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Modelos linear e não linear em análises genéticas para sobrevivência de crias de ovinos da raça Sant (página 2)

Wandrick Hauss de Sousa

Material e métodos

Neste estudo foram utilizados registros de sobrevivência de 3846 crias, progênies de 114 reprodutores, obtidos de três rebanhos experimentais de ovinos da raça Santa Inês, pertencentes às unidades do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA) da Embrapa, situados na região Nordeste do Brasil, no período de 1986 a 1995.

As crias permaneciam em abrigos apropriados nos primeiros dias de vida até adquirirem habilidade para acompanhar as mães ao pasto. As crias recém-nascidas tinham o umbigo cortado e tratado com solução de tintura de iodo a 10%, eram identificadas individualmente pela genealogia, data e tipo de nascimento (simples e duplo), sexo e peso ao nascer e, subseqüentemente, eram pesadas a cada 28 dias. A desmama e a separação por sexo ocorriam por volta dos 112 dias de idade.

A sobrevivência foi codificada como 1 se a cria sobrevivesse até o desmame e como 0, em caso contrário. Taxa de sobrevivência até o desmame e distribuição dos dados por rebanho, idade da mãe, combinação tipo de nascimento-criação e sexo são apresentados na Tab. 1. As classes da combinação tipo de nascimento-criação (TNC) foram: tipo de nascimento simples, criado como simples [1-1], tipo de nascimento duplo, criado como duplo [2-2] e tipo de nascimento duplo criado como simples [2-1]. A classe tipo de nascimento-criação foi estabelecida mediante o seguinte critério: crias nascidas de partos duplos que sobreviveram até 56 dias de idade tinham seu tipo de nascimento mantido. Caso contrário, mudava-se o tipo de nascimento.

 Inicialmente, aplicou-se uma análise pelo método dos quadrados mínimos, utilizando-se o procedimento GLM do SAS (1988), para determinar os efeitos fixos e aleatórios que seriam incluídos no modelo final. Com base nessas análises iniciais, observou-se que as fontes de variação que afetavam significativamente a sobrevivência foram: rebanho-ano-estação, sexo, combinação tipo de nascimento-criação, idade da ovelha ao parto e a covariável peso da cria ao nascer. Na Tab. 2, apresenta-se sumário da estatística dos dados e da variável estudada.

Os dados foram analisados sob dois enfoques: o primeiro ignorava a natureza discreta da variável e as análises procederam utilizando-se a metodologia de modelos lineares, no caso, equações do modelo misto; o segundo pressupunha que os dados seguiam uma escala contínua hipotética, invocando o conceito de limiar. Neste caso, o procedimento utilizado foi o proposto por Gianola & Foulley (1983).

O modelo linear utilizado foi o modelo de reprodutor, que incluiu os seguintes efeitos fixos e aleatórios:

Yijklmnp = m + hysi + r j + ik + sl + tm + pn + eijklmnp,

em que:
Yijklmnp = observação individual;
m = efeito comum para todas as observações;
hysi = efeito aleatório de rebanho-ano-estação, ~ N (0, I
s2 hys);
rj = efeito aleatório do reprodutor, ~ N (0, I
s2r);
ik = efeito fixo da idade da ovelha ao parto;
sl = efeito fixo do sexo da cria;
tm = efeito fixo da combinação tipo de nascimento-criação;
pn = efeito fixo do peso da cria ao nascer;
eijklmnp = efeito residual aleatório, ~ N (0, I
s2e),

em que:
s
2r é a variância de reprodutor,
s2hys é a variância do efeito rebanho-ano-estação, s2e é a variância residual.

Segundo Misztal et al. (1989), um problema peculiar ao modelo de limiar ocorre quando todas as observações de um dado efeito fixo caem em uma categoria extrema. Para superar este problema Harville & Mee (1984) sugeriram tratar este efeito como aleatório, ou eliminar as observações causadoras desses problemas.

Neste trabalho, para não remover aquelas sub-classes de rebanho-ano-estação com problemas nas categorias extremas, optou-se por tratar rebanho-ano-estação como aleatório.

A estrutura dos dados de parentesco não permitiu o estudo do modelo reprodutor-avô materno, que permitiria a inclusão do efeito materno. Assim, só foi estudado o modelo reprodutor.

A representação geral deste modelo na forma matricial é dada por:

Y = Xb + Z1hys+ Z2 r + e

em que:
Y é o vetor das observações (sobrevivência), X, Z1 e Z2 são matrizes de incidência relacionando os efeitos fixos (idade da ovelha ao parto, sexo da cria, tipo de nascimento-criação, peso da cria ao nascer) e aleatórios (rebanho-ano-estação e reprodutor), respectivamente, às observações.

