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Se o Poder Judiciário tiver a dotação necessária para o pagamento (como prevê o art. 100, § 2º, da Constituição Federal), poderá efetuar o pagamento devido, pois a ele não interessa reter o dinheiro do pagamento de precatório. Além disso, dispõe o § 6º do art. 100, incluído pela Emenda Constitucional nº 30/2000, que a retenção do dinheiro do pagamento configuraria crime de responsabilidade por parte do Presidente do Tribunal:
"§ 6º O Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatório incorrerá em crime de responsabilidade."
Como se vê, a Emenda Constitucional nº 30/2000 criou uma sanção expressa para o Presidente do Tribunal que deixar de pagar o precatório; por outro lado, não existe nenhuma sanção para o dirigente ou gestor do órgão ou entidade devedora que deixar de efetuar o pagamento. Isso não está errado, dentro do sistema estabelecido pelo art. 100 da Constituição Federal, pois, conforme vimos acima, a dotação deve ser consignada diretamente ao Poder Judiciário.
No período anterior á Emenda Constitucional nº 30/2000, a União acumulou uma grande dívida com as pessoas com decisões judiciais transitadas em julgado e precatórios expedidos. Para resolver esse problema, a Emenda Constitucional nº 30/2000 determinou que as dotações fossem consignadas diretamente ao Poder Judiciário (para evitar que os precatórios futuros deixassem de ser pagos) e determinou o parcelamento, em até dez anos, dos precatórios referentes a débitos que não fossem de pequeno valor, alimentícios ou previstos no art. 33 do ADCT (para resolver o problema dos precatórios passados).
A toda evidência, ao incluir o § 6º no art. 100 da Constituição Federal, quis a Emenda Constitucional nº 30/2000 assegurar que o Presidente do Tribunal irá tomar as providências devidas para que os pagamentos sejam efetuados, exatamente para assegurar que o Poder Judiciário não iria cometer o mesmo erro que o Poder Executivo, no tocante ao atraso ou mesmo não pagamento de precatórios, durante o período anterior ao regime estabelecido pela Emenda Constitucional nº 30/2000.
Assim, quem deve fazer o pagamento deve ser sancionado se não fizer o pagamento. Ou seja, quem deve ser sancionado é aquele que deve fazer o pagamento, caso não faça o pagamento. Se o § 2º do art. 100 diz que a dotação deve ser feita diretamente ao Poder Judiciário e o § 6º diz que o Presidente do Tribunal que não fizer o pagamento devido será sancionado, resta evidente que quem deve receber a dotação para efetivar o pagamento é o Poder Judiciário e não os órgãos e entidades do Poder Executivo.
Contudo, para resolver o problema das finanças das pessoas jurídicas políticas (e dos credores), de nada adianta o parcelamento dos precatórios passados, se os pagamentos dos precatórios passados e futuros não forem pagos. Isto é, caso não se adote o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 30/2000, o problema continuará insolúvel.
De acordo com nosso sistema constitucional, a lei orçamentária anual deve ser elaborada de acordo o disposto na lei de diretrizes orçamentárias. Os projetos de leis orçamentárias são de competência exclusiva do chefe do Poder Executivo (Presidente, Governador, Prefeito).
Antes do advento da Emenda Constitucional nº 30/2000, as leis orçamentárias da União determinavam que as dotações para pagamento de precatório fossem consignadas para os órgãos e entidades devedoras. Confira-se a LDO aprovada em 1999:
LEI FEDERAL Nº 9.811, DE 28 DE JULHO DE 1999 (LDO/2000)
"Art. 20. As despesas com o pagamento de precatórios judiciários correrão á conta de dotações consignadas com esta finalidade em operações especiais específicas, que constarão das unidades orçamentárias responsáveis pelos débitos.
