RESUMO: Quatro garrotes Jersey (J) (Bos taurus) e quatro Gir (G) (Bos indicus), providos de cânula ruminal, foram utilizados para comparar a susceptibilidade à acidose láctica ruminal (ALR) aguda. Para a uniformização da microbiota ruminal, os animais receberam uma alimentação padronizada por dois meses antes da indução da ALR. Esta foi realizada com o uso de sacarose administrada diretamente no rúmen, de acordo com peso metabólico corrigido. Amostras de suco ruminal e fezes foram colhidas no decorrer de 24 horas após a indução. Em ambas as amostras, foram determinados o pH e as concentrações de ácido láctico total e dos seus isômeros D e L. Ambas as raças apresentaram marcante e idêntica acidose ruminal, não ocorrendo diferenças no pH e nas concentrações de ácido láctico total, L e D no suco ruminal e nas fezes. Quanto maior foi a concentração de ácido láctico total nas fezes menores foram os valores de pH fecal (r = - 0,65). Devido à grande queda no pH fecal, sugere-se que esse pode ser utilizado para se firmar o diagnóstico de ALR.
Palavras-chave: bovinos, raças, susceptibilidade, acidose láctica, rúmen, fezes.
SUMMARY. To compare the susceptibility to acute rumen lactic acidosis (RLA) four Jersey (J) (Bos taurus) and four Gir (G) (Bos indicus) rumen-cannulated steers were used. In order to standardise the rumen microbiota, the steers were fed a standard diet of hay and concentrates, for two months before the beginning of the induction. The RLA was induced with sucrose administered intraruminally, on a basis of the corrected metabolic weight. Rumen fluid and faecal samples were collected throughout 24h after the induction. The pH and the concentration of total lactic acid and its L and D isomers were determined in all samples. Both breeds developed intense rumen acidosis; similar pH and concentration of total lactic acid and its isomers were found in the rumen fluid and faecal samples. The higher the total lactic acid concentration in the faeces, the lower the faecal pH (r = - 0.65). The faecal pH can be used as a tool to diagnosis RLA.
Key words: cattle, breeds, susceptibility, lactic acidosis, rumen, faeces.
A acidose láctica ruminal (ALR) é uma doença metabólica de evolução aguda ou crônica, causada pela ingestão exagerada de alimentos hiperglucídeos, os quais, fermentados no rúmen, produzem grandes quantidades de ácido láctico, provocando inicialmente acidose ruminal e atonia neste órgão, seguida de acidose sistêmica, desidratação, prostração, coma e, freqüentemente, morte (ORTOLANI, 1979). O ácido láctico gerado no rúmen pode ser tanto levógiro (L), como dextrógiro (D), variando suas concentrações neste órgão de acordo com o pH, tempo de fermentação assim como quantidade e tipo de carboidrato ingerido (DUNLOP, 1972).
A enfermidade é mais freqüente em bovinos mantidos em sistemas de confinamento e alimentados com dietas hiperglucídicas (DUNLOP, 1972). No Brasil, foram confinados no ano 2000 cerca de 1,5 milhão de cabeças, das quais 90% são de raças zebuínas ou azebuadas (MARUTA, 2000).
Apenas dois trabalhos compararam a susceptibilidade de taurinos e zebuínos à ALR. Em ambos os casos, os zebuínos demonstraram-se mais sensíveis à enfermidade. No primeiro deles, TAYLOR et al., (1969) realizaram um experimento com bovinos das raças Brahman e Hereford, alimentados exclusivamente com forragem. Uma solução de ácido láctico foi introduzida no rúmen desses animais, até que o pH do conteúdo atingisse o valor de 3,9. Os autores não especificaram a quantidade de ácido láctico administrado. Maior concentração de ácido láctico foi detectada na corrente circulatória dos zebuínos. Segundo PHILLIPS et al., (1960), zebuínos ingerem maiores quantidades de forragem, em relação ao peso vivo, que os taurinos. Quanto maior é a ingestão de forragem, maior é o tempo devotado à ruminação, e conseqüentemente maiores são a produção de saliva e a capacidade tamponante no conteúdo ruminal (BAILEY, 1961). Assim, é possível que os zebuínos utilizados por TAYLOR et al., (1969) tenham recebido uma quantidade muito superior de ácido láctico que os taurinos, pois a capacidade tamponante do conteúdo ruminal seria maior no primeiro grupo.
No segundo trabalho, BRAWNER et al., (1969) utilizaram bovinos das mesmas raças, acima descritas, submetendo-os a uma mudança brusca de alimentação de forragens para concentrados. Em seguida, acompanharam a evolução do pH e das concentrações de ácido láctico no suco ruminal e no sangue. Os autores não citaram nem a quantidade de alimento ingerido, nem o menor valor de pH do suco ruminal atingido por cada uma das raças. Concluíram que a absorção de ácido láctico é mais alta e rápida nos zebuínos, o que gerou um quadro clínico mais severo (letargia, diarréia, laminite, etc). HENTGES (1970) citando dados, não publicados, do experimento de BRAWNER et al., (1969) afirmou que a concentração de ácido láctico no suco ruminal, produzido durante a ALR, foi bem superior nos animais da raça Brahman, comparado aos Hereford.
O objetivo deste primeiro trabalho, dentro de uma série, é a comparação do grau de acidose ruminal, da geração de ácidos no rúmen e da excreção fecal dos mesmos em bovinos da raça Jersey (Bos taurus) e da raça Gir (Bos indicus), submetidos à ALR, induzida experimentalmente.
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