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Homoafetividade e direito: o oposto do que eu disse antes (página 2)

Enéas Castilho Chiarini Júnior
Partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6

A fé natural não leva o homem a Deus e nem trás Deus ao homem. CONSIDERE ISTO!

[...]

A Fé Natural não pode ser espiritualizada. Ela só atua na esfera material. Ela não pode ajudar o homem a compreender e a adquirir os bens espirituais. Ela não pode ser definida com "firme fundamento das coisas que se esperam", porque está sujeita á falhas, e costuma falhar!

Dentre os exemplos de Fé Natural podemos citar a do agricultor, ou lavrador, e veremos que sua fé pode falhar.

O agricultor e a necessidade da Fé Natural.

Se o agricultor não tiver fé natural, ele não semeia, conforme afirmou Salomão - "Quem observa o vento, nunca semeará, e o que olha para as nuvens nunca segará"- Eclesiastes 12:4.

Isto significa que ele não pode ficar na dependência do tempo, se vai chover, se vai fazer sol! O tempo passa! Ele tem que acreditar, ter fé, lançar a semente, crer que haverá uma colheita abundante... e esperar! Mas, nada pode lhe garantir que haverá colheita. A fé natural não se apóia num firme fundamento, e, pode falhar. Uma praga, a falta, ou excesso de chuva podem prejudicar, e até destruir toda colheita!

O ser "o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem" é o que faz a diferença entre a Fé Natural e a Fé Espiritual.

[...]

Por definição ela [fé espiritual] é "...o firme fundamento das coisas que se esperam e a prova das coisas que se não vêem"- Hebreus 11:1. Ela tem sua origem em Deus, sendo que o Senhor Jesus é o seu autor e consumador, ou seja, ela começa e termina em Jesus - "Olhando para Jesus, o autor e consumador da fé..."- Hebreus 12:2.

Ela é um dom de Deus - "Pela graça sois salvos por meio da fé, e isto não vem de vós; é dom de Deus"- Efésios 2:8. O mecanismo inicial para o homem receber esta fé é pelo ouvir a Palavra de Deus - "De sorte que a fé é pelo ouvir, e o ouvir pela Palavra de Deus"- Romanos 10:17. Não existe outra forma para adquiri-la.

Dissemos que a Fé Natural nunca poderá se transformar em Fé Espiritual. Isto é verdade! A fé espiritual só pode ser recebida como dom de Deus, através de Sua Palavra. Isto acontece no momento da Conversão, ou do Novo Nascimento. Somente o homem nascido de novo possui a fé espiritual."[3]

Desta forma, não se espera, com o presente trabalho, alcançar a plena aprovação de todos quantos o lerem, pois é de conhecimento geral que os indivíduos possuem convicções religiosas diversas, e que, assim, é possível que juristas de religiões não-cristãs venham a condenar o atual posicionamento do autor.

Por outro lado, é inadmissível que pessoas que se digam cristãs venham a contestar o que aqui está escrito, uma vez que é impossível ser cristão, e, ao mesmo tempo, assumir posicionamento contrário ao que diz a Bíblia Sagrada.

Tendo-se por base os ensinamentos bíblicos, e, considerando-se que estes são fruto da revelação divina ao Homem, e que ensinam a estes o que Deus espera que seja feito, o trabalho deverá convencer o leitor, com argumentos jurídicos, da nova posição jurídico-religiosa assumida pelo autor nos últimos meses.

O presente estudo irá se iniciar dando uma visão acerca do objeto do estudo, conceituando a homossexualidade, e diferenciando-a de outras figuras sociais, em seguida prosseguirá apresentando um resumo da visão anterior do autor, e, por fim, apresentará o seu novo posicionamento jurídico-religioso, concluindo-se, ao final, pela impossibilidade do reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas.

Uma vez que o presente tema exige uma opção ética, não deve-se deixar de esclarecer que a conclusão a que se chegará ao final deste trabalho é decorrente de posicionamento ético derivado diretamente dos ensinos bíblicos.

Desta forma, é recomendável dizer que, sobre ética, certa vez escreveu o Dr. Caramuru Afonso Francisco:

"ética" é palavra de origem grega, que vem de "ethos", que quer dizer costume, hábito, disposição. Em latim, a palavra usada para dar a mesma idéia é "mos, moris". Advém daí que, etimologicamente, temos que "ética" e "moral" se confundem, pois ambas dizem respeito ao conjunto de padrões e de atitudes que as pessoas devem ter no seu dia-a-dia, no seu cotidiano.

A ética, portanto, preocupa-se com a conduta ideal do indivíduo, ou seja, qual deve ser o comportamento do indivíduo ao exercer uma determinada atividade, ao desempenhar uma determinada ação, ou seja, como o indivíduo deve agir enquanto vive.

[...]

Quando se fala, portanto, em conduta ideal do indivíduo, em forma de agir, em comportamentos adequados, sempre teremos, de um lado, o comportamento exigido por Deus, proposto pelo Criador, determinado pelo Soberano Senhor dos céus e da terra, como, também, de outro lado, as propostas humanas de conduta e de comportamento, fruto da rebeldia do ser humano e de seu estado pecaminoso.

OBS: "...Todos nós tomamos diariamente dezenas de decisões, resolvendo aquilo que tem a ver com nossa vida, a vida da empresa e de nossos semelhantes. Ninguém faz isso no vácuo. Antigamente pensava-se que era possível pronunciar-se sobre um determinado assunto de forma inteiramente objetiva, isto é, isenta de quaisquer pré-concepções. Hoje, sabe-se que nem mesmo na área das chamadas ciências exatas é possível fazer pesquisa sem sermos influenciados pelo que cremos. Ao elegermos uma determinada solução em detrimento de outra, o fazemos baseados num padrão, num conjunto de valores do que acreditamos é certo ou errado. é isso que chamamos de ética: o conjunto de valores ou padrão pelo qual uma pessoa entende o que seja certo ou errado e toma decisões. Cada um de nós tem um sistema de valores interno que consulta (nem sempre, a julgar pela incoerência de nossas decisões...!) no processo de fazer escolhas. Nem sempre estamos conscientes dos valores que compõem esse sistema, mas eles estão lá, influenciando decisivamente nossas opções. Os estudiosos do assunto geralmente agrupam as alternativas éticas de acordo com o seu princípio orientador fundamental. As chamadas éTICAS HUMANÍSTICAS tomam o ser humano como seu princípio orientador, seguindo o axioma de Protágoras, "o homem é a medida de todas as coisas". O hedonismo, por exemplo, ensina que o certo é aquilo que é agradável.

Freqüentemente somos motivados em nossas decisões pela busca secreta do prazer. O individualismo e o materialismo modernos são formas atuais de hedonismo. Já o utilitarismo tem como princípio orientador o que for útil para o maior número de pessoas. O nazismo, dizimando milhares de judeus em nome do que é útil, demonstrou que na falta de quem decida mais exatamente o sentido de "útil", tal princípio orientador acaba por justificar os interesses de poderosos inescrupulosos e o egoísmo dos indivíduos. O existencialismo, por sua vez, defende que o certo e o errado são relativos á perspectiva do indivíduo e que não existem valores morais ou espirituais absolutos. Seu principio orientador é que o certo é ter uma experiência, é agir - o errado é vegetar, ficar inerte. O existencialismo é o sistema ético dominante em nossa sociedade moderna, que tende a validar eticamente atitudes tomadas com base na experiência individual.

A ÉTICA NATURALÍSTICA toma como base o processo e as leis da natureza. O certo é o natural - a natureza nos dá o padrão a ser seguido. A natureza, numa primeira observação, ensina que somente os mais aptos sobrevivem e que os fracos, doentes, velhos e debilitados tendem a cair e desaparecer á medida em que a natureza evolui. Logo, tudo que contribuir para a seleção do mais forte e a sobrevivência do mais apto, é certo. Numa sociedade dominada pela teoria evolucionista não foi difícil para esse tipo de ética encontrar lugar. Cresce a aceitação pública do aborto (em caso de fetos deficientes) e da eutanásia (elimina doentes, velhos e inválidos). (Rev. Augustus Nicodemus LOPES. A ética nossa de cada dia. http://www.thirdmill.org/files/portuguese/14495~9_19_01_9-44-44_AM~A_%C3%9tica_nossa_de_Cada_Dia.html)

[...]

A ética cristã, portanto, em primeiro lugar, caracteriza-se por ser um comportamento assumido por um indivíduo que o faz exclusivamente pela fé. Sim, o cristão passa a ter um determinado comportamento porque crê que aquele comportamento, aquelas atitudes são agradáveis a Deus, que é o galardoador dos que O buscam (Hb.11:6). Cremos em Deus e na Sua Palavra e é por isso que passamos a agir conforme os Seus mandamentos. é por isso que Paulo afirma que "tudo que não é de fé é pecado" (Rm.14:23).

Cumprimos a Palavra de Deus, praticamos as ações e atitudes que a Bíblia nos determina, porque, antes, cremos que a Bíblia é a Palavra de Deus e a única regra de fé e prática que deve ser seguida. Temos a convicção, que nasce em nós por dom de Deus (Ef.2:8), pela aceitação da ação de convencimento do Espírito Santo (Jo.16:8-11).

