Órgãos internos e trato gastrintestinal de novilhos de gerações avançadas do cruzamento rotativo entre as raças Charolês e Nelore terminados em confinamento
Foram avaliados os efeitos de heterose e de grupo genético nos órgãos internos e no trato gastrintestinal de novilhos puros (Charolês - C e Nelore - N) e cruzados da segunda (G2) (3/4C 1/4N e 3/4N 1/4C), terceira (G3) (5/8C 3/8N e 5/8N 3/8C) e quarta (G4) (11/16C 5/16N e 11/16N 5/16C) gerações de cruzamento terminados em confinamento e abatidos com 23 meses de idade. Os animais cruzados da G2, G3 e G4 foram, respectivamente, 14,95; 17,25 e 18,46% superiores aos puros quanto ao peso de corpo vazio (PCVZ). A heterose para o rendimento de carcaça fria em relação ao PCVZ (RCFCVZ) foi positiva em todas as gerações. Os mestiços apresentaram menor peso relativo (ao PCVZ) de coração, pulmões e rins, de modo que a heterose foi significativa para peso de coração (-18,29%) e rins (-14,29%) na G3 e para pulmões (-13,45%) na G4. Novilhos mestiços apresentaram valores inferiores à média dos puros para todos os componentes do trato gastrintestinal quando o peso destes componentes foi expresso em relação a 100 kg de PCVZ ou de peso vivo ao abate (PVA), com exceção do rúmen na G2.
A heterose retida foi positiva e significativa para PCVZ, RCFCVZ e para peso absoluto do fígado. Entretanto, foi negativa para a quantidade de sangue para os pesos de coração, intestino delgado + grosso e trato gastrintestinal quando expressos em relação a 100 kg de PCVZ e de PVA. Entre os animais puros, os novilhos Nelore tiveram maior RCFCVZ (57,09 vs 61,64%). O peso absoluto de rúmen, abomaso, intestino delgado + grosso e o trato gastrintestinal foram maiores nos novilhos Charolês em relação aos Nelore, o que também foi observado quando estes componentes foram expressos em relação ao PCVZ e PVA, com exceção para o intestino grosso + delgado. Estas diferenças explicam, em parte, o maior rendimento de carcaça dos novilhos Nelore.
Palavras-chave: Bos indicus, Bos taurus, cruzamento, heterose, peso de corpo vazio
Os grupos genéticos bovinos encontrados no Brasil, especialmente na Região Sul, são muito variados, pois muitos criadores ainda escolhem as raças pela preferência pessoal, ou por modismo, em detrimento da escolha pela produtividade. Para escolha da raça mais produtiva para cada situação, o entendimento e domínio de vários aspectos como desempenho, composição de carcaça e exigências nutricionais são fundamentais. As diferenças genéticas são representadas pela variação do rendimento de carcaça e dos requerimentos nutricionais. Esta variação se deve, principalmente, às diferenças nos fatores relacionados às características das partes do corpo não-integrantes da carcaça.
Diferenças nos requerimentos, principalmente energéticos, estão associadas a variações nas atividades metabólicas dos órgãos, entre os quais, segundo Smith & Baldwin (1973), o coração, o fígado e o trato gastrintestinal são os de maior atividade. Os tecidos viscerais consomem aproximadamente 50% da energia de mantença, enquanto os músculos gastam 23% (Caton & Dhuyvetter, 1997), diferença atribuída por Owens et al. (1993) ao maior tunorver protéico dos órgãos relacionados à digestão quando comparados ao músculo esquelético. Vários pesquisadores (Lunt et al., 1986; Solis et al., 1988) demonstraram que o peso do trato gastrintestinal e dos órgãos internos de animais zebuínos em relação aos taurinos e mestiços é menor, o que justifica a mais baixa exigência de mantença de animais zebuínos (NRC, 1996).
O rendimento de carcaça é uma característica muito importante para o sistema de produção nos últimos anos. Inicialmente, os bovinos eram comercializados com base no peso vivo, mas, gradativamente, a comercialização passou a ser feita com base no peso de carcaça. Restle et al. (1999) observaram que a introdução de animais Nelore nos cruzamentos aumentou linearmente o rendimento de carcaça. Esse maior rendimento de carcaça dos animais zebuínos pode ser atribuído aos menores pesos relativos das patas e do trato gastrintestinal dos animais deste genótipo (Peron et al., 1993a).
