Ao estudarmos o Ato Administrativo, especificamente os Atos Administrativos em espécie, classificados em função de seu conteúdo, nos deparamos com o conceito clássico de Autorização como sendo o "ato unilateral pelo qual a Administração, discricionariamente, faculta o exercício de atividade material, tendo como regra, caráter precário".1
São comumente utilizados como exemplos para ilustrar o emprego da Autorização neste sentido a instalação de bancas de frutas ou jornais em vias públicas e a autorização para porte de arma.
Nesta perspectiva tradicional, dado seu caráter discricionário, tal instrumento seria expedido observando a margem de liberdade da Administração para decidir, segundo critérios subjetivos de conveniência e oportunidade, avaliados em cada caso concreto pelo administrador responsável. Além disso, ao autorizatário não estaria garantida qualquer estabilidade, ante a possibilidade de revogação do ato a qualquer tempo pela Administração, dada sua precariedade.
Para um estudo específico da Autorização de Serviços de Telecomunicações, no sentido que lhe foi dado pela Lei nº 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações), sentido este que difere da receita reproduzida nos Manuais de Direito Administrativo, é importante tecer alguns comentários sobre o contexto no qual foi editada a mencionada Lei.
O Estado Brasileiro, atento as movimentações ocorridas no mundo, aos poucos foi modificando suas formas de atuação. O modelo que está sendo adotado é intitulado "Estado Regulador" e situa-se entre os modelos de estado intervencionista e liberal.
Este é um modelo novo, pois até pouco tempo o Brasil vivia em um modelo de Estado interventor, onde o governo financiava o desenvolvimento. Sua aplicação pode ser assistida através das concessões e permissões de serviços públicos à iniciativa privada e a criação de agências reguladoras que monitoram estes setores, como é o caso das telecomunicações com a Anatel.
A mudança no cenário do setor de telecomunicações do Brasil inaugurou-se no programa de governo do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, no ano de 1994, como peça fundamental no processo de desenvolvimento nacional, por ser um dos ramos mais atraentes e lucrativos para a alocação de investimentos privados nacionais e internacionais.
A Emenda Constitucional n.º 08, de 15 de agosto de 1995, extinguiu o monopólio estatal nas telecomunicações e abriu o Setor para a participação de capitais privados nacionais e estrangeiros. Em 16 de julho de 1997, o Congresso aprovou a Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que possibilitou a privatização das empresas do Sistema Telebrás e criou a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), órgão regulador do setor.
O Professor Carlos Ari Sundfeld, tece os seguintes comentários sobre a Lei Geral de Telecomunicações:
"Um dos mais complexos desafios da reforma das telecomunicações no Brasil foi construir sua base jurídica. Isso demandou boa dose de invenção. Os modelos do direito administrativo brasileiro pareciam avessos aos serviços públicos competitivos. Também soava estranho, para nossa tradição constitucional, criar agências reguladoras independentes.
Havia ainda o problema de o setor estar em metamorfose profunda, tornando difícil prever suas tendências para o médio prazo. Como criar uma regulamentação que viabilizasse as mudanças e, ao mesmo tempo, promovesse estabilidade?
é verdade que a reforma das telecomunicações integra um contexto mais amplo de revisão do papel do Estado, que vem levando à desestatização, flexibilização dos serviços ou criação de órgãos reguladores também em áreas como energia, petróleo e transportes. Nesse sentido, o direito das telecomunicações integra o direito administrativo econômico, que vem sendo construído na atualidade. Mas, com a LGT, as telecomunicações afirmaram enfaticamente sua especificidade, o que ficou nítido, por exemplo, com a determinação de que as leis gerais de licitação e de concessão seriam inaplicáveis no setor. Decidiu-se, portanto, criar uma disciplina própria, desvinculada dos grandes textos do direito administrativo econômico. Daí a autonomia da regulação das telecomunicações, propiciada também pelas particularidades técnicas e econômicas do setor.2
Feitas estas breves considerações acerca do Estado Regulador e da criação da Anatel através da Lei Geral de Telecomunicações, voltemos ao tema objeto deste estudo, a Autorização de Serviços de Telecomunicações.
A LGT, em seu artigo 131, § 1º, caracteriza a Autorização de Serviços de Telecomunicações como um ato vinculado. A ausência de precariedade está evidente quando o legislador garantiu à prestadora, no caso de extinção da autorização por razões de interesse público (decaimento), o direito de manter suas atividades regulares por um prazo mínimo de 5 anos (artigo 141, § 2º).
Página seguinte |
|
|