O mundo é, em geral, maior do que se pressupõe. Por isso, a ideia de globalização é, em grande parte, uma metáfora. Uma metáfora justificada por um universo – o universo-da-globalização – que é apenas uma parte do universo-propriamente- dito. Assim sendo, o propósito deste texto é afirmar a necessidade de dispormos de um desenho do universo-completo, com a consciência de que a produção intelectual que hoje se revela especialmente visível é apenas aquela que abundantemente caracteriza tudo o que tem a ver com as mobilidades económicas, simbólicas e culturais; com a emergência de novos actores transnacionais; com a predominância de novos factores competitivos da economia e de novas lógicas de especialização; com a consolidação de um novo paradigma económico; com o papel substantivo das redes translocais e dos aspectos imateriais do funcionamento dos sistemas – o texto de A. Mateus (1999) estabelece de forma estimulante este quadro.
Para alcançar o desenho proposto, a tarefa principal é a que consiste em juntar ao universo-da-globalização dois outros universos: o da não-globalização e o das trajectórias inesperadas.
O universo-da-não-globalização é o que assenta em dois aspectos bastante diferentes entre si: a exclusão (resultante, por exemplo, da procura não revelável perante os factores da globalização, porque não é solvente ou nem sequer se manifesta) e um conjunto de práticas e iniciativas que, por assentarem numa economia moral não-sistémica e em práticas relacionais contextuais e em interações institucionais autónomas, são alheias ao mundo globalizado, apresentando- se como formas de resistência.
Por sua vez, o universo-das-trajectórias-inesperadas é aquele que, sem ser excluído ou localmente não-sistémico, é tão universal como a globalização mas parte de contextos próprios (podemos chamar-lhes locais para lhes revelar a sua génese, e não devemos chamar-lhes «glocais» porque eles não são processos derivados de formas de hetero-regulação), e tem capacidades para criar as suas próprias trajectórias, mesmo que nem todas vinguem. O que o define é, justamente, o contexto diferenciado que o produz e um conjunto de processos (processos de vida) de que fazem parte dois itens importantes: normas e hábitos que configuram comportamentos institucionais de natureza particular, por um lado, e a incerteza, por outro lado. Com este modo de ver as coisas, quero situar- -me num plano de inconformismo que, simultaneamente, postule a necessidade de ultrapassar a análise da globalização como um período apenas marcado pela transição, pela crise, pelo hibridismo e pelo determinismo (Santos, 2001), e procure, ao mesmo tempo, valorizar radicalmente as estruturas e os sujeitos constitutivos dos processos colectivos e da acção.
José Reis
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