Destarte, quem não tem fé verdadeira e genuína, não pode, em absoluto, ter um comportamento ou conduta que esteja de acordo com a Palavra de Deus, ou seja, a ética cristã exige uma verdadeira conversão do indivíduo. é por isso que vemos com preocupação a constatação de que a ética tem sido relegada a um plano absolutamente secundário na pregação do evangelho nos nossos dias, tanto que o fenômeno tem sido observado até por sociólogos da religião, como Antonio Flávio Pierucci, que o denominou de "des-moralização religiosa", algo, aliás, que já tinha sido previsto nas Escrituras (II Pe.2:1-3)

OBS: "...Os cristãos entendem que éticas baseadas exclusivamente no homem e na natureza são inadequadas, já que ambos, como os temos hoje, estão profundamente afetados pelos efeitos da entrada do pecado no mundo. A éTICA CRISTÃ, por sua vez, parte de diversos pressupostos associados com o Cristianismo histórico. Tem como fundamento principal a existência de um único Deus, criador dos céus e da terra. Vê o homem, não como fruto de um processo evolutivo (o que o eximiria de responsabilidades morais) mas como criação de Deus, ao qual é responsável moralmente. Entende que o homem pecou, afastando-se de Deus; como tal, não é moralmente neutro, mas naturalmente inclinado a tomar decisões movido acima de tudo pela cobiça e pelo egoísmo (por natureza, segue uma ética humanística ou naturalística).

Um outro postulado é o de que Deus enviou seu Filho Jesus Cristo ao mundo para salvar o homem. Mediante fé em Jesus Cristo, o homem decaído é restaurado, renovado e capacitado a viver uma vida de amor a Deus e ao próximo. A vontade de Deus para a humanidade encontra-se na Bíblia. Ela revela os padrões morais de Deus, como encontramos nos 10 mandamentos e no sermão do Monte. Mais que isso, ela nos revela o que Deus fez para que o homem pudesse vir a obedecê-lo. A éTICA CRISTÃ, em resumo, é o conjunto de valores morais total e unicamente baseado nas Escrituras Sagradas, pelo qual o homem deve regular sua conduta nesse mundo, diante de Deus, do próximo e de si mesmo. Não é um conjunto de regras pelas quais o homem poderá chegar a Deus - mas é a norma de conduta pela qual poderá agradar a Deus que já o redimiu. Por ser baseada na revelação divina, acredita em valores morais absolutos, que são a vontade de Deus para todos os homens, de todas as culturas e em todas as épocas." (Rev. Augustus Nicodemus LOPES. A ética nossa de cada dia. http://www.thirdmill.org/files/ portuguese/14495~9_19_01_9-44-44_AM~A_%C3%89 tica_nossa_ de_Cada_Dia.html).

[...]

Sob um discurso de tolerância e de liberdade, o mundo, hodiernamente, defende a idéia do "relativismo ético", ou seja, nega que haja padrões de comportamento válidos para todos os homens, independentemente da época, da cultura ou da vontade de cada ser humano. Dentro deste pensamento, não é considerado exigível dos homens qualquer conduta estabelecida "a priori" por quem quer que seja. Deste modo, entende-se que não possa ser imposto qualquer comportamento a qualquer homem, sendo "fanáticos" e "intolerantes" aqueles que assim não entendem.

Entretanto, este tipo de pensamento é antibíblico, porquanto é mera conseqüência do pecado do homem, da sua recusa em obedecer a Deus e á ética estabelecida pelo Criador dos céus e da terra. Não negamos a liberdade de cada indivíduo de viver conforme a sua vontade, pois o livre-arbítrio foi dado ao homem pelo próprio Deus e, desta forma, é igualmente antibíblico agir de forma a negá-lo ou procurar massacrá-lo, mas não resta dúvida de que existe uma ordem universal instituída por Deus e que esta ordem deve ser observada pelo homem.

Portanto, existe, sim, uma conduta que deve ser perseguida pelo ser humano, que é a conduta determinada por Deus, por Ele revelada em Sua Palavra, que deve ser a nossa única regra de fé e prática. Ao contrário do que se diz no mundo, existe, sim, um padrão universal de conduta, que independe de cultura, de época ou da vontade de cada ser humano: o padrão bíblico, o padrão estabelecido por Deus e revelado ao homem por Sua Palavra.

[...]

A inobservância do padrão bíblico gera a ira de Deus sobre os desobedientes (Rm.1:18) e o resultado desta recusa á ética divina é o abandono de Deus, de forma que haja a concupiscência dos corações humanos á imundícia e toda a sorte de desordem, de desequilíbrio e de iniqüidade no seio da humanidade (Rm.1:26-32).

[...]

Por causa do "relativismo ético", é que se tem um vazio nas relações humanas, uma perplexidade quanto aos rumos e ás orientações que se devam tomar no tratamento dos principais problemas morais, tentando o homem em vão buscar a solução para este vazio em técnicas de auto-ajuda ou em valores como os direitos humanos. A solução para o homem está em acolher a ética divina, constante da Palavra de Deus e exemplificada de forma ímpar na vida e no ministério de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo."[4]

Assim, verifica-se que o presente trabalho é uma tentativa de resgatar a ética Cristã, em detrimento de éticas meramente humanísticas ou naturalísticas, visando uma forma de aproximação entre o ser humano e Deus, pois, nos últimos anos, o que se tem visto é exatamente o oposto, uma luta de todas as classes sociais, e de todos os ramos do conhecimento, em busca de uma relativização até mesmo do conceito de Deus, como fazem diversas religiões, e da qual o movimento ecumênico mundial é fruto.

Sabemos que não se alcançará êxito neste propósito, e que chegará o momento em que todas as religiões (exceto a verdadeira religião cristã) se unirão em uma religião mundial, de onde se levantará, por determinação do "falso profeta", uma verdadeira aversão á sadia doutrina cristã - sendo que a aceitação jurídica das uniões homoafetivas é apenas um pequeno passo neste sentido -, pois assim está escrito[5], e como disse Jesus: "passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão"[6]

2.0 - Da homossexualidade

Como encontramos na obra de Luis Alberto David Araújo, sexo "...para o Dicionário Flammarion, 'é o conjunto de características estruturais e funcionais que distingue o macho da fêmea.'"  e mais adiante

"Odom Maranhão assim define sexo: 'Não se pode mais considerar o conceito de sexo fora de uma apreciação plurivetorial. Em outros termos, o sexo é a resultante de um equilíbrio de diferentes fatores que agem de forma concorrente nos planos físico, psicológico e social' e na seqüência: 'Assim, fatores genéticos, endócrinos, somáticos, psicológicos e sociais se integram para definir a situação de uma pessoa em termos sexuais. As implicações jurídicas serão decorrentes dessa integração.'"

De um modo geral, os autores ressaltam que para a determinação do sexo de um indivíduo, é necessário que se conjuguem todos estes critérios, o cromossômico, o fenotípico, o gonadal e o psicológico, sendo que

"Havendo desarmonia entre eles [os componentes para determinação do sexo], o componente que apresenta maior relevância é o psicológico."[7].

Homossexualismo, como nos ensina Delton Croce, é "a atração erótica por indivíduos do mesmo sexo", podendo o homossexual praticar atos libidinosos ou apenas exibir fantasias sexuais com relação á indivíduos do mesmo sexo, apresentando certa indiferença ou repugnância por indivíduos do sexo oposto. Pode atingir ambos os sexos, de onde recebe a denominação de masculina, se praticada entre homens, ou feminina, se praticada entre mulheres.

Não existe um padrão comportamental típico que defina o homossexualismo, apresentando-se na prática, diversas gradações no aspecto físico, que podem ir, no caso de homossexualismo masculino, por exemplo, desde a completa efeminação exteriorizada por gestos e maneiras de se comportar, até a exterior aparência viril e heterossexual.

Conforme Renato Posterli,

"é oportuno, agora, ressaltar que homossexualismo deixou de ser doença. Á décima revisão da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados á Saúde (CID), da Organização Mundial de Saúde, exclui, depois de quase vinte anos, o homossexualismo como doença.'... o então presidente do Conselho Federal de Medicina, psiquiatra Ivan Moura Fé, afirmou que 'muitas vezes, os próprios pais levam os filhos homossexuais ao médico, porque acreditam que eles são doentes; a situação deixa os profissionais confusos, já que não é encontrado nenhum sinal que indica a existência de uma anomalia.'" mais adiante, conclui que "é, comprovadamente, uma opção de vida."

É tão bem aceito o fato de a homossexualidade ser uma escolha, que Delton Croce chega a lembrar que:

"Freud afirma que todo indivíduo, homem ou mulher, tem uma tendência ponderável, íntima e oculta á homossexualidade. Tal-qualmente, opina Abrachamsen (Delito y psique, p. 181 usque 183): "Não existe, provavelmente, nenhuma pessoa normal que não possua algumas inclinações homossexuais inconscientes.""

As leis da Grécia Antiga, severas, condenavam a pederastia, que somente era tolerada para os gregos adultos que tutelavam meninos para fins educacionais e de sua inserção no convívio social. A pederastia era apresentada através do mito de Orfeu que após a morte de Eurídice vem a se apaixonar por meninos. Às esposas era somente permitido o papel de procriadoras, sendo aceito o prazer na prática sexual apenas para as prostitutas.

Conforme Luiz Alberto David Araújo[8], com o surgimento do cristianismo, com o surgimento do ideal da virgindade, inspirado na vida de Maria, que teria concebido seu filho sem ter mantido relações sexuais com José, tornando-se um modelo a ser seguido por todas as mulheres do mundo; o casamento, a sociedade e a sexualidade passam a ter uma interpretação cristã. A Igreja Católica pregou o sexo como algo mau, o prazer seria obra do Diabo; o sexo seria admitido unicamente com a finalidade de procriação, sendo ainda hoje condenado pela Igreja o uso de preservativos, mesmo durante relações sexuais entre marido e mulher. O pecado original seria fruto de uma relação sexual. Por isso ele é mau. O celibato é o modo pelo qual os homens se redimem do pecado original.

Pouco mais adiante na história, durante o período Renascentista, vários intelectuais da época, cultivaram paixões homossexuais, como é, por exemplo, os casos de Miguel Ângelo e Francis Bacon[9].

