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Na história da Educação Brasileira a concepção de educação funcional como transmissão de quem sabe a quem não sabe se efetivou nas práticas educativas escolares, tomando forma a partir das concepções pedagógicas da escola Tradicional (1954/1930), escola Nova (1930/1945) e escola Tecnicista (1945). Tais escolas construíram os fundamentos filosóficos e didáticos do seu fazer educativo a partir da concepção do "método único" defendido por Comenius, sendo possível encontrar práticas educativas quem sigam de forma teórica e metodológica princípios de uma ou outra tendência ou mesmo misturem elementos didáticos das três tendências.Na escola tradicional a referência do ensinar baseia-se na centralidade do professor em sua autoridade como detentor dos conhecimentos a serem transmitidos, de forma que a relação professor-aluno é unilateral, o aluno é visto como um recipiente a ser preenchido, relação esta denominada por Paulo Freire (2005) como bancária e opressora. A Escola Tradicional fundamentada na idéias do alemão J. F. Herbart prevê um ensino dogmático, em que não estabelece distinção entre educação e instrução, por isso defende a "instrução educativa" a partir de conteúdos livrescos e uma metodologia que deve seguir os seguintes passos: 1. preparação: Os conteúdos são apresentados aos alunos; 2. apresentação: Momento de esclarecimento do conteúdo; 3. associação: comparação das novas idéias com as anteriores; 4 Generalização e aplicação: formulação de princípios gerais e fixação das idéias a partir da experimentação de exercícios. Assim é típico deste modelo o emprego da chamada oral, o método expositivo, o uso do livro didático e quadro negro, como outros recursos metodológicos que garantam a atenção e disciplina do aluno.Seguindo esta seqüência percebe-se a centralidade do método na figura do professor, que escolhe e apresenta os conteúdos, sem relação com a vida social do educando, de modo que este limita-se a mera transmissão de idéias recheada de valores sociais e culturais do ponto de vista de quem ensina. De modo que os interesses dos alunos não são considerados na escolha metodológica, e a perspectiva de formação humanista enseja homens e mulheres voltados para a moralidade, capazes de encontrarem-se consigo num processo educacional racional, a fim de atuarem corretamente e cumprirem suas funções políticas na sociedade, esta vista como o espaço do exercício dos direitos e deveres do cidadão ou cidadã. Em contraposição a esse modelo, o movimento escolanovista busca rever o centralismo da escola tradicional, propondo um modelo de ensino inspirado no liberalismo e no pragmatismo, em que se acentua a predominância dos processos técnico-metodológicos em contraposição a idéia de aquisição do conhecimento. Ao contrário da escola tradicional o que entra em cena são os interesses dos alunos, a partir de uma abordagem da psicológica evolutiva e da aprendizagem. O modelo defendido pelo americano Jonh Dewey busca defender a liberdade de escolhas, a autonomia e capacidades práticas para atuar na sociedade do trabalho. De modo que a razão pela razão defendida na concepção humanista, volta-se para racionalidade da atividade do trabalho, do "aprender a apreender", valorizando o processo de industrialização e o indivíduo (GHIRALDELLI, 2000, p. 46).Dewey propõe uma metodologia baseada na idéia de resolução de problemas, do ensino ativo, em que o aluno, no contexto de suas experiências é o centro do processo educativo, uma vez que é dotado da capacidade de tornar-se integrado socialmente á medida que se insere na sociedade do trabalho e torna-se produtivo. Nesse sentido, a partir da idéia de autonomia, no modelo da escola nova o aluno deve-se ser encaminhado a seguir os seguintes passos metodológicos: 1. Atividade e pesquisa, inicia-se o processo de aprendizagem a partir de atividades práticas, pois e dela que emerge o passo seguinte; 2. Formulação do Problema, após o exame da situação se analisa as dificuldades a fim de constituir o próximo momento; 3. Busca de dados para a; 4 Formulando de hipótese e por último a comprovação das hipóteses a partir de experimentação direta ou indireta.A racionalidade empregada por Dewey é do indivíduo prático, cético em relação a fé e a moralidade, a favor do empírico comprobatório que possa emitir resultados. Na esteira desta concepção e a fim de acompanhar a aceleração do modelo capitalista-industrial produtivo introduz-se os novos recursos tecnológicos do processo de industrialização como recursos didáticos, a fim de favorecer a idéia do indivíduo cognoscitivo, o "aprender a aprender" transforma-se no "aprender-fazer", constituindo uma perspectiva tecnicista do pragmatismo. O modelo tecnicista (TYLER) busca fugir do enfoque