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O Programa InfoEsp - "Informática, Educação e Necessidades Especiais" (página 2)

Teófilo Alves Galvão Filho

Atualmente são oferecidos dois cursos técnicos:

1- Curso de Informática Básica
2- Curso de Montagem e Manutenção de Computadores

A meta é a formação, somente com esses cursos técnicos, de uma média de 100 pessoas com deficiência por ano.

Alem desses cursos técnicos, o Programa InfoEsp também atende, atualmente, a 108 alunos com necessidades educacionais especiais a partir dos 8 anos de idade (pessoas com deficiência física, sensorial e deficiência intelectual), de Salvador e municípios próximos, com duas ou três horas-aula por semana. Nesses casos, o objetivo é trabalhar o desenvolvimento cognitivo e as possibilidades de comunicação desses alunos, principalmente crianças e adolescentes, utilizando os recursos do ambiente computacional e telemático. Em alguns casos, também adultos. Esses alunos constroem seus conhecimentos através da interação com softwares que respondem ás suas necessidades educacionais e de comunicação, detectadas por avaliação e no decorrer das atividades, segundo uma filosofia e metodologia que configura o paradigma pelo qual optamos. E, com isso, o trabalho têm apresentado resultados que estimulam a sua continuidade, aprofundamento e ampliação, resultados esses percebidos em diversos aspectos do desenvolvimento:

a) Desenvolvimento sócio-afetivo:

- Maior motivação e entusiasmo dos alunos para as atividades educacionais.
- Aumento da interação do aluno com o meio em que vive.
- Maior estímulo para o exercício da criatividade.
- Crescimento do sentido de auto-estima.

b) Desenvolvimento cognitivo:

- Compreensão de conceitos e aumento de conhecimentos teórico-práticos.
- Desenvolvimento do raciocínio lógico-dedutivo.

Nesse aspecto encontramos agora, por exemplo, adolescentes com paralisia cerebral que freqüentavam escolas especializadas há vários anos, sem que nunca tivessem conseguido aprender a ler e escrever, e que puderam desenvolver essas capacidades a partir do trabalho no Laboratório de Informática. Alguns deles já prestam, inclusive, pequenos serviços de informática para a instituição e também editam no computador o pequeno jornal do local. Além do desenvolvimento de outras habilidades e conceitos, como a capacidade de ver as horas, o desenvolvimento do conceito de número, comunicação através da Internet, etc., construídos em função do potencial de cada um.

Em relação a utilização da Internet, percebemos também que essa atividade tem influenciado no aprimoramento da comunicação escrita de alguns alunos, através das mensagens de e-mail que são trocadas, além de motivá-los a realizarem pesquisas sobre diversos assuntos na rede. Enfim, desenvolveram habilidades que proporcionam uma melhor interação com o seu meio e uma maior autonomia na resolução dos próprios problemas.

c) Desenvolvimento da psicomotricidade global e fina:
- Maior consciência de possibilidades motoras a serem exploradas.
- Busca de superação de limitações motoras.
- Treino de habilidades de coordenação motora fina.

Para que isto possa ocorrer no trabalho com alunos com necessidades educacionais especiais, freqüentemente é necessário recorrer a diferentes tipos de adaptações que facilitem, ou mesmo possibilitem, o trabalho no computador, principalmente quando se tratam de alunos com alguma deficiência motora ou sensorial. Esses recursos de Tecnologia Assistiva podem ser ou Adaptações Físicas e Órteses, ou Adaptações de Hardware, ou Softwares Especiais de Acessibilidade. Com a finalidade de possibilitar o acesso ao computador a alunos com um comprometimento motor mais severo, fazemos uso de diversas adaptações e programas especiais de acessibilidade, que tornam o trabalho possível a essas pessoas. é o caso, por exemplo, de um aluno nosso, adulto, tetraplégico, e que só consegue utilizar o computador através de um programa especial que lhe possibilita transmitir seus comandos somente através de sopros em um microfone. Isto lhe tem permitido agora, pela primeira vez na vida, escrever, desenhar, jogar e realizar diversas atividades que antes lhe eram impossíveis. Ou seja, novos horizontes se abriram para esse aluno, possibilitando que sua inteligência, antes aprisionada por um corpo extremamente limitado, encontrasse novos canais de expressão e desenvolvimento.

