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Normas capazes de sentar as regras de convivência com relação ao poder, a
distribuição e o uso da propriedade, a estrutura da família ou de alguma outra
entidade comunitária, a distribuição do trabalho e a regulação das trocas em
geral. Normas que, por resolver determinados problemas adaptativos, plasmam no
entorno coletivo e historicamente condicionado nossa capacidade e necessidade
inatas de predizer o comportamento dos demais, de controlá-lo e de justificar
mutuamente nossas ações.
Dito de outro modo, á medida que os vínculos sociais relacionais foram
tornando-se cada vez mais complexos , a cultura humana cresceu e as pessoas se
tornaram mais reflexivas (tanto a respeito de suas práticas, de suas reações
como de suas interações), as normas de conduta transformaram-se em um conjunto
normativo coativo mais elaborado, organizado e sofisticado; as bases
generalizadas dos motivos para os projetos axiológicos mais antigos foram
suplementadas, e algumas vezes substituídas, por razões e emoções humanas
cuidadosamente elaboradas, á medida que o direito se converteu em um
instrumento cultural cada vez mais eficaz em suas explorações no hiperespaço
das possibilidades. E embora essa evolução normativa não implicasse a criação
de normas necessariamente melhores, em qualquer sentido absoluto, eram contudo
mais capazes de responder a demandas cada vez mais complicadas de populações
que eram, biologicamente, bem semelhantes a seus ancestrais distantes, mas
culturalmente ampliadas, tanto do ponto de vista da qualificação como da
sobrecarga de tarefas e de interações sociais.
De fato, nesse particular, e tal como parece haver ocorrido com a própria
evolução biológica, o processo de evolução das normas não tem lugar de maneira
linear, senão por meio de ensaios e erros. Os humanos se caracterizam por
ensaiar distintas soluções normativas e adotar as que lhes parece mais eficaz
em um determinado momento, até que seja possível substituí-las por outras que
se revelam mais adaptadas aos seus propósitos evolutivos. Na medida em que a
flexibilidade da conduta humana e a diversidade das representações culturais são,
ainda que limitadas, amplas e, por outro lado, dado que as alterações culturais
se podem transmitir com grande rapidez e eficácia, o processo da evolução
normativa encontra-se sujeito a profundos sobressaltos e equívocos e inclusive
, por vezes, a retrocessos significativos. é essa, talvez, a melhor explicação
evolucionista das chamadas leis injustas.
Assim que a ordem jurídica emana da própria natureza humana (de sua faculdade
de antecipar as conseqüências das ações, de fazer juízos de valor e de eleger
entre linhas de ação alternativas) e não é algo que tenha sido imposto á
condição humana pela cultura. Nossas manifestações culturais não são coleções
casuais de hábitos arbitrários: são expressões canalizadas de nossos instintos,
ou seja, de nossas intuições e emoções morais7 . Por essa razão, os
mesmos temas despontam em todas as culturas: família, ritual, troca, amor,
hierarquia, amizade, propriedade, ciúmes, inveja, lealdade grupal e
superstição. Por essa razão, apesar das diferenças superficiais de língua e
costumes, as culturas estrangeiras têm sentido imediatamente ao nível mais
profundo dos motivos, das emoções, dos hábitos e dos instintos sociais. E
instintos, em uma espécie como a humana, não são programas ontogenéticos
imutáveis: são predisposições para aprender e atuar.
Por certo que todo o processo evolutivo das normas jurídicas (desde as pequenas
bandas até a sociedade global de que falamos a pouco) pressupôs um aumento
considerável do número de representações culturais produzidas e acumuladas8 pelo homem, numa profusão que atinge hoje dimensões quase que ilimitadas , e
que , por sua vez, dá conta de nossa inata capacidade para imitar a conduta de
nossos congêneres, isto é, para copiar-nos uns aos outros .De fato, parece
evidente que parte da cultura que assumimos se aprende imitando a outras
pessoas, a qual (imitação), por sua vez, requer uma grande quantidade de
circuitos inatos no cérebro para poder funcionar. De modo que a cultura, em si
mesma, requer umas habilidades mentais muito complexas e sofisticadas para
criá-la, transmiti-la e assumi-la.
Seja como for, essa dupla ação natureza/cultura produziu, durante o largo curso
de nosso processo evolutivo, algumas estratégias e mecanismos normativos
desenhados com a intenção de que servissem para resolver determinados problemas
adaptativos a eles associados. Se o propósito se alcança, assumimos e dizemos
que tais mecanismos têm valor (que são bons) e, como tal, que são capazes de ir
acumulando "tradições" que, não obstante em processo contínuo de renovação (da
evolução acumulativa e renovada da cultura pelo efeito "ratchet", de que nos fala Tomasello), se
transmitem de geração em geração mediante atuações individuais de pessoas
influídas por esse triplo conjunto de elementos procedentes da natureza, da
cultura e da história, tanto recente como remota, da humanidade.
Poderia dizer-se, em síntese, que os códigos e enunciados normativos da espécie
humana como um todo - dos valores éticos aos direitos humanos - são uma
conseqüência peculiar de nossa própria humanidade, e que esta , por sua vez,
"constitui o fundamento de toda a unidade cultural" (Maturana). Dito de outro
modo, a origem de nosso comportamento normativo (ético/jurídico) não se
encontra tanto no contrato social de Hobbes senão nas idéias do próprio Darwin,
precursor dos etólogos. A origem está nos "instintos sociais " dos animais, não
somente no temor racional do egoísmo (Hobbes). Há uma prévia "empatia" ativa
que desenha soluções compartidas. As condutas morais não somente são produto da
história cultural, senão também da seleção natural. Se cabe falar de um "animal
ético" que cumpre normas é porque os comportamentos altruístas e corporativos
possuem um alto valor de sobrevivência.
