem começado a ter alguma experiência de Internet, vários ainda não percebiam, de forma mais clara, suas dimensões e recursos. Naquele momento, com apenas um computador do laboratório conectado, procurou-se intensificar, na medida do possível, suas oportunidades de interação na rede.

E foram começando a surgir as idéias de cada um, para as suas páginas.

No processo de construção propriamente dito, além do aprendizado gradativo na utilização do software específico para montagem de webpages, percebemos que os alunos começaram a trabalhar, intuitivamente, com conceitos de diferentes domínios. Desde as decisões iniciais sobre cores, fundos, layout, organização de textos e imagens, gifs animados, até o conteúdo dos assuntos tratados em cada página, segundo as preferências e opções de cada um.

Foi possível verificar, na prática, a rica experiência de um aprendizado interdisciplinar, normalmente presente no processo de construção de conhecimentos através de projetos. Como faz notar Prado:

"De um modo geral, o desenvolvimento de um projeto computacional pode abranger vários domínios na sua constituição, propiciando uma interação entre as diversas áreas do conhecimento. Assim, a atividade de produzir um projeto computacional evidencia características de uma aprendizagem interdisciplinar." (PRADO, 1999)

Nesta fase também foi possível constatar a importância, para o aprendizado, das interações, tanto entre os alunos, quantos entre alunos e professores. Na construção de projetos, professor e alunos engajam-se, com uma perspectiva interdisciplinar, numa relação cooperativa de interações e intercâmbios, entrando o aluno com todas as suas vivências e conhecimentos anteriores sobre os temas tratados, e o professor ajudando a explicitar os conceitos que vão sendo intuitiva ou intencionalmente manipulados no desenvolvimento dos trabalhos e das novas descobertas.

E se pensarmos em termos de rede, de Internet, essa parceria na construção de projetos extrapola a relação restrita entre aluno e professor, para ampliar-se sem fronteiras em direção a inúmeras outras interações, fontes, parcerias, convergindo para o que Pierre Lévy chama de aprendizagem cooperativa. Nessa perspectiva, ressalta Lévy que:

"Os professores aprendem ao mesmo tempo que os estudantes e atualizam continuamente tanto os seus saberes 'disciplinares' como suas competências pedagógicas."... "A partir daí, a principal função do professor não pode mais ser uma difusão dos conhecimentos, que agora é feita de forma mais eficaz por outros meios. Sua competência deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento." (LÉVY, 1999)

Um segundo momento importante deste trabalho foi o momento no qual cada um colocou no ar o seu trabalho. Quando cada aluno pôde acessar a sua página já na rede, e ter na mão o endereço que a personalizava e a situava como um espaço só seu, foi um momento crucial a nível de crescimento da auto-estima e do sentimento de vitória, de sucesso e realização pessoal, na medida em que ficavam satisfeitos com o resultado dos seus esforços, trabalhos e pesquisas.

Um dos resultados mais evidentes e imediatos desse sentimento, nesta etapa, é a motivação renovada e ampliada para o estudo e aprendizado por parte dos alunos, acelerando o seu processo de desenvolvimento.

Neste momento, procuramos evidenciar para os alunos que a publicação das páginas era apenas mais uma etapa concluída, mas não um ponto final de chegada. Quisemos também deixar claro que o objetivo principal destas páginas e trabalhos não era alcançar uma suposta "perfeição", nem ortográfica, nem estilística, nem estética, mas sim o prazer da comunicação e da interação.

Os alunos são estimulados a que, em decorrência de seus próprios processos de aprendizagem, façam, gradativamente, eles mesmos as correções e melhorias em suas páginas e trabalhos, o que deve gerar um processo continuado e permanentemente inacabado, como todo o processo de desenvolvimento humano.

A terceira etapa é a que se refere às conseqüências e resultados da publicação e continuidade do processo interativo: os alunos iniciaram, então, diversos relacionamentos novos com diferentes pessoas, principalmente através da troca de e-mails.

