É perceptível a frustração profissional que sente um alto percentual dos advogados brasileiros, principalmente os mais jovens. Mesmo competentes, aprovados nos duros Exames de Ordem, ansiosos para exercer a profissão, sentem à frente um como que muro invisível. Invisível mas mesmo assim incontornável pois a atual ética profissional inibe qualquer tipo de auto-propaganda. Muro que só poderá ser transposto mediante fortuitas relações de parentesco, casamento, ou rara e feliz coincidência de ser notado e convidado para trabalhar em próspero escritório de advogados.
A explicação do fenômeno está no excesso de Faculdades de Direito, fornecendo mais bacharéis do que o exigido pelo mercado de trabalho; no progressivo achatamento do poder aquisitivo da classe média; na impossibilidade das classes menos favorecidas de arcar com os custos de uma demanda judicial; no congestionamento da justiça em todas as instâncias, tanto em razão da falta de juízes quanto da lentidão resultante de uma legislação processual estimuladora da protelação; na utilização freqüente de ações coletivas movidas pelo Ministério Público e outras entidades igualmente legitimadas — ações solitárias que dispensam o ajuizamento de milhares de outras iguais (algo bom para a população mas uma ruína para os advogados).
Novas explicações poderiam, por certo, figurar como origem de um imerecido empobrecimento de boa parte dos advogados, principalmente os iniciantes. Idealistas — a maior parte —, ansiosos para comprovar seu valor, mas impossibilitados de fazê-lo, sentem-se justamente revoltados. Falando-se de modo geral, as Faculdades de Direito, no Brasil, funcionam mais como difusoras de cultura geral — e nisso merecem aplauso — do que como habilitação para ganhar a vida em uma profissão decente. Ocorre que a maioria dos bacharéis não estudou Direito como passatempo ou enciclopedismo.
Como utilizar, de forma ética e beneficiando a população brasileira, o grande número de egressos das Faculdades de Direito? Se há excesso de Faculdades, não são eles os responsáveis pela distorção. São mais é vítimas de um sistema falho de planejamento, indiferente ao que se vislumbra no futuro.
A Magistratura e o Ministério Público não podem aproveitar senão um mínimo percentual desses jovens. E o mesmo acontece na carreira policial, com os Delegados de Polícia. Nos concursos de ingresso à magistratura e ao ministério público a proporção de aproveitamento tem sido a de um candidato para oitenta, noventa ou cem inscritos. Ou bem mais. E nem todo bacharel se inscreve em concursos. É irrisório e desanimador, portanto, o percentual de formados que terá seu futuro assegurado ingressando nas carreiras acima mencionadas. Resta-lhes, portanto, a dura missão de advogar — missão cada vez mais enredada num improvisado, pouco prático e mutável cipoal legislativo de controversas hermenêuticas.
Quando se fala em "advogar", a primeira idéia que vem à mente é a de postular em juízo, como autor ou réu. Mas é preciso considerar que se a justiça brasileira, hoje, não consegue processar com celeridade as causas já existentes — a culpa quase sempre não é dela, mas da legislação processual deficiente e restrições orçamentárias —, imagine-se o que ocorreria se considerável acréscimo de demandas chegasse aos tribunais, em razão melhores oportunidades oferecidas aos jovens advogados.
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