Da mesma forma, outros alunos fazem uso de diferentes adaptações, em função das necessidades específicas de cada um, tais como: máscara de teclado (colméia), estabilizador de punho, abdutor de polegar, simuladores de teclado e simuladores de mouse com diferentes acionadores, opções de acessibilidade do Windows e outras (para mais detalhes sobre esses recursos utilizados, clique aqui).

Além desses resultados, o Programa InfoEsp tornou-se centro de referência para pesquisa e capacitação de profissionais, sendo convocado, através de membros de sua equipe, por instituições de educação da Bahia, para a formação de técnicos na área, através de palestras, seminários e disciplinas ministradas em cursos de graduação e pós-graduação em instituições de ensino superior, tais como:

- Universidade do Estado da Bahia, UNEB, em Salvador.
- Universidade Estadual de Santa Cruz, UESC, em Ilhéus.
- Faculdade de Educação da Bahia, CEPOM/FEBA, em Salvador.
- Curso de Pedagogia da UNIBAHIA, em Lauro de Freitas.
- Curso Normal Superior das Faculdades UNIME, em Lauro de Freitas.
- Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, em Salvador.
- Faculdade São Bento da Bahia, em Salvador.

O Programa foi chamado a apresentar suas atividades no II Curso de Capacitação de Multiplicadores em Informática na Educação, orientado para a Educação Especial, realizado em Brasília e promovido pelo MEC (Secretaria de Educação Especial - SEESP/MEC), em setembro de 2000, através de seu coordenador que, como palestrante convidado, proferiu a palestra "O Programa Informática na Educação Especial do CRPD: O Aluno Construindo sua Autonomia".

Ao Programa também foi solicitada a apresentação de projetos de capacitação de professores, em Informática na Educação Especial, para diferentes instituições especializadas de Salvador. Em abril de 2000 iniciamos a capacitação dos professores da APAE-Salvador com um curso introdutório de 30 horas, ministrado pelos professores do nosso Programa, tendo ocorrido visitas de alunos e professores da APAE ao nosso laboratório.

O Programa InfoEsp, numa parceria com o ITS - Instituto de Tecnologia Social, de São Paulo, começou a desenvolver, no ano de 2007, um projeto de formação de multiplicadores, para coordenadores e monitores de Infocentros (Telecentros), de diferentes estados brasileiros. Esse projeto tem o intuito de possibilitar que os programas de inclusão digital desses estados sejam verdadeiramente acessíveis a todos, levando em consideração as necessidades de acesso e utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação por pessoas com deficiência, disponibilizando as metodologias e recursos de Tecnologia Assistiva indispensáveis para isso. Com esse objetivo, os profissionais do InfoEsp ministraram o curso "Infocentros Acessíveis: Inclusão Sócio-Digital da Pessoa com Deficiência nos Telecentros Comunitários". Esse curso tem uma carga horária de 80 horas, sendo 20 horas á distância pré-curso presencial, mais 40 horas de curso presencial nos Laboratórios do Programa InfoEsp em Salvador, e outras 20 horas á distância, pós-curso presencial. Na primeira turma participaram representantes de seis Telecentros, de cinco estados brasileiros, além de representantes do ITS, entre coordenadores e monitores.

