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Assume a mesma postura de Barandier quando afirma que as provas ilícitas são admissíveis no processo apenas quando necessárias à defesa do acusado.
A legítima defesa exclui a ilicitude da coleta da prova, que corresponde uma exceção a proibição de admissibilidade da prova ilícita. Também não há ilicitude de provas colhidas em estado de necessidade. Inclusive, há entendimento jurisprudencial no sentido de que não existe violação de domicílio em ambos os casos.
A moderna doutrina alemã processual civil, tem-se manifestado no sentido de que não mais vige radicalmente, o princípio da busca da verdade real, de modo que devem ser impostas algumas restrições à obtenção da prova, com o fito de serem respeitados os direitos personalíssimos e os direitos fundamentais.
A invalidade material do meio de prova acarreta normalmente a invalidade do processo.
Podemos nomear os seguintes exemplos de prova ilícita no direito alemão são a saber: a) gravação de conversa telefônica sem o consentimento das partícipes; b) a exibição de fotografia com ofensa aos direitos gerais da personalidade; c) leitura indevida de diário pessoal; d) o depoimento de alguém que observou ilegalmente, o cônjuge-réu em sua própria casa; e) o depoimento de testemunha sobre fatos que soube espreitando conversa privada em segredo ou da lei da ponderação.
Cogita-se da incidência dói princípio da proporcionalidade no procedimento probatório a fim de abrandar a proibição da prova obtida ilicitamente.
A lei de ponderação avalia os interesses e direito em jogo a fim de dar solução mais justa. Há normas expressas na Ordenança Processual Penal Alemã indicando o princípio da proporcionalidade naquele sistema jurídico.
O nosso Supremo Tribunal Federal sobre a ponderação de direitos igualmente protegidos pela CF, indicam-nos verdadeira similitude entre a teoria e a práxis dos dois tribunais, de modo a fazer com que seja válida tanto aqui como na doutrina alemã sobre o princípio da proporcionalidade (que encontra seu conteúdo no Estado de Direito, havendo ainda que o situe no princípio do processo legal).
O entendimento dominante jurisprudencial é que a proibição de provas ilícitas somente gera a nulidade do processo se a condenação ou se a acusação basear-se exclusivamente na prova ilícita ou em provas colhidas a partir dela.
Assim sendo, apenas a prova considerada ilícita será excluída dos autos, mas o processo segue o curso normal se houver outras provas a abalizar a sentença condenatória.
Uma vez reconhecida judicialmente a ilicitude da prova, é a regra, é o seu desentranhamento do processo. Mesmo não ocorrendo o desentranhamento também não há nulidade da decisão, se esta foi calcada na prova ilícita.
A Procuradoria Geral da República, em parecer do Dr. Marden Costa Pinto, afirma que a admissão da prova vedada não acarretará a nulidade do processo se a condenação não estiver fundada exclusivamente nela. Na mesma esteira, entendem os Ministros do STF Paulo Brossard, Carlos Velloso, Sydney Sanches e Néri da Silveira.
Entendimento diverso é o esposado pela doutrina e a jurisprudência norte-americana que se constituiu sob o nome de fruits of poisonous tree (frutos da árvore venenosa) que defende a tese de que havendo prova ilícita no processo, a sua ilicitude contamina todas as demais provas. Com fulcro em tal pensamento já se manifestaram os Ministros do STF Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio, Francisco Rezek e Celso de Mello.
As declarações colhidas mediante violência física não podem ser consideradas provas, o depoimento é comprometido e não merece a mínima credibilidade. As revelações extorquidas mediante violência ou torturas é absolutamente ausente a manifestação de vontade do depoente ou interrogado.
A tortura é expressamente proibida pelo direito positivo brasileiro (art. 5o. III CF) além de ser crime inafiançável a sua prática (art. 5o., inciso XLIII).
Ademais, o inciso XLVII também do referido art. 5o. da CF, estabelece a proibição das penas cruéis, também sendo proibidos os modos de investigação cruéis, pois para a aplicação de penas pressupõe-se a existência de um culpado, assim declarado judicialmente, e para a investigação é suficiente a existência de um suspeito, em favor de quem há a presunção de inocência.
A jurisprudência brasileira tem-se inclinado a favor da tese intermediária, encontrando assim a aplicação ideal para o princípio da proporcionalidade.