Parágrafo único. Os recursos alocados na lei orçamentária, com a destinação prevista neste artigo, somente poderão ser cancelados para a abertura de créditos adicionais com outra finalidade mediante autorização específica do Congresso Nacional." (Original sem destaques)
Naquela época, os pagamentos de precatórios por parte da União eram efetuados com grande atraso. Não era sem razão: as verbas eram consignadas para os órgãos devedores!
O resultado foi um acúmulo na dívida da União com as pessoas com decisões judiciais transitadas em julgado e precatórios expedidos, que motivou o advento da Emenda Constitucional nº 30/2000, conforme vimos acima.
Vejamos, a título de exemplo, a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Estado de Minas Gerais aprovada em 1999, que incidia no mesmo erro da LDO da União do mesmo ano:
LEI ESTADUAL Nº 13.272/1999 (LDO-MG/2000)
"Art. 24 - A despesa com precatórios judiciários será programada, na lei orçamentária, em dotação específica da unidade orçamentária responsável pelo débito.
§ 1º - Os órgãos e as entidades integrantes do Orçamento Fiscal deverão encaminhar á Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral, para inclusão na Lei Orçamentária de 2000, a relação de débitos referentes a precatórios judiciários apresentados até 1º de julho de 1999 de acordo com o § 1º do art. 100 da Constituição da República.
(...)" (original sem destaques)
Esse era o sistema passado, aplicável em decorrência de uma interpretação equivocada do § 2º do art. 100 da Constituição Federal. A Emenda Constitucional nº 30/2000 surgiu para corrigir esse equívoco: introduziu-se no § 2º do art. 100 da Constituição Federal o vocábulo diretamente, para restar claro que as dotações seriam efetuadas para o Poder Judiciário e não para os órgãos e entidades devedoras.
Vejamos, então, como o sistema está atualmente. Vamos comparar os dispositivos referentes á questão do pagamento de precatórios das leis de diretrizes orçamentárias da União e do Estado de Minas Gerais, ambas aprovadas em 2004 e referentes á lei orçamentária para execução em 2005:
Dispõe a Lei Federal de Diretrizes Orçamentárias atualmente em vigor:
LEI FEDERAL Nº 10.934, DE 11 DE AGOSTO DE 2004.
"Art. 26.
As dotações orçamentárias das autarquias e das fundações públicas, destinadas
ao pagamento de débitos oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado,
aprovadas na lei orçamentária anual e em créditos adicionais, incluídas as
relativas a benefícios previdenciários de pequeno valor, deverão ser
integralmente descentralizadas aos Tribunais que proferirem as decisões
exeqüendas, ressalvadas as hipóteses de causas processadas pela justiça comum
estadual.
§ 1o A descentralização de que trata o caput deverá ser feita de forma
automática pelo órgão central do Sistema de Administração Financeira Federal,
imediatamente após a publicação da lei orçamentária e dos créditos adicionais.
(...)"
Como se vê, o art. 26 da Lei Federal de Diretrizes Orçamentárias é expresso no sentido de que as verbas para pagamentos devidos pelas pessoas jurídicas da administração indireta federal devem ser descentralizadas para o Poder Judiciário, exatamente para que ele possa determinar que o pagamento seja feito. Isso está de acordo com o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal.
Como essa lei se aplica apenas aos débitos federais, estão excluídos do âmbito de sua incidência os débitos dos Estados, Distrito Federal e Municípios, que são regidos pelas leis locais, embora adstritos ao art. 100 da Constituição Federal.
Devem os Estados, Distrito Federal e Municípios, em obediência ao art. 100, § 2º, da Constituição Federal, estabelecerem em suas leis orçamentárias que as dotações para o pagamento de precatórios serão consignadas para o Poder Judiciário (normalmente para o Tribunal de Justiça do Estado ou do Distrito Federal).
Vejamos, agora, a título de exemplo, a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Estado de Minas Gerais atualmente em vigor:
LEI ESTADUAL Nº 15.291/2004 (LDO-MG/2005)
"Art. 25.
A despesa com precatórios judiciários e com o cumprimento de sentenças
judiciais será programada, na lei orçamentária, em dotação específica da
unidade orçamentária responsável pelo débito.