E uma vez que a sociedade usa leis para encorajar as pessoas a se comportar
diferentemente do que elas se comportariam na falta de normas, esse propósito
fundamental não somente torna o direito altamente dependente da compreensão das
múltiplas causas do comportamento humano como, e na mesma medida, faz com que
quanto melhor for esse entendimento da natureza humana, melhor o direito poderá
atingir seus propósitos9 : sabemos que descendemos daqueles
primeiros símios que começaram a andar sobre duas patas ; sabemos que todos os
seres vivos usamos o mesmo código, e que estamos baseados no DNA ; somos
essencialmente animais; animais falantes ou animais éticos , mas animais ao
fim.
Assim que o projeto axiológico e normativo de uma comunidade ética nada mais é
que um artefato cultural manufaturado e utilizado para possibilitar a
sobrevivência, o êxito reprodutivo e a vida em grupo dos indivíduos. Serve para
expressar (e por vezes, mas não infrequentemente, para controlar e/ou
manipular) nossas intuições e nossas emoções morais, traduzindo e compondo em
fórmulas sócio-adaptativas de ordenada convivência a instintiva e mesmo
compartida aspiração de justiça que nos move no curso da história evolutiva e
cultural própria de nossa espécie. Daí que as normas jurídicas ditem as
práticas sexuais, fomentem certos tipos de vínculos sociais relacionais em
detrimento de outros, regulem a liberdade e a igualdade e proíbam - em
determinadas circunstâncias - a agressão e a violência.
E não parece ser outra a razão pela qual as normas jurídicas não são
simplesmente um conjunto institucional de regras formalizadas destinadas a
constituir uma razão (determinante e/ou moral) para o atuar dos indivíduos. Em
vez disso, as normas jurídicas plasmam regras de condutas sociais, sobre as
quais uma alta percentagem de pessoas concorda, que refletem as inclinações
comportamentais e oferecem benefícios potenciais e eficientes áqueles que as
seguem : quando as pessoas não reconhecem ou não acreditam nesses benefícios
potenciais, as normas são, com freqüência, não somente ignoradas ou desobedecidas
- pois carecem de validade substancial e de contornos culturalmente aceitáveis
em termos de uma comum, consensual e intuitiva concepção de justiça -, senão
que seu cumprimento fica condicionado a um mero critério de autoridade de
duvidosa legitimidade. E uma prática social que não pretendesse nada mais que o
poder ou a força não seria um sistema jurídico .
Dito de outro modo, a legitimidade da lei depende da circunstância de que esta
expresse adequadamente as intuições morais e as obrigações percebidas pela
sociedade (Morse). Com efeito, se há uma coisa que o pensamento evolucionista
sobre a ética nos ensina é que as normas de conduta são uma necessidade, uma
necessidade natural das sociedades humanas, as quais têm, como as outras,
necessidade de regras , mas que, além disso, têm necessidade de justificações
racionais para essas regras, para as poderem aceitar. A eficácia da regra não é
para nós suficiente. Os homens têm necessidade de saber se a regra que seguem é
legítima. é desta necessidade que deriva o naturalismo evolucionista em matéria
de ética, pois há outras constantes que, do mesmo modo que a necessidade de
normas de conduta, atravessam as culturas humanas e a sua história: há, em
particular, a necessidade de encontrar causas, a necessidade de saber .
é certamente nisto que o homem revela a sua maior força: ele continua a querer
erguer-se acima da animalidade de que se sente impregnado, viabilizando novos
meios para regular a sua conduta e desmistificando o que, nos seus
comportamentos, crenças e juízos, é a expressão oculta da natureza nele
presente. Isto não significa que haja um combate entre a natureza e a razão,
pois esta é o instrumento que se criou no decurso do processo evolutivo como
uma resposta adaptativa ás necessidades de sobrevivência de uma espécie viva
essencialmente social. Assim que a interrogação sobre a ética e a investigação
de normas de comportamento social racionalmente fundadas parece residir no
suposto de que têm, em última análise, uma função sócio-adaptativa: trata-se de
garantir de modo mais satisfatório a sobrevivência e a satisfação dos seres
humanos e, afinal, a sua adequação adaptativa.(Kirsch).
Nesse particular sentido, parece razoável admitir que a justiça ou a moral
encontram-se necessariamente vinculadas com o direito (Alexy): os valores da
solução pacífica de conflitos e a cooperação social não podem ser realizados
sem o direito, e ambos devem ser realizados, porque os direitos estariam em
perigo se os conflitos sociais se resolvessem pela pura força, e porque a
justiça e o bem estar geral não são possíveis sem cooperação social10 .
Com efeito, dispomos de normas de conduta bem afinadas porque nos permitem
predizer, controlar e modelar o comportamento social respeito a reação dos
membros de uma determinada comunidade. Estes artefatos, se plasmam grande parte
de nossas intuições e emoções morais, não são construções arbitrárias, senão
que servem ao importante propósito de, por meio de juízos de valor acerca do
justo e do injusto (acerca de questões morais relativas á correção na
distribuição e compensação), tornar a ação coletiva possível - e não seria
nenhum exagero de nossa parte assumir que os seres humanos encontram satisfação
no fato de que as normas sejam compartidas e cumpridas pelos membros da
comunidade .