Sobre o Programa foram publicadas diferentes matérias e entrevistas, tais como:

- nos jornais "A Tarde" (07/06/2000, 18/07/2002, 07/07/2004, 08/12/2004), "Correio da Bahia" (06/03/1997, 06/04/2000, 13/04/2000, 07/06/2001, 18/07/2002, 05/07/2004, 22/10/2004, 04/12/2004, 21/05/2005), "Gazeta Mercantil" (17/04/2000, 01/10/2001);
- nos websites do Ministério da Educação - MEC (21/06/2004), da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado da Bahia (SECTI - 21/10/2004 e 09/12/2004, 20/05/2005), da Fundação Banco do Brasil (09/07/2003) e da Rede de Informações para o Terceiro Setor - RITS (07/11/2003);
- na Revista TV ESCOLA, do MEC 
(ver em: http://portal.mec.gov.br/seed/index.php?option=content&task=view&id=121&Itemid=256);
- nos noticiários das TVs Educativa, Bahia, Bandeirantes e Aratu;
- no episódio "Democratização da Comunicação" (maio/2003) do Programa "Brava Gente Brasileira", no CANAL FUTURA.
- No Episódio nº 46 do "Programa Especial" (18/01/2005), da TVE - Rede Brasil (RJ).

Em agosto de 2002 a equipe do Programa participou do III Congresso Ibero-Americano de Informática na Educação Especial (CIIEE 2002), em Fortaleza-Ceará, onde apresentou quatro trabalhos científicos, sendo que, como painelista convidado, seu coordenador apresentou o trabalho "A Telemática no Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos: Vivências da Educação Especial no CRPD" (clique para ler). Em 2005, também foi apresentado trabalho por componente da equipe do Programa InfoEsp no CIIEE 2005, em Montevidéu, no Uruguai.

No ano de 2001 nosso Programa recebeu a "Certificação como Tecnologia Social", conferida pelo Prêmio Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil em parceria com a UNESCO, passando a compor o Banco de Tecnologias Sociais dessa Fundação. Em 2007, o Programa InfoEsp foi o vencedor do Prêmio Rainha Sofia de Reabilitação e Integração 2007, conferido pelo Real Patronato sobre Discapacidad, do Ministério do Trabalho e Assuntos Sociais da Espanha (ver matérias sobre este prêmio: Real Patronato sobre Discapacidad, Casa Real Espanhola, Discapnet, Revista Sentidos). Em função desse prêmio recebido, o Real Patronato sobre Discapacidad lançou, na Espanha, as versões impressa e digital de uma publicação sobre o trabalho do Programa InfoEsp, disponibilizando no site do Centro Español de Documentación sobre Discapacidad (CEDD) a versão digital dessa publicação (clique para ler). E, também em 2007, o Programa InfoEsp recebeu o Prêmio Top Social 2007, conferido pela Associação Brasileira de Agências de Publicidade, capítulo Bahia - ABAP-BA, Associação dos Dirigentes de Marketing e Vendas da Bahia, ADVB/BA e da ACB - Associação Comercial da Bahia.

Como Centro de Pesquisa, no Programa foram sistematizados diferentes estudos, dos quais destacamos:

1) Pesquisa sobre "o desenvolvimento do conceito de número no ambiente Logo de aprendizagem com alunos portadores de paralisia cerebral", que resultou em monografia aprovada pelo "Curso de Especialização em Informática na Educação" da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em 1996, apresentada por membro da equipe do Programa.

2) Foi estudada, também por componente da equipe, "a relação entre o vínculo afetivo e a aprendizagem em indivíduos institucionalizados e portadores de deficiências", trabalho examinado e aprovado pelo "Curso de Especialização em Projetos Educacionais e Informática" do Centro de Estudos de Pós-Graduação Olga Mettig, da Faculdade de Educação da Bahia (FEBA/CEPOM), em 1998.

3) Ao longo desses anos, tem sido alvo permanente da preocupação e estudos da equipe a construção e captação de novas adaptações e recursos de Tecnologia Assistiva, que facilitem, ou mesmo possibilitem, o trabalho no computador a alunos com diferentes níveis de comprometimento motor, pesquisas desenvolvidas sempre em função das necessidades concretas dos nossos alunos.

