Refletindo sobre a prática de ensino de Filosofia no Ensino Médio: uma experiência no ensinar a pensar



  1. A contradição entre a expectativa inicial e a prática educativa
  2. A democracia em sala de aula e o risco do basismo
  3. A avaliação participativa: uma idéia democrática num contexto de condicionamentos
  4. O trabalho planejado a partir de temas geradores
  5. Algumas considerações finais

 

O presente texto é resultado de uma experiência de regência de classe com a disciplina de Filosofia em Escola de Ensino Médio, na cidade de Santa Rosa, Estado do Rio Grande do Sul. Na época, um conjunto de questões estava emergente e, como não tínhamos referências de uma prática já existente, que fosse coerente com as nossas expectativas, na qual pudéssemos basear nossa ação, fomos desafiados a construir uma proposta que pudesse ser adequada à realidade local. Durante a elaboração da proposta de ensino, optamos em integrar os alunos em nossas atividades de planejamento e sistematização, motivando o grupo envolvido para a elaboração teórica, considerando a construção de propostas para a educação um desafio para a própria disciplina de Filosofia.

Sem dúvida, isso parecia muito difícil num contexto da educação, no qual a interação entre professores e alunos constitui um problema atual. Se, para realizar uma aula tradicional, na qual os conteúdos, a metodologia e a forma de avaliação são apresentados pelo professor, os alunos reagem com indiferença ao estudo, certamente essa abertura à possibilidade de envolvimento do grupo de alunos, acostumado a receber informações prontas, a participar na elaboração da proposta de uma disciplina escolar, seria um grande desafio. Ao mesmo tempo, compreendíamos essa iniciativa como um elemento importante para a motivação do grupo de alunos, visto que, se o trabalho desenvolvido partisse da construção coletiva, haveria um maior comprometimento com a disciplina e, em conseqüência, um melhor desenvolvimento das atividades.

1. A contradição entre a expectativa inicial e a prática educativa

Uma das primeiras constatações importantes da nossa atividade educativa foi a identificação do contexto social, político, econômico e cultural, no qual se insere a juventude de nossa época. A implicância das transformações da sociedade com a vida das pessoas é um aspecto fundamental para a prática pedagógica. Assim, a definição de alguns eixos básicos de atividades possíveis para o trabalho levaram em conta a sua adequação à realidade dos educandos. Por outro lado, diante da preocupação com a motivação do grupo envolvido, havia um cuidado especial com a metodologia a ser utilizada. Levando em consideração a rejeição dos alunos aos métodos tradicionais de ensino, trabalhamos filosofia,  com base em uma metodologia que caracterizamos de "debate construtivo de problemas".

No entanto, desde o primeiro contato com a turma de alunos, logo percebemos que existe uma lacuna entre o que nos propusemos a realizar (antes do envolvimento com o grupo) e a situação concreta em que nos encontrávamos. Essa experiência foi fundamental para a elaboração da proposta de trabalho, visto que, após as primeiras aulas, surgiram idéias bem diferentes acerca do que poderia ser realizado. Podemos afirmar, diante disto, que a atividade educativa carece de uma constante reflexão crítica para que possa ser, de fato, um processo coerente com nossa postura de educador. Se não nos propusermos a refletir diante da prática realizada, corremos o risco de cair num ativismo, o que reforça a cultura do improviso, tão presente na cultura brasileira e, muitas vezes, prejudicial a um efetivo trabalho que almeje a obtenção de resultados positivos diante de problemas.

Com a perspectiva de estarmos propondo um processo educativo em constante construção, desde a primeira aula apresentamos nossa proposta ao grupo para que fosse discutida, criticada e adequada ao interesse coletivo. Além da metodologia que procurava evitar, na medida do possível, atividades expositivas do professor diante dos alunos, a principal novidade da proposta que apresentamos foi a forma de avaliação. Considerando o poder do professor em determinar a classificação dos alunos através de notas, nos atrevemos a alterar esta histórica concepção de avaliação. Propusemos a discussão da avaliação com o grupo, tentando estabelecer critérios coletivos que pudessem criar uma maior responsabilidade dos alunos com a disciplina em curso. Prevíamos a abolição da prova bimestral e apresentávamos a sugestão de realizar diversos trabalhos escritos que pudessem revelar o crescimento do grupo e de cada indivíduo no decorrer das aulas.

No entanto, desde as primeiras aulas, verificamos que os alunos não estavam preparados para a nova forma de trabalho apresentada. A inibição da maioria com a comunicação foi um problema sério a ser enfrentado. Se estávamos prevendo um processo de debates e discussões em grupo, os alunos esperavam um professor que viesse expor conteúdos que, posteriormente, seriam exigidos em forma de prova. Como os alunos devem ter passado grande parte de sua vida escolar com a prática tradicional de educação, baseada em metodologias expositivas, muitos demonstravam intimidações em se pronunciar publicamente, permanecendo, a maior parte do tempo, em silêncio. Alguns, ao contrário, se manifestavam seguidamente e chegavam a impedir a manifestação dos outros. Assim, constatamos a enorme distância entre o que estávamos dispostos a trabalhar e a realidade dos alunos. Assim, a proposta foi apenas apresentada, não havendo uma efetiva discussão a seu respeito, durante as primeiras aulas.

Entretanto, não desistimos da nossa forma de trabalhar. Entendíamos que seria necessário motivar os alunos para a participação. Isso representou uma grande mudança em nossa concepção de trabalho inicial. A necessidade de estimular os alunos para o debate, nos motivou a reelaborar as atividades após cada aula, desenvolvendo reflexões sobre o que realizamos e o que precisávamos modificar ou melhorar. Quando iniciamos as reflexões críticas das aulas percebemos uma contradição importante em nossa proposta. Se estávamos dispostos a construir nossas aulas com os alunos, porque havíamos planejado as atividades para todas as aulas antes de entrar em contato com a turma? E por que estávamos tão preocupados com os conteúdos, se nossa principal meta era a motivação para o pensamento filosófico? Concluímos, nesse momento, que o fundamental do trabalho era construir atividades a partir de cada aula, de cada comportamento que se manifestava, buscando  uma participação cada vez maior dos alunos na construção das atividades.


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