No mesmo diapasão obra o acórdão do TJRJ de Barbosa Moreira assim ementado: "Prova obtida por meio de interceptação e gravação de conversas telefônicas do cônjuge suspeito de adultério: não é ilegal, quer à luz do Código Penal, quer do Código Brasileiro de Telecomunicações, e pode ser moralmente legítima, se as circunstâncias do caso justificam a adoção, pelo outro cônjuge, de medidas especiais de vigilância e fiscalização (TJRJ 5 ª Câm. Civ. Ag In.7.111 rel. Des. Barbosa Moreira voto unânime, j. 22.11.1983).
Ao tratar de documentos obtidos para formar prova no processo penal CPP, art. 233, parágrafo único dispõe que "as cartas poderão ser exibidas em juízo pelo respectivo destinatário, para a defesa de seu direito, ainda que não haja consentimento do signatário."
Portanto, é válida a prova em juízo obtida por um dos participantes ou signatários de carta ou qualquer outro meio, mesmo sem o consentimento do signatário ou do co-partícipe.
O art. 233 CP parágrafo único legitima tal prova e não ofende ao princípio constitucional estatuído no art. 5o., XII e LVI da CF/1988.
A prova de conversa telefônica obtida licitamente por autorização judicial na instrução criminal art. 5o., XII , CF, é prova lícita e lídima e, pode ser emprestada no processo civil, respeitados os requisitos de validade e eficácia (foi o caso recente do afamado "Belo" que galgou feio destaque na mídia nacional).
O inciso LVI do art. 5o. diz respeito ao processo civil, penal e administrativo. O conceito de prova ilícita é trabalho da doutrina. Entretanto a terminologia mais adequada é aquela que denomina como prova vedada sugerida por Pietro Nuvolone há vedação em sentido absoluto (proibida sua produção em qualquer hipótese) e em sentido relativo (há autorização do ordenamento que prescreve sob o preenchimento de certos requisitos de validade da prova).
Será prova ilegal sempre que houver a violação do ordenamento jurídico como um todo (leis e princípios gerais) sejam material ou processual. Será ilícita a prova quando sua proibição for de natureza material, ou seja, quando for obtida ilicitamente.
A ilicitude material ocorre quando a prova deriva de um ato contrário ao direito e pelo qual se consegue um dado probatório(invasão domiciliar, violação do sigilo epistolar, quebra de segredo profissional, subtração de documentos, escuta clandestina, constrangimento físico ou moral na obtenção de confissões ou depoimentos testemunhais).
Há ilicitude formal quando a prova decorre de forma ilegítima pela qual ela se produz, embora seja lícita a sua origem. A ilicitude material diz respeito ao momento formativo da prova; a ilicitude formal, diz respeito ao momento introdutório da prova.
Em suma, razões de legalidade e de moralidade atuam como causas restritivas da livre atividade probatória do poder Público.
O acórdão do STF inserto no RTJ 84/609 aborda o caso em que o marido, já separado de fato, da mulher ingressara indevidamente na intimidade dela, que era a única assinante da linha telefônica, fazendo gravações clandestinas sem o conhecimento da mulher.
A violação da intimidade foi patente e agiu com inteiro acerto o Pretório Excelso ao execrar a prova ilicitamente obtida.
Porém seria outra a solução, se o casal estivesse vivendo sob o mesmo teto, o direito de uso da linha telefônica pertencesse a ambos os cônjuges, as circunstâncias do caso concreto justificassem a adoção de medidas especiais de vigilância, ou ainda, o que se beneficiaria da prova se tivesse participado da conversa gravada.
E neste caso,a prova não terá sido obtida ilicitamente mas por meio moralmente legítimo. Mas ainda, se a parte que coligiu a prova por gravação sem o conhecimento do adversário tiver participado da conversa gravada de maneira oculta, não haverá prova obtida ilicitamente , mas mera reprodução de conversa mantida pelas partes.
A regra do art. 5o. XIL é da preservação da intimidade pela inviolabilidade da correspondência, das comunicações, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma da lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
A Lei 9.296/96 veio a viabilizar a autorização judicial do Poder Judiciário e regulamentou a parte final do inciso XII do art. 5o. da CF/1988. As outras formas e espécies de provas ilícitas continuam a merecer a atenção do intérprete e do operador do direito, no sentido de fixar o âmbito de aplicação do princípio constitucional da proibição da prova obtida ilicitamente.