Mais tarde, Freud postula a existência da sexualidade desde o nascimento; inicialmente assimiladas ás funções fisiológicas de nutrição, as relações com a mãe, o pai, a família e o meio social vão-se integrando como um todo, transformando-se num longo processo, que culminaria na fase adulta. Os instintos sexuais, com base orgânica ligada ás zonas erógenas do corpo, que constituem uma fonte ininterrupta de estímulos, que não podem ser eliminados pela fuga. A noção de perversão perde seu sentido original para englobar características preliminares ao ato sexual, sendo que todo adulto lança mão das perversidades para alcançar o ato sexual em si, que desta forma se desvincula da necessidade de procriação, o fundamental é a realização do desejo, a busca do prazer. Segundo Freud, os homossexuais, os voyers, os fetichistas, etc... são considerados perversos no sentido que buscam o prazer dentro dá ótica infantil e não adulta.

A homossexualidade não é, de forma alguma, uma característica exclusiva da espécie humana, estando presente também entre os animais. Segundo o cientista inglês George V. Hamilton, a homossexualidade está presente não só entre os primatas, mas também em inúmeros animais mamíferos[10].

Conforme reportagem da revista Superinteressante de agosto de 1999, o biólogo americano Bruce Bagemihl, em seu livro Exuberância Biológica - Homossexualidade Animal e Diversidade Natural, lançado naquele mesmo ano, apresentou provas mais do que convincentes e irrefutáveis de que existe homossexualidade e vasta diversidade de comportamentos sexuais entre os animais de diversas espécies.

O homossexualismo masculino costuma receber as denominações de uranismo, pederastia e sodomia; e o feminino é conhecido por safismo ou lesbianismo e tribadismo. Não se trata de termos sinônimos, embora na prática seja comum empregar-se estes termos sem nenhuma distinção.

2.1 - Uranismo

Para Renato Posterli, o uranismo é sinônimo de homossexualismo masculino, e origina-se do grego a Ouranía,

"...um dos epítetos, ou seja, da formosura que corresponde a ou identificada com Vênus, na mitologia latina, nascida da espuma do mar..."[11]

Conforme Delton Croce, uranismo é o penhor sexual de um homem sem anomalias dos órgãos genitais por outros homens, desde que estes não sejam meninos púberes. Cita ainda que "para Ulrichs, uranista é o indivíduo do sexo masculino que se relaciona com homem por falta de mulher"[12].

Para Maria Helena Diniz, esta é uma forma congênita de homossexualismo masculino, que acaba "...fazendo com que o indivíduo passe a se vestir como mulher..."[13].

2.2 - Pederastia

Etimologicamente pederasta significa homossexual que mantém relações ano-sexuais ou que pratica atos eróticos com criança ou menino. Atualmente porém, costuma-se aplicar o termo para designar o homem que  pratica sexo com outro homem, não sendo obrigatório o coito anal, posto que

"...muitos pederastas se contentam com a masturbação recíproca ou não, e com afagos mútuos. Outros praticam o coitus per anun et os e/ou o coitus ab ore. Costuma-se dividir os pederastas em ativos e passivos; pederasta ativo é o homem que faz o papel de macho e pederasta passivo o que, representando a mulher, satisfaz a psicossexualidade do outro pederasta e de si próprio..."[14]

Para Maria Helena Diniz, é uma

"...perversão sexual adquirida na busca de novas sensações eróticas, na privação da companhia feminina ou por razões patológicas ou de distúrbios de caráter."[15]

Não deve-se confundir pederastia com pedofilia, pois, esta vem a ser a atração sexual de um adulto (homem ou mulher) por criança, do próprio sexo ou do sexo oposto, enquanto aquela é a atração de um homem por um rapaz jovem.

2.3 - Sodomia

O termo sodomia é empregado como sendo o termo genérico que designa o coito anal, quer seja de um homem com outro homem, de um homem com uma mulher, ou de homem com animal, que neste caso recebe também a denominação de bestialidade.

2.4 - Safismo ou Lesbianismo

Conforme Delton Croce, este termo também é conhecido como lesbismo, e indica a preferência sexual de uma mulher por outra mulher. Safismo, deriva de Safo (ou Sapho), poetisa homossexual, casada e com filhos, que habitava a ilha de Lesbos, de onde deriva a sua outra designação (lesbianismo ou lesbismo).

Para Maria Helena Diniz esta é uma forma de homossexualismo feminino "...consistente no coito bucal ou cunilíngua, sucção do clitóris por uma mulher em outra..."[16]

Esta forma de homossexualismo admite, assim como o homossexualismo masculino, uma forma ativa e outra forma passiva, e é caracterizada pela sucção, recíproca ou não, do clitóris e/ou a masturbação.

2.5 - Tribadismo

Outra forma de homossexualismo feminino, o tribadismo é a prática sexual caracterizada

"...pela atrição recíproca dos órgãos genitais, clitóris com clitóris. Por isso são ativas e passivas concomitantemente. Intromissio kleitoris in vaginae é uma lenda. "[17]

2.6 - Do Transexual

O homossexual não se confunde com o transexual.

Conforme lembra Luiz Alberto David Araújo, "não há dúvida de que o transexualismo é uma alteração da psique. Essa alteração, se examinada em cotejo com o padrão de regularidade (identificação do sexo psicológico com o sexo biológico), dificulta a integração social, que deve ser vista sob o prisma do transexual (como sujeito de direitos e obrigações como todos nós) e não sob o prisma da maioria, que, num primeiro momento, segrega, rejeita e impede essa integração."

Seguindo-se a linha apontada por este jurista, será demonstrado que, na realidade, ocorre um conflito apenas aparente entre a lei e a possibilidade jurídica da autorização da cirurgia de ablação de sexo, de forma que o que deve prevalecer, neste caso, além do direito á intimidade e á vida privada do indivíduo transexual, é, principalmente, o direito sagrado que este têm á felicidade.

O transexual, segundo a CID-10[18], que corresponde ao item F64.0, caracteriza-se por:

"um desejo de viver e ser aceito como um membro do sexo oposto, usualmente acompanhado por uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo anatômico e um desejo de se submeter a tratamento hormonal e cirurgia para seu corpo tão congruente quanto possível com o seu sexo preferido."

Segundo ainda Luiz Alberto David Araújo,

"...No Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, o transexualismo está no capítulo de transtornos de identidade de gênero. O Manual inicia com 'características diagnósticas', dizendo: '...há dois componentes no Transtorno da Identidade de Gênero, sendo que ambos devem estar presentes para fazer o diagnóstico. Deve haver evidências de uma forte e persistente identificação com o gênero oposto, que consiste no desejo de ser, ou a insistência do indivíduo de que é do sexo oposto.' Segue: '...também deve haver evidências de um desconforto persistente com o próprio sexo atribuído ou de uma sensação de inadequação no papel de gênero deste sexo. O diagnóstico não é feito se o indivíduo tem uma condição intersexual física concomitante (por ex. síndrome de insensibilidade aos andróginos ou hiperplasia adrenal congênita). Para que este diagnóstico seja feito, deve haver evidências de sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no fundamento social ou ocupacional em áreas importantes da vida do indivíduo.'"

Delton Croce explica que:

"no transexualismo não ocorre nenhuma alteração anatômica ou hormonal; a genitália externa e os testículos ou os ovários mostram desenvolvimento normal. Aqui sucede discordância ou conflito entre os caracteres orgânicos e psíquicos do sexo (sexo psicológico). A cromatina de Bar, colhida por esfregaço bucal, não proporciona resultados conflitantes para a determinação da identidade sexual. Chamado hermafroditismo psíquico...situada na 'cadeia contínua' ou seqüência da intersexualidade como uma das formas de transição entre o hermafroditismo masculino e o homossexualismo masculino, nos casos de transexualismo masculino ou entre o hermafroditismo feminino e o homossexualismo feminino, nas de ocorrência de transexualismo feminino, na qual o invertido psicossexual se identifica com o sexo oposto, negando assumir a identidade do seu verdadeiro sexo anatômico, exigindo, com insistente determinação compulsiva, ao cirurgião plástico, a operação de reajustamento sexual a fim de poder assumir a identidade de seu verdadeiro gênero. Dessarte, é nossa opinião concorde com Harry Benjamin: os transexuais não são doentes, mas são normais sob todos os aspectos, além do que a sua identidade de gênero é bem definida e normal."

E continua mais adiante

"Pode acarretar uma conduta homossexual reprimida, com a adoção de comportamento social característico do sexo oposto, bem como o irrefreável desejo de uma alteração cirúrgica para completar os impulsos sentidos...Do ponto de vista psicológico, o transexual masculino é verdadeiramente 'um homem com cérebro de mulher'. Desse modo, não há de ser sempre a cirurgia mutiladora, desnecessária e fixadora irreversivelmente da doença mental do transexual, a forma ideal de tratamento e cura da ansiedade de castração delirante, gerada de enorme inferioridade sexual de um homossexualismo coibido e cujo sentimento de culpa é punido pela angústia". Mais adiante, explica que, referente á cirurgia de redesignação de sexo: "..quando, todavia, o cirurgião a comete sem dolo, não infringe a legislação vigente, nem o Código de ética Médica, sendo a sua responsabilidade a mesma referente a qualquer outra atuação cirúrgica. Isto porque a intenção do médico não é causar dano, mas curar ou minimizar o sofrimento físico ou mental do transexual."

A diferença que existe entre homossexual e o transexual é, portanto, justamente o desconforto psicológico que este possui com relação ao seu próprio sexo genético, de maneira que o transexual não aceita o próprio corpo, chegando até mesmo, em alguns casos, a tentar realizar, por si mesmo, a cirurgia de ablação de sexo[19], enquanto que o homossexual, normalmente, não possui qualquer desconforto com seu sexo, muito pelo contrário, embora tenha uma atração por indivíduos do mesmo sexo, deseja continuar pertencendo ao seu sexo.