4) Foi desenvolvida, no laboratório do Programa, a pesquisa intitulada "Ambientes computacionais e telemáticos no desenvolvimento de projetos pedagógicos com alunos com paralisia cerebral", para a elaboração da dissertação do Mestrado em Educação, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), por componente da equipe (para ler, clique aqui).

5) Também foi desenvolvida a pesquisa sobre "o processo de alfabetização de portadores de deficiência múltipla através de recursos das tecnologias da informação e da comunicação", para a elaboração de monografia do "Curso de Especialização em Alfabetização Infantil", pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), também por componente da equipe.

6) Em andamento no Laboratório, a pesquisa sobre "tecnologias assistivas em ambiente computacional e telemático: sistemas estimuladores dos processos de supercompensação em alunos com deficiência motora severa"  para a Tese de Doutorado em Educação, por componente da equipe, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Em função de diferentes fatores detectados e vivenciados na nossa realidade e comunidade, dos quais destacamos:

a) o real e acentuado atraso no desenvolvimento global da quase totalidade das pessoas com alguma deficiência que nos procura, a grande maioria proveniente de famílias de baixa renda;

b) o fato de que ainda não sejam encontrados com facilidade, nas estruturas educacionais oficiais de nossa comunidade, nem a infra-estrutura de novas tecnologias a serviço da Educação Inclusiva, e, em muitos casos, nem modelos pedagógicos que realmente confiem e apostem nas capacidades e iniciativa do aluno com necessidades especiais, na construção de seus próprios conhecimentos e de sua autonomia;

este trabalho, como um programa específico de utilização da informática na educação de alunos com necessidades especiais, tem confirmado sua viabilidade e relevância, ao longo dos seus mais de 10 anos de existência, principalmente pelos significativos resultados alcançados, entre os quais podemos destacar as transformações e saltos na qualidade da postura de muitos alunos em relação a sua própria vida, o resgate da sua auto-estima, a vivência e valorização de seu processo de aprendizagem e interação com o mundo, e a inclusão sócio-digital desses alunos, conforme relatado acima.

Todo este caminho e resultados apontam para a necessidade de dar prosseguimento e aprofundamento sempre maior ao trabalho, que preenche, em nossa comunidade, uma lacuna entre as atividades essenciais para o desenvolvimento e autonomia da pessoa com necessidades educacionais especiais, num mundo que cada vez mais exige do cidadão uma participação ativa e criadora. Com maior eficácia ainda se todo o trabalho de Informática Aplicada á Educação, com os paradigmas que propomos, for sendo integrado, cada vez mais, em um contexto mais abrangente de Escola e Sociedade Inclusiva.

1- Introdução: Educar para a autonomia

(GALVÃO FILHO, Teófilo A. Educação Especial e novas tecnologias: o aluno construindo sua autonomia. Revista INTEGRAÇÃO, Brasília, MEC, ano 13, n. 23, p. 24-28, 2001.)

Com muita freqüência a criança com alguma deficiência, física, mental ou sensorial, por suas próprias limitações motoras e/ou sociais, agravadas por um tratamento paternalista não valorizador de suas potencialidades, cresce com uma restrita interação com o meio e a realidade que a cerca. Muitas vezes, se não for adequadamente estimulada, assume posições de passividade diante da realidade e na solução de seus próprios problemas diários. é condicionada a que outros resolvam os seus problemas e até pensem por ela. Como faz notar VALENTE:

"As crianças com deficiência (física, auditiva, visual ou mental) têm dificuldades que limitam sua capacidade de interagir com o mundo. Estas dificuldades podem impedir que estas crianças desenvolvam habilidades que formam a base do seu processo de aprendizagem." (VALENTE, 1991).

