Trata o presente trabalho de comentar de forma mais sucinta e abarcada pelo direito empresarial e também pelo direito constitucional a nova lei de recuperação de empresas (Lei n°: 11.101/2005) enfatizando como linha mestra da elaboração da referida lei os princípios da eticidade e da preservação da empresa como pressupostos curiais para revisão do instituto da falência e como substitutivo mais eficaz e eficiente da concordata, cuja edição perdeu sua razão de ser face ao imenso desenvolvimento social, econômico, político e tecnológico da nação nos últimos anos.
Com o surgimento da teoria da empresa, no correr do ano de 1942, o Direito comercial sofreu um impulso quântico na exata medida em que, dispensando-se de um enfoque precipuamente voltado para as atividades de mercancia, voltou-se com um olhar mais acurado sobre a atividade econômica enquanto meio necessário para a produção e circulação de bens, mercadorias e serviços, dispondo-se a regular o que, a partir de então, denominou-se de "atividade empresarial".
Segundo a análise muito mais que apropriada de FÁBIO ULHOA COELHO (1), "A atividade dos empresários pode ser vista como a de articular os fatores de produção, que no sistema capitalista são quatro: capital, mão-de-obra, insumo e tecnologia. As organizações em que se produzem os bens e serviços necessários ou úteis a vida humana são resultado da ação de empresários, ou seja, nascem do aporte de capital - próprio ou alheio -, compra de insumos, contratação de mão-de-obra e desenvolvimento ou aquisição de tecnologia que realizam".
Desta forma, a atividade empresária é mais que apenas uma atividade em que o empresário, assumindo o risco do negócio, reúne os meios de produção e, agindo sob caráter de profissionalismo, visa a obtenção de lucro, posto que, enquanto atividade que, de per si, é capaz promover o desenvolvimento econômico da nação, bem como o progresso universal da raça humana, chamando a atenção do controle social e, por conseguinte, a necessidade de sua regulação por meio do poder estatal, a fim de evitar-se abusos ou excessos que possam vir a causar desequilíbrios insanáveis, cuja resultante imediata atinge a todos os indivíduos da sociedade e, por que não dizer, de todo o mundo.
É nesse diapasão que, no ano de 1945 surgira o Decreto-Lei n°: 7.661, cujo intento era o de regular e estabelecer critérios para, em sendo inevitável, organizar o processo falimentar do empresário que, sujeito as condições de mercado, poderia vir a perder o controle de seu negócio, atingindo todos aqueles que com ele estavam envolvidos na atividade - fornecedores, consumidores, investidores, sócios - e, principalmente a própria atividade econômica enquanto instrumento de regulação e funcionamento do sistema econômico.
Trata-se de um vértice macro e micro econômico com o mundo do direito e, ressalte-se, não o único, posto que economia e direito são ciências sociais de mesma origem axiológica, qual seja, a de entender os fenômenos humanos enquanto resultantes da própria ação humana junto a natureza. O funcionamento do sistema econômico, de forma harmônica e equilibrada, permite o desenvolvimento humano e, por conta de seus efeitos - sejam funestos ou proveitosos - exige uma regulação jurisdicional-legal, evitando que abusos, excessos, omissões ou ações indevidas possam vir a resultar em prejuízo coletivo, prejuízo esse que, revestindo-se de caráter eminentemente social, redunda em danos, muitas vezes insanáveis, a nação, bem como - seja de forma direta ou indireta - a toda humanidade.
De modo geral, podemos ousar distinguir a falência a partir de dois enfoques conceituais do referido instituto. O primeiro é aquele que se refere a sua natureza econômica, posto que a falência constitui-se em um estado de insolvência frente a situação patrimonial do devedor que, complementa-se pelo conceito econômico, no qual a falência não é o estado de insolvência, mas sim a própria falência; ou seja, não é a insolvência do devedor que interessa ao direito, mas sim, seu novo status decorrente da própria falência - uma situação de fato que concorre para uma situação de direito, cujos efeitos espraiam-se para o mundo fático, afetando todos aqueles que se encontrem envolvidos, direta ou indiretamente com a atividade empresaria em regime de falência.
Cabe ressaltar, de plano, que o conceito aqui abarcado não se preocupa, sob qualquer aspecto, com o inadimplemento do indivíduo revestido da capacidade empresária, até porque, o interesse desenvolvido pelo referido indivíduo, perde de imediato, seu caráter individualista para consagrar-se ao direito coletivo, na exata medida que envolve interesses diversos, inclusive atingindo - guardadas as devidas proporções - certo grau de interesse público, observada a característica principal da atividade empresária é a produção de bens e serviços que serão consumidos por vários, e por que não todos, os indivíduos da sociedade.
Nesta mesma vertente, convém evidenciar, que a falência é um instituto que vai diretamente de encontro ao estado patrimonial, interessando os efeitos que a mesma produz junto ao conjunto de bens econômicos envolvidos da operação empresária, razão pela qual deve ela concretizar-se em verdadeiro processo executivo, com aduz o iminente doutrinador SAMPAIO DE LACERDA (2), para o qual "a falência se caracteriza como um processo de execução coletiva, decretado, judicialmente, dos bens do vendedor comerciante ao qual concorrem todos os credores para o fim de arrecadar a patrimônio disponível, verificar os créditos, liquidar o ativo, saldar o passivo, em rateio, observadas as preferências legais".
Sob esse enfoque cristaliza-se o caráter dúplice da falência, não apenas enquanto instituto econômico e jurídico, mas também, sob o aspecto jurídico, de natureza material e processual ao mesmo tempo. Material porque é a insolvência que se constitui em pressuposto que concede validade e eficácia ao instituto e não menos que impor um regime jurídico decorrente do procedimento necessário para a solução do estado falêncial com vistas a sanar os efeitos dele decorrentes.
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