E uma vez considerado o direito como um artefato cultural, uma estratégia
sócio-adaptativa desenhada pelo homem para resolver os problemas adaptativos
associados á complexidade de nosso estilo de vida social11 , esta
parece ser uma das principais funções das normas jurídicas. Tais normas, por
resolverem determinados problemas sócio-adaptativos práticos, modelam e separam
os campos em que os interesses individuais, sempre a partir das reações do
outro, podem ser válidos, social e legitimamente exercidos, isto é, plasmam
publicamente não somente nossa inata capacidade (e necessidade) de predizer e
controlar o comportamento dos demais senão também o de justificar e coordenar
recíproca e mutuamente, em um determinado entorno sócio-cultural, nossas ações
e interações sociais.
Estamos desenhados pela seleção natural para circunstâncias ecológicas e
culturais distintas das atuais (o cérebro é um conjunto de máquinas
processadoras de informação que foram desenhadas pela seleção natural para
solucionar os problemas adaptativos aos que se enfrentaram nossos ancestrais
caçadores-recoletores) e com uma mente dotada de módulos (domínio-específicos e
ricos em conteúdo) que processam tanto os motivos inatos que conduzem a atos
perversos como os motivos inatos que nos levam a evitá-los. Nossos sistemas
perceptivos evolucionaram para construir modelos adequados ao entorno, para
poder averiguar qual será o passo seguinte. Nosso cérebro está desenhado para
resolver com eficácia as dificuldades que encontramos, eleger e tomar decisões.
Nossos vínculos sociais relacionais são, como resulta difícil negar,
deficientes e nossa capacidade de predição e de antecipação das conseqüências
das ações dista muito de ser perfeita, mas é em qualquer caso melhor que nada.
Sem normas, não haveríamos evolucionado; não ao menos na forma em que o
fizemos. Mas dispomos do direito e, com ele, promovemos em uns grupos tão
complexos como são os humanos aqueles meios necessários para controlar e
predizer as más e as boas ações, para justificar os comportamentos coletivos e,
o que é mais importante, para articular, combinar e estabelecer limites sobre
os quatro modelos elementares de vínculos sociais relacionais - comunidade,
autoridade, proporcionalidade e igualdade - que entabulamos enquanto espécie
desenhada pela seleção natural para a prática da sociabilidade.
Poder-se-ia, inclusive, dizer que criamos um sistema complexo de justiça e de
normas de conduta para canalizar nossa tendência á "agressão" decorrente da
falta de reciprocidade e dos defeitos que emergem dos vínculos sociais
relacionais que estabelecemos ao longo de nossa secular existência. A própria
idéia de justiça - no seu sentido apenas humano, e quaisquer que tenham sido os
significados que haja recebido ao longo da nossas várias vezes milenar história
cultural - sempre quis exprimir a suprema axiologia da existência humana
comunitária.
Graças ao universo jurídico, plasmado em último termo em normas e valores
"explícitos", os seres humanos conseguimos na interação própria da estrutura
social um reparto ( ao que caberia chamar, com as cautelas necessárias acerca
do conceito, "consensuado") dos direitos e deveres que surgem na vida
comunitária. O que talvez ainda falte é uma firme disposição para utilizar o
direito como instrumento destinado a fomentar a virtude de cultivar o melhor da
natureza humana e, do mesmo modo, reprimir o pior12 .
Compreender a natureza humana, sua limitada racionalidade, suas emoções e seus
sentimentos parece ser o melhor caminho para que se possa formular um desenho
institucional e normativo que, evitando ou reduzindo o sofrimento humano,
permita a cada um conviver ( a viver com o outro) na busca de uma humanidade
comum13 : o modo como se cultivem os traços de nossa natureza e a
forma como se ajustem á realidade configuram naturalmente o grande segredo da
cultura , da civilização e de nossa própria condição de cidadão.
Assim que promover modelos institucionais, normativos e sociais por meio das
quais a colaboração ou a cooperação se potencie simplesmente porque traz
benefícios ( e justiça) para todos, parece ser a melhor alternativa a
considerar para uma espécie essencialmente social como a humana e para a qual
parece haver uma forte predisposição para seguir regras: as pessoas querem
obedecer a regras e querem que as outras também o façam; elas sentem culpa
quando deixam de fazê-lo e raiva quando isto ocorre com os demais.
E isto implica, depois de tudo, que já não mais parece resultar lícito e
razoável tentar compreender o fenômeno jurídico por outro meio que não seja a
da consideração de duas questões fundamentais:
a) a primeira - porque a cultura é produto da mente humana-, que não se pode
esperar explorar os caminhos da explicação social ou da avaliação jurídica e
política sem ter uma visão de conjunto das pessoas e da sociedade, isto é, sem
ter um desenho indicativo da natureza dos indivíduos e das diferenças ( não
indefinidas e ilimitadas, registre-se) que os estímulos provenientes da vida
social provoca neles e vice-versa ; e
b) a segunda , é que tampouco se pode ter uma visão global das pessoas e da
sociedade se não adotamos um desenho da sua constituição cognitiva, um desenho
do que é estar psicologicamente equipado como seres humanos (na realidade,
quanto melhor entendermos a natureza humana melhor podemos educar e formar
cidadãos virtuosos).
