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Indivíduos que fumavam regularmente, tragando a fumaça, de três ou mais cigarros por dia em média e o faziam há um período ³1 ano, foram considerados fumantes 15.
Uma ingestão de gordura total >30g e de colesterol ³300mg/dia foi classificada como inadequada11.
Os estudantes que negavam prática regular de atividade física, com freqüência ³2 vezes por semana, e duração mínima de 30min, foram tidos como sedentários.
Na análise estatística, para caracterizar o perfil lipídico em relação ao sexo, foram comparados seus valores médios, através do teste t de Student, quando as variáveis eram homogêneas. Quando as variáveis eram heterogêneas, as médias foram comparadas através do teste de Kruskal-Wallis.
A comparação das variâncias foi feita através da utilização do teste de Bartlett. A possível associação entre os FR para DA e os valores do perfil lipídico foi avaliada por meio do teste do qui-quadrado, usando a correção de Yates. Em todas as análises o nível de significância utilizado foi de 5%.
Dos 209 estudantes avaliados, 72,2% eram mulheres e 52,6% estavam na faixa etária entre 17 a 19 anos.
Dados referentes aos valores do perfil lipídico (média, mínimo e máximo), de acordo com o sexo, encontram-se na tabela I. As mulheres apresentaram média de HDL-c superior a dos homens, não havendo diferença estatisticamente significante em relação as demais médias.
Dislipidemias, caracterizadas por níveis de CT e LDL-c aumentados, ocorreram em 9,1% e 7,6% da amostra, respectivamente. Porém, níveis de CT acima dos desejáveis (limítrofes e aumentados) foram observados em 39,7% das mulheres e 29,3% dos homens (p=0,215). Níveis de LDL-c acima dos desejáveis também foram superiores nas mulheres (19,9%) em relação aos encontrados nos homens (15,5%) (p=0,536).
Níveis diminuídos de HDL-c foram observados em 8,6% dos estudantes, sendo esse percentual superior no sexo masculino (17,2%) em relação ao feminino (5,3%) (p=0,013).
A hipertrigliceridemia foi encontrada em 16,3% da amostra. Níveis aumentados de TG foram superiores em homens (24,1%) quando comparados às mulheres (13,2%) (p=0,088).
Em relação aos demais FR analisados, o sedentarismo, presente em 78,9% da amostra, foi o fator de risco mais prevalente, seguido por ingestão inadequada de gordura total (77,5%). O tabagismo e a HA apresentaram a mesma prevalência (15,8%). Dos 33 indivíduos hipertensos, 60,6% deles era do sexo masculino. A obesidade foi observada em 7,2% da amostra, e sua freqüência foi maior nas mulheres (tab. II).
Foram observadas associações estatisticamente signficantes entre sedentarismo e níveis acima dos desejáveis de LDL-c (p=0,050) e TG (p=0,032) e entre IMC e níveis de CT (p=0,011), LDL-c (p=0,030) e TG (p=0,007). O IMC apresentou relação diretamente proporcional com os níveis de CT e LDL-c, e o maior percentual de níveis séricos de TG aumentados foi observado nos estudantes obesos (IMC >30kg/m2).
Em relação à composição da amostra estudada, vale lembrar que os 209 calouros avaliados representavam 25,1% dos estudantes que ingressaram naquela universidade nesse período. A predominância do sexo feminino na nossa amostra (72%), se deveu, essencialmente, ao fato das mulheres terem obtido maior índice de aprovação no vestibular. Dos 832 aprovados, 527 (65,3%) eram mulheres.
Foi observada elevada prevalência de FR para DA nesta amostra. Observação concordante com a da literatura nacional e internacional, onde a prevalência de FR em indivíduos jovens também foi alta.