Se, conforme Piaget, as crianças são construtoras do próprio conhecimento, quando portadoras de deficiência essa construção, portanto, pode ser limitada pela restrita interação das mesmas com o seu ambiente. E é nesta interação que, segundo Papert, através da ação física ou mental do indivíduo, se dão as condições para a construção do conhecimento. Sobre a importância, para o aprendizado, das interações no mundo, enfatiza PAPERT:

"O Construcionismo, minha reconstrução pessoal do Construtivismo,... atribui especial importância ao papel das construções no mundo como apoio para o que ocorreu na cabeça, tornando-se, deste modo, menos uma doutrina puramente mentalista." (PAPERT, 1994)

E quando estas crianças com necessidades educacionais especiais ingressam em um sistema educativo tradicional, em uma escola tradicional, seja especial ou regular, freqüentemente vivenciam interações que reforçam uma postura de passividade diante de sua realidade, de seu meio. Freqüentemente são submetidas a um paradigma educacional no qual elas continuam a ser o objeto, e não o sujeito, de seus próprios processos. Paradigma esse que, ao contrário de educar para a independência, para a autonomia, para a liberdade no pensar e no agir, reforça esquemas de dependência e submissão. São vistas e tratadas como receptoras de informações e não como construtoras de seus próprios conhecimentos.

Exatamente pelas dificuldades e atrasos que estes alunos com necessidades especiais frequentemente apresentam em seu desenvolvimento global, é vital, com mais ênfase nestes casos, oferecer-lhes um ambiente de aprendizagem que os ajude a abandonar essa postura passiva de receptores de conhecimento. Um ambiente onde sejam valorizadas e estimuladas a sua criatividade e iniciativa, possibilitando uma maior interação com as pessoas e com o meio em que vivem, partindo não de suas limitações e dificuldades, mas da ênfase no potencial de desenvolvimento que cada um trás em si, confiando e apostando nas suas capacidades, aspirações mais profundas e desejos de crescimento e integração na comunidade.

Mas, para que o aprendiz seja esse sujeito ativo na construção do próprio conhecimento, é vital que lhe sejam oferecidas condições e ambientes nos quais ele possa, a partir de seus próprios interesses e dos conhecimentos específicos que já traga consigo, exercitar sua capacidade de pensar, comparar, formular e testar ele mesmo suas hipóteses, relacionar conteúdos, conceitos. E errar para reformular suas hipóteses, depurando-as.

2- Referência Primeira: Construtivismo/Construcionismo

A referência filosófica e metodológica primeira do nosso Programa, no seu início em 1993, foi o Ambiente Logo de Aprendizagem. Todo o suporte e estruturação teórica do Ambiente Logo, que tem principalmente em Papert, Piaget, Vygotsky e Paulo Freire seu alicerce mais profundo, continua norteando o paradigma educacional que permeia as nossas ações e práticas pedagógicas.

Papert procurou sistematizar, na interação com o computador, muitos aspectos das idéias de Piaget, com quem estudou, e cujas proposições teóricas tiveram origem no interesse particular de Papert pelos mecanismos de aprendizagem do ser humano. Sua idéia era criar um ambiente de aprendizagem onde o conhecimento não é passado para a pessoa, mas onde o aluno, interagindo com os objetos desse ambiente, pudesse manipular e desenvolver outros conceitos (VALENTE, 1991).

Piaget demonstrou que a criança já possui, desde os primeiros anos, mecanismos de aprendizagem que ela desenvolve mesmo sem ter ido a escola, a partir da interação com os objetos do ambiente onde vive (VALENTE, 1991). Baseado nisso, Papert propõe o Construcionismo, que estuda e explica a construção do conhecimento em função da ação física ou mental do aprendiz, na construção de projetos de seu interesse, em interação com os objetos de seu meio através do computador. Para o Construcionismo é importante também o tipo de ambiente onde o aprendiz está inserido. Por isso, busca-se criar um ambiente de aprendizagem rico e aberto, onde o controle do processo de construção do conhecimento está nas mãos do aluno e não do professor. A atividade é proposta pelo aprendiz, e seus projetos são algo que ele deseja realizar. O professor deixa de ser o "controlador" e passa a ser o "facilitador" do processo de aprendizagem (VALENTE, 1991), o que exige normalmente uma mudança de mentalidade do professor.

