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Peso à cobrição e ganho de peso durante a gestação de cabras nativas, exóticas e mestiças no semi-ár (página 2)

Wandrick Hauss de Sousa

Steine (1975) relatou regressão significativa do tipo de parto sobre o peso do corpo da cabra ao parto. Cabras que pariram dois ou três cabritos foram 0,5 e 2,0 kg mais pesadas, respectivamente, que cabras de parto simples.

Silva et al. (1986), trabalhando com ovinos, verificaram que os pesos pré-cobrição (28,0 e 29,7 kg) e ao parto (31,4 e 31,6 kg) para partos simples e múltiplos, respectivamente, não tiveram efeito significativo sobre o peso corporal pós-parto das matrizes, e reportaram que a perda de peso após o parto está associada ao peso da cria, placenta e líquidos, ao peso corporal e à idade da ovelha.

A ordem de parto constitui um importante fator de ambiente. Os processos de crescimento corporal e de elevação do peso corporal, geralmente, ocorrem em função da idade, quando atendidas as necessidades nutricionais. Segundo Sampaio et al. (1984), cabras jovens gestantes não têm seu crescimento prejudicado. Pelo contrário, seu desenvolvimento é estimulado, principalmente, quando estão submetidas a planos nutricionais adequados (Argheore et al., 1992).

O presente trabalho foi conduzido com o objetivo de avaliar os efeitos de mês, ano, ordem de parto, tipo de parto e grupo genético sobre os pesos à cobrição e o ganho de peso durante a gestação de cabras nativas, exóticas e mestiças, criadas no semi-árido paraibano.

Material e Métodos

O trabalho foi desenvolvido na Estação Experimental de Pendência, pertencente à Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba (EMEPA-PB), Soledade - PB, na microrregião semi-árida do Cariri Ocidental, utilizando-se dados de pesos à cobrição e ganho de peso durante a gestação, respectivamente, de 753 e 527 cabras Canindés, pertencentes ao núcleo de preservação da raça; 463 e 333 Anglo-nubianas; 151 e 87 ½ Alpina ½ SRD; 92 e 73 ¾ Alpina ¼ SRD; e 374 e 296 Alpinas, no período de 1980 a 1994.

Os animais foram criados em regime semi-intensivo. Na estação chuvosa, a alimentação do rebanho foi constituída de pastagens nativas melhoradas com capim-buffel (Cenchrus ciliares L.), suplementação com concentrados para as lactantes e reprodutores e fornecimento de mistura mineral. Na época seca, além da pastagem, todos os animais receberam suplementação alimentar composta de capim-marrequinha (Howardia smilacina, Klotz), cunhã (Clitoria ternatea L.), leucena (Leucaena leucocephala), palma forrageira (Opuntia sp), silagem de milho, ração concentrada, mistura mineral, uréia e melaço.

Adotou-se o sistema de monta natural controlada, utilizando-se rufiões para detecção do cio. As estações de monta, geralmente, ocorreram nas épocas chuvosa (abril a junho) e seca (novembro a janeiro). Em alguns anos, as montas foram antecipadas ou retardadas, de acordo com a condição corporal das matrizes e a oferta de alimentos durante e após a gestação. As fêmeas jovens foram incorporadas ao rebanho de matrizes quando apresentaram peso igual ou superior a 65% da média de peso adulto das matrizes de cada grupo genético, contemporâneas do rebanho. O controle sanitário dos animais foi realizado por vacinações e combate aos endo e ectoparasitas. Os tratamentos contra querato-conjuntivite, linfadenite caseosa e do ectima contagioso foram adotados quando constatadas as ocorrências no rebanho.

O pequeno número de informações relativas às cabras com ordem de parto superior a cinco provocou sua exclusão das análises, em conseqüência do manejo reprodutivo adotado na Estação Experimental.

Para as análises, consideraram-se como fontes de variação os efeitos de mês e ano de cobrição, ordem de parição, tipo de parto e grupo genético.

Os pesos de machos e fêmeas dos rebanhos estudados eram mensurados a cada 28 dias. Realizaram-se, também, as pesagens das crias ao nascerem e das fêmeas logo após a cobertura e imediatamente após o parto, quando estas liberavam os envoltórios fetais. Estes restos placentários não foram mensurados.

