Nos seus Elementos de Teologia Filosófica, Battista Mondin classifica diversas classes e subclasses de ateísmo, inscrevendo os ateísmos de Sartre e Camus no que designou por «ateísmo niilista»1. Esta forma de ateísmo contrapor-se-ia a um «ateísmo utópico» pelas diferentes e antagónicas maneiras com que um e outro negam a existência de Deus. Se utópicos, como Ernst Bloch, crêem fazer do homem o sucessor de Deus, homem que, sob os auspícios de um Prometeu libertador, teria Deus por idealização do humano, já os niilistas, na sombra do sofrimento de Sísifo, negariam a existência de Deus precisamente por a realidade lhes desmentir a utopia. À esperança crédula do ateu utópico opor-se-ia a desesperança e inquietude incrédulas do ateu niilista.
Naturalmente, estas diferenças permitem explorar ambiguidades no confesso ateísmo dos supostos niilistas Camus e Sartre. Perguntar-se-ia, como o fez Francis Jeanson, no contexto menos simpático de um feroz criticismo a O Homem Revoltado, se Camus não terá montado o seu ateísmo num “antiteísmo”4, o que não é realmente o mesmo – como não é o mesmo dizer que Deus não existe ou, diversamente, protestar contra a existência de Deus a ponto de se negar a Deus a existência. Deste lado mata-se Deus, do outro nunca houve o que matar. O risco de pseudo-ateísmo pode ser apontado a Camus e, em todo o caso, quer no que respeita ao autor de O Homem Revoltado quer referindo-nos ao pensamento de Jean-Paul Sartre, parece estarmos perante ateísmos tensos, o que não é, por si só, razão bastante para os desqualificar ou mesmo os reconverter em teísmos inconfessos.
André Barata
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