As alterações do perfil lipídico são importantes na determinação do desenvolvimento da DA 16. Os índices de mortalidade por DAC estão diretamente relacionados à média dos níveis séricos CT da população 17. A média de CT neste estudo foi de 172,05+33,86mg/dL e não houve diferença estatisticamente significante entre as médias de homens e mulheres. No Brasil, Gerber e Zielinsky 18, ao avaliar estudantes de 6 a 16 anos incompletos, tanto da rede de en-sino pública quanto privada, obtiveram média de CT igual a 167,22+30,57. Forti e cols. 19, apesar de ter incluídos apenas jovens com história familiar positiva em seu estudo, obtiveram dados semelhantes. Média <150mg/dL foi descrita por Bertolami e cols. 20 no grupo de 14 a 21 de sua amostra total. O número reduzido de indivíduos desse grupo (N=80) pode ter sido responsável pelo achado. Em relação aos estudos nacionais que avaliaram indivíduos na faixa dos 20 aos 29 anos, a maior média de CT observada não ultrapassou os 200mg/dL21-24.
Embora as médias de CT, na maioria dos estudos brasileiros, não terem sido elevadas, a freqüência de níveis indesejáveis foi muito alta, independente da faixa etária e região do país. No estudo de Gerber e Zielinsky 18, dos 1502 estudantes, de 6 a 16 anos, 27,8% da amostra cursavam com níveis de CT >180mg/dL. Estudos realizados na Bahia 25, Rio Grande do Sul 21 e São Paulo 23, em população adulta, apresentaram proporções semelhantes de níveis de CT indesejáveis (>35% da amostra total). No nosso estudo, 9,1% dos calouros apresentaram níveis de CT aumentados. Esta proporção se eleva para 36,8% se considerarmos aqueles com níveis de CT acima dos desejáveis. Em relação aos estudos internacionais, 24% dos jovens avaliados no Muscatine Study tinham níveis de CT >200mg/dL 26. No Framingham Heart Study 27, 48% dos homens e 26% das mulheres, com idade entre 31 a 39 anos, apresentaram níveis de CT >220mg/dL.
No presente estudo, a média de LDL-c foi inferior a 100mg/dL, em ambos os sexos. Do total da amostra, 26,3% apresentaram níveis de LDL-c acima dos desejáveis e 7,6% níveis aumentados. Não houve associação significativa entre os níveis de LDL-c e sexo. A freqüência de indivíduos com níveis indesejáveis de LDL-c, importante preditor de risco para DA, também foi elevada em outros estudos brasileiros 20,23.
Foi observada média de HDL-c >45mg/dL em indivíduos de ambos os sexos, porém mais elevada em mulheres. A maior parte da amostra apresentou níveis desejáveis de HDL-c (94,7% das mulheres e 82,8% dos homens). Entretanto, enquanto que o percentual de homens com níveis diminuídos foi de 17,2%, o de mulheres foi de apenas 5,3%. Outros estudos nacionais apresentaram níveis médios de HDL-c >45mg/dL em indivíduos <20 anos 18,19 e >40mg/dL em indivíduos a partir dessa idade 20,28,29. Em relação ao sexo, Kannel e cols. 30 referem níveis de HDL-c superiores em mulheres, independente da idade. Além disso, o HDL-c apresenta uma forte relação inversa com a maturação sexual em homens brancos 31.
Em relação aos TG, sua média neste estudo foi <120mg/ dL e 16,3% da amostra apresentou níveis aumentados dessa partícula. Apesar da diferença de idade ser pequena, chama atenção o fato de indivíduos com idade entre 20 a 25 anos apresentarem médias de TG significantemente maiores que os de 17 a 19 anos. Como o consumo de bebidas alcoólicas pode levar a hipertrigliceridemia por aumento da síntese hepática de TG 32, pode se especular que haja um aumento de sua ingestão entre os estudantes de 20 a 25 anos.
