Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 


Roteiro didático de elaboração de projetos de pesquisa em Direito (página 2)

Túlio Lima Vianna

Os objetivos: para que pesquisar?

O objetivo geral da pesquisa científica é oferecer uma resposta ao problema que é o núcleo da investigação, testando a veracidade da hipótese de trabalho.

Os objetivos específicos da pesquisa, por outro lado, são as perguntas secundárias que o pesquisador deverá responder, cujas respostas conjuntas levará a consecução do objetivo geral.

Tradicionalmente os objetivos - geral e específicos - vêm expressos através de verbos no infinitivo.

O objetivo geral nada mais é do que o problema redigido sobre a forma de ação: "analisar a viabilidade da descriminalização do uso de maconha no Brasil do século XXI".

Os objetivos específicos são ações a serem realizadas pelo pesquisador que tornarão possível alcançar o objetivo geral: "1) identificar as origens históricas da criminalização da maconha no Brasil; 2) identificar os efeitos da droga no organismo humano; 3) avaliar os aumento dos gastos com a saúde após a descriminalização da droga; 4) avaliar o decréscimo da violência urbana após a descriminalização da droga; etc".

A justificativa: por que pesquisar?

A justificativa é a fase do projeto na qual o pesquisador irá expor quais elementos dentro do binômio interesse/capacidade pessoal e social foram decisivos na eleição do seu tema de estudo.

Evidentemente, o principal elemento a ser explicitado aqui é o interesse social na solução do problema, pois será a partir dele que o orientador, a universidade e as agências de financiamento irão decidir se há ou não interesse institucional em se concretizar o projeto.

O pesquisador, nesta fase, deverá iniciar explicitando o "estado da arte", ou seja, o atual estado das pesquisas científicas sobre o tema. é importante que se faça uma revisão da literatura existente, comentando sucintamente as principais obras que tratam direta ou indiretamente do tema proposto.

Em seguida, necessário se faz demonstrar a relevância social do problema, explicitando-se nesta fase o que já foi comentado anteriormente quanto ao interesse social na resolução do problema.

Em síntese, será nesta fase que o pesquisador irá "vender seu peixe", ou em uma linguagem mais acadêmica, demonstrar ao leitor o real interesse social de seu projeto de pesquisa.

A metodologia: como pesquisar?

Nesta parte do projeto o pesquisador deverá demonstrar como irá testar a veracidade de sua hipótese de trabalho.

Para tanto deverá estabelecer um marco teórico e definir se sua estratégia de pesquisa será dogmática ou empírica.

Marco teórico

Na academia a expressão "marco teórico" é utilizada muita vez para designar o autor cujas idéias mais influenciaram o pesquisador em sua formação. Assim, se diz que "meu marco teórico é Kelsen", "meu marco teórico é Habermas", etc.

Marco teórico, porém, é uma concepção teórica da realidade concebida ou consagrada na obra de determinado pensador.

As pesquisas jurídicas sempre retomam uma série de conceitos que necessitam de um fundamento teórico de apoio: crime, democracia, soberania, cidadania, direito, justiça, etc.

Se cada pesquisador precisasse desenvolver seus próprios conceitos, a pesquisa certamente não evoluiria. Assim, o pesquisador parte do pressuposto de que a concepção teórica de determinado autor sobre aquele conceito é suficientemente adequada.

Ao indagar-se sobre a "viabilidade da descriminalização do uso de maconha no Brasil do início do século XXI", o pesquisador terá como ponto de partida para solucionar o seu problema o conceito de crime que certamente será decisivo no rumo da pesquisa. Se seu marco teórico for juspositivista, sua concepção de crime será diversa da de um jusnaturalista, que também será diferente da de um criminólogo crítico.

Assim, pesquisadores com marcos teóricos diferentes, muita vez, usarão métodos de pesquisa bastante semelhantes, mas chegarão a resultados absolutamente diversos, já que o ponto de partida da análise é distinto.(4)

Definido o marco teórico, deverá o pesquisador optar entre uma pesquisa jurídico-teórica ou um trabalho empírico.

Pesquisa jurídico-teórica

É uma estratégia de pesquisa que tem por objeto a análise da norma jurídica isolada do contexto social em que se manifesta.

Esta concepção baseia-se na análise do dogma jurídico, que é um ponto fundamental apresentado como certo e indiscutível, cuja verdade se espera que as pessoas aceitem sem questionar: a lei, a jurisprudência, os costumes, os princípios gerais do direito, etc.

O Direito deverá ser pesquisado enquanto ciência pura e, portanto, isolado dos elementos sociais que se relacionem com o problema pesquisado.

O único objeto válido para este tipo de pesquisa jurídica é o dogma, daí porque a pesquisa teórica pode muito bem ser denominada de dogmática.

A solução do problema não é buscada no mundo fático, mas é concebida na mente do pesquisador a partir da análise dos dogmas jurídicos no tempo (História do Direito) e no espaço (Direito Comparado).

Trata-se de uma concepção formal do Direito que é entendido como ciência independente das demais ciências sociais e, por conseguinte, dotada de autosuficiência metodológica e técnica.

