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Vivemos hoje, no país, desde há muito, uma tendência de importação de estereótipos culturais (modelos conceituais), que refletiria na nossa cultura acadêmica, de modo que tendemos a entender que o tecnicismo utilitarista norte-americano, buscando a especialização isolada em dada área, o que levaria a uma concentração da pesquisa financiada e direcionada para certas corporações de interesse.
E, de forma mais complexa, inobstante a negativa oficial do regime, temos observado uma tendência governamental que, cada vez de forma mais acentuada, vem reduzindo os recursos de pesquisas e administração das universidades públicas.
E muito embora como advirta Régis de Moraes na obra mencionada, se trate de um fenômeno que venha ocorrendo desde meados da década de 1.970, posteriormente à chamada crise do petróleo, não sendo prerrogativa brasileira (cuida-se de fenômeno que vem sendo observado em outros países do mundo), tem-se percebido que a adoção do chamado neoliberalismo no Brasil, onde o único dado relevante é balanço patrimonial, sem preocupações com aspectos qualitativos, o fenômeno vem tendendo a uma complexidade maior.
Com efeito, conforme vem sendo fartamente alardeado pelos meios de comunicação de massa, o país tem vivenciado uma evasão de cérebros, mais propriamente, de um patrimônio intelectual, com a remessa de pesquisadores para fora do país, atraídos por melhores condições de vida e de pesquisa.
Tal evasão, obviamente, se refletirá a médio prazo, na própria posição do país no ranking mundial, sobretudo numa sociedade competitiva como a instaurada no mundo globalizado (e como pondera Peter F. Drucker, mencionado por Régis de Moraes na obra em comento, vivemos hoje no que poderia ser chamado uma sociedade pós-empresarial, organizada numa knowledge society, que necessitará, cada vez mais, de trabalhadores especializados e dotados de conhecimento, ou knowledge workers).
Existe, portanto, uma premente necessidade de dotar as universidades, sobretudo as públicas (em que pesem as estatísticas demonstrarem o grande fluxo de alunos de classe média alta nessas universidades, as mesmas ainda constituem uma forma democrática de acesso de jovens oriundos de outros extratos sociais a uma educação de qualidade) de recursos que permitam às mesmas a obtenção de padrões de excelência, conduzindo-as à condição de universidades centrais, voltadas não só para a difusão do conhecimento massificado e importado, mas para o fomento da pesquisa e a formação de profissionais aptos à mantença do país em padrões aceitáveis dentro dessa knowledge society.
E a sociedade, tomada enquanto realidade poliédrica e complexa, deve estar atenta a essa situação, de modo a não permitir o sucateamento de nossas universidades, sobretudo se atentarmos que a maior parte das críticas assacadas contra as instituições de ensino superior de nosso país possa estar sendo assacada de forma engendrada, visando, justamente, denegrir sua imagem junto ao público em geral, para facilitar a consecução de fins menos nobres.
Não que algumas das críticas assacadas não tenham fundamento, tais como as referentes ao caráter hermético de algumas instituições ( voltadas para um culto do cientificismo, em acepção depreciativa do termo, como exagero ), ou para a formação de grupos fechados e isolados, que não contribuam, uns em relação aos outros (como os artistas e cientistas mencionados por Régis de Moraes), mas, o que se adverte é para a superexploração dessas críticas, de forma intencional, por esse ou aquele regime, ou órgão de imprensa, como forma de preparar o caminho para a privatização em alta escala de nossas universidades públicas, ou para que permitamos o seu sucateamento, como formas de obtenção de um balanço positivo, sem sacrifícios aos setores privilegiados da economia nacional (v.g., o sistema bancário, dentre outros).
E nem se alegue que se estaria centrando o texto na universidade pública, posto que, conforme é cediço, e nossa experiência vem demonstrando, no setor público existe um maior número de nossas universidades que poderiam ser apontadas como centrais, e que, de um modo ou de outro, acabam influenciando as demais que seriam periféricas em relação à mesma, mas sempre dentro de uma realidade nacional.