A expressão investigação criminal engloba tanto o inquérito policial bem como qualquer outro procedimento administrativo instaurado pela autoridade MP, e outros a fim de averiguar fato típico caracterizado como crime ou contravenção penal.
Já a expressão "instrução processo penal" indica prova para o processo penal, produzida com a denúncia ou queixa (podendo tanto ser ação penal pública como privada).
O inciso XII do art. 5o. da CF/1988 deve ser interpretado restritivamente, somente o juiz criminal pode autorizar a interceptação telefônica, não podendo o juiz cível.
A natureza da causa civil é irrelevante para a admissão da prova, logo a prova direta da esfera criminal pode ser emprestada ao processo civil. Sendo exigido que a parte contra quem vai ser produzida tenha efetivamente participado do processo penal de onde proveio a prova a ser emprestada.
Caso contrário, em atenção ao princípio do contraditório, a parte terá de ratificar a prova no juízo cível.
Resultando positiva a interceptação telefônica, o resultado será transcrito e juntado aos autos. No inquérito,a juntada se dará imediatamente antes do relatório final da autoridade. A gravação de que não resulte prova utilizável será inutilizada.
Sem autorização judicial cabal, a interceptação telefônica constitui crime punido com reclusão de 2 a 4 anos e multa (art. 10).
Assim, se a vida estiver sendo ameaçada por telefonemas, o direito à intimidade e à inviolabilidade da comunicação telefônica daquele que vem praticando a ameaça à vida de alguém deve ser sacrificado em favor do direito maior à vida.
Antes da CF de 1988, as garantias constitucionais vigentes não possuíam eficácia marcante, assim os arbítrios praticados raramente eram levados aos autos dos processos (HC 69.912-0/RS). O Estado tinha poderes para cassar o direito de expressão e comunicação das pessoas, interferia nos meios de comunicação, nas artes e até, na ciência.
Em defesa da segurança nacional, o Estado infiltrava fiscais nas universidades para controlar o ensino e evitar a conspiração.
A falta de efetividade dos limites aos métodos de persecução e investigação criminal gera inquietação social pela insegurança que impõe aos indivíduos. Fortalece o poder estatal a ponto de subjugar as pessoas, negando-lhes o respeito à sua cidadania à subserviência.
A própria história da civilização ocidental, com o advento da expansão do Cristianismo, o homem aceitou que todos os seres humanos têm natureza semelhantes, merecedores de igual respeito individual e contam com a mesma dignidade humana.
Inaceitável, portanto, que a dignidade humana seja submetida pelo arbítrio estatal, fortalecendo o poder estatal em detrimento da cidadania.
Por isso, recomenda-se a defesa das garantias constitucionais mesmo que acarrete a absolvição de criminosos comprovados se as provas foram colegiadas por meios ilícitos.
O pressuposto de existência e de coerência do estado é a promoção do bem-estar do homem, para tanto, é fundamental estabelecer restrições ao livre arbítrio tanto do cidadão quanto do Estado.
Do contrário, teremos a lei do mais fortes, permitindo-se o fortalecimento dos fortes em detrimento dos mais fracos. No que tange a obtenção de provas, é curial impor limites quer por parte de particulares ou do Estado, para se evitar a tirania estatal na persecução criminal, como também se evitar a beligerância entre os cidadãos.
Fatalmente o Estado sem limites ofenderá os cidadãos em seus direitos de pessoas humanas. Relativos à prova ilícita é curial observar o art. 50. inciso LVI, X e XII da CF/1988 (estes últimos três incisos reforçam-se mutuamente, e não podem ser analisados isoladamente.
Via de regra, os direitos não são absolutos e o seu exercício não exclui limitações e temperamentos mediante o denominado poder de polícia.
O bem maior para o homem é o direito à vida , mas este admite restrições. É o caso da legítima defesa. Assim, também o direito de propriedade, que por algum tempo foi considerado absoluto, hoje sofre inúmeras limitações em função do bem-estar comum, devendo cumprir sua função social.
No mesmo sentido, o direito à propriedade (hierarquicamente inferior a esses outros direitos), não enseja tutela absoluta , e a doutrina é quase unânime em reconhecer a natureza relativa do sigilo.
Todos os sistemas jurídicos organizam-se de modo a escalonar os valores por eles protegidos de acordo com o grau de importância que a sociedade lhes atribui.