Vê-se claramente que a pesquisa jurídico teórica é uma pesquisa de gabinete, construída em uma torre de marfim e absolutamente alienada quanto á realidade social, econômica e política da sociedade para a qual o dogma jurídico está sendo construído.

O pesquisador crítico deve, pois, evitar uma análise exclusiva dos dogmas jurídicos, procurando as respostas do seu problema não só na lei, na doutrina ou na jurisprudência, mas principalmente na realidade social onde está inserido seu objeto de estudo.

Pesquisa empírica

É uma estratégia de pesquisa que tem por objeto a análise da norma jurídica no contexto da realidade social em que se manifesta.

Por esta concepção, deverá o pesquisador analisar uma série de fatores econômicos, políticos e sociais e a partir destas constatações empíricas, estabelecer a solução do problema pesquisado.

Parte-se do "ser" para se alcançar o "dever ser"; do "real" para o "ideal"; por isto, é uma concepção realista de pesquisa jurídica.

A observação direta (espontânea ou dirigida), a coleta e análise de documentos, de legislações, jurisprudência, etc, a aplicação de questionários (abertos ou fechados) e as entrevistas (espontâneas ou dirigidas)(5) são alguns dos principais procedimentos da pesquisa jurídica empírica.

Nem sempre, porém, é possível obter os dados de forma direta, através dos procedimentos acima. Assim, na pesquisa empírica, poderá o pesquisador valer-se de dados obtidos indiretamente que podem ser encontrados em livros, em artigos de periódicos e em todo e qualquer material bibliográfico impresso ou informático.

Ainda que o ideal - até por uma questão de confiabilidade dos dados - seja obter os dados diretamente, vale lembrar que o pesquisador empírico não necessita obrigatoriamente de realizar trabalhos de campo, pois muitos dos dados da realidade social, política e econômica de seu problema podem perfeitamente ser encontrados em material bibliográfico das mais diversas fontes.

O que caracteriza a pesquisa empírica não é a coleta dos dados, mas sim a postura do pesquisador em relação ao objeto da pesquisa: enquanto na pesquisa teórica a solução do problema encontra-se no dogma, na pesquisa empírica deverá o pesquisador buscá-la na realidade social.(6)

O cronograma: quando pesquisar?

Como já foi dito anteriormente, nenhuma pesquisa pode prolongar-se indefinidamente no tempo. Assim, necessário é que o pesquisador estabeleça um cronograma no qual especificará quanto tempo levará na realização de cada etapa de sua pesquisa.

Em geral este cronograma é apresentado através de uma tabela na qual as colunas representam os meses em que será realizada a pesquisa e as linhas, as tarefas a serem concluídas.

Dentre outros itens, deverão constar no cronograma: levantamento bibliográfico, observações, entrevistas, transcrição das entrevistas, análise das entrevistas, leitura do material bibliográfico, cruzamento de dados, redação preliminar do texto, discussão do texto preliminar com o orientador, redação final do texto, revisão e edição final.

A bibliografia preliminar: onde pesquisar?

Para encerrar o projeto de pesquisa, o pesquisador deverá listar toda a bibliografia que potencialmente irá utilizar na realização do trabalho.

Evidentemente, na fase do projeto, não há necessidade de o pesquisador ter acesso físico ás obras, muito menos de adquiri-las.

Deverá, no entanto, ter as referências completas das obras que futuramente poderá consultar devidamente formatadas no padrão ABNT.

Atualmente, é indispensável a consulta através da Internet ás bibliotecas das principais Faculdades de Direito do Brasil, bem como á base de dados da Biblioteca do Senado Federal(7) .

Conclusões

Evidentemente, não tivemos a pretensão de nestas breves linhas esgotar o assunto, mas tão-somente de oferecer os primeiros subsídios á elaboração de um projeto de pesquisa original.

Esperamos ter despertado o interesse daqueles que darão os primeiros passos na trabalhosa, mas sempre instigante, pesquisa jurídica.

Notas de rodapé convertidas em notas de fim, e referências

1 Este texto é dedicado aos pesquisadores do Grupo de Estudos Alessandro Baratta da PUC-MG que dão seus primeiros passos na pesquisa jurídica.

2 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 13ªed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 38. O Prof. Celso Mello se coloca entre os "divulgadores do Direito", o que só se justifica pela infinita humildade do mestre internacionalista, haja vista o inegável conteúdo científico de sua obra.

3 Sobre o tema-problema e sua delimitação cf. PEREIRA, Lusia Ribeiro. VIEIRA, Martha Lourenço. Fazer pesquisa é um problema? Belo Horizonte, Lápis Lazúli, 1999. 39p.

4 Para maiores detalhes sobre o marco teórico cf. GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa. DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p.55

5 Sobre os diversos procedimentos da pesquisa empírica cf. GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa. DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria e prática. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p.100

6 Sobre as diferenças da pesquisa jurídico teórica e da pesquisa empírica cf. WITKER, Jorge.Como elaborar una tesis en derecho: pautas metodologicas y tecnicas para el estudiante o investigador del Derecho. s/l: Civitas, s/d. p. 85-120.

7 Os endereços eletrônicos destas bibliotecas podem ser obtidos em: www.tuliovianna.org

 

 

Autor:

Túlio Lima Vianna

prof[arroba]tuliovianna.org



 Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.