O fato de que o controle do processo esteja nas mãos do aprendiz, já favorece o seu envolvimento, cabendo ao facilitador propor novos desafios que o estimulem e estejam ao seu alcance, propor alterações nas atividades, perguntar, ajudando a explicitar os conceitos que estão sendo trabalhados a cada passo dos projetos. é fundamental para isto, o conceito de "zona de desenvolvimento proximal", definida por VYGOTSKY como:

"... a distância entre o nível de desenvolvimento real que se costuma determinar através da solução independente de problemas e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes." (VYGOTSKY, 1987)

Segundo MENEZES, "esta concepção vem permitindo mudanças no ambiente de aprendizagem, principalmente quanto á adoção de metodologias voltadas para o reconhecimento da identidade cultural do aluno" (MENEZES, 1993). Portanto, é imprescindível, para o facilitador, o conhecimento sobre o aluno, sua história, seu meio social, sua forma e estilo de interagir e construir o conhecimento. A partir disso, é possível atuar na sua "zona de desenvolvimento proximal", levando-o a dar passos de seu "nível de desenvolvimento real", para o "nível de desenvolvimento potencial".

Sobre a valorização da identidade cultural do aluno e a importância de seu contexto social, esse paradigma é enriquecido também por toda a reflexão de Paulo Freire relativa a este tema.

Neste modelo educacional a ênfase não é colocada no produto que a pessoa realiza, mas no processo pelo qual ela atinge seus objetivos. Por isso, o erro deixa de ser algo passível de punição, e passa a ser um momento de reavaliação, de depuração pelo aluno de suas próprias hipóteses. Esta reavaliação e depuração é um momento privilegiado para o aprendizado, pois no momento em que revê suas hipóteses, que foram testadas por ele mesmo em seu projeto, fica desafiado, a partir da identificação e análise do seu erro, a elaborar novas hipóteses e novas estratégias para a solução dos problemas. Ele tem o interesse em encontrar a solução para as dificuldades que encontra, pois os objetivos a que deve chegar são definidos por ele mesmo e não impostos por outros. O aluno começa a pensar sobre sua forma de pensar. E as etapas normalmente percorridas pelo aluno neste processo, são sistematizadas por VALENTE segundo os seguintes passos: descrever a solução do problema através dos comandos, executar no computador, refletir sobre o resultado obtido e depurar se for necessário, para novamente continuar a descrição (VALENTE, 1993).

3 - Aprendizagem baseada em projetos

Com o advento dos novos recursos multimídia e do acesso massivo á Internet, novos programas e atividades foram sendo incorporados aos nossos trabalhos, mas mantendo a estruturação teórica que nos tem servido de referência.

Se estivermos manipulando outros softwares e sistemas abertos, ou seja, aqueles que permitam ao aluno o desenvolvimento de projetos em diferentes áreas do conhecimento (software de autoria, por exemplo), recorrendo, para isto, a sua criatividade e mecanismos internos de construção desse conhecimento e resolução de problemas, também poderemos estar trabalhando segundo a Filosofia Logo, mas utilizando diversos recursos além da Linguagem Logo.

Para exemplificar, se pensarmos em atividades que objetivem o desenvolvimento da lecto-escrita, além de outros conteúdos, os alunos podem trabalhar, por exemplo, com projetos de criação, redação e leitura de histórias utilizando, entre várias opções:

a) editores de texto e softwares específicos de edição de histórias;

b) programação livre com a Linguagem Logo, combinando projetos gráficos com frases e textos, descritivos ou narrativos;

c) o intercâmbio, através de correio eletrônico, de suas produções, projetos e idéias, entre os próprios alunos participantes das atividades ou também com outros alunos de diferentes localidades;

d) pesquisa de histórias na Web.