psicológico do indivíduo, atribuindo a este a capacidade de reverenciar modelos e instrumentos didáticos baseados em um planejamento sistêmico, a exemplo os módulos de ensino, instrução programada, os tele-cursos, o ensino á distância e outras formas de ensinar em que a relação professor-aluno não se caracteriza como necessária, pois o mediador do processo ensino-aprendizagem são os meios tecnológicos, que dispensam a interlocução dialógica.As respectivas abordagens teórico-metodológicas negam a própria dinâmica da sociedade, a possibilidade de discussão de outros saberes, produzidos na organização do povo, nos movimentos sociais, enquanto prendem-se aos aspectos técnicos do método, desconsideram a contextualização histórica, política e social dos sujeitos do pensar-fazer educativo, bem como a possibilidade de integração entre teoria e prática e da percepção do aluno como sujeito participativo, construtor de sua história. Nesse sentido, Apple (1989, p. 35), assinala as diversas tentativas ao longo da história desde Bobbit e Thorndike até Tyler de transformar o currículo e o fazer didático numa mera preocupação com métodos eficientes, despolitizando a educação. Nessa perspectiva, a escola é vista como uma das instituições da sociedade capitalista que exerce funções vitais na recriação das condições necessárias para que a ideologia hegemônica seja mantida, condições estas que não são impostas, mas, que necessitam ser continuamente reelaboradas no campo de instituições tais como a escola. E, o currículo é concebido como formas de ensinar e aprender, expressas através das disciplinas obrigatórias e optativas e dos conteúdos transmitidos, metodologias escolhidas e processos de avaliação que passa a expressar concepções ideológicas. Assim, o currículo, enquanto um instrumento do processo de organização do trabalho escolar é aquele que possui objetividade, racionalidade e eficiência, ou seja, preocupa-se com as questões internas do ato pedagógico, sem, contudo questionar a sociedade capitalista em suas contradições, o valor do conhecimento e sua aplicabilidade para o aluno na sociedade, o tipo de conhecimento transmitido e/ou agregado.
Entender a escola e o currículo a partir das concepções liberais de educação (Herbart, Dewey, Tyler) ou mesmo como espaço de reprodução das ideologias dominantes (Bowles e Gintis, Althusser, Bourdieu e Passeron), significa fechar o campo de discussão e as possibilidades de se construir alternativas viáveis em que se considere a perspectiva dos diferentes saberes, e se possa perceber a educação escolar do ponto de vista da controvérsia, contradição e movimento. Nesta discussão quais seriam os elementos teórico-metodológicos diferenciadores de uma prática educativa que possa gerar alternativas de organização social? Como fazer que essa escola sirva também ás classes populares e não somente ao capital dominante?A possibilidade da construção de uma Pedagogia crítica implica romper com as perspectivas liberais da educação que cristalizam a dicotomia cultura clássica - cultura popular. é preciso entender que na escola algo mais pode se reproduzir, além dos valores e conceitos do capital dominante. Uma vez, considerada a escola como um espaço produtor de ideologias, torna-se necessário questionar como se reproduz as ideologias? E que ideologias são reproduzidas? Partindo da conceituação gramsciana de ideologia, estas são vistas como "historicamente necessárias, as ideologias tem uma realidade, que é a realidade "psicológica": elas "organizam" as massas humanas, formam o terreno sobre o qual os homens se movimentam, adquirem consciência de sua posição, lutam, etc." (GRAMSCI, 1991, p. 62). Assim, as ideologias são formas de pensar / organizar de cada grupo social, geram a consciência de si e do grupo, servem tanto para promover a resistência como o conformismo e são produzidas tanto por uma como por outra classe/grupo social, considerando a capacidade de pensar e fazer dos sujeitos. Portanto, subtraem a idéia dominante da reprodução pela reprodução e institui-se a idéia de transformação, revolução. Para Gramsci (1989, p. 09) "a escola é o instrumento para elaborar os intelectuais de diversos níveis", entendida como um espaço de contradições, confrontos, diferenças, onde se configura as diversas expressões ideológicas do pensar e fazer humano e pode-se exercer a diversidade cultural. é na dinâmica social, em um constante processo de reflexão pedagógica que se constrói a educação crítica, de modo que faz parte dela as práticas educativas dos movimentos sociais em que se insere a tendência pedagógica libertadora de Paulo Freire, que fornecer elementos teóricos e metodológicos para a construção de uma educação voltada para a conquista da autonomia do ser, enquanto sujeito pensante do ser fazer.