Além de influenciar as exigências energéticas dos animais e afetar o rendimento de carcaça, os componentes não-integrantes da carcaça são importante fonte de receita para os frigoríficos que os comercializam tanto no mercado interno quanto no externo (Restle et al., 2005).
Diferenças nos pesos dos órgãos vitais, do sangue e do trato gastrintestinal em animais mestiços segundo a predominância taurina ou zebuína no genótipo são relatadas por Pacheco et al. (2005), em novilhos, e por Kuss et al. (2007), em vacas de descarte.
Neste experimento, objetivou-se avaliar o desenvolvimento dos órgãos internos de novilhos terminados em confinamento, puros e da segunda, terceira e quarta gerações do cruzamento rotativo entre as raças Charolês e Nelore.
O trabalho foi realizado no Setor de Bovinocultura de Corte do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Comparou-se o efeito da composição racial e da heterose no desenvolvimento dos órgãos internos de novilhos puros Charolês (C) e Nelore (N) e mestiços da segunda (G2) (3/4C 1/4N e 3/4N 1/4C), terceira (G3) (5/8C 3/8N e 5/8N 3/8C) e quarta (G4) (11/16C 5/16N e 11/16N 5/16C) gerações de cruzamento. A heterose considerada neste trabalho é a total, decorrente da heterozigose individual e materna.
Foram utilizados 57 novilhos tomados ao acaso da fazenda experimental da UFSM, nascidos na mesma época de parição e mantidos sempre sob as mesmas condições de manejo e alimentação. Os novilhos foram gerados por fêmeas puras e mestiças inseminadas com sêmen de seis touros de cada raça (Charolês e Nelore). Quatro touros de cada raça foram utilizados para repasse na monta a campo. Os touros Charolês que originaram os novilhos Charolês foram os mesmos que deram origem aos novilhos 3/4C 1/4N, 5/8C 3/8N e 11/16C 5/16N, assim como os touros Nelore que geraram os novilhos Nelore foram os mesmos que geraram os novilhos 3/4N 1/4C, 5/8N 3/8C e 11/16N 5/16C.
Ao início do período de terminação em confinamento, os animais apresentavam, em média, 20 meses de idade e 304 kg. O período total de confinamento teve duração de 97 dias, sendo que os primeiros 14 dias de confinamento foram destinados à adaptação ao confinamento e à dieta. A dieta, igual para todos os animais, foi calculada para proporcionar GMD de 1,2 kg (NRC, 1996) e apresentava 12,32% de PB, 2,96 Mcal de ED e 58,30% de FDN. O volumoso, representando 52% da MS total, foi constituído de silagem de milho (AG 5011). O concentrado foi composto de 93,97% de farelo de trigo, 1,5% de uréia, 3,62% de calcário calcítico, 0,9% de sal e, ainda, monensina sódica em dose recomendada pelo fabricante.
Depois de 97 dias de confinamento, os animais foram pesados após jejum de sólidos de 14 horas e embarcados para um frigorífico comercial. O abate foi realizado logo na chegada, conforme o fluxo normal do estabelecimento. Foram tomados os pesos de cabeça, patas, sangue, couro, vassoura da cauda, retículo-rúmen, omaso, abomaso, intestino delgado, intestino grosso, coração, rins, fígado, pulmões, baço e gorduras internas (inguinal, renal, ruminal e de toalete). O peso de carcaça mais o somatório de todos esses componentes resultou no peso de corpo vazio.
As vísceras foram pesadas cheias e lavadas em água corrente para determinação do peso do conteúdo do trato gastrintestinal.
O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, com número diferenciado de repetições por grupo genético: seis repetições para os grupos C, 3/4C 1/4N e 11/16N 5/16C; nove para os grupos 3/4N 1/4C e 11/16C 5/16N; 12 para o grupo 5/8C 3/8N; e 15 para os grupos N e 5/8N 3/8C).
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