Jornalista e professor universitário. Além de ser especialista em Teorias e Técnicas da Comunicação e mestre em Comunicação e Mercado, ele também é colecionador de revistas, "gibis" e de outros produtos oriundos da Indústria Cultural, por isso um entusiasta das discussões sobre essa área.
"A imagem elevada no seu mais alto grau de expressão, não mais a representação do objeto, mas de sua própria alma".
Lotte Eisner, in A Tela Demoníaca.
Com essa definição, a crítica Lotte Eisner tentaria decifrar o movimento expressionista alemão, que vigorou em quase toda a produção cinematográfica das décadas de 20 e 30 na Alemanha pré-nazista do século passado. Momentos de inquietude, que gerou mitos, fantasmas e monstros na inconsciência social daquele povo acostumado á grandiosidade de sua lógica filosófica e histórica.
Os artistas alemães, principalmente os escritores e cineastas da época, assumiram uma postura um tanto quanto sombria daquela vida incógnita durante a, então recém imposta, República de Weimar. As emoções desses artistas, agora extrapoladas num ponto alto de sua expressão, eram quase sempre acompanhadas por figuras deformadas, que procuravam demonstrar exatamente como era compreendida a realidade. Para esses artistas, a Luz, natural ou artificial, ao ser refletida numa determinada imagem, escondia seu real significado.
Nas sombras expressas pelas imagens seriam onde encontraríamos nossos fantasmas, significantes de uma determinada realidade desse período alemão. A partir deste pressuposto, o trabalho com expressões ou distorções de imagens, os jogos de luzes e sombras e a materialização da agonia, do desespero e dos piores pesadelos, definiriam o expressionismo dos filmes alemães dessas duas décadas.
Esse movimento estético de grande magnitude psicológica coletiva também foi importado, nos anos 30 e 40, por outros países. Nos Estados Unidos alguns artistas, cineastas e até mesmo desenhistas de histórias em quadrinhos a utilizariam como forma adaptada aos veículos específicos, para melhor definir personagens ou estilo das narrativas.
Dois dos personagens de comic books criados nessa época, The Spirit (1940) e The Batman (1939), figuraram como casos expressivos desse movimento nos EUA, não com a postura política, social ou até mesmo psicológica, provocadora, que os artistas alemães tiveram, mas apresentando e valorizando, apenas, os traços estéticos, veiculados por esse meio de comunicação de massa: as revistas em quadrinhos, consumidas em larga escala pela massa norte-americana nas décadas de 30, 40 e 50.
Esse modelo, mesmo no cinema norte-americano, propiciou a primeira montagem do gênero naquele país: "Citizen Kane" (1940), de Orson Welles, diretor e ator principal, o qual foi, sem dúvida, um importante marco estético, a partir dos jogos de luzes, enquadramentos e o clima enigmático da própria trama, além da narrativa fragmentada apresentada. A decifração dessa narrativa e das imagens tornou-se um jogo para o espectador, o qual teve de buscar elementos simbólicos nas expressões figurativas, significantes do íntimo das personagens.
Will Eisner, um jovem e profícuo desenhista que já havia trabalhado com diversos outros grandes autores de histórias em quadrinhos, criou o personagem The Spirit na década de 40 (sua primeira aparição se deu no "The Detroit News", no dia dois de junho de 1940, estranhamente no mesmo dia em que Welles iniciava as filmagens de "Citizen Kane"), que mesmo sem os elementos de um super-herói, os quais na época começavam a nortear a maioria das produções desses comics, detinha as virtudes necessárias para a conquista do público como um instigante "anti-herói".
Porém, não foi somente a característica desse personagem misterioso que atraiu as atenções dos leitores da época. O desenho, com alto índice de elementos cinematográficos, no qual o autor abusa de enquadramentos, angulações e técnicas de luz e sombra, parecia ter saído de um story board de um filme expressionista. O leitor descobre, por meio desses elementos, novos espaços, novos contornos e uma nova maneira de ver os quadrinhos.
Outro fator básico das histórias de Eisner é a narrativa. Mesmo com protagonistas fixos, como o comissário Dolan, sua filha Ellen, o garoto Ebony e o próprio Spirit, a narrativa muitas vezes centrava-se em personagens periféricos, elementos cuja presença sugere os protagonistas das histórias, deixando aqueles que deveriam nortear a trama em segundo plano narrativo. Raras vezes vimos o herói do título (Spirit) cumprindo esse papel.
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