O sedentarismo, neste estudo foi o fator de risco mais prevalente entre os estudantes avaliados. Sabe-se que, atualmente, a televisão, videogames e computadores ocupam grande parte do período de lazer dos jovens 33. Porém, em relação a diminuição da prática de atividade física no grupo estudado, pode-se especular o envolvimento de outros fatores. O desinteresse das escolas em promover esse tipo de atividade, principalmente no ano que antecede o vestibular; a inexistência de aulas de educação física em cursinhos pré-vestibulares e a redução de atividades extra curriculares nesse período podem ter contribuído para a elevada freqüência de sedentarismo verificada (78,9%).
No presente estudo, houve associação entre sedentarismo e níveis aumentados de LDL-c e TG. Estes achados são concordantes aos encontrados na literatura. Porém, não houve associação com níveis diminuídos de HDL-c.
Das variáveis ambientais envolvidas na determinação do perfil lipídico, a dieta é considerada uma das mais importantes 34. A excessiva ingestão calórica, com elevado teor de gordura e colesterol está associada a níveis séricos aumentados de CT e LDL-c 35. Em nosso estudo, 77,5% da amostra apresentava ingestão de gordura total >30% das calorias totais e 35,9% uma ingestão de colesterol >300mg/ dia. Apesar da elevada freqüência de indivíduos com hábitos alimentares inadequados, não foi observada associação entre alterações lipoprotéicas e ingestão inadequada de gordura total e colesterol. O fato de nossa avaliação nutricional não ter discriminado a proporção de gordura saturada da dieta pode ter contribuído para a ausência desta associação. Além disso, poucos estudos epidemiológicos intra-populacionais relataram uma associação consistente entre dieta e níveis de lipídeos séricos 36. Esta associação é mais clara em estudos que objetivaram a comparação de diferentes populações, como o Seven Countries Study 37. Nesse estudo, a forte associação entre ingestão de gordura e níveis séricos de colesterol verificada, ao se comparar diferentes coortes, não foi observada em nenhuma coorte em particular. Como mencionado por Dressler e cols. 28, a variabilidade intra-individual, tanto na dieta como nos níveis séricos de colesterol, pode reduzir a possibilidade de detectar a presença de associações numa mesma população. Porém, as variações "randômicas" podem ser minimizadas através da obtenção da média entre indivíduos, permitindo a demonstração de possíveis associações, ao se comparar diferentes populações.
No nosso estudo, 19,6% da amostra apresentaram história familiar positiva e não foi verificada sua associação com alteração no perfil lipídico. Diversos estudos revelam a maior prevalência de FR em parentes de 1º grau de indivíduos com DA manifesta, comparados àqueles sem história familiar para essa doença38. Forti e cols. 19 verificaram elevada freqüência de desvios do metabolismo lipídico e de aumento do peso corpóreo em crianças e adolescentes filhos de coronariopatas jovens. Ao comparar a prevalência de dislipidemias primárias entre parentes de 1º grau de coronariopatas revascularizados e indivíduos sem história familiar de DAC, Giannini e cols. 29 relataram maior freqüência de níveis lipídicos inadequados no 1º grupo. Outros autores porém, não encontraram essa relação. No estudo de Gerber e Zielinsky 18, 61,67% dos estudantes com hipercolesterolemia não tinham história familiar positiva para DA. Estes dados são semelhantes aos encontrados no Bogalusa Heart Study, onde a história familiar foi positiva em apenas 40% dos jovens brancos e 21% dos negros hipercolesterolêmicos 39.
A relação entre níveis pressóricos, tanto diastólicos quanto sistólicos, e risco cardiovascular já se encontra bem estabelecida. No presente estudo, 15,8% dos estudantes apresentaram HA, sendo que 60,6% dos indivíduos hipertensos eram homens. A HA também predominou no sexo masculino em indivíduos de 20 a 39 anos no estudo de Martins e cols. 40. Como já mencionado na introdução, os níveis pressóricos tendem a ser mais elevados em indivíduos jovens do sexo masculino 41. Alguns estudos relataram associação entre HA e níveis aumentados de colesterol 24,40,42, porém esta associação não foi verificada neste estudo.