3.1. A Pedagogia Liberadora de Paulo Freire como prática social.
A restruturação econômica e política da sociedade, das décadas de 50 e 60, no Brasil, passa a requerer maior qualificação para o exercício do trabalho e da cidadania através do direito ao voto. De forma, que a chamada "vergonha nacional", o analfabetismo precisava ser eliminado, surgindo daí inúmeras demandas da sociedade por educação. Neste contexto, iniciam-se as experiências de alfabetização de jovens e adultos sob os princípios filosóficos de Paulo Freire, que vem a se constituir em uma educação não-formal, posteriormente denominada de educação popular, entendida como a pedagogia que transcende a formalidade do conteúdo memorístico através do diálogo dos seus interlocutores e se faz ação processual para a superação das formas de opressão, constituindo-se elemento de conscientização, politização e emancipação do sujeito e do seu coletivo.Neste prisma a educação constitui-se como uma prática social, que só pode ser compreendida e analisada no contexto da sociedade e das relações de antagonismo do sistema capitalista, adquirindo com isso o cunho emancipatório de humanização que possibilita a transformação dessas relações. Ao denunciar a educação vigente como burocrática e anacrônica, indica um paradigma de educação comprometida com os oprimidos, vistos como capazes de produzir cultura.Portanto para Freire, o ponto de partida e chegada para o desenvolvimento da aprendizagem é a comunidade, ou seja, a realidade sócio-cultural e política que os indivíduos estão inseridos. Através da ação dialógica educador e educando interagem, se comunicam e se conscientizam acerca da realidade, problematizando-a a fim de lutarem contra a "ideologia de opressão". Desta forma é possível visualizar em Freire cinco passos metodológicos: 1. vivência e pesquisa: momento que educador e educando exploram a realidade em suas diversas faces e escolhem os temas geradores a serem trabalhados; 2. Escolha dos temas geradores: a partir do "método dialógico" educador e educando relatam suas vivências, dificuldades e problemas definem as temáticas a serem discutidas e reelaboradas; 3. Problematização dos temas: diante das problemáticas, educadores e educandos num constante diálogo tecem considerações, relações, críticas e análises a fim de criticamente se perceberem imbricados pela temática, no mundo, com que e com quem; 4. Conscientização: o educador a partir das problematizações feitas elabora a síntese e encaminha novos elementos teóricos e críticos acerca da realidade, buscando a causalidade de forma profunda, desvelando a ideologia dominante que encobre a realidade; 5. Ação social e política: refere-se ao complemento do processo de conscientização, associa-se teoria e prática na ação social e política constituindo-se uma práxis transformadora do sujeito e da realidade.Do que se observa, a Pedagogia Libertadora rompe com a idéia do método único, da homogeneização e introduz através da dimensão político-social a perspectiva da diversidade, em que a cultura é a categoria central de análise da realidade, partindo do pressuposto teórico gramsciano de que;
[...] todo homem (mulher), fora de sua profissão, desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um "filósofo", um artista, um homem (mulher) de gosto, participa de uma concepção de mundo, possui uma linha consciente de conduta moral, contribui assim para manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para promover novas maneiras de pensar. (GRAMSCI, 1989, p. 07-8).
Diante de tal perspectiva a Didática é um campo do conhecimento sobre a problemática educativa na sua totalidade e historicidade, de forma que o fenômeno educativo apresenta-se como expressão de interesses sociais em conflito na sociedade, daí o currículo constitui-se como expressão das práticas sociais, não limitando-se á sala de aula ou ás práticas de ensino, mas direciona-se ao fazer cotidiano e cultural, evolvido pelo movimento e contradições da relação educador-educando-sociedade. Nessa lógica o caminho para a construção de um currículo é inverso, não parte da lógica disciplinar dos conteúdos, procedimentos e métodos didáticos unívocos e fragmentados, ao contrário, surge das demandas dos indivíduos envolvidos no processo educativo, de forma que emerge vozes silenciadas, experiências escondidas e histórias não contadas.
Ressaltar a Pedagogia crítica significa rever o papel da escola, como um espaço de pensar que circundam diferenças ideológicas e culturais, o papel do professor como agente de transformação social e os fundamentos teórico-metodológicos como instrumentos de conscientização e politização, pois "na medida em que o mestre é consciente dos contrastes entre o tipo de sociedade e de cultura que ele representa e o tipo de sociedade e cultura representado pelos alunos, sendo consciente de sua tarefa, que consiste em acelerar e em disciplinar a formação da criança conforme o tipo superior em luta com o tipo inferior" (GRAMSCI, 1989, p. 131).Ao se concebe a educação como uma prática social, entende-se que ela se realiza no pensar e no fazer de homens e mulheres que elaboram e difundem uma cultura que representa um terreno contraditório de luta, expressa no cotidiano que legitima a linguagem, os códigos e valores de uma classe. Portanto, a educação crítica relaciona-se e incorpora a cultura popular como saber metodológico que se realiza na prática dos movimentos de cultura e educação popular e especificamente nos movimentos sociais. Diante desta possibilidade o desafio é pensar como efetivar no espaço institucional da escola formal as dimensões de uma educação crítica que considere imprescindível a articulação teoria e prática como práxis social e inclua a diversidade dos saberes populares.