E, da mesma forma, diferentes conteúdos podem ser desenvolvidos através de outros projetos, definidos juntos por alunos e professor, mas a partir das necessidades e interesses dos alunos, utilizando os mais variados recursos computacionais abertos, facilmente encontrados e manipulados hoje, quando se construiu e se está inserido em uma cultura de informática. Esses projetos podem incluir atividades tais como a construção individual ou coletiva de páginas na Internet, desenvolvimento de temas atuais utilizando recursos multimídia, pesquisas e comentários relacionados com as problemáticas diárias vividas pelo aluno, utilizando a Web, editores gráficos e de texto, software de autoria, etc, etc. O nível de complexidade dos projetos pode variar, desde o mais simples e elementar, até um mais complexo e sofisticado, em função do potencial cognitivo e capacidade de abstração do aluno, mas, ao mesmo tempo, sempre num patamar que o desafie a produzir saltos de qualidade em seus conhecimentos e capacidades atuais.

É importante destacar que, na aprendizagem através de projetos, como unidade de trabalho, conteúdos de diferentes áreas estarão sendo trabalhados, de forma interdisciplinar, no desenvolvimento de um mesmo projeto. é vital que o facilitador tenha a sensibilidade de ajudar o aluno a explicitar esses conteúdos. Nas palavras de PRADO:

"De um modo geral, o desenvolvimento de um projeto computacional pode abranger vários domínios na sua constituição, propiciando uma interação entre as diversas áreas do conhecimento. Assim, a atividade de produzir um projeto computacional evidencia características de uma aprendizagem interdisciplinar. Para Fazenda (1993), '...a interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre especialistas e pelo grau de integração real das disciplinas no interior de um mesmo projeto'" (PRADO, 1999)

Na construção de projetos, professor e alunos engajam-se, com uma perspectiva interdisciplinar, numa relação cooperativa de interações e intercâmbios, entrando o aluno com todas as suas vivências e conhecimentos anteriores sobre os temas tratados, e o professor ajudando a explicitar os conceitos que vão sendo intuitiva ou intencionalmente manipulados no desenvolvimento dos trabalhos e das novas descobertas. E se pensarmos em termos de rede, de Internet, essa parceria na construção de projetos extrapola a relação restrita entre aluno e professor, para ampliar-se sem fronteiras em direção a inúmeras outras interações, fontes, parcerias, convergindo para o que Pierre Lévy chama de aprendizagem cooperativa. Nessa perspectiva, ressalta LéVY que:

"Os professores aprendem ao mesmo tempo que os estudantes e atualizam continuamente tanto os seus saberes 'disciplinares' como suas competências pedagógicas."... "A partir daí, a principal função do professor não pode mais ser uma difusão dos conhecimentos, que agora é feita de forma mais eficaz por outros meios. Sua competência deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento." (LéVY, 1999)

O trabalho de forma interdisciplinar nem sempre é fácil, essencialmente porque estamos por demais acostumados com uma visão compartimentada do conhecimento. Sobre isto, comenta PRADO:

"... acredito que a efetivação de um trabalho interdisciplinar depende, essencialmente, do rompimento de uma visão fragmentada e hierarquizada do conhecimento. Em outras palavras, a interdisciplinaridade depende de mudanças de concepções, valores e, conseqüentemente, de atitudes." (PRADO, 1999)

No desenvolvimento de projetos a Educação apropria-se de um dos recursos mais humanizantes das novas tecnologias, que é a possibilidades da execução de projetos cooperativos via rede. Como destacam ALMEIDA e FONSECA JÚNIOR:

"A grandeza da informática não está na capacidade que ela tem de aumentar o poder centralizado nem na sua força para isolar as pessoas em torno da máquina"... "A grandeza da informática encontra-se no imenso campo que abre á cooperação. é uma porta para a amizade, para a criação de atividades cooperativas, para a cumplicidade de críticas solidárias aos governos e os poderes opressores ou injustos. Enfim, as redes informatizadas propiciam a solidariedade e a criação e desenvolvimento de projetos em parcerias." (ALMEIDA e FONSECA JÚNIOR, 2000)