O ganho de peso na gestação foi calculado a partir da diferença entre os pesos corporais registrados ao parto e ao acasalamento. Na seleção dos dados para o ganho de peso durante a gestação, consideraram-se os valores compreendidos no intervalo de - 8,0 a 8,0 kg, para maior consistência das análises. Na análise de peso à cobrição, por razões óbvias, não foi considerado o tipo de parto. As análises de variância foram feitas pelo método dos Quadrados Mínimos e os testes de comparação de médias, pelo teste Tukey, a 5% de probabilidade, com o auxílio computacional do programa SAEG – Sistema de Análises Estatísticas e Genéticas (UFV, 1992).

Para as características de peso à cobrição por grupo genético, foi utilizado o modelo I.

Yijk = m + MCi + ACj + OPk+ eijk

em que Yijk = peso médio à cobrição observado em cada cabra; m = média geral da população; MCi = efeito do i-ésimo mês de cobrição, sendo i = 1...6,11,12; ACj = efeito do j-ésimo ano de cobrição, sendo j = 1981...1994; OPk = efeito da k-ésima ordem de parto, sendo k = 1...5; eijk = erro aleatório associado a cada observação.

Para os pesos à cobrição entre grupo genético, utilizou-se o modelo II.

Yijkl = m + RCi + MCj + ACk + OPl+ eijkl

em que Yijkl = peso médio à cobrição observado em cada grupo genético; m = média geral da população; RCi = efeito da i-ésima grupo genético; MCj = efeito do j-ésimo mês de cobrição, sendo j = 1...7,9,11,12; ACk = efeito do k-ésimo ano de cobrição, sendo k = 1980...1992,1994; OPl = efeito da l-ésimo ordem de parto, sendo l = 1...5; eijkl = erro aleatório associado a cada observação.

Na avaliação do ganho de peso durante a gestação por grupo genético, foi utilizado o modelo III.

Yijkl = m + MCi + ACj + OPk + TPl + eijkl

em que Yijkl = ganho de peso observado por cada cabra; m = média geral da população; MPi = efeito do i-ésimo mês de cobrição, sendo i = 1...6,11,12; APj = efeito do j-ésimo ano de cobrição, sendo j = 1980...1992, 1994; OPk = efeito da k-ésima ordem de parto, sendo k = 1...5; TPl = efeito do l-ésimo tipo de parto, sendo l = 1 e 2; eijkl = erro aleatório associado a cada observação.

Para o ganho de peso durante a gestação entre os grupos genéticos, utilizou-se o modelo IV.

Yijklm = m + RCi + MCj + ACk + OPl + TPm + b( Xijklm - X) + eijklm

em que Yijklm = ganho de peso durante a gestação observado em cada grupo genético; m = média geral da população; RCi = efeito da i-ésimo grupo genético; MPj = efeito do j-ésimo mês de parto, sendo j = 2,4...12; APk = efeito do k-ésimo ano de parto, sendo k = 1980...1995; OPl = efeito da l-ésima ordem de parto, sendo l = 1... 5; TPm = efeito do m-ésimo tipo de parto, sendo m = 1 e 2; b = coeficiente de regressão linear do ganho de peso em função do peso à cobrição; Xijklm = peso observado em cada grupo genético; eijkl = erro aleatório associado a cada observação.

Resultados e Discussão

Observou-se influência (P<0,05) do mês sobre os pesos das matrizes. Os menores pesos à cobrição (Tabela 1) foram verificados nos meses de maior incidência de chuvas, fevereiro a abril, principalmente para as cabras Canindés, Anglo-nubianas, ½ A ½ SRD e ¾ A ¼ SRD, quando registrou-se 24,57; 37,06; 29,48 e 32,91 kg, respectivamente. Segundo Peter (1992), em condições de pastagem nativa da caatinga, os caprinos, por preferência alimentar, consomem maior quantidade de folhas de árvores, herbáceas e arbustos, em relação às gramíneas. Araújo Filho & Silva (1994) reportam que na caatinga a fitomassa pastável de espécies lenhosas que participam ativamente da composição da dieta dos caprinos é baixa e que, quando o valor nutritivo e a digestibilidade são elevados, grande parte da folhagem produzida está fora do alcance dos animais.

Segundo Quittet (1978), quando a cobrição ocorre nos meses considerados chuvosos, momento em que há disponibilidade forrageira, verifica-se redução do peso da cabra, como reflexo do seu baixo consumo sob condições de elevada umidade do ambiente e da forragem.

Os pesos à cobrição das cabras cobertas nos meses finais da estação seca (novembro a janeiro), 29,76; 43,04; 33,60; 40,36 kg, para os grupos Canindé, Anglo-nubiana e ¾ A ¼ SRD, respectivamente, foram superiores aos da estação chuvosa (Tabela 1).