§ 1º. Os órgãos e entidades integrantes do Orçamento Fiscal alocarão os
recursos para as despesas com precatórios judiciários, em suas propostas
orçamentárias, com base na relação de débitos apresentados até 1º de julho de
2004, com valores atualizados até a referida data, de acordo com o § 1º do art.
100 da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional
nº 30, de 13 de setembro de 2000, especificando por grupo de despesa:
(...)
§ 2º. Os órgãos e entidades, para registro de seus precatórios judiciários na
proposta orçamentária de 2005, deverão se assegurar da existência de pelo menos
um dos documentos relacionados a seguir:
I - certidão de trânsito em julgado dos embargos á execução;
II - certidão de que não tenham sido apostos embargos ou qualquer impugnação aos respectivos cálculos. (...)" (Original sem destaques)
Como se vê, o art. 25 da Lei Estadual de Diretrizes Orçamentárias é expresso no sentido de que a dotação é efetuada para o órgão e entidade devedora. Ou seja, o art. 25 da Lei de Diretrizes Orçamentárias do Estado de Minas Gerais viola claramente o art. 100, § 2º, da Constituição Federal.
Isso significa que, a despeito da alteração no sistema de pagamentos estabelecido pela Emenda Constitucional nº 30/2000, a Lei de Diretrizes Orçamentárias do Estado de Minas Gerais continuou mantendo o equivocado sistema anterior, o que causa injustiças e prejuízos para os cidadãos.
Das leis analisadas acima, apenas a Lei de Diretrizes Orçamentárias da União aprovada em 2004, no que se refere ao pagamento devido pelas entidades da administração indireta sujeitas ao regime de precatórios, cumpriu corretamente o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal. Com efeito, no que se refere a esses pagamentos, foi obedecido o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal, vale dizer, prevendo que as dotações para pagamento de débitos oriundo de decisão judicial deverão ser consignados para o Poder Judiciário e não para as entidades devedoras.
Por essa razão, a título de exemplo, o INSS, que no passado era um impontual devedor de precatórios, passou a pagá-los de forma correta (exceção feita, evidentemente, a casos específicos em que ocorreu erro no processamento do precatório ou no processamento do pagamento). Como se vê, foi corretamente aproveitado pelo Poder Público Federal o parcelamento dos precatórios pendentes de pagamento, previsto na Emenda Constitucional nº 30/2000, para a regularização da desconfortável situação de estar o Estado descumprindo as decisões do próprio Estado. Além disso, no que se refere ás autarquias e fundações públicas, restou obedecido pela LDO o disposto no § 2º do art. 100 da Constituição Federal.
é evidente que isso decorre não apenas do disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal, que vincula não só a União, mas também os Estados membros da Federação. O fato de estar a União pagando os precatórios decorre de uma vontade política do chefe do Poder Executivo de encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei de diretrizes orçamentárias em consonância com o referido dispositivo constitucional.
No caso de vários Estados membros da Federação, isso não vem ocorrendo, razão pela qual os credores de precatórios estaduais não estão recebendo os valores devidos. Há um erro político, consistente em se propor e aprovar uma lei que prejudicará os cidadãos; e há um erro jurídico, consistente na existência de um dispositivo na lei estadual de diretrizes orçamentárias que, ao estabelecer que as dotações serão feitas para os órgão ou entidades devedoras, é claramente inconstitucional, por violar frontalmente o disposto no art. 100, § 2º, da Constituição Federal. Trata-se de uma opção política do Governador do Estado, cuja responsabilidade fica ainda mais grave quando ele tem maioria na Assembléia Legislativa, responsável pela aprovação de leis orçamentárias claramente prejudiciais aos interesses da população e gritantemente violadoras da ordem constitucional.
Autor:
Bruno Mattos E Silva
brunosilva2008[arroba]hotmail.com
Autor do livro "Direito administrativo para concursos" (Ed. Fortium)
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