2.7 - Do Hermafrodita

De um modo geral, os autores concordam que, na espécie humana não é possível o hermafroditismo completo e funcional, ou seja, um indivíduo que, ao mesmo tempo, possua capacidade reprodutora como macho e como fêmea. O que concordam ser possível, é o que chamam de pseudo-hermafroditismo verdadeiro, que seria um indivíduo aparentemente de ambos os sexos, mas que não possuiria capacidade reprodutora de nenhum sexo, ou apresentaria capacidade reprodutora de apenas um dos sexos.

Hélio Gomes, por motivos didáticos, distingue

"...os pseudo-hermafroditas em femininos (mulheres com aspecto de masculino); pseudo-hermafroditas masculinos (homem com aspecto feminino); pseudo-hermafroditas verdadeiros (a dubiedade do sexo dura sempre)".[20]

E mais adiante sobre a questão do hermafroditismo verdadeiro diz que

"...o certo é que se conhecem casos nos quais se tem comprovado histologicamente o hermafroditismo anatômico, glandular, isto é, a presença de tecido ovário e tecido testicular em uma única e mesma glândula. Tais são as observações de 'ovário-testis', nome com que são conhecidos em ciência."[21]

Na verdade, pode-se afirmar que, no caso de pseudo hermafrodita verdadeiro, trata-se de um sexo sui generis. Homens não possuem vaginas, e, como os pseudo hermafroditas verdadeiros possuem vaginas não podem ser considerados como pertencentes ao sexo masculino. Da mesma forma, usando-se o mesmo raciocínio, mulheres não possuem pênis, logo, como os pseudo hermafroditas verdadeiros possuem pênis, não podem ser considerados como pertencentes ao sexo feminino. Portanto, conclui-se que, não sendo do sexo masculino, nem do sexo feminino, os pseudo hermafroditas verdadeiros devem constituir um terceiro sexo sui generis.

Deve-se esclarecer que, o hermafrodita assim é, por força da natureza, ou seja, devido a algum problema, provavelmente gestacional, ele nasce com "defeitos físicos", constituindo, assim, uma espécie de deficiente físico, o que o torna um hermafrodita. Não existe possibilidades de um indivíduo após o nascimento venha a se tornar hermafrodita. Pode acontecer, de o indivíduo nascer hermafrodita sem que a família ou o médico saiba, e só muito tempo depois ficar este fato comprovado através de exames. Mas é certo que hermafroditismo não se adquire.

2.8 - Do Intersexual

Odon Maranhão, segundo Luiz Alberto David Araújo, define o intersexualismo como sendo

"...quadros clínicos que apresentam problemas (diagnóstico, terapêutico e jurídico) quanto ao verdadeiro sexo da pessoa considerada. Isto ocorre face a anomalias genitais (principalmente) e extragenitais."[22]

Para Delton Croce,

"...Ocorre o intersexualismo sempre que houver discordância ou conflito de um ou mais dos caracteres orgânicos mas não psíquicos do sexo (sexo genético, fenotípico, gonadal, hormonal, cromatício etc.)".

Mais adiante diz ainda que os indivíduos intersexuais

"...não são necessariamente homossexuais. Alguns são homossexuais latentes" e ainda, "Outros são bissexuais, ora ativos, ora passivos. Há os que são homossexuais assumidos, com perturbações emocionais e perturbações do caráter, configurando psicopatia. Há casos de intersexualismo em que a anomalia sexual pode ser corrigida por cirurgia plástica reparadora."[23]

O intersexual, a exemplo do pseudo-hermafrodita-verdadeiro, é um caso de "deficiência física", ou seja, o indivíduo nasce intersexual, ou por motivos de ordem biológica, vem a se tornar intersexual na época da adolescência, quando deveria estar desenvolvendo os caracteres sexuais secundários, quer sejam masculinos, quer sejam femininos. Porém, enquanto os pseudo-hermafroditas-verdadeiros são de ambos os sexos, os intersexuais, ao contrário, não pertencem nem á este, nem áquele sexo, são indivíduos que não desenvolvem qualquer dos sexos, muito embora, na maioria das vezes, apresentem preponderância em relação a um dos sexos.

2.9 - Do Travesti

O travestismo, é normalmente confundido com o homossexualismo pelos leigos, pois os travestis se vestem de modo semelhante ao sexo oposto, assim como alguns homossexuais, mas na verdade são dois conceitos bem distintos.

Chamado pela CID-10 de travestismo de duplo papel, e classificado sob o item (F64.1), caracteriza-se pelo:

"uso de roupas do sexo oposto durante parte da existência para desfrutar a experiência de ser membro do sexo oposto, mas sem qualquer desejo de mudança de ou de redesignação sexual cirúrgica associada. Nenhuma excitação sexual acompanha a troca de roupas, o que distingue o transtorno do travestismo fetichista (F65.1)."

Citado por Luiz Alberto David Araújo, Hélio Gomes define travestismo como sendo "...um desvio do sexo no qual o indivíduo se sente atraído pelas vestes do sexo oposto", mas como nota-se pela clara definição da CID-10, este é o caso do travestismo fetichista (F65.1).

Para Delton Croce, "o travestismo ou eonismo ... foi considerado uma forma de homossexualismo profundamente exibicionista" continua dizendo que o travestismo não deve ser confundido com o homossexualismo

"pois os travestis parecem sentir-se atraídos pelo sexo oposto e não pelo mesmo, sem excluir, evidentemente, os casos de homossexualismo que apresentam o problema do travestismo. Assim, são, em sua maioria, heterossexuais cuja gratificação lasciva exterioriza-se pelo uso de vestes e pelos ademanes e atitudes inerentes ao sexo oposto."[24]

3.0 - O que foi dito antes

Nos países "de primeiro mundo", sobre tudo da Europa Ocidental, a homossexualidade já é encarada como preferência pessoal de cada indivíduo, sendo, inclusive em alguns países, permitida, reconhecida e até mesmo protegida a união entre pessoas do mesmo sexo.

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil, por sua vez, no seu artigo 226, § 3º afirma que  "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar..."

Os intérpretes costumam entender que através de tal dispositivo constitucional, a lei protege apenas "a união estável entre o homem e a mulher", não protegendo outras espécies de união (homem com homem e/ou mulher com mulher).

Porém, tais intérpretes seguem o que os lógicos denominam de argumento á contrário, o que do ponto de vista lógico é inconcebível; pois, se digo que amo minha esposa, não significa, necessariamente, que não amo meus filhos, posso, ou não amá-los (no meu caso, é claro que também os amo).

Se a lei, não exclui, expressamente, a proteção das uniões homoafetivas, então caímos no que Bobbio chamou de Norma Geral Exclusiva, que é uma das premissas básicas do pensamento Kelseniano, que afirma que "tudo o que não está explicitamente proibido, está, implicitamente, permitido", idéia protegida pela Constituição Federal que afirma que "ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" (artigo 5º, inciso II).

A respeito de tal posicionamento, Fábio Ulhoa Coelho afirma que

"...como todas as normas são reduzidas á estrutura de um imperativo sancionador (dado certo comportamento, deve ser uma sanção), para o pensamento kelseniano, aquele juiz que enxerga lacuna no direito está, na verdade, pretendendo aplicar sanção a uma conduta não-sancionada ou deixar de aplicar sanção a conduta sancionada. Ou seja, ele pretende inverter o sentido da norma [...] em Kelsen, o julgador só considera que há lacunas no ordenamento quando não o satisfaz a solução oferecida..."

Apesar disso, os que acreditam haver lacuna no direito brasileiro, devem, uma vez que pelo princípio da indeclinabilidade, consagrado no artigo 126 do Código de Processo Civil, o juiz não pode deixar de solucionar o caso concreto alegando lacuna na lei, recorrer ao artigo 4º da Lei nº 4.657/42 (Lei de Introdução ao Código Civil) que ordena: "quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito", completando em seu artigo 5º que "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e ás exigências do bem comum".

3.1 - Da analogia

Analogia, segundo Ferrara, apud R. Limongi França,

"...é a aplicação de um princípio jurídico que a lei estabelece, para um certo fato, a um outro fato não regulado, mas juridicamente semelhante ao primeiro."

Pela analogia, conclui-se pela admissão de tais uniões através do seguinte raciocínio que possui duas premissas básicas:

1ª) todo ser humano possui o sagrado direito de constituir uma família (direito este garantido pelo artigo XVI da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, de 1948);

2ª) todo deficiente físico, se desejar, pode recorrer a uma cirurgia plástica reparadora para minimizar seus déficits físicos.

A partir de tais premissas, chega-se a outras duas:

a) todo deficiente físico (que é membro da espécie humana) pode constituir uma família;

b) todo hermafrodita, por ser uma espécie de deficiente físico, pode, se assim desejar, recorrer a uma cirurgia plástica para definição de seu sexo (fenotípico), sendo imperiosa, neste caso, a permissão para retificação de seu registro de nascimento;

Estas duas últimas premissas levam á conclusão de que todo hermafrodita, por ser uma espécie de deficiente físico, pode constituir uma família, independente de cirurgia plástica reparadora, com um homem ou uma mulher, sob pena de criar-se uma restrição de direitos ao hermafrodita que é contrária ao ordenamento jurídico nacional;

Assim, abrindo-se uma exceção á regra constitucional do § 3º do artigo 226 da Constituição Federal para aceitar-se a união que possua um, ou porque não dois hermafroditas, deve-se concluir que é igualmente possível, e imperioso, aceitar-se a união que possua um transexual, pois este, assim como os hermafroditas, possui o direito de recorrer á cirurgia plástica de redesignação de sexo, com posterior possibilidade de retificação do seu registro de nascimento (como inclusive já é aceito pela jurisprudência nacional), uma vez que segundo Pontes de Miranda, apud Maria Berenice Dias, "...a conformação viciosa ou a mutilação dos órgãos sexuais não torna impossível a existência do casamento..."