No entanto, na Tabela 2, observa-se que os ganhos de peso durante a gestação das matrizes cobertas no período de fevereiro a abril, principalmente das cabras Canindé, ½ A ½ SRD, ¾ A ¼ SRD e Alpina, que apresentaram médias no início da estação de 4,98; 4,15; 4,13; e 4,14 kg, respectivamente, foram maiores que os das matrizes cobertas na época seca (novembro a janeiro), de 0,73; 1,51; - 0,18; 0,50 kg para as nativas, nubianas, ¾ A ¼ SRD e alpinas, respectivamente, indicando que a gestação daquelas matrizes transcorreu em uma época de disponibilidade de alimentos na pastagem (fevereiro a setembro) e, conseqüentemente, houve consumo de alimentos capaz de promover ganhos de peso, contrariando a informação de Quittet (1978).

Na Figura 1, observa-se a variação dos pesos à cobrição das matrizes de ano para ano. As cabras Canindé apresentaram baixos pesos à cobrição nos anos de 1984 (22,61 kg) e de 1987 (23,78 kg). Esses pesos podem ser atribuídos a um razoável número de matrizes jovens selecionadas para reprodução, além do manejo que era diferenciado, pois as cabras Canindé eram criadas quase que extensivamente. A partir de 1989, estas cabras apresentaram maiores pesos, permanecendo acima da média, o que se deve ao aumento da idade e de sua inclusão no programa de melhoramento genético, quando passaram a receber manejo mais adequado e semelhante ao dos outros grupos genéticos.

As cabras ¾ A ¼ SRD apresentaram menor peso à cobrição (31,26 kg), em 1988, por constituírem um rebanho recém-formado de matrizes com esta composição genética.

O ganho de peso das cabras Canindé até 1988 manteve-se sempre acima da média desta raça, principalmente em 1987 (5,54 kg) (Tabela 3). Em 1992, o ganho foi muito reduzido, ficando em torno de 0,56 kg. As cabras Anglo-nubianas obtiveram ganho de peso de 6,80, em 1981, e de -2,69 kg, em 1983. As mestiças ½ A ½ SRD, em 1987, apresentaram o menor ganho (1,66 kg), que, em 1988, aumentou para 4,23 kg. Para as matrizes Alpinas, registrou-se ganho de 6,21 kg, em 1980, época em que foram importadas da Alemanha e, portanto, receberam manejo diferenciado, e de -0,36 kg, em 1992. Fatores como incidência e regularidade das chuvas, entre os anos do período considerado, idade e manejo alimentar dos animais podem ter contribuído para os ganhos durante a gestação.  

Os pesos à cobrição apresentaram tendência de aumento com o incremento da ordem de parição (Tabela 4).

Nota-se que os pesos das cabras submetidas à primeira cobrição representam, para a Canindé, Anglo-nubiana, ½ A ½ SRD e ¾ A ¼ SRD e Alpina, 78; 77,2; 80,86; 86,8 e 79,2%, respectivamente, em relação à média de peso das cabras de quinta parição de cada grupo genético. Isto sugere que o critério de peso adotado para o primeiro acasalamento, mesmo em condições de semi-árido, está retardando o início da vida reprodutiva dessas matrizes, o que implica em elevada idade ao primeiro parto e maiores custos com a criação das fêmeas jovens e, ainda, menor longevidade.

Gonçalves (1996) reporta que o alto valor para a idade ao primeiro parto pode ser reflexo da falta de um manejo adequado para as cabritas em crescimento ou do critério de peso utilizado para a primeira cobrição (30-35 kg), que considera elevado para as cabras nas condições brasileiras, visto que este valor se baseia em uma porcentagem do peso adulto dos animais nas condições de clima temperado.

O ganho de peso foi mais evidente nas cabras de primeira parição, 3,87; 4,45; e 3,50 kg para as matrizes Canindés, ½ A ½ SRD e Alpina, respectivamente (Tabela 5). Sampaio et al. (1984) e Anderson (1986) comentam que, quando as exigências nutricionais são atendidas, a gestação beneficia o crescimento do feto, incrementa o peso corporal da mãe e até estimula o desenvolvimento das matrizes jovens.  

Fehr (1981) reporta ganho real de peso, durante primeira gestação, em torno de 12,0 kg. Na primeira lactação, o peso corporal aumentou de 10,0 a 14,0 kg e, durante o segundo ciclo reprodutivo (gestação-lactação), o ganho foi menor (2,0 a 7,0 kg) em relação ao peso à primeira cobrição.