Por conseguinte, nenhum filósofo do direito consciente das implicações práticas
que sua atividade provoca, quase cotidianamente, no espaço público, quero
dizer, nenhum filósofo do direito intelectualmente honrado, e que queira
propugnar de verdade sua causa (quer dizer, honrado também na ação), pode
desconsiderar a questão última do pensamento moderno: a do status do humano no
reino da natureza (do ser humano considerado simultaneamente como um ser
biológico, cultural, psicológico e social).
Afinal, o direito encontra-se entre os fenômenos culturais mais poderosos já criados pela humanidade, e precisamos entendê-lo melhor se quisermos tomar decisões políticas bem informadas e justas. Embora haja riscos e desconfortos envolvidos, nesse tema, devemos tomar fôlego e deixar de lado nossa relutância tradicional de investigar cientificamente os fenômenos jurídicos, de modo a compreender como e por que o direito inspira tal devoção, e descobrir como deveríamos aperfeiçoá-lo a partir do estabelecimento de elos com a natureza humana.
Notas de rodapé convertidas
* Para a consulta da referência bibliográfica relativa aos autores citados
neste artigo cfr.: Atahualpa Fernandez, Direito
e natureza humana. As bases ontológicas do fenômeno jurídico,
Curitiba, Ed. Juruá, 2006.
1 Segundo Pinker, todo mundo tem uma teoria sobre a natureza humana. Todos
temos de prever o comportamento dos demais, o qual significa que todos
necessitamos umas teorias sobre o que é o que move ás pessoas a adotar
determinadas condutas. Uma teoria tácita da natureza humana - segundo a qual o
comportamento é causado por pensamentos e emoções dos causadores da conduta- é
ínsita ao modo como concebemos a pessoa. Damos corpo a esta teoria analisando nossa
mente e supondo que nossos semelhantes são como nós, assim como observando o
comportamento das pessoas e formulando generalizações. Ademais, também
absorvemos outras idéias de nosso ambiente intelectual: da experiência dos
expertos e da sabedoria convencional do momento. Nossa teoria sobre a natureza
humana é a fonte de grande parte do que ocorre em nossa vida. A ela nos
remitimos quando queremos convencer ou ameaçar, informar ou enganar.
Aconselha-nos sobre como manter vivo nosso matrimônio, educar aos filhos e
controlar nossa própria conduta. Seus supostos sobre a aprendizagem condicionam
nossa política educativa; seus supostos sobre a motivação dirigem as políticas
sobre economia, justiça e delinqüência. E dado que delimita aquilo que as
pessoas podem alcançar facilmente , aquilo que podem conseguir somente com
sacrifício ou sofrimento, e aquilo que não podem obter de modo algum, afeta a
nossos valores: aquilo pelo que pensamos que podemos lutar razoavelmente como
indivíduos e como sociedade. As teorias opostas da natureza humana se
entrelaçam em diferentes maneiras de viver e em diferentes sistemas políticos,
e tem sido causa de grandes conflitos ao longo da história.
2 Assim, por exemplo, os animais não humanos matam, mas não cometem um
"assassinato": é impossível para um pássaro "assassinar" outro pássaro,
porquanto a palavra "assassinato" se reserva para a morte intencionada,
deliberada, iníqua, de um ser humano por outro (podemos matar um cachorro, mas
não assassiná-lo e se um cachorro nos mata não é um assassinato). Da mesma
forma, não parece razoável afirmar que um pato violou outro pato. E muito embora exista "canibalismo" sexual entre as aranhas ( as
fêmeas esperam que o macho haja terminado de fecundá-las e então o matam e o
comem), gaivotas "lésbicas", gusanos "homossexuais" e pássaros "cornudos", o
significado destes termos só adquirem potenciação cultural quando produzidos e
metabolizados por nosso mecanismo cognitivo neocortical e vinculados a aspectos
da existência humana (Dennett).
3 Sobre o conceito das "restrições
cognitivas" acerca da aquisição, armazenamento e transmissão das
representações culturais , assim como da transmissão cultural como um processo
inerentemente seletivo (um "modelo seletivo"
segundo o qual , dadas certas circunstâncias e tendo a população uma variedade
de representações, algumas dessas representações têm mais probabilidade de
armazenar-se na memória dos sujeitos e de transmitir-se a outros sujeitos: ao
ser mais fáceis de aprender e de memorizar, tem um maior "valor de
sobrevivência" que outras representações para sua transmissão cultural), cfr.,
por todos, Pascal Boyer : dadas as propriedades gerais da mente humana, certas
representações têm mais probabilidade que outras de ser adquiridas e
transmitidas, e de chegar, deste modo, a constituir os conjuntos estáveis de
representações aos que os antropólogos chamam de "culturas". Assim que os
sistemas culturais podem e devem ser estudados como conjuntos de representações
mentais adquiridas e armazenadas pela mente humana, já que os processos de
aquisição e memorização impõem fortes constrições aos conteúdos e á organização
das representações culturais. Note-se que Boyer trabalha com as idéias
religiosas porque parecem ser a parte "mais cultural" da cultura e em conseqüência
a menos suscetível de ser explicada em termos cognitivos. A partir daí, e
contradizendo os pressupostos da antropologia cultural ( que costuma centrar-se
em sistemas abstratos de "símbolos", "códigos" ou "significados", cujas
propriedades se presumem independentes do modo em que estão representados na