Cumprindo ressaltar, porém, que a união do transexual, não deveria ser aceita apenas no caso de cirurgia, uma vez que este não poderia ser compelido a se submeter a uma operação plástica para que possuísse o direito de se unir com aquele que ama;

Logo, do mesmo modo, o homossexual deveria ser livre para unir-se com a pessoa amada, independente do sexo (genético), sob pena de se autorizar-lhe a união com um indivíduo do mesmo sexo (genético) que o seu, se este submeter-se a uma cirurgia de redesignação de sexo, o que seria anti-jurídico.

3.2 - Dos costumes

Caso não seja compreendida a analogia proposta, pela observância dos costumes, torna-se-ia imperiosa a admissão das uniões homossexuais, uma vez que é bastante comum a união fática de dois homossexuais, sendo inclusive de aceitação popular, uma vez que no dia 10 de agosto de 2000, no programa de televisão Você Decide, o público, de todo o país, votou a favor e um "casal" de mulheres que desejavam dar á luz a uma criança, para constituírem uma família (o placar foi 63.649 votos contra, e 100.547 - 61,2% - a favor), sendo, ainda que, no dia 17 de janeiro de 2002, no site do portal Terra, até as 16 horas e 45 minutos, obteve-se uma aprovação de 82,78% (10.376 votos) a favor de que o filho da cantora Cássia Eller permanecesse com a sua ex-companheira, Maria Eugênia. Fatos estes que evidenciam a abertura da sociedade brasileira á união entre homossexuais.

3.3 - Dos princípios gerais de Direito

Caso os costumes também não sejam suficientes para convencer acerca da admissibilidade das uniões homossexuais, chega-se á aplicação dos Princípios Gerais de Direito, que para Bobbio são normas generalíssimas do sistema, ou seja, uma modalidade de normas gerais e não escritas.

Destes princípios gerais de direito, o mais importante é o princípio de liberdade, amplamente recepcionado pela Constituição Federal que além de trazer a liberdade como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, na tentativa de "construir uma sociedade livre" (artigo 3º, inciso I), traz ainda, em vários momentos a idéia de liberdade, como é por exemplo o caso do caput do artigo 5º que apresenta "aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito [...] á liberdade", ou, também é o caso da "livre manifestação do pensamento" (artigo 5º, inciso IV), da "liberdade de consciência e de crença" e do "livre exercício dos cultos religiosos" (artigo 5º, inciso VI), da "livre expressão da atividade intelectual" (artigo 5º, inciso IX), do "livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão" (artigo 5º, inciso XIII), da "livre locomoção no território nacional" (artigo 5º, inciso XV), da "plena liberdade de associação para fins lícitos" (artigo 5º, inciso XVII). Isto apenas para apresentar-se alguns exemplos, ficando, apenas, com alguns direitos do artigo 5º.

Outro princípio geral é o da inviolabilidade do direito á intimidade e á vida privada, que, segundo José Adércio Leite Sampaio poderia ser apresentado como uma "regra e princípio", que poderia ser expressada da seguinte maneira:

"estão proibidas as intervenções do estado na esfera da intimidade e da vida privada das pessoas, se não forem previstas em lei ou se não forem necessárias ao cumprimento dos princípios opostos que, devido ás circunstâncias do caso, tenham precedência frente ao princípio da inviolabilidade da intimidade e vida privada."

3.4 - Da eqüidade

Celso Ribeiro Bastos afirma que:

"não sendo possível suprir a lacuna mediante a utilização dos instrumentos acima citados, deverá lançar mão a autoridade competente da eqüidade, que é uma apreciação subjetiva, cujo critério reside no senso de justiça. O Código de Processo Civil de 1939, no seu art. 114, conceituava a eqüidade nos seguintes termos: "Quando autorizado a decidir por eqüidade, o juiz aplicará a norma que estabeleceria se fosse legislador"."

Caso seja necessária a aplicação da eqüidade, cumpre ressaltar que, atualmente, apesar de uma nova onda de contaminação pelo vírus da AIDS, sobre tudo nos Estados Unidos da América (Conforme noticiado pela revista Veja de 14 de fevereiro de 2001), mais precisamente na cidade de São Francisco, "capital mundial dos homossexuais", a AIDS não está relacionada com a opção sexual, e sim com a vida sexual, com a promiscuidade, de maneira que não se pode afirmar que o homossexual está mais, ou menos, propenso á ser infectado pelo HIV. O que está acontecendo, nestes casos, é que, atualmente, a AIDS não é mais vista como uma sentença de morte. O preconceito aos aidéticos está diminuindo. Os médicos estão conseguindo, graças aos recentes avanços da medicina, prolongar e, principalmente, melhorar a qualidade de vida dos infectados, o que causa uma diminuição do "medo" que cada indivíduo tem de ser infectado, fazendo com que este indivíduo venha a diminuir a prevenção, causando desta forma a contaminação pelo não uso de preservativos.

A verdade é que, aquele que mantém uma vida sexual ativa com vários parceiros, quer seja ele homossexual ou heterossexual, está dentro do chamado "grupo de risco", denominação esta que hoje já é combatida por muitos especialistas que dizem não mais existir este "grupo de risco", e que todos são passíveis de contaminação. Tanto é verdade esta afirmação que, no dia 6 de setembro de 2000, a revista Istoé trouxe uma reportagem a respeito do crescente número de casos de donas de casa infectadas pelo HIV, e que foram contaminadas pelos próprios maridos, sendo que estes casos representavam cerca de 57% dos casos registrados entre dezembro de 1999 e junho de 2000.

Cumpre ressaltar ainda, que Antônio Joaquim Werneck de Castro, Secretário de Assistência e Saúde do Governo Federal, conforme ofício dirigido ao Presidente da Câmara dos deputados, é a favor da união homoafetiva como medida eficaz na luta contra a AIDS.

No site www.aids.gov.br, encontramos uma tabela referente aos números oficiais do contágio pelo vírus da AIDS no Brasil, nos últimos anos, segundo a referida tabela, em 1984, o número de homossexuais contaminados representava 54,2% do total de casos registrados, enquanto que o número de heterossexuais era de apenas 2,5% Em 1999, o número relativo aos homossexuais caiu para 19,3%, enquanto que o número de heterossexuais subiu para 29,7%, de forma que a contaminação pelo vírus da AIDS não pode ser motivo para se proibir a união entre homossexuais.

O argumento de que se o Congresso Constituinte quisesse autorizar tais uniões teria feito expressamente também não convence, uma vez que no final de 1985 travou-se um grande debate em torno da escolha entre as duas espécies de Assembléia Constituinte, a Assembléia Constituinte autônoma, e a Assembléia Congressual Constituinte, aquela sendo eleita única e exclusivamente para elaborar a nova Constituição, e esta sendo formada pelos integrantes do Congresso Nacional, que deveriam votar a Constituição, além de cumprir seu mandato normal.

Segundo João Baptista Herkenhoff,

"A principal vantagem de uma Assembléia Constituinte exclusiva seria a de possibilitar uma eleição fundada apenas na discussão de teses, princípios e compromissos ligados ao debate constituinte [...] Na fórmula da Constituinte congressual (ou Congresso constituinte), os candidatos poderiam prometer estradas, empregos, benefícios pessoais, pois a eleição deixa de ser de constituintes exclusivos para ser de deputados e senadores"

Concluindo mais adiante que tal esquema

"...facilitaria a eleição dos velhos políticos, ligados ás máquinas eleitorais, e desencorajaria a participação de elementos descompromissados com esquemas..."

Mas, segundo o mesmo autor,

"O aspecto mais chocante da decisão governamental, que optou pela Constituinte congressual e, ao mesmo tempo, uma das razões mais fortes para que o Governo tomasse essa decisão, constitui no fato de que a Constituinte congressual teria a participação, como constituintes, dos senadores eleitos em 1982. Esses senadores, de direito, não poderiam ser membros natos da Constituinte, pois ninguém pode ser constituinte sem mandato específico"

Diante desse quadro histórico, é fácil notar que a Assembléia Nacional Constituinte de 1988 não possuía a liberdade necessária para aprovar a Constituição conforme deveria, sendo influenciada pelo regime militar que na época dava seus "últimos suspiros", o que explica por que não existe em toda a constituição vigente qualquer norma explícita que aprove e proteja a união homoafetiva.

Para reforçar tal argumento, cumpre trazer o texto que fora aprovado pela subcomissão dos Negros, Populações Indígenas e Pessoas Portadoras de Deficiência do Congresso Constituinte para o que seria o artigo 2º da Constituição Federal, que, ao final fora substituído sob o argumento de "enxugar" o texto da Constituição. O texto era o seguinte:

"Art. 2º - Todos, homens e mulheres, são iguais perante a lei, que punirá como crime inafiançável qualquer discriminação atentatória aos direitos humanos e aos aqui estabelecidos. Parágrafo 1º - Ninguém será prejudicado ou privilegiado em razão de nascimento, etnia, raça, cor, sexo, trabalho, religião, orientação sexual, convicções políticas ou filosóficas, ser portador de deficiência de qualquer ordem e qualquer particularidade ou condição social..."[25]

Aliás, tais argumentos valem também para o Novo Código Civil que entrou em vigor em 2003, uma vez que seu projeto vem de 1975, ou seja, desde a época da Ditadura Militar, não tendo sofrido grandes alterações de lá para cá.