A criação de um ambiente educacional informatizado aberto, que propicia uma intensiva participação criativa e cooperativa dos alunos com necessidades educacionais especiais, tem apresentado resultados tais como uma "...maior motivação e entusiasmo dos alunos para atividades educacionais", "...aumento da interação do aluno com o meio em que vive", além do "...desenvolvimento do seu raciocínio lógico-dedutivo". (GALVÃO FILHO, 1995)

Trabalhando desta maneira, o aluno estará utilizando diferentes recursos computacionais e telemáticos, mas dentro de um mesmo paradigma valorizador de suas capacidades e iniciativa. E o computador e a telemática serão utilizados como recursos, ou como um ambiente (em se tratando de Internet), através dos quais esse aluno irá construindo o seu conhecimento. é superada, portanto, a concepção do computador como uma "máquina de ensinar", na qual eram introduzidas informação, para que depois fossem repassadas, "ensinadas", ao aprendiz. Com essa metodologia não é, portanto, o computador que ensina o aluno, mas sim o aluno que aprende "ensinando o computador", ou seja, criando, desenvolvendo novos projetos.

(Sobre essa temática, ver também o texto "A Telemática no Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos: Vivências da Educação Especial no CRPD" - clique para ler)

Teófilo Alves Galvão Filho

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Fernando José de. e FONSECA JUNIOR, Fernando. Aprendendo com projetos. Brasília, PROINFO/MEC, 2000.

GALVÃO FILHO, Teófilo Alves. Informática: novos caminhos na educação. Salvador, Anais do XII Congresso Nacional da Associação Brasileira de Paralisia Cerebral, ABPC, 1995.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, Ed. 34, 1999.
MENEZES, Sulamita Ponzo de. Logo e a formação de professores: o uso interdisciplinar do computador na educação. São Paulo, ECA/USP, 1993.

PAPERT, Seymour. A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática. Porto Alegre, Artes Médicas, 1994.
PRADO, Maria Elisabette B. B. O uso do computador na formação do professor. Brasília, PROINFO/MEC, 1999.
VALENTE, José Armando (org.). Liberando a mente: computadores na educação especial. Campinas, UNICAMP, 1991.
VALENTE, José Armando (org.). Computadores e conhecimento: repensando a educação. Campinas, UNICAMP, 1993.

VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo, Martins Fontes, 1987.

Programa InfoEsp: www.infoesp.net

 

 

Autores:

O Programa conta com uma equipe fixa de quatro técnicos, permanentemente envolvidos com o trabalho. Eventualmente e por períodos de tempo pré-definidos, ela é ampliada com a participação de estagiários de diferentes cursos superiores. Formam a equipe permanente do Programa os seguintes profissionais:

Luciana Lopes Damasceno

- Especialista em "Projetos Educacionais e Informática", pelo Centro de Estudos de Pós-Graduação Olga Mettig, da Faculdade de Educação da Bahia (FEBA/CEPOM);

- Especialista em "Alfabetização Infantil", pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB);

- Pedagoga, graduada pela Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA).

Mariana De Azevedo Barros  

- Pedagoga, graduada pela Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA).

- Pesquisadora pelo PIBIC (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) da UFBA, com o projeto "A Escolarização da Pessoa com Deficiência Visual" (2005-2006).

Teófilo Alves Galvão Filho

www.galvaofilho.net

teofilo[arroba]infoesp.net

teogf[arroba]ufba.br

- Mestre e Doutorando em Educação, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA);

- Especialista em "Informática na Educação", pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL);

- Engenheiro, graduado pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel/RS);

- Coordenador do Programa. 

Wesley Silveira Santos

- Acadêmico do Curso Tecnológico Superior - Redes de Computadores, pela UNIFACS.

- Técnico e Instrutor de Informática.



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