Observar a mudança: o papel dos estudos rurais

Vou guiar-me pela ideia de que o tema do rural, para além das questões substantivas que comporta, tem sido, por sistema, uma boa chave para interpelar a matriz socioeconómica, simbólica e material da nossa formação social, bem assim como alguns dos principais aspectos da sua natureza estrutural e da sua evolução.

E é particularmente significativo que assim seja, numa sociedade como a portuguesa, que manifesta tão frequentemente grandes dificuldades em reconhecer as suas estruturas internas. Talvez esta dificuldade se deva ao facto de as mais significativas das tendências pesadas que a têm marcado serem habitualmente tendências de extroversão ou de influência externa. Creio que não faltam exemplos: demos sempre mais atenção à viragem exportadora da nossa economia, nos anos sessenta, do que à industrialização de base endógena dos anos cinquenta; tivemos sempre mais sensibilidade para como o fenómeno emigratório do que para com a forma rápida e dúctil como uma percentagem elevada da população residente, regressada subitamente ao país em 1975, se inseriu social e economicamente, tornando-se depressa num não-problema; compreensivelmente, insistimos mais nos olhares que deitamos à integração europeia enquanto fenómeno de transnacionalização do que enquanto fenómeno produtor de regionalização e de dinâmicas de proximidade no quadro da evolução do sistema europeu e mundial (vemos o Euro e esquecemos Espanha?); conhecemos pior o interior, o nosso sistema urbano e as grandes dinâmicas do território nos anos oitenta e noventa do que as periferias das metrópole lisboeta onde afluem populações em mobilidade; entendemos com mais facilidade os movimentos das empresas que entram e saem do que os sistemas produtivos localizados. Aliás, seria interessante que isto não viesse a passar- se com a mais impressiva novidade sociológica deste início de século, que é o acolhimento ao longo do país (e não apenas na Grande Lisboa) de imigrantes, como os que têm vindo dos países do leste europeu, cujo grau de interpelação da sociedade portuguesa me parece que será muito significativo.



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José Reis
jreis[arroba]fe.uc.pt


 
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