Também não convence o argumento de que tais uniões não devem ser liberadas por serem um mal exemplo para a juventude, posto que os exemplos de heterossexuais são em número muito maior, seria mais fácil para o jovem que ele seguisse o exemplo da maioria, ademais, todo mal exemplo caí frente a uma boa educação.

Também não pode ser aceito o argumento de que tais uniões não são capazes de gerar filhos, uma vez que, atualmente, já é possível que duas mulheres que vivem juntas dar á luz um filho inseminado artificialmente. Além de que, frente as mais recentes descobertas acerca da existência, embora raríssimas, de crianças geradas fora do útero materno (chamada de gravidez ectópica), é possível ter-se uma visão futurística fantástica segundo a qual seria possível, ao menos em tese, de que um homem possa dar á luz um filho fertilizado in vitro e inserido, posteriormente, em seu abdômen, semelhante ao que já se pode ocorrer com as mulheres (lembre-se de que Júlio Verne foi chamado de louco quando escreveu histórias sobre viagens á lua, assim como Eistein também foi chamado de louco quando disse que o tempo é relativo, assim como alguns achavam que Jesus Cristo era louco por dizer que era filho de Deus e rei dos Homens).

Deve-se lembrar ainda que, a respeito do Contrato Social de Rousseau, Beccaria afirma que

"...somente a necessidade obriga os homens a ceder parcela de sua liberdade; disso advém que cada qual apenas concorda em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, quer dizer, exatamente o que era necessário para empenhar os outros em mantê-lo na posse do restante."

Darcy Azambuja concorda com Beccaria quando afirma que

"...se a vontade geral, criada pelo contrato, fosse ilimitada, seria criar o despotismo do Estado, ou melhor, das maiorias, cuja opinião e decisão poderia arbitrariamente violentar os indivíduos..."

O próprio Rousseau alerta que

"...o maior bem de todos, que tal deve ser o fim de todo o sistema de legislação, achá-lo-eis resumido nestes dois objetos principais, a liberdade e a igualdade..."

Segundo Darcy Azambuja:

"...toda a intervenção do estado é nociva ao bem comum; ele apenas deve dar segurança aos indivíduos e não intervir na vida social senão para manter a ordem. Liberdade de profissão, liberdade de trabalho, liberdade de comércio, toda a atividade livre: o estado não deve pretender conhecer melhor do que eles próprios os direitos dos indivíduos..."

3.5 - Da homossexualidade e o Código Penal Brasileiro

O Código Penal Brasileiro reservou um Título para o que chamou de Crimes Contra os Costumes, onde penaliza as condutas anormais com relação á prática sexual, sem, em momento algum, falar a respeito de práticas homossexuais.

 Sobre este Título, Damásio E. de Jesus assim se pronunciou:

"...Evidentemente, o intérprete e o aplicador da lei devem valer-se, mais do que nunca, da observação dos costumes vigentes na sociedade onde vivem. Com a crescente liberdade sexual hoje predominante as relações entre homem e mulher perderam a conotação de pecado e segredo [...] devemos levar em consideração que se trata de crimes contra os costumes. Estes, refletindo práticas constantes em determinada sociedade, em épocas certas, são variáveis e influenciam na própria caracterização dos delitos em estudo. Como se verificará a seguir, o homossexualismo, a prostituição e a bestialidade (coito com animais) não são puníveis por si mesmos. Apenas na hipótese de tais condutas subsumirem-se em alguma norma incriminadora serão elas consideradas crimes, o mesmo se diga do tribadismo (amor lésbico entre mulheres)."[26]

Mais especificamente, sobre os Crimes Contra a Liberdade Sexual, Damásio E. de Jesus afirma que

"A lei penal protege a faculdade de livre escolha ou livre consentimento nas relações sexuais. é o direito de dispor do próprio corpo, de selecionar os parceiros e de praticar livremente os atos do sexo [...] Para a caracterização dos delitos é indispensável a violência ou a fraude, sem o que o fato será penalmente indiferente ou não se constituirá em crime contra os costumes. O bem jurídico tutelado, em regra, é disponível."[27]

Existem ainda, os Crimes de Ultraje Público ao Pudor.

"...Dois são os crimes capitulados neste Título: 1) ato obsceno (art. 233); e 2) escrito ou objeto obsceno (art. 234). Visa o legislador a proteger o sentimento de moralidade sexual vigente numa sociedade em determinado momento. A moralidade sexual, ou pudor-público, possui conceito variável no tempo e no espaço [...] O pudor público é, assim, conceito variável, dependendo dos costumes do grupo social. Para se averiguar, portanto, se o objeto jurídico tomado pelo legislador ao definir os crimes capitulados sob o título 'Do Ultraje Público ao Pudor' foi violado, é necessário proceder-se a uma pesquisa no grupo social dentro do qual o fato foi perpetrado. Somente após se aferir qual o sentimento de moralidade sexual vigente em determinada sociedade, em determinado período de sua história, é que se poderá verificar se o pudor público foi ou não lesado."[28]

Pode-se notar, desta forma, que, o Código Penal Brasileiro, somente irá punir condutas homossexuais que venham a desrespeitar o pudor público, ou seja, atos que não deveriam ser praticados em público. Mas, neste caso, não se estaria punindo a homossexualidade, mas sim a falta de pudor público, de forma que, se o mesmo ato fosse praticado por heterossexuais, estes também deveriam ser, igualmente, punidos.

A razão do código não ter, se quer, mencionado o termo homossexual, é trazida, implicitamente, na Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal, quando o legislador lembra da lição de Zanardelli, que assim fixava

"a lei deve deixar que cada um proteja aos próprios interesses pelo modo que melhor lhe pareça, e não pode intervir senão quando a livre ação de uns seja lesiva do direito de outros..."[29]

Conclui-se portanto, que o Código Penal Brasileiro, não pune, como já dito, as condutas homossexuais por si mesmas. O que o Código condena são os atos que sejam contrários aos costumes, e como já demonstrado mais acima, a sociedade, cada vez mais, aprende a conviver abertamente com os homossexuais, de forma que, não constitui mais afronta ao pudor público o fato de indivíduos homossexuais andarem, em público, de mãos dadas, ou até mesmo, se beijarem, desde que de maneira não acintosa ou escandalosa, o que torna tal atitude impunível, mesmo frente ao atentado violento ao pudor, definido no artigo 61 do Decreto-Lei nº 3.688/41 - "Lei das Contravenções Penais", que, segundo definição legal consiste no ato de "importunar alguém, em lugar público, ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor".

3.6 - Dos DireitosHumanos

3.6.1 - Origem

Os autores, de um modo geral, concordam em traçar um paralelo entre o surgimento do constitucionalismo e o surgimento dos Direitos Humanos, uma vez que o objetivo de toda Constituição é, além de "dar forma" ao Estado, criando os órgãos estatais e descrevendo sua forma de atuação; limitar o Poder estatal, garantindo uma parcela "intocável" de direitos individuais e/ou sociais, a qual não poderia ser, arbitrariamente, suprimida pelos agentes estatais.

Esta parcela de direitos, a priori insuprimíveis é, justamente, o conteúdo do que hoje é conhecido por Direitos Humanos, assim como afirma Hewerstton Humenhuk: "é notório que os direitos fundamentais constituem a base e a essencialidade para qualquer noção de Constituição"[30]

João Baptista Herkenhoff defende a idéia de que o processo de "criação" dos Direitos Humanos seria fruto da História da Humanidade, iniciando-se nos tempos mais remotos, e ainda hoje em permanente evolução (Conforme defende nos livros "Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia" e "Direitos Humanos: uma idéia muitas vozes"), afirmando em determinado momento que

"o que hoje se entende por Direitos Humanos não foi obra exclusiva de um grupo restrito de povos e culturas, especialmente, como se propala com vigor, fruto do pensamento norte-americano e europeu. A maioria dos artigos da declaração Universal dos Direitos Humanos foi verdadeira construção da Humanidade, de uma imensa multiplicidade de culturas, inclusive aquelas que não integram o bloco hegemônico do mundo."[31]

3.6.2 - Conceito

A maioria dos autores[32] concordam em dizer que a idéia de Direitos Humanos está intimamente ligada á idéia de dignidade da pessoa humana.

Para João Baptista Herkenhoff:

"por direitos humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. Este conceito não é absolutamente unânime nas diversas culturas. Contudo, no seu núcleo central, a idéia alcança uma real universalidade no mundo contemporâneo..."[33]

Cumpre assinalar que Fábio Konder Comparato lembra que, segundo doutrina Alemã, os Direitos Fundamentais seriam uma espécie do gênero Direitos Humanos, que consistiriam nos Direitos Humanos positivamente reconhecidos.

Assim, apesar de que grande parte da doutrina considerar como sendo sinônimos os termos "Direitos Humanos" e "Direitos Fundamentais", chegando uns[34] a considerar adequada a terminologia de "Direitos Humanos Fundamentais", estes termos não são, nos moldes apresentados, termos equivalentes. Concorda com esta idéia, Hewerstton Humenhuk.

3.6.3 - Valores da Declaração Universal dos Direitos Humanos

A Declaração de Direitos Humanos da ONU abriga e apresenta certos "valores", os quais deveriam ser buscados e respeitados por todos os povos.

Segundo concepção de João Baptista Herkenhoff, estes valores seriam em número de oito[35] e permeariam toda Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.

Um destes valores é o valor "igualdade e fraternidade" que estaria presente nos dois primeiros artigos da Declaração.

