Analisa o despertar de uma tendência de vinculação das decisões administrativas emanadas por órgãos colegiados superiores que uniformizam as decisões do respectivo órgão.
Palavras-chaves: Direito Administrativo, Processo Administrativo, Decisões Administrativas Vinculantes.
O advento da Emenda Constitucional nº 45/2004 (EC nº 45/2004) trouxe inúmeras alterações em nossa Carta Magna, notadamente, relativo ao Judiciário brasileiro. Críticas e elogios à parte, referida norma introduziu, entre outros dispositivos, o art. 103-A e parágrafos em nosso ordenamento jurídico instituindo a súmula vinculante.
Por esse dispositivo legal, o Supremo Tribunal Federal (STF) poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir da data de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, na três esferas de governo, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
Lima, Marques e Aguiar (2007:2) conceituam súmula como sendo uma "síntese dos julgamentos tomados em dado sentido pelos membros de um determinado tribunal, condensados em enunciados aprovados pela maioria absoluta de seus membros. Em outras palavras, significa o conjunto de enunciados que sufragam idêntica interpretação de preceito jurídico em tese, sem caráter obrigatório".
Antes da "reforma do judiciário", as súmulas editadas, notadamente pelo STF, não possuíam caráter vinculante, muito embora servissem de base para as demais instâncias e orientação para quase a unanimidade dos julgados sobre a respectiva matéria.
Assim, desde a publicação da EC nº 45/2004, os enunciados contidos nas súmulas do STF possuem caráter normativo:
Dessa forma, na atual configuração, não poderão tais entes [do Poder Judiciário] afastar-se da proposição contida na súmula, a qual, embora limitada em seu objeto e no grau de generalidade e abstração, possui evidente caráter normativo, tanto que, nos termos do parágrafo 3º do próprio art. 103-A da Constituição Republicana, o desvio da orientação preconizada na súmula desafiará o manejo de reclamação perante a Corte Suprema, a qual poderá, se for o caso, cassar a decisão proferida ou anular o ato administrativo. (LIMA, MARQUES E AGUIAR, Loc. Cit.)
A súmula vinculante tem, pois, como objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, a cerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processo sobre questões idênticas (§1º do art. 103-A). Ou seja, sua finalidade é uniformidade de julgados sobre determinada matéria, promovendo a celeridade e segurança da prestação jurisdicional e o desafogamento da justiça brasileira.
Por se tratar de dispositivo constitucional de relevância, a súmula vinculante tem considerável espaço na mídia, revistas e livros especializados em direito, bem como, nas discussões jurisprudenciais.
No entanto, observa-se no Brasil uma singela tendência de tornar vinculante as decisões dos órgãos colegiados superiores da administração pública. Porém, o estudo sobre esse fenômeno ainda não possui aprofundamento bibliográfico. É sobre essa tendência que iremos traçar breves comentários.
Sem prejuízo das demais legislações pertinentes ao assunto deste artigo, tratar-se-á aqui de dispositivos legais referentes ao processo de vinculação das decisões administrativas, face as recentes normas, emitidas pelos seguintes órgãos colegiados: Conselho de Recurso da Previdência Social (CRPS), no âmbito do Sistema Nacional da Seguridade Social, e, no âmbito do Ministério da Fazenda, dos Conselhos de Contribuintes (CC) e da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF).
2.1. CONSELHO DE RECURSO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL (CRPS).
O art. 126 da Lei 8.213/91, que dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social - com a redação dada pela Lei nº 9.528/97-, versa que das decisões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) nos processos de interesse dos beneficiários e dos contribuintes da Seguridade Social caberá recurso para o Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS).
O Decreto nº 3.048/99, que aprova o Regulamento da Previdência Social, dispõe, em sua redação original, que o CRPS, colegiado integrante da estrutura do Ministério da Previdência e Assistência Social, é órgão de controle jurisdicional das decisões do Instituto Nacional do Seguro Social, nos processos de interesse dos beneficiários e dos contribuintes da seguridade social (art. 303).
O referido Conselho de Recursos é formado por Juntas de Recursos, Câmaras de Julgamento e Conselho Pleno. Àquelas competem o julgamento em 1ª e 2ª instâncias, respectivamente, e, esse, "previa" a competência para uniformizar a jurisprudência previdenciária através de enunciados.
Em maio de 1999, tanto a Seguridade Social quanto os segurados, possuíam um eficaz instrumento de celeridade processual, cujas características se assemelham à súmula vinculante, isto é: emanados por órgãos colegiados superiores, caráter vinculativo das decisões e aprovada pela maioria dos membros colegiados.
No entanto, sucessivos decretos modificaram a composição e a competência do CRPS. Inclusive, o inciso III do § 1º do art. 303, relativo à uniformização jurisprudencial previdenciária através de enunciados, foi revogado pelo Decreto nº 3.668/00, por isso destacamos a palavra "previa".
Em outras palavras, o segurado (ou dependente) voltaria a amargar os percalços da excessiva burocratização e percorrer as inúmeras instâncias do processo administrativo previdenciário junto ao Sistema Nacional de Seguridade Social.
Felizmente, o Decreto nº 4.729/03 incluiu o inciso IV ao § 1º do art. 303, restabelecendo ao Conselho Pleno do CRPS a competência para uniformizar a jurisprudência previdenciária através de enunciados, podendo ter outras definidas no Regimento Interno do Conselho de Recursos da Previdência Social.
Atualmente, o CRPS é composto por vinte e nove Juntas de Recursos, seis Câmaras de Julgamento e Conselho Pleno. As Juntas e as Câmaras possuem a competência para julgar os processos em 1ª e 2ª instâncias, respectivamente, e o Pleno, como visto acima, a competência para uniformizar a jurisprudência previdenciária através de enunciados.
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