Dessa forma, recebem sanção mais rigorosas as condutas ofensivas aos interesses e direitos havidos por mais importantes. Diminui a severidade das sanções a medida que as violações alcançam interesses mens importantes.
Baseado nesta idéia, a legislação alemã adota em caráter excepcional, em casos extremamente graves, tem admitido a prova ilícita, calcando-se no equilíbrio entre valores fundamentais contrastantes.
A admissibilidade ou não da prova ilícita é decidida a posteriori, o julgador analisa qual o valor de maior relevância social. Sendo mais valioso o interesse atingido pelo crime, a prova será admitida, caso contrário, rejeitada.
Os indivíduos não podem abusar do direito do privacidade em detrimento de outros interesses e direitos sociais que sejam constitucionalmente, tão relevantes quanto aquele.
O Estado utilizando-se do princípio da proporcionalidade, tem o poder-dever de sacrificar esse direito em favor do interesse ofendido pelo criminoso.
O Estado de Direito moderno assume a obrigação de não atentar contra a realização dos direitos sociais como também a de atuar para dar satisfação a esses mesmos direitos.
Desta forma, exige-se do Estado uma conduta firme no sentido de garantir a materialização desse direitos, que pode efetivar-se em casos específicos, mediante a aceitabilidade processual de provas obtidas por meios ilícitos.
Para alguns doutrinadores tal conduta da estatal é temerária pois expõe a risco as garantias individuais do cidadão, pois deixa ao arbítrio do juiz decidir no caso concreto qual interesse preponderante.
O princípio da proporcionalidade visa prioritariamente a mínima interferência na esfera dos direitos individuais(necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito).
A valoração da licitude das provas criminais deverá ser analisada seguindo os objetivos da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito.
Outras limitações a admissibilidade da prova ilícita é a necessidade de motivação das decisões judiciais, o princípio do duplo grau de jurisdição, e ainda, a atividade do Ministério Público na função de custos legis.
O MP é uma instituição que se tem fortalecido em todo o mundo, e em alguns países, exerce grande controle sobre a atividade da magistratura, pois acumula as funções de custos legis e custos societatis.
O princípio da legalidade funciona como limite ao poder decisório dos juízes juntamente com o imperativo de motivação das decisões judiciais servem de bússola tanto para os limites à liberdade do cidadão quanto para o exercício das funções dos magistrados. Reforçando assim, as regras para a aplicação do princípio da proporcionalidade.
Contudo, Maria Cecília Pontes Carnaúba, tem entendimento diverso e arrisca a considerar a proporcionalidade como fundamento lógico de qualquer sistema jurídico, e de todas as construções ideológicas.
Acredita a ilustre autora da obra intitulada "Prova ilícita" ,da Editora Saraiva que a proporcionalidade se aplica, sobretudo ao direito constitucional posto que os limites formais do Estado são dados pela lei, e os materiais são fixados pelo critério de proporção entre a restrição a liberdade individual e o fim estatal perseguido, correspondendo ao bem-estar coletivo.
Segundo Larenz, a existência do princípio da proporcionalidade não depende da formulação textual na Constituição. E sua aplicabilidade dependerá dos tribunais.
É o caso da Carta Magna brasileira de 1988, com o disposto do § 2o. do art. 5o. firmando o princípio da proporcionalidade pois "os direitos e garantias expressos constitucionalmente não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados."
A garantia de inadmissibilidade da prova ilícita no processo não pode prevalecer quando exclui outros direitos e garantias constitucionais ou da Constituição derivados.
É inegável que a inadmissibilidade de provas ilícitas no processo é a regra a ser obedecido pelo Estado (em particular o Estado de Direito) mas atividades investigatória e persecutória.
Porém, para a devida classificação das provas em lícitas ou ilícitas, é curial a análise formada quanto ao modo de produção das provas associado a um exame de conteúdo material colhido a fim de, utilizando-se do princípio da proporcionalidade, decidir-se pela admissibilidade ou não da prova.
Deverá ser feita uma análise sistêmica, enxergando ao texto constitucional de forma unitária e harmônica e visando a promoção da justiça, a erradicação da miséria e da marginalização, de todos os direitos fundamentais e do princípio do Estado de Direito.
A hierarquia lógica dos valores tutelados indicará que nenhum direito pode ser considerado absoluto.
Gisele Leite
professoragiseleleite[arroba]yahoo.com.br
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