"NÃO CONHEÇO NADA MAIS PRÃTICO QUE UMA BOA TEORIA"
(EINSTEIN)
Desde 1976 moramos no Brasil. Por volta de 1990 começou no país o "boom" da Qualidade Total. No início, muita gente a considerava como uma panacéia, uma varinha mágica que levaria o país, em pouco tempo, a transformar-se num membro do Primeiro Mundo. Como conseqüência, passou a ser aplicada em forma generalizada em organizações de todo tipo.
Contudo, pouco tempo depois - lá por 1992 ou 1993 - começou a sentir-se uma reação contrária: pessoas reclamando de estragos causados pela tal senhora chamada "Qualidade Total". Em nossas variadas atividades como palestrante, professor, escritor e consultor no tema, fomos sentindo esta mudança de percepção nas pessoas, de modo que supondo houvesse algum mal-entendido por parte destas, explicamos em forma mais cuidadosa os princípios e os fundamentos da nova tecnologia gerencial. Em ocasiões, parecia que estas novas explicações eram satisfatórias, ás vezes só parcialmente e em certas oportunidades ficava claro que eram insatisfatórias.
Para esclarecer ainda mais, publicamos no final de 1993 um livro intitulado: "Resposta á Crise: Qualidade Total Autêntica em Bens e Serviços" (Bonilla, 1993), onde apresentamos uma visão ecossistêmica da Qualidade. Contudo, na enorme listagem de obras sobre o assunto, este livro era apenas mais um, e pouco divulgado, não foi um sucesso de vendas, a não ser em seu lançamento.
Com o passar do tempo nossa perplexidade acerca do que corria na cabeça das pessoas em relação com a idéia de Qualidade Total, foi aumentando. Até que em 1995 fomos privilegiados com uma faisca de compreensão: "Qualidade" ou "Qualidade Total" significam coisas diferentes, do mesmo modo que as palavras, justiça, liberdade ou amor significam coisas distintas, segundo seja a mente que as está percebendo. Na realidade, entanto nós fazíamos ênfase nos fundamentos, muitas pessoas vinculavam Qualidade exclusivamente a suas aplicações concretas.
A partir daí, em todas as nossas palestras, seminários, cursos e consultorias (e agora neste texto) enfrentamos essa dificuldade a partir de uma afirmativa provocante: "Somos contra e a favor da Qualidade Total". Naturalmente que a platéia tem um sentimento de surpresa ou até de espanto quando ouve isto (e esse é justamente o objetivo: despertar o interesse, para que a compreensão seja completa), já que deveria esperar-se de nossa parte, uma fervorosa e incondicional defesa da Qualidade. A explicação que apresento para essa aparente contradição é, mais ou menos, a seguinte:
Hoje em dia já não é possível falar de Qualidade, Qualidade Total ou Gestão da Qualidade Total como um conceito homogêneo. Com o passar do tempo tem-se desenvolvido certas categorias de Qualidade Total, cada uma tendo suas características específicas. Para simplificar, essas categorias são reduzidas a três principais:
A) Qualidade Total Clássica. é oriunda do Japão, elaborada durante 20 anos (1950 - 70) nas principais indústrias japonesas. Através de sua aplicação generalizada, o Japão passou de país arrasado a uma potência mundial, inclusive invadindo o próprio mercado do país mais poderoso do mundo, colocando em xeque ás orgulhosas empresas automotrizes americanas, entre outras. O modelo clássico têm duas vertentes essenciais, a vertente técnica, a qual fornece instrumentos simples e pragmáticos, capazes de contribuir de forma significativa ao combate dos problemas identificados e uma vertente humanista, preocupada com o crescimento do ser humano na empresa.
B) Qualidade Total Mecanicista. Na medida em que o sucesso japonês foi conhecido em todo o mundo, os outros países - já no início da década de 80 os mais adiantados - passaram a adotar o modelo clássico. Só que, seguindo o modelo ocidental de resultados a curto prazo, simplificaram - melhor seria dizer banalizaram e ainda distorsionaram - de tal forma que acabaram apropriando-se apenas das técnicas, deixando quase totalmente de lado a vertente humanista, seguramente considerada como traço cultural japonês, inapropriado em Ocidente. Desta forma, a importância dos recursos humanos para as organizações passou a ser lembrada apenas no momento dos discursos. A oleada neo-liberal que invadiu o mundo no início da década de 90 deu mais combustível ainda a este enfoque. O mais lamentável é que este é o modelo de Qualidade Total que predomina em Ocidente.
C) Qualidade Total Autêntica. Junto com um brote neo-liberal na economia, a década de 90 veio com outros ingredientes mais interessantes: direitos do consumidor, proteção ambiental, movimentos reivindicatórios dos mais variados, mostrando que a conscientização do ser humano está em processo de rápida aceleração. A Qualidade Total Autêntica (ver Bonilla 1993) é um modelo em fase incipiente; na realidade ele implica numa expansão do modelo clássico, pois na época em que este foi elaborado (década de 50) determinados assuntos não estavam em discussão.
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