O tipo de parto influenciou (P<0,05) o ganho de peso das cabras Anglo-nubianas, ½ A ½ SRD e Alpinas. As matrizes que tiveram partos múltiplos apresentaram ganhos de peso em torno de 1,83; 2,76 e 2,33 kg, respectivamente, inferiores (41,15; 8,31 e 37,36%) aos registrados para as cabras de partos simples (Tabela 6). Este fato pode estar associado à idade, pois as cabras de partos simples eram jovens, principalmente nulíparas e primíparas em crescimento, portanto, com o trato reprodutivo ainda em desenvolvimento (Awemu et al., 1999; Silva & Araújo, 2000), bem como ao aumento das exigências nutricionais para manutenção da gestação dupla, associada à deficiência de nutrientes na alimentação com a conseqüente mobilização de reservas.

 Esses resultados diferem dos encontrados por Steine (1975), que observou maior ganho de peso (0,5 a 2,0 kg) para as cabras de partos múltiplos em relação às cabras com gestação simples.

Na Tabela 7, observa-se que houve influência (P<0,05) da raça sobre o peso à cobrição. As matrizes Canindés se apresentaram as mais leves (26,42 ± 5,03 kg), ratificando a informação de Figueiredo & Pant (1982), de que os animais nativos encontrados no Nordeste são de porte hipométrico e apresentam peso adulto em torno de 30 a 40 kg.

Entre as matrizes de raças exóticas, as Anglo-nubianas foram as que evidenciaram maiores pesos à cobrição (39,59 ± 7,15 kg), seguida das Alpinas (37,91 ± 7,05 kg), por serem animais de porte elevado. Shelton (1978) e Majid et al. (1993), nos Estados Unidos, citam pesos adultos das duas raças em torno de 64 e 71,5 kg, para as cabras Anglo-nubianas, e de 50 e 64,8 kg, para as Alpinas.

As matrizes mestiças apresentaram médias de pesos à cobrição intermediárias entre a nativa e as raças exóticas (31,40 ± 5,81 e 35,13 ± 6,59 kg), para ½ A ½ SRD e ¾ A ¼ SRD, respectivamente. Nota-se, ainda, que o aumento na participação genética de Alpinas incrementou o peso corporal. Resultados similares foram encontrados por Pu et al. (1987), na China, e Jagtap et al. (1991), na Índia, quando cruzaram cabras nativas com machos de raças exóticas.

O efeito de grupo genético foi significativo (P<0,05) sobre o ganho de peso durante a gestação (Tabela 7). As cabras Canindés apresentaram os melhores ganhos durante a gestação (3,56 ± 3,26 kg), seguidas das mestiças ½A ½ SRD (3,24 ± 3,80 kg). As cabras Anglo-nubianas, Alpinas e ¾ A ¼ SRD tiveram ganhos de peso semelhantes, 2,54 ± 3,77; 2,63 ± 3,80; 2,91 ± 3,97 kg, respectivamente.

As cabras Canindés, mais rústicas, adaptam-se melhor ao ecossistema do semi-árido e apresentam-se como matrizes de baixa produção de leite; conseqüentemente, menos exigentes em termos nutricionais. Talvez essas características expliquem a maior capacidade de ganhar peso durante a gestação em relação às cabras dos outros grupos genéticos de maior potencial leiteiro.

Conclusões

A composição genética dos animais e, principalmente, os fatores ambientais, como mês, ano, ordem e tipo de parto, refletiram sobre o peso à cobrição e o ganho de peso durante a gestação das matrizes estudadas, fatores que estão relacionados à idade das cabras, ao número de crias por gestação, percentual de cabras nulíparas, primíparas e multíparas no rebanho, aos manejos nutricional e reprodutivo, a problemas sanitários, à distribuição de chuvas e à disponibilidade de forragens ao longo dos anos, no período avaliado.

Agradecimento

À Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária do Estado da Paraíba, pela cessão dos dados.

Literatura Citada

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1. Parte da Dissertação de Mestrado apresentada ao CCA/UFPB pelo primeiro autor.

Geovergue Rodrigues de MedeirosI; Edgard Cavalcanti Pimenta FilhoII; Wandrick Hauss de SousaIII; Evaneusa Alves de BritoIII
wandrick[arroba]emepa.org.br

IProfessor da Escola Agrotécnica Federal de Codó-MA
IIProfessor do Centro de Ciências Agrárias/UFPB – Areia – PB
IIIPesquisador da Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária – EMEPA-PB

Artigo original: R. Bras. Zootec., Dez 2004, vol.33, no.6, suppl.1, p.1711-1720. ISSN 1516-3598 



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