A partir do lançamento e divulgação das páginas, diversas mensagens começaram a chegar para os alunos, de diferentes cidades e estados. Era o "feedback" que cada um recebia e fazia com que "re-visitasse" a sua própria página com um novo olhar.

Para alguns, foi a oportunidade de compreender, de forma mais concreta, os alcances e possibilidades da Internet e da publicação de sua página.

Por exemplo, um aluno recebeu um e-mail de uma pessoa do Rio Grande do Sul, elogiando o seu trabalho, as suas iniciativas e idéias, divulgadas em sua homepage. O aluno ficou muito contente com a mensagem, mas perguntou à sua professora:

"Mas por quê essa pessoa escreveu para mim?..."

Sintomaticamente, essa pergunta revelou uma percepção ainda bastante parcial e incipiente sobre o alcance e possibilidade de repercussão que sua publicação podia ter. A partir das mensagens recebidas e das perguntas que os alunos começavam a se fazer, era possível perceber seus progressos na construção de uma percepção mais ampliada e realista do sentido e possibilidades da telemática, da comunicação via Internet.

E continuam chegando diversas outras mensagens para vários alunos, todas com repercussões bastante positivas para cada um. Coloco alguns exemplos de trechos dessas mensagens, chegadas de diversos lugares, para diferentes alunos:

"A tua vida serve de exemplo para muitas pessoas que se acham "normais", mas desistiram de lutar, sufocados e desanimados pelas amarguras da vida..."

"Gostei demais do teu texto e da tua página em geral... Peguei um desenho animado que está na tua página e dei o arquivo para minha filha..."

"...fiquei maravilhada com sua vida e história de amor..."

"Amei o site do CRPD e a sua página está linda. Vou fazer propaganda para os meus amigos internautas..."

"Sou mãe de um menininho de 6 anos muito especial como você... Gostei muito de sua página... Se precisar de alguma ajuda, é só mandar um e-mail."

E assim, diversas outras mensagens. Creio que não é difícil imaginar a ressonância dessas mensagens no interior de cada aluno que as recebe...

A repercussão desse novo canal de comunicação e interação para os alunos, já vem trazendo reflexos positivos em todo o processo de aprendizado e desenvolvimento de cada um. A renovada motivação para o aprendizado, o aumento da auto-estima, o desejo de comunicar-se mais e melhor, enfim, são alguns dos frutos desse projeto em construção. Como exemplo disso, nos parece significativo esse pequeno texto, escrito por um aluno (aqui reproduzido literalmente, sem correções):

"AMIZADE NA INTERNET. Eu fico muito feliz quando recebo e-mail de pessoas mim dando parabéns pela a minha página na internet. Quando recebo os e-mail eu leio e respondo e assim eu faço amizade na internet. essas pessoa gostam do trabalho e acham interessante, eu mim sinto importante."

Todo este caminho aponta para a necessidade de dar prosseguimento e aprofundamento cada vez maior ao trabalho, que, por sua própria metodologia e filosofia, preenche, em nossa comunidade, uma lacuna entre as atividades essenciais para o desenvolvimento e autonomia da pessoa portadora de necessidades educacionais especiais, num mundo que cada vez mais exige do cidadão uma participação ativa e criadora.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, Ed. 34, 1999.

GALVÃO FILHO, Teófilo A. Educação Especial e novas tecnologias: o aluno construindo sua autonomia. Revista INTEGRAÇÃO, Brasília, MEC, ano 13, n. 23, p. 24-28, 2001.

PRADO, Maria Elisabette B. B. O uso do computador na formação do professor. Brasília, PROINFO/MEC, 1999.

VALENTE, José Armando. (Org.), Liberando a mente: computadores na educação especial. Campinas, UNICAMP, 1991.

 

Autor:

Teófilo Alves Galvão Filho

teofilo[arroba]infoesp.net

teogf[arroba]ufba.br

Mestre e Doutorando em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), especialista em "Informática na Educação" e engenheiro. É coordenador do Programa InfoEsp das Obras Sociais Irmã Dulce, professor universitário e membro do Comitê de Ajudas Técnicas da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, da Presidência da República - CORDE/SEDH/PR

www.galvaofilho.net



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