O modelo não linear utilizado foi o modelo de reprodutor, que incluiu os mesmos efeitos fixos e aleatórios do modelo linear, utilizando a metodologia proposta por Gianola & Foulley (1983). Esse modelo usa o conceito de limiar (Dempster & Lerner, 1950; Falconer, 1965) que pressupõe estarem as respostas relacionadas a uma variável normal subjacente, usualmente chamada "liability" (predisposição) e a um conjunto de limiares fixos que divide a linha real em m intervalos correspondentes às categorias de resposta.

Segundo Gianola & Foulley (1983), pressupõe-se que os dados são organizados numa tabela s x m, onde as "s" linhas representam combinações de variáveis explanatórias e as "m" colunas indicam categorias de resposta.

Os componentes de variância para o modelo linear foram obtidos pelo método da Máxima Verossimilhança Restrita (REML), e para o modelo não linear, por uma aproximação da máxima verossimilhança marginal (MML), ambos pelo programa computacional CMMAT2, proposto por Misztal (1989)

Neste programa é empregado um esquema iterativo, sendo o critério de convergência dado pela diferença entre o valor do componente de variância em duas rodadas consecutivas. A convergência foi considerada satisfatória quando esta diferença foi menor do que 10-9 .

Os estimadores de herdabilidade para os dois modelos foram obtidos por meio da expressão:

 

Para o modelo de limiar, a variância do erro foi estabelecida igual à unidade e os componentes de variâncias foram expressos em valores relativos ao componente do erro.

Resultados e discussão

Essa comparação seria mais adequada se fosse expressa em termos de variância residual, pois diferentes escalas foram assumidas para os dois modelos, isto é, a variância residual do modelo de limiar foi estabelecida igual à unidade (s2e =1).

A estimativa de herdabilidade para sobrevivência obtida pelo modelo de limiar foi de 0,29, e pelo modelo linear, de 0,14. Segundo Matos et al. (1997), o modelo de limiar, pelo menos teoricamente, parece mais apropriado para dados discretos, por apreender uma maior porção da variação genética do que é possível com a metodologia linear, e apresenta vantagem sobre a metodologia linear nos programas de melhoramento. Essa vantagem aumenta quando a herdabilidade da característica decresce.

As estimativas de herdabilidade encontradas neste trabalho estão dentro dos limites encontrados na literatura. Gama et al. (1991), utilizando o método da correlação entre meio-irmãos paternos em várias raças, relataram estimativas de herdabilidade para sobrevivência até à desmama, que variaram de 0,05 a 0,35. Peterson & Danell (1985) também obtiveram estimativas de herdabilidade para essa característica, em diferentes raças, que variaram de 0,04 a 0,19 na escala visível, e de 0,11 a 0,54, na escala normal subjacente. Matos et al. (1994), aplicando procedimentos linear e não-linear, com o modelo reprodutor avô materno, obtiveram estimativas de herdabilidade para efeito genético aditivo direto, que variaram de 0,03 a 0,06 para a raça Rambouillet, e de 0,09 a 0,17 para a raça Finnsheep, nas escalas visível e normal, respectivamente. Esses autores também obtiveram estimativas de herdabilidade devido aos efeitos maternos que variaram de 0,03 a 0,04 na raça Rambouillet e de 0,19 a 0,26, na raça Finnsheep, concluindo que estimativas de parâmetros genéticos para sobrevivência do nascimento à desmama deveriam incluir efeitos maternos.

A correlação de ordem de Spearman entre as soluções para os efeitos de reprodutores, com base nos modelos linear e não linear, foi de 0,96, indicando alta correspondência na classificação dos reprodutores, pelas duas metodologias. Este resultado está de acordo com aqueles que utilizaram similar comparações envolvendo análises de dados categóricos em ovinos (Olsen et al., 1994; Matos et al., 1997).

Conclusões

Pelos resultados obtidos pode-se concluir que: a estimativa de herdabilidade estimada pelo modelo de limiar foi duas vezes maior do que a obtida com o modelo linear; é possível obter por seleção ganho genético para sobrevivência com base nas estimativas obtidas; a classificação dos reprodutores praticamente não apresentou alteração quando se utilizou o modelo de limiar ou o modelo linear.

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W.H. Sousa1, C.S. Pereira2, F.L.R. Silva3
wandrick[arroba]emepa.org.br

1Pesquisador da EMEPA-PB. Rua Eurípedes Tavares, 210. 58013-290 Tambiá - PB
2Professora da UFMG - MG,
3
Pesquisador da EMBRAPA - CNPC

Artigo original: Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., Jun 1999, vol.51, no.3, p.287-292. ISSN 0102-0935



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