mente humana e parecem estar completamente restringidos e determinados ao modo
como os sujeitos recebem e aprendem a partir da interação social - portanto, a
suposição de que a transmissão cultural é primordialmente um processo passivo),
considera que, se as hipóteses cognitivas são relevantes para a explicação das
idéias religiosas, então outros aspectos das representações culturais seriam a fortiori passíveis desse tipo de
descrição - aqui incluído, evidentemente, o direito. Recordemos que a idéia de
que uma mente é modular implica que os processos mentais estão de alguma forma
compartimentados já desde o nascimento, quer dizer, que existem estruturas
inatas que definem certos domínios especializados no cérebro (domínios, por
exemplo, relativos á visão, á linguagem, etc.) por meio dos quais se produz o
conhecimento. A idéia de um dos psicólogos que mais estudou a maneira como se
produz o desenvolvimento do mental, e que mais influiu na psicologia do desenvolvimento
ontogenético (ao menos em Europa), Piaget, é totalmente distinta: o recém
nascido não conta, segundo Piaget, com nenhum conhecimento inato específico de
domínio ( note-se que, de modo similar, Vygotsky entendia que a cognição humana
é totalmente de origem sócio-histórica e que a linguagem é a base do
pensamento). Através dos reflexos e do processo de acomodação ás influências
provenientes do meio ambiente, a criança vai construindo um conhecimento do
mundo de uma forma similar a como se desenvolvem as estruturas biológicas nos
processos epigenéticos. Em síntese, a proposta epigenética de Piaget sustenta
que o desenvolvimento cognitivo é um produto emergente de um sistema
auto-organizativo que se encontra diretamente afetado por sua interação com o
meio. Isso é tanto como dizer que é a dependência do meio a que vai determinar
que o desenvolvimento cognitivo vá em uma direção ou outra. A idéia de
modularidade, pelo contrário, estabelece que existem uns determinados domínios
mentais prefixados - estabelecidos de forma inata - e específicos de certas
operações cognitivas, como podem ser a linguagem ou a percepção, para citar
apenas dois facilmente relacionáveis com a teoria da mente modular. Seja como
for o meio ambiente, o que se desenvolverá é esse domínio específico
relacionado com um módulo mental. Por outro lado, e como mínimo, tal como
sustenta Sperber , isto explica que o suposto implícito em muitas teorias da
transmissão cultural de que a mente é um processador de informação
equipotencial - o suposto de que as representações mentais com distintos
conteúdos são igualmente fáceis de ser transmitidas - é falso: as
representações cujo conteúdo encaixa em um domínio para o qual temos mecanismos
especializados serão transmitidas de modo muito distinto daquelas que não
encaixam nesse domínio; em segundo lugar, acaba com a grande dúvida sobre se o
indivíduo é um receptor passivo da transmissão cultural (tal como defendido
pelo relativismo cultural, no sentido de que todos os aspectos da conduta
humana se aprendem, diferem e podem diferir por completo em distintas
culturas), o que , de fato, não o é : é a
mente humana a que impõe constrições significativas para a percepção , a
transmissão e o armazenamento discriminatório de representações culturais.Em
palavras de Pinker , " a complexidade da mente não se deve á aprendizagem,
senão que o aprendizado se deve á complexidade (modular) da mente humana".
4 Aqui se coloca o problema de que as intuições e as emoções morais da gente
podem estar irreparavelmente marcadas por seus interesses. Também é possível, e
inclusive não infrequente que uma diferença de intuições morais de origem
biológica seja amplificada pela elaboração cultural dessas intuições: sabemos
que os ciúmes sexuais masculinos (desenvolvidos evolutivamente como uma
estratégia psicológica para proteger a certeza masculina da paternidade), uma
vez manipulados pela elaboração cultural, podem causar sofrimentos, inclusive
até a morte, a muitas mulheres do mundo, amplificada que pode ser até o
execrável uma diferença de intuições morais de origem biológica. Assim, por
exemplo, determinadas hipóteses biológico-evolucionárias sobre a filogênese
humana e o estudo etológico do comportamento de nossa espécie coincidem em
insistir no chamado "lado escuro da sexualidade masculina" (Wilson e Daly). De
acordo com esta tese, o comportamento sexual masculino estaria em boa medida
guiado pelo temor do "cuco": pelo temor á promiscuidade de sua companheira
feminina e a conseqüente inversão de recursos próprios na criação de filhos
alheios. Daí derivaria umas tendências "proprietaristas" sobre as mulheres,
isto é, umas intuições morais tendentes a considerar a mulher como uma
propriedade. Dessas intuições digamos "naturais" - para seguir com a hipótese -
se pode fazer elaborações culturais muito distintas: desde a "mulher dona de
casa" de nossa cultura, até a ablação de clitóris, habitual em certas culturas
norte e centro-africanas, passando pelo chador islâmico e a vendagem e a molduração dos ossos dos pés da tradição chinesa. Um
triunfo (perverso) da cultura sobre a espontaneidade e a natureza. Neste tipo
de culturas, que amplificam até as abomináveis disposições de raiz
presumivelmente biológicas, parece difícil achar soluções menos radicais que a
posta em marcha pelo governo revolucionário da China em 1949: varrer sem
contemplações toda a tradição cultural (Doménech).
