Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, segundo o parágrafo único do art. 1o da Constituição Federal. O problema que parece insolúvel, porém, é o referente ao controle do poder, para que os governantes realmente o exerçam de acordo com o interesse público.
A separação dos poderes, que resultou de diversas contribuições doutrinárias e foi consagrada por Montesquieu, no Espírito das Leis, pretendia exatamente criar um sistema capaz de evitar os abusos por parte dos governantes, através de limitações recíprocas entre os poderes. Assim, para que as autoridades do Legislativo, do Executivo e do Judiciário não possam abusar do poder, existe em nosso ordenamento constitucional uma série de mecanismos, como o do controle de constitucionalidade, pelo qual o Judiciário examina a regularidade dos atos do Legislativo ou do Executivo, ou como o veto, pelo qual o Presidente da República nega a aprovação a um projeto já aprovado pelo Congresso Nacional.
Não importa como a autoridade seja investida no cargo, é preciso que o poder seja controlado, para que os abusos possam ser evitados. O ingresso dos magistrados de carreira através de concurso público de provas e títulos não é melhor, nesse aspecto, do que o processo de escolha dos deputados e senadores, que são investidos pelo voto popular, porque seria fácil citar exemplos de magistrados ou de congressistas que abusaram do poder, legislando ou decidindo em causa própria. No STF, por exemplo, os Ministros são nomeados pelo Presidente da República, com a prévia aprovação da maioria absoluta do Senado Federal. Em todos os Tribunais do País, um quinto das vagas, que são reservadas a advogados e membros do Ministério Público, são preenchidas por processo semelhante. Indicados em listas sêxtuplas, o Tribunal escolhe três candidatos, e um deles será nomeado pelo Chefe do Executivo. O juiz Nicolau dos Santos Neto, tristemente famoso, era integrante do Ministério Público e foi investido através desse processo. Também a investidura nos cargos de confiança, que é feita através da simples nomeação, caso dos Ministros de Estado, ou dos dirigentes de Estatais, ou do Secretário-Geral da Presidência, Eduardo Jorge, não pode garantir que, no futuro, aquela autoridade terá um desempenho exemplar, sem qualquer suspeita de improbidade administrativa.
Portanto, quer a autoridade seja eleita, quer seja concursada, quer seja nomeada, com ou sem a prévia aprovação de algum outro órgão, o ponto central da questão é a impunidade.
Montesquieu consagrou o sistema da Separação dos Poderes, para que o Poder fosse controlado. Dizia ele que era preciso que os poderes se controlassem reciprocamente, porque a concentração gera a tirania. Na realidade, a separação (independência e harmonia, CF, art. 2o), no Brasil, não funciona, e os abusos se multiplicam, nos três Poderes. No Judiciário, o abuso das liminares. No Executivo, o abuso das medidas provisórias. No Legislativo, o abuso da legislação em causa própria, como na recente anistia das multas eleitorais.
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