Os movimentos sociais, não são invenções das classes populares, dos capitalistas ou mesmo de intelectuais, eles nascem da insatisfação por parte de determinada classe ou grupo social, significa uma rebeldia individual ou coletiva, um protesto diante do confronto ideológico entre um e outro segmento social. Na história do Brasil, pode-se reportar aos movimentos sociais a partir das lutas de parcelas da sociedade que se encontram excluídas dos direitos aos bens sociais, a uma vida digna com usufruto á educação, saúde, moradia, trabalho e etc., A educação historicamente sempre se caracterizou como uma demanda requerida pela sociedade, especialmente pelas camadas populares da classe trabalhadora que se via expropriada do acesso e permanência na escola pública. Quando da escola tradicional, esta garantia a transmissão dos conhecimentos universais e necessários, mas, á pequena parcela da população, apenas aos filhos dos nobres. A luta pela democratização da educação feita pelos pioneiros da educação tenta garantir o acesso, mas não garante a qualidade e a permanência, pois a escola pensada e estruturada pela burguesia não discute e não valoriza as vivências e os saberes populares.De forma que diante das exigências feitas pelo crescimento do processo de industrialização, avanço do capitalismo, exercício da cidadania através do voto, a educação vai-se constituindo uma demanda efetiva da sociedade, de modo que as camadas populares passam a ver nesta uma possibilidade concreta de ascensão social, de forma que emerge inúmeros movimentos que buscam expandir o direito á educação como o movimento de extensão da escola pública. E outros que tinham como propostas a conscientização política e social do povo, atuando nas camadas populares do nordeste pretendiam promover maior participação, dentre esses cita-se: as experiências de Alfabetização de Jovens e Adultos a partir do Serviço de Extensão da Universidade do Recife (1960); os Círculos de Cultura Popular e os Movimentos de Cultura Popular (CPC, MCP - 1961); a Campanha de Educação Popular (CEPLAR - Paraíba - 1962); a Campanha De Pé no Chão também se apreende (Rio Grande do Norte - 1961); o MEB (Movimentos de Educação de Base) que foi ligado diretamente a Igreja, atuando na zona rural e dedicando-se a educação de jovens e adultos.O que unia tais movimentos na década de 60 era a possibilidade de interagir com o restante da população desorganizada, isolada e sem condições política de levar suas reivindicações ao Estado, de forma que tais movimentos tinham o papel de chamar atenção para a situação de exclusão da classe oprimida, contra o capital e promover novas formas de organização, uma força-política alternativa que viessem a constituir uma nova ordem social.Atualmente, as demandas por educação continuam existindo em outros contextos, com novas necessidades e expectativas. O cunho revolucionário de base econômica e estrutural vai cedendo lugar ás diversidades culturais e ao cotidiano, pois o processo de democratização pelo qual o Brasil passara, após 20 anos de ditadura militar, indica o avanço da participação do povo, que se organizar autonomamente, levados pelo desejo da democratização.
Tal foi o brado popular neste período, clamando por autonomia e por direitos, que acreditou-se na possibilidade de uma "grande virada". No entanto, em vez de transformações abruptas e profundas conduzidas por essas forças, deu-se, na passagem da década, uma transição conservadora rumo á democratização, através de pacto entre as elites políticas (DOIMO, 1995, p. 48).