5 Com relação a cultura, parece razoável admitir que os mecanismos psicológicos
condicionam em boa parte o tipo de traços culturais que se manifestam e se
transmitem nos grupos humanos. Por outro lado, se supõe que estes mecanismos
são compartidos por todas as pessoas e que, por essa razão, hão de ser
perfeitamente compatíveis com a diversidade de comportamentos e culturas
existentes em nossa espécie. Segundo Sperber, uma ciência naturalista da
cultura poderia denominar-se epidemiologia
das representações e deveria explicar porquê algumas representações
são mais exitosas - mais contagiosas - que outras. Desde uma perspectiva
epidemiológica, toda informação que os seres humanos introduzem em seu entorno
se pode considerar como competidora do tempo e do espaço públicos e privados (
no sentido de que, entre todas as representações presentes em um grupo humano
em um momento dado, algumas se difundirão e perdurarão, enquanto que outras
terão lugar somente de maneira breve e muito local), isto é, que competem pela
atenção, a memória, a transmissão e o armazenamento externo. São muitos os
fatores que afetam as possibilidades de que uma informação (crença ou representação
cultural) tenha êxito e alcance um nível de distribuição amplo e duradouro,
quer dizer, que forme parte da cultura de maneira estável. Alguns destes
fatores são psicológicos e outros são ecológicos. A maior parte deles são
relativamente particulares, ainda que existam alguns bastante gerais. O fator
psicológico mais geral que afeta a distribuição da informação é a
compatibilidade e a correspondência com a organização modular cognitiva humana.
Desde um ponto de vista modular, as crenças ou representações que são estáveis
em uma população são as que desempenham um papel fundamental na organização
modular e no procedimento do conhecimento. Boyd e Richerson , Cavalli-Sforza e
Feldman e Dawkins , propuseram abordagens evolucionárias ou epidemiológicas da
cultura que são comparáveis ás de Sperber, não obstante a epidemiologia das
representações proposta por este autor apresente diferenças com relação aos
demais enfoques 1) porque enfatiza a importância dos mecanismos cognitivos
individuais na explicação geral da cultura e 2) porque sustenta que a
informação se transforma cada vez que se transmite até um ponto tal que resulta
inapropriada qualquer analogia com a reprodução ou a replicação biológica.
(cfr. nota seguinte). Resumindo: o problema não consiste, portanto, em insistir
na diversidade cultural, senão em utilizá-la como evidência empírica que nos
permita averiguar que classe de mecanismos cognitivos a tornaram possível. De
fato, a extraordinária riqueza humana é um tronco comum - uma natureza humana -
a partir da qual existem possibilidades insólitas de (limitada) diversidade
individual e cultural. Assim que realizar a unidade da espécie humana
respeitando ao mesmo tempo sua (limitada) diversidade não somente é uma idéia
de fundo, senão que também deve consistir em um projeto da própria humanidade.
Para novos desenvolvimentos importantes nesta área ver também Cosmides e Tooby
.
6 A que Richard Dawkins denominou memes:
termo que, por analogia com genes, define a um módulo de informação contagioso
que infecta e contamina a mente humana, donde se replica e altera sua conduta ,
provocando sua propagação. Assim, da mesma forma que os genes, supõe-se que os memes são replicadores em um meio
diferente, mas sujeitos aos mesmos princípios da evolução dos genes. Trata-se
de elemento de uma cultura qualquer digno de ser transmitido por procedimentos
não genéticos, especialmente por imitação.
Poder-se-ia dizer, inclusive, que um meme é qualquer coisa que se transmite de uma pessoa a outra por imitação (as
histórias que conhecemos, as canções, as frases feitas, os slogans, as leis que acatamos, etc.). A
imitação é uma modalidade de replicação ou de cópia e isto é o que institui o meme como replicante e lhe outorga,
ademais, sua capacidade de replicação. Por conseguinte, o termo "imitação"
inclui desde o fato de passar informação por meio da linguagem, da leitura e da
inculcação, até o desenvolvimento de outras habilidades e condutas mais
complexas (aprendizagem social). O ato de imitar compreende qualquer tipo de
cópia de idéias e de conduta de uma pessoa a outra: quando ouvimos uma história
e a transmitimos, ainda que seja apenas em essência, a outra pessoa, efetuamos
uma cópia, transferimos "algo": esse "algo" é um meme. E ao contrário de qualquer outro animal, imitamos espontaneamente
a quase qualquer coisa e a qualquer um e, o que é mais intrigante, parece que
gostamos de fazê-lo (Blackmore). Em resumo, porque herdamos a predisposição
para imitar o vizinho (Ridley), parece ser mais fácil e quase sempre melhor
fazer o que os outros dizem do que descobrir, por conta própria, a melhor
maneira de fazer qualquer coisa (Simon). Sem embargo, aponta Mosterín , os
paralelismos entre a evolução biológica e a cultural não devem fazer-nos passar
por alto algumas diferenças importantes. Dawkins por pôs os memes como contraponto cultural dos genes. Até que ponto são equiparáveis?.
