Neste artigo se apresenta o perfil da demanda - composta por mulheres e homens - a uma delegacia de polícia de uma cidade do interior do Rio de Janeiro, tendo como queixa, lesões, traumas e outras expressões de violência conjugal. Os dados para o estudo foram colhidos dos registros de ocorrência da Delegacia de Mendes (RJ), realizados no período de 1997 a 2001, retirados do acervo da delegacia (DEAC- Delegacia Especial de Acervo Cartorário). Os resultados demonstram que a violência contra mulher é um problema grave na cidade1, pois, no período estudado, do total de 1000 casos de crimes e infrações registrados na delegacia, 40% aproximadamente se deveram a violência contra a mulher e 20%, especificamente de violência conjugal.
Neste estudo, os dados estatísticos sobre o fenômeno foram cruzados e confrontados com falas de homens e mulheres atendidos no balcão da delegacia de Mendes que é hoje, institucionalmente uma Delegacia Legal. No Estado do Rio de Janeiro, o termo delegacia legal passou a designar um programa de modernização do processo de trabalho da Polícia Civil, incluindo-se aí novas rotinas de todas as atividades de atendimento, desde a recepção até o acompanhamento dos cidadãos, assim como novas instalações e equipamentos e atualização da formação dos policiais2.
A importância da pesquisa que deu origem ao artigo e que se soma à contribuição oferecida por alguns outros que analisam as notificações policiais sobre violência conjugal, é o fato dele focalizar a situação numa localidade interiorana, quando, a totalidade das análises existentes se concentra sobre capitais ou grandes cidades. Esse é o caso, por exemplo, de estudos do ISER3 realizados em delegacias tanto distritais como especializadas em atendimento a mulheres (DEAM) do Rio de Janeiro. Tais trabalhos mostram que as denuncias cresceram 68,1% no período de 1991 a 1999. Assinalam também um aumento de notificações de ameaças, estupros e lesões corporais dolosas, da ordem de 256,6%, 65% e 35%, respectivamente.
Além de tornar visível o problema da violência entre casais no interior do Estado do Rio de Janeiro, o presente artigo tem o objetivo sugerir para onde as políticas públicas devem dirigir sua atenção, criando uma estrutura regional de atendimento e encaminhamento dos casos.
Entende-se que pela sua marca cultural secular de supremacia do homem sobre a mulher, mesmo em comunidades consideradas pacíficas e sem ocorrências graves de delitos criminosos, a violência conjugal ocorre e se esconde atrás das cortinas da vida privada. Sua mera existência, como mostra Boulding4 alimenta e incrementa a violência social em geral.
Neste artigo apresenta-se (1) uma análise do conceito de violência conjugal que faz parte do mesmo campo semântico de violência de gênero e de violência intrafamiliar, no entanto, tem seu nicho de expressão particular; (2) uma contextualização do campo empírico do estudo; e (3) resultados e análises do trabalho empírico.
O estudo que dá origem ao artigo ocorreu na DEAC - Delegacia Especial de Acervo Cartorário - de Mendes, através dos registros de ocorrências nela arquivados. Esses acervos foram criados a partir da inauguração das Delegacias Legais. Todos os registros anteriores à implementação desse programa foram arquivados nesse acervo e as novas delegacias começaram a partir do zero, buscando agilizar os registros atuais e futuros e resolver os pendentes.
As informações foram colhidas por meio de um questionário aplicado à leitura de dados específicos da vítima e do agressor, retirando-se as informações dos registros de ocorrência. Depois foram transferidos para o Programa Excel e transformados em dados estatísticos descritivos da situação, para posterior análise.
O instrumento de coleta incluiu as seguintes informações: nº do atendimento, mês e ano do atendimento, profissão, estado civil, escolaridade, sexo e idade. As falas dos casais que apresentaram queixas no balcão de atendimento e que são aqui analisadas fazem parte de um acervo criado pela primeira autora deste artigo, então Técnica de Atendimento Social na Delegacia Legal de Mendes. Portanto, na configuração do perfil, além das informações quantitativas, foram levados em conta os motivos de suas queixas. Depois de realizados os registros de ocorrência, as mulheres e homens que aceitaram fazê-lo, aceitaram dar entrevistas mais longas, explicativas e aprofundadas. Na análise qualitativa foi dada ênfase aos fatores culturais legitimadores de comportamento violento. Os casos selecionados, analisados, contextualizados e cujos fragmentos foram relatados no presente artigo, demonstram a influência da cultura na produção da violência. Para uso desse material, a autora solicitou dos participantes a assinatura de um Termo de Consentimento Livre.
A maior dificuldade encontrada no trabalho foi a ausência de informações importantes para traçar o perfil dos casais, motivada pelo mau preenchimento dos dados de ocorrência tanto da vítima como do agressor. Mesmo assim, o acervo permite conclusões importantes. Do total de 1000 registros realizados pela delegacia de Mendes no período de 1997 a 2001, aproximadamente 40% se devem à violência de gênero e 20%, à violência conjugal. Isso ressalta, de um lado, que na cidade ocorrem poucos crimes letais em comparação com a capital e, de outro, que a violência interpessoal e no âmbito familiar prepondera e é relevante.
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