A relação entre o espaço e a saúde bucal coletiva



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. A relação entre o espaço e a saúde e a construção social destes dois elementos
  4. A saúde bucal e a sua expressão espacial
  5. Análise espacial em saúde bucal: a epidemiologia georreferenciada
  6. Considerações finais
  7. Referências

Por uma epidemiologia georreferenciada

RESUMO

A importância do meio-ambiente sobre a saúde das pessoas é uma preocupação antiga do ser humano. Dos textos hipocráticos aos dias de hoje, o conceito de espaço permitiu e permite diferentes representações e formas de apreensão. Superando a concepção natural do espaço apenas como um ambiente inerte e passivo, a visão de um espaço geográfico socialmente construído, tanto como um receptor dos processos sociais quanto como o próprio ativador destes processos, torna-se cada vez mais relevante na compreensão dos fenômenos envolvidos no processo saúde-doença. Neste sentido, a epidemiologia se apresenta como um referencial privilegiado na articulação entre os elementos lugar-tempo-pessoas. Este ensaio reflexivo busca explorar as relações estabelecidas entre o espaço (social e geográfico) e a Saúde Bucal Coletiva, destacando o papel do território na reprodução das iniqüidades em saúde e a necessidade do desenvolvimento de pesquisas que abordem o espaço como elemento constitutivo do processo saúde-doença bucal. Aproximando-se do que poderia ser chamado de uma epidemiologia georreferenciada, a expressão espacial dos eventos de saúde-doença bucal e dos atores envolvidos neste processo fortalece a importância do território (e suas várias significações) para a Saúde Bucal Coletiva.

Palavras-chave: Saúde Bucal, Epidemiologia, Sistemas de Informação Geográfica

The relation between space and collective oral health: for a georeferenced epidemiology

ABSTRACT

The influence of the environment on health is an ancient human concern. From the Hippocratic texts to today, the concept of space permitted and still permits different representations and forms of perception. Overcoming the natural conception of space as only an inert and passive environment, the idea of a socially constructed geographic space, both as a receiver of social processes as much as being its own activator in these processes, becomes ever more relevant in the comprehension of phenomena involved in the health-disease process. In this sense, epidemiology is presented as a privileged reference point in the articulation of place-time-people elements. This reflexive investigation seeks to explore the relations established between space (social and geographical) and Collective Oral Health, emphasizing the role of territory in the reproduction of iniquities in health and the necessity of developing studies that approach space as a constitutive element in the oral health-disease process. In what could be termed a georeferenced epidemiology, the spatial expression of events of oral health-disease and of the actors involved in this process strengthens the importance of territory (and its various significations) to Collective Oral Health.

Key words: Oral Health, Epidemiology, Geographic Information Systems

Introdução

A influência do meio ambiente sobre as condições de saúde das pessoas é uma preocupação antiga do ser humano. Ainda no século V a.C., Hipócrates já defendia a importância do espaço como o lócus de ocorrência das doenças em sua obra, pioneira neste aspecto, Dos ares, dos mares e dos lugares1.

Séculos depois, o médico britânico John Snow iniciava um importante passo na compreensão de como a distribuição de eventos de saúde-doença no espaço poderia fornecer hipótese etiológica para a sua ocorrência. Pelo uso sistematizado de uma metodologia científica e com a realização de uma investigação epidemiológica, Snow contribuiu para o fim da epidemia de cólera na cidade de Londres, em 1854, por meio da associação espacial entre mortes por cólera e o fornecimento de água em diferentes bombas de abastecimento público2.

Apesar de a epidemiologia ainda ser uma ciência relativamente nova, ela possui um conjunto próprio de metodologias de investigação em saúde. Notadamente após a Segunda Grande Guerra, vários estudos epidemiológicos passaram a exercer grande influência na saúde das populações. Como exemplo, os ensaios comunitários de suplementação de flúor nas águas de abastecimento público, que se iniciaram durante a década de 1940, difundindo uma forma de prevenção primária da cárie3. A identificação de regiões com diferentes concentrações de flúor presente naturalmente na água tem mostrado repercussões sobre a prevalência e severidade de cárie dentária, evidenciando a influência ambiental sobre a saúde bucal da população.

A distância secular presente nos estudos acima mencionados é reduzida pela importância que eles atribuíram ao espaço como um fator determinante para a ocorrência de eventos de saúde ou doença. Nesta perspectiva, o meio ambiente deixou de ser apenas um pano de fundo ou um simples cenário onde seus protagonistas (população) adoeciam para se transformar em ator atuante nesse processo, ou seja, um agente com poder de provocar mudanças significativas nos perfis de morbimortalidade de uma sociedade.

A evolução da própria Epidemiologia, revelando um potencial epistemológico e metodológico para se postular como Ciência da Saúde4, e o reconhecimento de uma necessidade de se buscar transformações estruturais que desequilibrem o sistema desencadeante das iniqüidades, ao invés de apenas propor medidas corretivas biológico-ecológicas5, reforçam a validade de uma estratégia conceitual e metodológica que tenha como perspectiva a abordagem do espaço geográfico-social entendido como expressão das condições de vida da população6.

Sob esta perspectiva, a Saúde Bucal Coletiva, dentro dos limites de uma reflexão que a considere um novo paradigma, mas reconhecida como um campo aberto ao debate não-dogmático e não-normativo7, poderá encontrar na espacialização do processo saúde-doença bucal uma relação entre ocorrências e determinantes, adotando a epidemiologia como referencial privilegiado no estudo desta relação.


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