Falta de justa causa, trancamento da ação penal sem decisão de mérito
Direitos Humanos e os princípios nulla culpa sine iudicio e nullum iudicium sine accusatione, frente a um Poder Judiciário moderno no Estado Democrático
"Felizes os famintos e sedentos de justiça, porque serão saciados" Bem-aventuranças
"é tão difícil chegar ao Céu como fazer Justiça" Voltaire
"Não há Justiça sem Deus" Rui Barbosa
Primeiro se faz necessário esclarecer que o presente ensaio jurídico não possui nenhuma pretensão de enfrentar ou retirar legitimidade do Judiciário; pelo contrário, é fazer com que o Poder Judiciário se engrandeça ainda mais, que aumente a credibilidade popular de seus magistrados no instante em que a justiça criminal se realize com mais transparência e imparcialidade.
é preciso dar a real e correta efetividade ao sistema penal acusatório democrático e constitucional, implementado pela Carta Magna de 1988, porque até os dias de hoje a práxis jurídico-penal processual continua sendo flagrantemente inquisitiva. Um absurdo para os tempos atuais frente a vigência das cláusulas pétreas fundamentais e dos princípios de Direitos Humanos.
Quando o Ministério Público delibera pela absolvição, significa o mesmo que "retirar a acusação", em outros términos, o mesmo que a desistência da ação penal, por ilegitimidade de causa, carência de pressupostos processuais e falta de interesse estatal para continuar com a persecutio criminis. Tranca-se a ação penal, porque o órgão ministerial não pretende mais exercitar o ius persequendi e o ius puniendi. Assim por razões de justiça, lógica, coerência, racionalidade e correta aplicação da lei, resta ao Poder Judiciário encerrar a ação penal, em nome dos princípios da imparcialidade e do no judex ex officio.
Nesta hipótese, não se aplica o princípio da indisponibilidade da ação penal pública, mas sim os princípios nulla culpa sine iudicio e nullum iudicium sine accusatione, visto que o Ministério Público é o dominus litis e titular exclusivo da persecutio criminis.
Em certos casos o Estado deve e pode renunciar ou dispor da ação penal, por critérios de justiça ou justificadores para o exercício da prestação jurisdicional, no modelo acusatório penal democrático.
Pleiteada pelo Ministério Público a absolvição do acusado, implica na desnecessidade de julgamento de mérito pelo Poder Judiciário - julgamento antecipado da lide a exemplo do disposto no art. 267 do CPC: quando o autor desistir ou retira a ação; quando se verificar ausência de pressupostos legais ou quando não concorrer qualquer das condições da ação. Decisão judicial declaratória de extinção do feito, por falta de legitimidade de causa, do interesse de agir e de pressupostos processuais como condições indispensáveis para a ação penal, nos termos do art. 647/648 do Código de Processo Penal.
A sentença de mérito de absolvição pelo Poder Judiciário somente é possível quando o Ministério Público requerer a procedência da ação penal e o magistrado entende o contrário, ou seja, pela improcedência da acusação, por carência de provas, negativa de autoria ou existência de causas excludentes de ilicitude, "ex vi" do art. 386 CPP.
A prova incumbe a quem acusa - ao Ministério Público -, sine probatione, sine acusatione, nullum iudicio, e nulla poena. Somente o órgão encarregado da acusação possui legitimidade para ex officio para deliberar pela falta de interesse na continuidade do feito.
Ao se definir a correta postura institucional do Ministério Público coloca-se no escanteio a mera e retrograda função única de acusar, marcando assim posição contra o império do abominável sistema inquisitivo. A missão sublime, una e indivisível do Ministério Público como instituição de defesa das garantias judiciais e do sistema penal acusatório democrático faz do representante do Parquet um verdadeiro Ombudsman dos Direitos Humanos.
Note-se. No passado, época do Brasil imperial por exemplo, os representantes do Ministério Público denominavam-se Promotores Públicos, uns eram escalados para promover a acusação ou a ação penal pública e outros designados para desempenhar a tarefa de defender o réu no processo-crime, daí a origem das expressões "advogado de acusação" e "advogado de defesa".
Deve-se observar no sistema democrático acusatório o princípio da ampla defesa e do contraditório, como expressa o artigo. 5º inciso LV da Constituição federal: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". O que significa que tanto na fase investigatória, na polícia, como na instrução criminal em juízo, se faz obrigatório o respeito a ampla defesa e ao contraditório, onde todos os acusados possuem direito de defesa, e o onus probandi incumbe a quem alega, ou seja, ao agente ministerial, encarregado exclusivo da acusação, no sistema legal pátrio vigente.
Com a falta de provas de fato ou de direito não está autorizado o decisium condenatório, pois na dúvida sempre prevalecem os princípios sine culpa, sine poena ou in dubio pro reo, assim trilha o direito penal democrático, liberal e humanitário. O búsilis para a solução da culpabilidade resulta em favor do agente.
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