O que se pretende, através do presente trabalho, seria, a partir da análise de capítulos da obra do Prof. Régis de Moraes, já mencionada acima, se alertar para o sério risco de que, no vácuo de universidades públicas que possam servir de paradigma (ou as chamadas universidades centrais), possamos perder, por completo, nosso referencial, passando a adotar modelos importados, que atendam a interesses que não são os do povo brasileiro, esvaziando nosso capital intelectual, de forma a nos tornarmos cada vez mais dependentes de outros países (sem qualquer pretensão de voltar a um nacionalismo universitário).
Essas as razões pelas quais, inobstante nossas universidades até possam sofrer críticas por problemas de somenos importância, deve ser fomentado, de forma cada vez mais candente, o debate entre a universidade e a sociedade, de modo a acentuar o papel da primeira no que concerne à difusão de conhecimentos e fomento de pesquisas, buscando torná-las cada vez mais próximas de universidades centrais, de forma a que fiquemos cada vez menos dependentes do capital intelectual de outros países.
Tal preocupação, aliás, não é prerrogativa pátria, posto que, como assevera Peter Mortimore, em interessante artigo publicado na obra Universidade Futurante, o Reino Unido sofreu várias mudanças visando a preservação de seu capital intelectual.
Inobstante a adoção de medidas semelhantes a adotadas no Reino Unido pelo documento chamado Higher Education: Meeting the challenge (1.987), pudesse ser entendida como a adoção de um modelo importado, não se pode aplicar uma mentalidade xenofobista em relação àquilo que possa ser aproveitado para a nossa realidade.
Sobre tal tema, inclusive, causa espécie, merecendo ser destacada, a importância da interdisciplinariedade na prática universitária, fazendo com que o acadêmico compreenda não só as especificidades de sua área, como também que deve estar inserido num quadro global de compreensão, permitindo a obtenção de conhecimentos mais eficazes para a sua realidade, experiência, aliás, que vem sendo exercida com sucesso na PUC – Campinas, neste curso de mestrado em processo civil.
A busca de soluções para o problema apontado acima, ou seja, o abordado na necessidade de ampliar o debate entre universidade e sociedade, polindo-se arestas em nome de um objetivo comum, que seria o fortalecimento de nosso capital intelectual (um dos muitos aspectos que poderia ser analisado sob a ótica de tal poliédrico tema), deve passar por uma análise dos modelos implantados nas chamadas universidades centrais localizadas fora do país, para que, adaptadas suas realidades às realidades pátrias, possamos fortalecer nosso capital intelectual, de modo a que possamos atender aos desafios que a sociedade pós-industrial nos oferece.
Referências bibliográficasFRANÇA, RUBENS LIMONGI ( COORDENADOR ), ENCICLOPÉDIA SARAIVA DO DIREITO, VOLS. 69 E 75, 1.977, SAO PAULO, EDITORA SARAIVA
LEITE, DENISE B.C. ( E OUTROS ), UNIVERSIDADE FUTURANTE, 1.997, CAMPINAS, EDITORA PAPIRUS;
MORAIS, J.F. RÉGIS DE, A UNIVERSIDADE DESAFIADA, 1.995, CAMPINAS, EDITORA DA UNICAMP;
Autor:
Julio Cesar Ballerini Silva
carolinaatbs[arroba]hotmail.com
MAGISTRADO E PROFESSOR DE GRADUAÇAO E PÓS-GRADUAÇAO DO CREUPI
MESTRE EM PROCESSO CIVIL PELA PUC-CAMPINAS, ESPECIALISTA EM DIREITO PRIVADO PELA USP
[1] MACEDO, Silvio de. Enciclopédia Saraiva do Direito, vol. 69. Saraiva: São Paulo. p. 467.
[2] MENESES, João Gualberto de Carvalho. Enciclopédia Saraiva do Direito, vol. 75. Saraiva: São Paulo. p. 516-517.
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