Enquanto conhecemos o mecanismo subyacente á informação genética (a dupla
hélice de DNA e o código genético), ignoramos o mecanismo cerebral que subjaz
aos memes. Os genes se replicam diretamente, sem passar por efeitos
fenotípicos. Cada gen, considerado como seqüência de DNA, produz por duplicação
dois genes idênticos. Os memes, pelo contrário, somente podem replicar-se
através da mediação de seus efeitos fenotípicos (preferências linguísticas,
textos escritos, gestos, conduta observada, etc.), que, eventualmente, podem
chegar a provocar o surgimento de um meme similar no ouvinte, observador ou
receptor. No mundo biológico os câmbios meramente fenotípicos não se transmitem
geneticamente e em geral se perdem. Não obstante, os conteúdos culturais ( que
desde um ponto de vista biológico são parte do fenótipo estendido) sim se
transmitem, ainda que não geneticamente, senão por aprendizagem social. Os
câmbios genéticos são aleatórios, ocorrem ao azar, em ausência de qualquer
intencionalidade. Sem embargo, os câmbios culturais com frequência (ainda que
nem sempre) respondem a um desenho intencional de seus inventores ou
introdutores. Os indivíduos portadores de genes e de memes podem cambiar de
memes, mas não de genes. Uma espécie somente se extingue pela morte de todos os
seus membros. Sem embargo, uma cultura grupal, o mesmo que uma moda, pode
desaparecer ou passar sem que faleçam seus portadores. As espécies biológicas
são como tubos no espaço-tempo pelos quais viajam os genes. Os tubos são
completamente estancos e impermeáveis (excetuando os fenômenos marginais de
hibridização). Pelo contrário, as culturas dos grupos sociais não estão
isoladas, senão que são permeáveis. O fenômeno da convergência cultural, pelo
qual os diversos grupos sociais compartem cada vez mais memes, carece de
paralelismo na evolução biológica. Grupos culturais distintos podem
intercambiar memes, mas espécies distintas não podem intercambiar genes ( se
pudessem, não seriam espécies distintas). A atual convergência cultural
universal, também chamada "globalização", carece de contrapartida alguma na
evolução biológica. Em qualquer caso, a evolução cultural , como a biológica, é
um fenômeno histórico, dependente de mil contingências imprevisíveis. E não
podemos predizê-la com nenhum grau de precisão nem segurança. Para uma análise
dos possíveis usos no direito do meme de modo similar ao do gen, cfr. : Stake e
Fried.
7 E é o cérebro que oferece o cenário deste drama em que se representam os
valores culturais, os juízos morais e as peripécias de nossa existência. Nele
percebemos o mundo através da lente das emoções (de nossas idéias e de nosso
pensamento).Estas são as verdadeiras portadoras de sentido até o ponto de
constituir uma verdadeira linguagem que permite ao sujeito dialogar não somente
com o outro, senão também consigo mesmo. As emoções constituem, assim, um
repertório inato de signos mediante os quais se estabelece a comunicação entre
os indivíduos , o reparto da subjetividade, e que , em igual medida, permitem
atribuir ao outro um estado mental e compartir com ele uma representação. Sobre
a importância do cérebro como a fronteira definitiva para entendimento da vida
emocional do ser humano a partir do estudo científico dos correlatos neuronais
subjacentes responsáveis pelos mecanismos e funcionamento das emoções (isto é,
do fundamento neurológico da emoção do ponto de vista evolutivo e registrado
pelo cérebro), e considerando estas (as emoções) como funções biológicas do
sistema nervoso ou uma função do cérebro , cfr. LeDoux.
8 A característica da cultura humana que a torna tão central na vida humana é o
seu potencial acumulativo: os seres humanos modernos desenvolveram a capacidade
de "identificar-se" (de ver os "outros") como membros de sua própria espécie,
conduzindo a um entendimento recíproco como seres intencionais; esta nova
classe de entendimento social favoreceu o aparecimento de novas formas
simbólicas de interação social que, por sua vez, conduziu á produção gradual de
novos artefatos culturais cada vez mais complexos, acumulando modificações ao
longo do tempo histórico e em um grau que não é encontrado em outra espécie.
Nas palavras de Edgar Morin: a cultura, que não está assimilada de forma
hereditária, aparece e se transmite por aprendizagem. A cultura não somente
nasce no marco de um processo natural senão que adquire uma relativa autonomia,
o que vai a propiciar o desenvolvimento da humanidade: já na última etapa, a do Homo sapiens, havia um acervo
cultural propício para a eclosão de um grande cérebro, esse grande cérebro que
supera desde qualquer ponto de vista ao do Homo
erectus. Se a cultura é o resultado de uma evolução natural, o
último estágio desta evolução não podia dar-se sem que existisse a cultura. Já
não falamos simplesmente de corte epistemológico senão também de soldadura
ontológica. Significa dizer que inclusive o ato de filosofar não pode perder de
vista sua origem animal, e que aí, nessa simbiose, reside o característico da
"natureza humana" (o próprio "tempo", que durante um largo período se acreditou
ser uma noção filosófica agora descobrimos que talvez seja um conceito
biológico; os neurobiólogos nos explicam que quando se produz um corte do
lóbulo pré-frontal ou uma alteração dos tubérculos mamilares, os sujeitos
passam a perceber somente o presente, vivem em uma sucessão de presentes: deixa
de haver, nessas zonas cerebrais, conexões com a memória e possibilidade de
antecipação) . A mente se inscreve no cérebro, que é o mais sofisticado órgão
animal. Nenhuma construção cultural pode desconectar-se de sua raiz, e esta
raiz é tão "espiritual" como "material", tão cultural como animal.