Sobre o valor "igualdade" escreveu o ilustre jurista:

"o valor "igualdade" constituiu-se através da História por meio de dois movimentos interdependentes: a) o da afirmação da igualdade intrínseca de todos os seres humanos; b) o da rejeição de desigualdades específicas, particulares."[36]

Nesse sentido, o autor lembra, mais adiante, que

"Jefferson, nos Estados Unidos, afirmou, como democrático, que a vontade da maioria fosse a base do poder. Mas completou que essa vontade da maioria, para ser legítima, deveria ser razoável. A minoria possui direitos iguais, também protegidos pela lei, sentenciou Jefferson. Violar esses direitos é agir como opressor."[37]

Outro o valor seria o da "liberdade" seria o suporte dos artigos III, IV, XIII, XVIII, XIX e XX, onde o autor afirma que

"...a liberdade deve conduzir á solidariedade entre os seres humanos. Não deve conduzir ao isolamento, á solidão, á competição, ao esmagamento do fraco pelo forte, ao homem-lobo-do-homem, á ruptura dos elos. Essa ruptura leva tanto á esquisofrenia individual quanto á esquisofrenia social. Garantir a liberdade dentro de uma sociedade solidária é o desafio que se coloca. Liberdade para todos e não apenas para alguns. Liberdade que sirva aos anseios mais profundos da pessoa humana. De modo algum a liberdade que seja instrumento para qualquer espécie de opressão."[38]

Um terceiro valor a ser apontado seria o valor "dignidade da pessoa humana" - que segundo nossa visão implica na concretização de todos os outros valores - seria a chama que alimenta os artigos III, V, VI, XIV, XV, XVI, XVII, XXII, XXVI e XXVII;

Assim seriam estes, e os outros cinco (os outros valores seriam: "paz e solidariedade universal", "proteção legal dos direitos", "Justiça", "Democracia" e "dignificação do trabalho") valores, os grandes objetivos a serem alcançados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, em seus trinta artigos.

3.6.4 - Características dos Direitos Humanos

Na visão de Alexandre de Morais[39], os Direitos Humanos seriam: imprescritíveis, inalienáveis, irrenunciáveis, invioláveis, universais, interdependentes, complementares e que buscam uma efetividade máxima dentro do ordenamento jurídico.

3.6.5 - A não-estabilização dos Direitos Humanos pela Carta da ONU

João Baptista Herkenhoff, no seu livro Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia, demonstra de forma irrefutável a noção de que o processo de reconhecimento e declaração dos Direitos Humanos não se estabilizou após a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Muito pelo contrário, a noção de Direitos Humanos continua se desenvolvendo, apresentando-se, na prática, a necessidade de declaração de mais direitos como sendo inerentes aos seres humanos.

Assim, ele apresenta vários documentos jurídicos que foram assinados após a promulgação da referida Declaração da ONU, e que trazem, em relação a esta mesma Declaração, uma ou outra ampliação da noção de Direitos Humanos. Seriam os principais documentos: A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, A Declaração Islâmica Universal dos Direitos do Homem, a Declaração Universal dos Direitos dos Povos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, e a Declaração Solene dos Povos Indígenas do Mundo.

Assim, este autor afirma que

"a idéia de "Direitos Humanos" não se estabilizou no texto aprovado em 1948. Esta estabilização contraria o sentido dialético da História."[40]

Uma vez que "a História não caminha dentro de parâmetros fixos..."[41].

A noção de "gerações" ou "dimensões" de Direitos Humanos comprova o alegado: em um primeiro momento, cuidou-se dos direitos civis e políticos, depois vieram os direitos sociais, para depois chegar a vez dos direitos supra-individuais, tais como os relativos ao meio-ambiente, á saúde, á paz, etc...

Concorda com esta tese o jurista Paulo Gustavo Gonet Branco, que, em determinado momento, chega a afirmar que:

"De fato, o catálogo dos direitos fundamentais vem-se avolumando, conforme as exigências específicas de cada momento histórico..."[42]

Apenas com o intuito de clarear esta idéia de não-estabilização dos Direitos Humanos, cumpre assinalar que Manoel Gonçalves Ferreira Filho afirma que

"O reconhecimento dos direitos sociais não pôs termo á ampliação do campo dos direitos fundamentais. Na verdade, a consciência de novos desafios, não mais á vida e á liberdade, mas especialmente á qualidade de vida e á solidariedade entre os seres humanos de todas as raças ou nações redundou no surgimento de uma nova geração - a terceira -, a dos direitos fundamentais. [...] Na verdade, não se cristalizou ainda a doutrina a seu respeito. Muita controvérsia existe quanto a sua natureza e a seu rol. Há mesmo quem os conteste como falsos direitos do Homem. Tal hesitação é natural, pois foi somente a partir de 1979 que se passou a falar desses novos direitos cabendo a primazia a Karel Vasak."[43]

Ora, se os direitos de terceira geração somente foram assimilados pela consciência dos juristas mundiais a partir de 1979, é sinal que a tese apresentada por João Baptista Herkenhoff da não-estabilização dos Direitos Humanos com a simples Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU é correta, pois esta foi promulgada trinta e um anos antes, em 1948.

Existe quem defenda até mesmo uma quarta geração de direitos, a qual estaria apenas em estágio embrionário.

A não-estabilização dos Direitos Humanos é tão nítida que, Manuel Gonçalves Ferreira Filho aponta para a necessidade de não-vulgarização dos Direitos Fundamentais que surgiria da multiplicação destes direitos[44].

3.6.6 - As "gerações" ou "dimensões" dos Direitos Humanos

Deve-se ter em mente que com a idéia de "gerações" de Direitos Humanos, uma nova "geração" não exclui a anterior, muito pelo contrário, esta nova "geração" - por força da interdependência que existe entre os Direitos Humanos - vem reforçar a anterior.

O que acontece é que, em momentos históricos distintos, o povo percebe que o atual estágio de Direitos Humanos é insuficiente para garantir-lhes a dignidade condizente com sua condição de pessoa humana.

Assim, muda-se o enfoque da busca de Direitos, saindo-se da primeira para a segunda geração, e desta para a terceira, ou, em termos históricos: na época das Revoluções Francesa e de Independência das Treze Colônias, o que se buscou foi a garantia dos Direitos Civis e Políticos; depois, á época da Revolução Russa e pós-Primeira Guerra Mundial, buscou-se a garantia dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais; e, presentemente, busca-se a consagração dos Direitos de Fraternidade - o que, como dito anteriormente, reforça a idéia de não-estabilização dos Direitos Humanos pela simples Declaração da ONU em 1948.

Os Direitos de primeira geração seriam as liberdades públicas; os de segunda geração, seriam os direitos econômicos e sociais, enquanto que os de terceira geração seriam os ligados á solidariedade entre os seres humanos: direito á paz, ao meio ambiente, á propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade...

Há, ainda, quem pregue o surgimento de uma quarta geração de Direitos Humanos que, conforme Paulo Bonavides apud Hewerstton Humenhuk, seriam "o direito á democracia, o direito á informação, e o direito ao pluralismo"

3.6.7 - Novos e velhos direitos

Ao contrário do que pode parecer, não existe qualquer contradição entre a luta por novos direitos e a luta pela efetivação dos direitos já proclamados. é o que se verifica com a teoria das gerações dos Direitos Humanos: uma nova geração não substitui, nem exclui a anterior, pelo contrário, soma-se a ela.

Segundo, novamente o grande jurista João Baptista Herkenhoff, (Direitos Humanos: a construção universal de uma utopia, págs. 15 a 18) não existe contradição entre a luta pelos direitos já consagrados, mas ainda não efetivados, e a luta por novos direitos, pois todas estas lutas seriam lutas pela dignidade da pessoa humana.

é justamente a tese da não-estabilização dos Direitos Humanos com a Declaração da ONU de que tratamos acima, e sobre a qual o referido autor comprovou a veracidade, onde se pode comprovar que os Direitos Humanos ainda estão em fase de expansão, existindo quem propugne por uma quarta gestação de direitos.

Idéias estas que se somam no sentido de comprovar a tese de que ainda existem Direitos Humanos a serem universalmente proclamados, e dos quais um deles seria, justamente, o reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas.

3.7 - A ligação entre homossexualidadee Direitos Humanos

Um dos Direitos Humanos de primeira geração, o qual já era posto a salvo das intromissões estatais desde a Magna Charta Libertatum de João Sem Terra em 1218 é o Direito á Liberdade.

é possível perceber os traços básicos do moderno direito de liberdade analisando-se a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de agosto de 1789, onde no artigo 4º, declara-se que qualquer indivíduo pode fazer tudo o que não afete a liberdade dos demais.

Quanto ao direito á liberdade, escreveu João Baptista Herkenhoff:

"O direito á liberdade é complementar do direito á vida. Significa a supressão de todas as servidões e opressões. A liberdade é a faculdade de escolher o próprio caminho, de tomar as próprias decisões, de ser de um jeito ou de outro, de optar por valores e idéias, de afirmar a individualidade, a personalidade. A liberdade é um valor inerente á dignidade do ser, uma vez que decorre da inteligência e da volição, duas características da pessoa humana. Para que a liberdade seja efetiva, não basta um hipotético direito de escolha. é preciso que haja a possibilidade concreta de realização das escolhas."[45]

O direito á liberdade, que no ordenamento jurídico brasileiro está presente na Constituição Federal desde o seu preâmbulo, constituindo-se um dos objetivos da República Federativa do Brasil (art. 3º, I da CF/88), e garantido a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país, através do caput do artigo 5º da Carta brasileira, está, também, intimamente ligado ao princípio da legalidade, também estabelecido pela atual Constituição Federal, no inciso II do artigo 5º, o qual estabelece que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

Este "princípio" da legalidade é - conforme já dito anteriormente - a consagração jurídica do que Bobbio chamou de "Norma Geral Exclusiva", que é uma das premissas do pensamento kelseniano, segundo a qual "tudo o que não está expressamente proibido, está implicitamente permitido", e que constitui uma maneira "fácil" de se evitar lacunas no ordenamento jurídico.