A força que emerge dos chamados "novos sujeitos políticos" culmina em diversos movimentos sociais, que em suas ações deslocam o lócus do conflito social do ângulo da luta de classes para a comunidade, vindo á tona novos temas como a família, a religiosidade, a saúde, a sexualidade, o meio ambiente, a fome, a moradia, escola, a cidadania e problemáticas relacionadas a criança, ao adolescente, ao idoso, aos negros, as mulheres, aos índios, dentre outras (JEZINE, 2002, p. 162). Nesse contexto a educação passa a constituir o principal instrumento de solução social, abrindo-se um leque de domínios educativos setorizados para o atendimento das inúmeras demandas. De forma que a escola passa a ser lugar de "tudo acontecer", a reunião da comunidade, do político, o atendimento de saúde, de Programas Assistenciais e outros, com isso esquecendo-se de sua função primordial a produção e socialização dos saberes.A dimensão educativa que se ressalta dos Novos Movimentos Sociais é a recuperação da capacidade ativa do povo, a partir do conceito gramsciano de sociedade civil e hegemonia, o povo se percebe como agente de cultura e promotor de saber em diversos espaços sociais. E embora os "Novos Movimentos Sociais" não busquem romper com o modo de produção capitalista e adotem ações pragmáticas, há de se destacar os elementos novos de discussão, não se centram mais na polaridade sociedade-estado, mas na dimensão da esfera pública e privada, indicando a possibilidade de auto-gestão dos próprios movimentos e/ou parcerias com o Estado para a execução dos seus projetos é o exemplo dos Programas de Alfabetização (Solidária e Brasil Alfabetizado) ou cursos de formação para militantes do Movimento dos Sem Terra, acampados e assentados da Reforma Agrária, o PRONERA. A luta pela escola pública, pela democratização dos saberes tem demonstrado que mesmo buscando outras formas didáticas como a interdisciplinaridade e a transversalidade, (significando a integração de disciplinas, em que as temáticas atuais devem permeia os conteúdos clássicos das mesmas) não têm encerrado a questão, pois, enquanto não se perceber a natureza política da educação e a necessidade do compromisso ideológico dos envolvidos, volta-se a antiga problemática o método pelo método. A educação sob os princípios fundantes da educação liberal, não tem se constituído em um instrumento de libertação e instrução para a classe trabalhadora, ao contrário, tem servido para excluir e segregar, como salienta Mészáros (2005, p. 53).
Nunca é demais salientar a importância da estratégia mais ampla de educação, expressa na frase: "a aprendizagem é a nossa própria vida". Pois muito do nosso processo contínuo de aprendizagem se situa, felizmente, fora das instituições educacionais formais. Felizmente, porque esses processos não podem ser manipulados e controlados de imediato pela estrutura educacional formal legalmente salvaguardada e sancionada.
Portanto, não adianta mudar os aspectos estrutural-organizacionais da escola e pedagógico-didáticos do ensino se o ato educativo não for resignificado pelo professor, agente mediador da relação escola-comunidade, aluno-realidade. Contudo, Mészáros (2005, p. 74) indicar a necessidade de ruptura com a lógica do capital e a importância da educação. "é impossível romper esse círculo vicioso sem uma intervenção efetiva na educação, capaz, simultaneamente, de estabelecer prioridades e de definir as reais necessidades, mediante plena e livre deliberação dos indivíduos envolvidos". Portanto, não podemos eliminar a escola pública, como instituição social, e sim utilizar - lá como um espaço de formação, conscientização e politização em sua essência, adotando as práticas político-educacional-culturais como internalizadas ao fazer pedagógico de professores e alunos. Nesta perspectiva, o currículo não se elabora ou se planeja, se constrói na perspectiva do movimento, tendo o diálogo como procedimento metodológico constante, em que o global e o particular se completam, vinculados a um conteúdo fundamentado na história de vida dos sujeitos. A educação que tem por base o diálogo é uma educação voltada para a emancipação das classes populares. Daí que o projeto político-pedagógico emancipatório tem de mexer com os conteúdos pedagógicos, e terão de incorporar o conhecimento produzido e transmitido historicamente pelo povo (GARCIA, 2000, p. 09). Para tanto é preciso aprender com os movimentos sociais, a pensar e fazer uma pedagogia que se constitua no movimento de luta social, em que o educador a perceba como educativa, na medida em que ela faça parte da história dos sujeitos. Isso significa o enraizamento numa atividade coletiva em movimento, ou como enseja Gramsci uma organicidade entre intelectuais e massa. Portanto construir uma pedagogia crítica, emancipatória, que se realize nas práticas da educação popular e da escola pública implica ter intencionalidade política e pedagógica, pois o processo de educação se dar na participação, no movimento, na práxis. Educar nessa perspectiva é promover a participação numa corrente coletiva que humaniza as pessoas. A participação implica devolver á vida social pessoas que estavam excluídas dela, uma vez que não lhe era permitido desenvolver a capacidade de pensar e fazer história. A pedagogia da luta educa para determinada postura diante da vida. Uma postura, crítica e emancipadora. Nesse ínterim o currículo e fruto do movimento que possibilita fazer-se e refazer-se a si próprio, pois enquanto os sujeitos contestam a ordem estabelecida, problematiza, propõe valores, transforma a realidade se produz como sujeito da história e constrói novas propostas político-pedagógica.
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Autor:
Edineide Jezine
Dra. em Sociologia
Universidade Federal da Paraíba - UFPB
Professora Doutora em Sociologia do Programa de Pós-graduação em Educação
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