9 Nas palavras de Jones e Goldsmith : "Society uses law to encourage people to
behave differenntly than they would behave in the abssence of law. This
fundamental purpose makes law highly dependent on sound understanding of the
multiple causes of human behaviour. The better those understanding, the better
law can achieve social goals with legal tools. Current understanding though
clearly improving, are imperfect in a variety of ways. One imperfection
accompanies the prevalent, often unexamined assumption that law can gain
accurate and sufficient understanding of human behaviour by using only the
tools of the social sciences, the humanities, or both. Every day we leave
further behind a world in which tha assumption was excusable. Knowledge in
behavioral biology is growing rapidly, and is has laid a significant foundation
for understanding how the brain works and how it came to work as it does. It
affords a deeper understanding of what behavior is, where it comes from, what
evolutionary and developemental causes underlie species-typical brains, what
influences yield species-typical patterns of behavior, how the brain develops
at the temporal intersection of genes and environments, how the brais
functions, and how evolutionary biology and culture inevitably intertwine,
reciprocally affecting one another. To be clear, we have not suggested that
behavioral biology deserves a place at the head of the table. Nor are we
claiming that it will solve every problem. We have argued, instead, that trying
to understand behavior at any deep level, while simultaneously ignoring an
enormous and growing store of relevant scientific information, is a path to
certain obsolescence. We have argued that building more accurate and more
robust models of human behaviour that can improve law´s effectiveness requires
integrating traditional perspectives with perspectives from behavioral biology.
And we have argued that this is an interdisciplinary enterprise in which legal
thinkers should participate.[…] In doing so, behavioral biology promises to
help discover useful patterns in regulable behavior, uncover policy conflicts,
sharpen cost-benefit analyses, clarify causal links, increase understanding
about people, provide theoretical foundation and potential predictive power,
disentangle multiple causas influences, expose unwarranted assumptions, assess
comparative effectiveness of legal strategies, reveal deep patterns in legal
architecture, identify selection pressures that law creates, and also usefully
highlight legal features through evolutionary metaphors. Any one of these
functions, standing alone, could justify greater attention to behavioral
biology. Taken together, they make a geometrically stronger case".
10 Significa dizer, em síntese, que, porque o direito não surgiu do "nada" e
nem parece ser um artefato inescrutável de origem desconhecida , mas antes o
resultado de um processo causal originado e motivado pelo comportamento moral
(isto é, de que surgiu de uma base moral comum que todos possuímos e que, sem
embargo, se configura mais como uma interpretação construída a partir das
realidades culturais do entorno imediato), já não há nenhuma razão sensata para
não aceitar a postura teórica adotada por Alexy acerca do conceito e da
natureza não positivista do direito, no sentido de que existe uma vinculação ou
conexão necessária (ou conceitual) entre o direito e a moral ou a justiça (
entre o direito que "é" e o direito que "deve ser") , que se torna visível
mediante a inclusão, a delimitação e a fundamentação do direito a partir de
elementos morais: o conceito de direito há de incluir ou incorporar
necessariamente a idéia de justiça (ou de correção material ou de moral),
entendida como correção em relação com a distribuição e a compensação.
Observe-se que, para Alexy , a pretensão de correção não é uma pretensão
especificamente jurídica: está enraizada em todo tipo de raciocínio, e na
medida em que raciocinar, isto é, afirmar, debater e perguntar, é um componente
necessário da forma humana de vida, se funda (está ínsita) na natureza humana.
11 Para dizê-lo de outra maneira, entendemos que o direito não é mais nem menos
que uma estratégia sócio-adaptativa - cada vez mais complexa, mas sempre
notavelmente deficiente - empregada para articular argumentativamente - de
fato, nem sempre com justiça -, por meio de atos que são qualificados como
"valiosos", os vínculos sociais relacionais elementares através dos quais os
humanos construímos sistemas aprovados de interação e estrutura social. Um
artefato cultural que deve ser manipulado para desenhar um modelo normativo e
institucional que evite, em um entorno social prenhado de assimetrias e
desigualdades, a dominação e a interferência arbitrária recíprocas, garantindo
uma certa igualdade material e, em último termo, estimulando e assegurando a
titularidade e o exercício de direitos (e o cumprimento de deveres) de todo ponto
inalienáveis e que habilitam publicamente a existência dos cidadãos como
indivíduos plenamente livres.
12 Tanto temos instintos sinistros como instintos luminosos : os seres humanos
têm alguns instintos que fomentam a virtude e o bem comum e outros que favorecem
o comportamento egoísta e anti-social. Precisamos planejar uma sociedade que
estimule aqueles e desencoraje estes (Ridley), isto é, nas palavras de Sandel :
na presença de indivíduos dotados de certas qualidades de caráter, de certas
disposições morais que os levam a identificar com a sorte dos demais e, em
definitiva, com os destinos de sua comunidade, o melhor será deixar de lado a
idéia liberal do Estado neutral, para substituí-la por um Estado ativo em
matéria moral, e decidido a "cultivar a virtude" entre seus cidadãos.
13 Tentando definir o que significa "ser de esquerda", assim se manifesta Peter
Singer : "Tomar consciência da imensa quantidade de dor e sofrimento que há em
nosso universo, assim como do desejo de fazer algo para reduzi-la (...) isso,
creio eu, consiste a esquerda (...) - ou seja - é essencial para qualquer
esquerda autêntica. Se nos encolhemos de ombros ante o sofrimento evitável dos
débeis e dos pobres, dos que estão sendo explorados e despojados, ou dos que
simplesmente não têm nada para levar uma vida decente, não formamos parte da
esquerda. Se dizemos que o mundo sempre foi e será assim, pelo que não se pode
fazer nada, então não formamos parte da esquerda. A esquerda (ao seguir o
imperativo de reduzir o sofrimento) quer fazer algo por cambiar esta situação".
Autor:
Atahualpa Fernandez
atahualpaf[arroba]yahoo.es
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