Peter Pan, uma leitura inglesa no sítio do Picapau Amarelo



  1. A personagem presa no livro inglês
  2. Peter Pan lido pelas personagens do Sítio
  3. De Neverland para o Sítio
  4. Concluindo

Entre as obras infantis de Monteiro Lobato, abordamos a adaptação lobatiana da obra Peter Pan, de James Barrie. A obra estudada apresenta-se como uma história contada dentro de outra história, ou seja, uma história contada por Dona Benta a seus netos e demais personagens do Sítio do Picapau Amarelo, em vários serões domésticos.

O Peter Pan lobatiano pode ser considerado uma adaptação, em primeiro lugar por não ter a pretensão de ser uma tradução literal. Pelo contrário, objetiva modificar a história, mantendo o enredo, porém contando-o de forma resumida. A isso é somado ainda o fato de a história ser introduzida através da fala de uma personagem.

Destacaremos a maneira como a história é contada, ou seja, como a narradora (e por trás dela o autor) traz uma narrativa da cultura européia, escrita em língua estrangeira, para um espaço brasileiro. Desse modo, damos destaque à forma como a narradora adapta a história em função de seus ouvintes, facilitando a recepção e tornando a leitura agradável a eles.

É importante ressaltar que, por trás das alterações feitas no texto original, há o objetivo de facilitar sua apreensão pelo leitor infantil brasileiro, e a criação de um serão doméstico seria uma forma de fazê-lo. Temos no serão do Sítio a avó, leitora culta, que transmite histórias a seus netos, dando a eles a liberdade para não só ouvir como também discutir e emitir opiniões sobre aquilo que ouvem.

Sendo assim, apresentaremos a relação entre o texto inglês, sua narração por Dona Benta e sua recepção pelas crianças do Sítio, o que pode ser visto como um diálogo entre um texto estrangeiro e um contexto nacional.

1. A personagem presa no livro inglês

A obra Peter Pan, de Monteiro Lobato, inicia-se com um narrador de terceira pessoa, que apresenta ao leitor o espaço do Sítio do Picapau. Esse narrador apresenta ao ouvinte a sala de Dona Benta, onde as crianças, tendo ouvido falar de Peter Pan em Reinações de Narizinho, perguntam à avó quem é tal personagem. Nesse momento a avó mostra-se ignorante sobre o fato e precisa recorrer a um livro.

Escreveu a uma livraria de São Paulo pedindo que lhe mandasse a história do tal Peter Pan. Dias depois recebeu um lindo livro em inglês, cheio de gravuras coloridas (...) O título dessa obra era Peter Pan and Wendy.

Dona Benta leu o livro inteirinho e depois disse:

Pronto! Já sei quem é o senhor Peter Pan, e sei melhor do que o gato Félix, pois duvido que ele haja lido esse livro. 2

Dona Benta, enquanto leitora culta e conhecedora de outra língua, consegue acesso à obra estrangeira "escrevendo a uma livraria de São Paulo. O autor, ao mostrar como a personagem tem acesso ao livro, não deixa de sugerir a importância da livraria para a aquisição da obra e da leitura como fonte para a história que seria depois transmitida oralmente. Assim, depois de ler o texto em inglês, Dona Benta o traduz não apenas para o português, mas para uma linguagem simplificada e oralizada, mais compreensível às personagens do Sítio e às crianças brasileiras.

Em "O irmão do Pinóquio"3 , dá-se, com relação à obra Pinóquio, de Collodi, um processo semelhante ao ocorrido em relação a Peter Pan. Dona Benta adquire o livro, e, depois de lê-lo, conta a história aos demais.

Ainda na mesma história, as personagens do Sítio tentam criar uma réplica da personagem de Collodi, que seria um Pinóquio lobatiano – a quem batizariam como João Faz-de-Conta. Desse modo, pela semelhança de processos e pelo fato de a personagem mencionar Peter Pan, poderíamos pensar no Pinóquio lobatiano como um condutor, por cuja mão é trazida a personagem de J. Barrie.

Em ambas as obras, explicita-se a importância do livro4, o mesmo ocorrendo em Hans Staden (1927), História do mundo para crianças (1933) e em Don Quixote das crianças (1936)5.

Sendo assim, podemos perceber na obra infantil lobatiana, mesmo ao serem apresentadas situações de oralidade, não deixa de ser ressaltada a importância do livro como princípio da cultura e fonte das histórias narradas por Dona Benta. Quando ela transmite as histórias, sua narrativa sofre mudanças em função de sua leitura do texto, do horizonte de expectativas de sua platéia e da relação entre narradora e ouvintes no momento em que conta a história ao grupo.


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