A freqüência de fumantes observada nesta amostra foi de 15,8%. A partir da adolescência, o tabagismo é uma das influências mais danosas na progressão das placas ateroscleróticas 6. Craig e cols. 43 demonstraram, através de metanálise, que o tabagismo está relacionado à diminuição dos níveis de HDL-c em indivíduos de 8 a 19 anos, à semelhança do que ocorre em adultos. Porém, assim como Forti e cols. 19, não observamos associação entre as variáveis do perfil lipídico e o hábito de fumar. Os diferentes critérios utilizados para determinar a presença de tabagismo, podem contribuir para a discordância, no que diz respeito a essa associação. No Framingham Heart Study 44, o risco de DAC estava relacionado com o número de cigarros fumados por dia. Um consumo >10 cigarros por dia esteve relacionado a alterações lipoprotéicas (níveis maiores de CT e LDL-c, além de níveis menores e HDL-c).
A obesidade (IMC >30kg/m2) foi observada em 7,2% de nossa amostra, sendo que desses indivíduos 60% eram do sexo feminino e 40% do sexo masculino. Embora analisem uma faixa etária mais jovem, Gerber e Zielinky18 também relataram uma freqüência relativamente baixa (6,33%). Outros estudos, porém, referem uma casuística mais elevada19,45. Em relação ao IMC, chama atenção a freqüência de desnutrição entre estudantes de uma universidade privada de São Paulo (10,5%). Possivelmente, em função do padrão de beleza atual e da pressão social ser mais forte sobre as mulheres, foi observado, que a maior parte dos indivíduos desnutridos era do sexo feminino (86,4%).
Em nosso estudo, foi observada uma associação estatisticamente significante entre o IMC e níveis séricos de CT, LDL-c e TG. O IMC apresentou uma relação diretamente proporcional com os níveis séricos de CT e LDL-c. Quanto maior o IMC, maior o percentual de níveis acima dos desejáveis dessas partículas. O maior percentual de níveis séricos de TG aumentados foi observado em estudantes com excesso de peso grau II e III. Estes dados são concordantes com os da literatura 40. Em relação aos níveis de HDL-c, apesar de não ter havido associação estatisticamente significante com o IMC, o maior percentual de níveis séricos diminuídos dessa lipoproteína foi observado em indivíduos com excesso de peso grau II e III.
O diabete melito está entre as principais causas de dislipidemias secundárias. Os estudos nacionais envolvendo a análise de FR para DA não discutem acerca do diabete melito, ou por excluírem indivíduos diabéticos, ou por não os terem presentes em sua amostra. Neste estudo, nenhum dos estudantes apresentou níveis de glicemia de jejum >126mg/dL.
Concluindo, cabe lembrar que estudos visando caracterizar o perfil de risco de uma população constituem a primeira etapa para a elaboração de planos preventivos, permitindo que haja adequação das medidas preventivas à realidade local onde serão implantadas, garantindo assim o seu sucesso. O presente estudo chama atenção para a elevada prevalência de FR para DA em adolescentes e adultos jovens. O envolvimento das universidades, não só na avaliação do perfil de risco de seus estudantes, como também, no processo educacional, esclarecimento dos benefícios advindos com a adoção de um estilo de vida mais saudável, seria de grande valia para a implantação de um plano preventivo aos universitários.
Lísia Marcílio Rabelo, Roberto Márcio Viana, Maria Arlete Schimith, Rose Vega Patin, Mara Andréa Valverde, Regina Célia Denadai, Ana Paula Cleary, SandraLemes,Caio Auriemo, Mauro Fisberg, Tania Leme da Rocha Martinez
fisberg[arroba]uol.com.br
Centro de Estudos e Pesquisa em Saúde e Nutrição da Universidade São Marcos e Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – São Paulo Correspondência: Lísia Marcílio Rabelo - Av. Euclides da Cunha, 475/1301 – 40150-120 - Salvador, BA Recebido para publicação em 19/6/98 Aceito em 8/12/98
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