Uma vez que o legislador é impossibilitado, pela própria natureza intrínseca de ser humano, de prever todas as possibilidades de ações, este mesmo legislador preferiu, implicitamente, reconhecer que tudo o que não for expressamente normatizado através do ordenamento jurídico positivo, enquadra-se na categoria de ações "facultativas", as quais, podem, ou não, ser realizadas, de acordo, única e exclusivamente, com a vontade do indivíduo diretamente interessado, posto que é um princípio intimamente ligado com o da liberdade.

A Constituição Federal, além de trazer - como visto - a liberdade como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, na tentativa de "construir uma sociedade livre" (artigo 3º, inciso I), traz ainda, em vários momentos a idéia de liberdade; como é por exemplo - além do já visto caput do artigo 5º - o caso do artigo 5º que apresenta o direito á "livre manifestação do pensamento" (artigo 5º, inciso IV), da "liberdade de consciência e de crença" e do "livre exercício dos cultos religiosos" (artigo 5º, inciso VI), da "livre expressão da atividade intelectual" (artigo 5º, inciso IX), do "livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão" (artigo 5º, inciso XIII), da "livre locomoção no território nacional" (artigo 5º, inciso XV), da "plena liberdade de associação para fins lícitos" (artigo 5º, inciso XVII). Isto apenas para apresentar-se alguns exemplos, ficando, apenas, com alguns direitos do artigo 5º. Fica claro, desta forma, que a Constituição Federal de 1988, traz expressamente o princípio da liberdade como fazendo parte dos "direitos [...] individuais e coletivos".

Com relação á Declaração Universal dos Direitos Humanos, o direito á liberdade está presente, especialmente, no preâmbulo, nos artigos I a III.

Assim, segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, "todos os homens nascem livres", tendo a "capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidas nesta Declaração", e tendo, ainda, "direito á vida, á liberdade e á segurança pessoal".

Ora, o direito á liberdade afirma que toda pessoa humana pode fazer o que bem lhe aprouver desde que, com suas ações, não prejudique ninguém. Uma vez comprovando-se que a união homoafetiva não prejudica ninguém, tratar-se-ia de parcela, nitidamente, ligada á liberdade pessoal de cada indivíduo.

Assim, a homossexualidade seria, indiscutivelmente, parte do Direito de Liberdade, do qual todos os indivíduos são - por força internacional e constitucional - portadores, não sendo possível que o Estado crie, ou imponha limites a referido direito, exceto em situações extremas, ou de choques com outros direitos fundamentais como se verá logo adiante.

Os direitos á intimidade e á vida privada são meros corolários do direito á liberdade. Não seria possível falar-se em liberdade sem as garantias do direito á intimidade e/ou vida privada.

Na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, estão previstos no artigo XII que estabelece que "ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada [...] Todo homem tem direito á proteção da lei contra tais interferências ou ataques"

Quanto ao conteúdo do direito á vida privada, esclarece José Adércio Leite Sampaio que:

"No centro de toda vida privada se encontra a autodeterminação sexual, vale dizer, a liberdade de cada um viver a sua própria sexualidade, afirmando-a como signo distintivo próprio, a sua identidade sexual, que engloba a temática do homossexualismo, do intersexualismo e do transexualismo, bem assim da livre escolha de seus parceiros e da oportunidade de manter com eles consentidamente, relações sexuais..."[46]

"Integra a liberdade sexual a faculdade de o indivíduo definir a sua orientação sexual, bem assim de externá-la não só de seu comportamento, mas de sua aparência e biotipia. Esse componente da liberdade reforça a proteção de outros bens da personalidade como o direito á identidade, o direito á imagem e, em grande escala, o direito ao corpo. De Cupis define identidade sexual, no desdobramento do direito á identidade pessoal, como o "poder" de aparecer externamente igual a si mesmo em relação á realidade do próprio sexo, masculino ou feminino, vale dizer, o direito ao exato reconhecimento do próprio sexo real, antes de tudo na documentação constante dos registros do estado civil."[47].

Nota-se que o direito á vida privada, e á intimidade, são, há muito tempo, considerados como direitos fundamentais do Homem, de maneira que, atualmente é mundialmente reconhecido este direito, inclusive - como já visto - pela Constituição Federal de 1988, além de que:

"A Corte européia de Direitos do Homem reconheceu como atentatória ao direito ao respeito da vida privada a incriminação pela legislação da Irlanda do Norte das relações entre homens maiores de 21 anos de idade, pois feria "uma manifestação essencialmente privada da personalidade humana", não sendo a proteção da moral motivo suficiente para sustentar a existência de uma tal lei. Não há como negar que a chamada preferência sexual ou, na dicção estadunidense, a sexual orientation também se instale no âmbito das decisões de foro íntimo, embora haja certa vacilação jurisprudencial não só nos Estados Unidos como em outros países nesse sentido..."[48]

Frente ao que foi exposto sobre intimidade e vida privada está claro que o indivíduo tem o direito de ser homossexual, pois esta é uma escolha que apenas a ele diz respeito, faz parte de sua vida mais íntima, e ninguém tem o direito de dizer como este ou aquele indivíduo deve viver sua privacidade.

Não parece, por outro lado, contraditório o fato de um indivíduo ter direito de ser homossexual e não poder "exercer" esta homossexualidade através de união - juridicamente reconhecida - com outro indivíduo homossexual, contrariando o que afirmou João Baptista Herkenhoff sobre as reais possibilidades de exercício do direito á liberdade?

Por outro lado ainda sobre o direito á liberdade, cumpre lembrar o ensinamento - aparentemente esquecido - da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, que, em seu artigo 5º estabelecia, entre outras coisas, que "a lei não proíbe senão as ações nocivas á sociedade". E, assim sendo, a lei não deveria proibir o reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas.

A igualdade é estabelecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos nos artigos I e II, sendo que, afirma João Baptista Herkenhoff quanto ao artigo II:

"O artigo consagra assim a absoluta igualdade de todos os seres humanos para gozar dos direitos e das liberdades que a Declaração Universal assegura. O artigo II, neste seu primeiro parágrafo, completa o artigo I. [...] A cláusula "sem distinção de qualquer espécie", no início do parágrafo, e a cláusula "ou qualquer outra condição", no final do parágrafo, são cláusulas generalizadoras da maior importância. Essas cláusulas, a meu ver, proíbem todas as discriminações, mesmo aquelas não enunciadas no texto. Assim, atentam contra os Direitos Humanos as discriminações contra o homossexual, contra o aidético, [...] Todas as discriminações, mesmo veladas, que visem a rotular pessoas afrontam os Direitos Humanos. Nenhuma exclusão ou marginalização de seres humanos pode ser tolerada."[49]

Na Constituição Federal, o direito á igualdade é previsto, também, desde o preâmbulo, estando presente, ainda, dentre os objetivos da República Federativa do Brasil - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigo 3º, IV) - além, é claro do caput do artigo 5º que começa estabelecendo que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza".

Assim, a igualdade implica no tratamento igualitário de todos os indivíduos, quer sejam hetero ou homossexuais.

Com este tipo de afirmação - dos que defendem tais uniões - não se pretende dizer-se que hetero e homossexuais são iguais, pois é obvio que não são. O que se pretende afirmar com o princípio de isonomia é que todos os indivíduos, como seres humanos que são, têm o sacro direito de se unir com quem desejar, não importando a sua preferência sexual. Ou, por outras palavras, homossexuais possuiriam o mesmo direito que os heterossexuais de conviver com outro indivíduo, e ter esta união reconhecida e protegida.

Assim, o que pretendem é que ambos tenham o direito de reconhecimento jurídico das uniões estáveis a qual pertençam, uma vez que a razão jurídica do reconhecimento jurídico de uma união estável é, como lembra a Des. Maria Berenice Dias, a afetividade. Aqui está a razão maior para a analogia entre a união estável heterossexual e a união estável homossexual. Se ambos podem cumprir os requisitos para a constituição e reconhecimento de uma união estável - convivência, mutua assistência, notoriedade da relação, relação relativamente duradoura e estável - não há razões jurídicas plausíveis para excluir-se dos homossexuais a possibilidade de reconhecimento de suas uniões, sob pena de quebra do princípio da isonomia através da hipótese de exclusão de benefício incompatível com o princípio da isonomia - que se verá logo a diante.

Pode ser indicado, ainda, como diretamente ligado á homossexualidade o direito ao casamento, garantido pelo artigo XVI da Declaração Universal dos Direitos Humanos nos seguintes termos:

"Os homens e as mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família..."

O grande João Baptista Herkenhoff, sobre o artigo, escreveu:

"O artigo 16 trata do casamento e da família. Este artigo é subdividido em 3 parágrafos: o primeiro trata do direito ao casamento e á fundação da família e da igualdade de direitos de homens e mulheres; [...] A família é depositária da vida, e não só da vida biológica, mas da vida espiritual, afetiva, num plano existencial que suplanta definições limitadas, moralistas e preconceituosas. [...] A família não é somente, nem principalmente uma instituição jurídica. Daí merecer todo respeito a família que se forma sem casamento legal. Também é família, sagradamente respeitável, a da mãe solteira e do filho ou filhos que advenham em tal situação. E mesmo a união homossexual em clima de amor e respeito, tem a nosso ver direito de proteção. Não cabem nesta matéria julgamentos morais exclusivas. Não cabe atirar a primeira pedra, procedimento que Jesus Cristo condenou com tanta veemência. O amor tudo justifica e tudo santifica, como está escrito na célebre epístola de Paulo [...] A primeira afirmação do parágrafo consagra o direito que todas as pessoas têm de se casar e de fundar uma família. Em outras palavras: ninguém pode ser impedido de casar e de fundar uma família, se esse for seu desejo."[50]

Partes: 1, 2, 3, 4, 5, 6


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