A questão da mobilização política universitária é altamente complexa, o que, aliás, é fruto de todo e qualquer objeto de pesquisa após o advento do fenômeno conhecido como globalização, que uniu não só fronteiras e meios de comunicação, como também, as disciplinas científicas, de modo a afastar, sobretudo nas ciências humanas que não se baseavam precipuamente na verificação empírica, a idéia de uma "ciência sem consciência" (são conhecidos os textos do eminente EDGAR MORIN[1]a esse respeito).
No seu surgimento, a Universidade não se demonstrava como um espaço democrático como atualmente se pretende seja a mesma considerada, posto que surgiram inicialmente mediante Cartas de Privilégio outorgadas pelo Papa, nos séculos XI e XII (como o Mosteiro de Salermo e a Escola de Bolonha) que ensinavam medicina, ainda que de forma assistemática.[2]
Tais instituições, destinadas basicamente ao ensino da elite nobiliáriquica e de segmentos do clero, fundavam-se em formas oficiais de difusão do conhecimento autorizado pela Igreja Católica, cultora do entendimento oficial, situação que se agrava com a laicização do Estado, que, fortalecido pelo poder político e econômico, começa a se distanciar da Igreja, em visão que altera o foco do poder, mas ainda se orienta no sentido de atender interesses de um grupo minoritário.
Isso porque, conforme é sabido, em países sem uma tradição democrática (e, na República Brasileira, desde 1.889, apenas quatro presidentes civis eleitos pelo povo terminaram seus mandatos – com a perspectiva, talvez, de que um quinto presidente – Luís Inácio Lula da Silva venha a terminar o seu – apontando-se, no entanto, que desde FHC, se Lula terminar seu mandato será indício de uma séria estabilidade política de quase duas décadas, eis que se terá um conjunto de quatro mandatos eletivos exercidos pelos dois últimos presidentes), os detentores do poder começam a se sentir tentados (como já mencionava Dalmo de Abreu Dallari[3]em sua alusão a Lord Acton, segundo o qual "todo poder corrompe") a superexplorarem a ignorância de suas populações em proveito próprio (quanto menos consciente for a população, menos mobilizada ela será, com maior facilidade para a demagogia, na acepção técnica do termo, enquanto derivação negativa da democracia).
Desta feita, a universidade, enquanto difusora de um processo civilizatório e cultural dos espaços que ocupa, sempre implicou em foco de interesses muito singular aos detentores do poder, por razões geopolíticas, como parece ser de singular obviedade.
Isso se verifica porque, como é sabido, a universidade produz (ou, ao menos, deveria produzir, sob tal perspectiva) profissionais aptos a serem líderes, formadores de opinião e doutores, colaborando para a difusão de cultura e do conhecimento, de forma ampla e generalizada, em detrimento de projetos políticos fundados no obscurantismo da população, em tendência, destarte contrária, a movimentos hodiernamente verificados em países da África e da América Latina (a revista Veja tem apresentado interessantes reportagens que demonstram, por exemplo, o que vem acontecendo nas Universidades da Venezuela, em que a personificação do chefe do Estado vem influenciando as idéias políticas e tendências acadêmicas, sem tolerância com idéias diversas das apregoadas pelo "saber oficial" – em distorção da idéia universal e tolerante que deu nome à instituição universitária).
Mas, a questão é ainda mais complexa, se analisada sob uma perspectiva macroscópica, na qual se tenha que começar a lidar com o par conceitual estabelecido por Philip G. Altbach[4]que diferencia as universidades em centrais e as periféricas – no que tange ao papel de desenvolvimento científico das primeiras, relegando às segundas, em maior número que as primeiras, a função distribuidora do saber.
Por esta primeira dicotomia conceitual já se pode perceber que, em relação ao papel desempenhado por cada instituição, se poderá aferir um número maior ou menor de expectativas da sociedade (grupo complexo e mutifacetado, no qual, aliás, muito dificilmente haverá qualquer consenso a respeito de qualquer coisa), o que, por razões óbvias, refletirá na qualidade do relacionamento mantido entre ambas.
Assim, tender-se-ia a entender conveniente o acompanhamento das instituições centrais, malgrado as mais das vezes voltadas para outras realidades (geralmente situadas fora do país, recebendo grandes somas de dinheiro para pesquisas, laboratórios e bibliotecas – embora não se desconheça ou desmereça a existência de instituições centrais no território nacional, vivendo, muitas vezes, da dedicação dos professores desestimulados pela baixa remuneração e dificuldades orçamentárias para pesquisa), limitando-nos a tecer críticas à massa de instituições periféricas que, muitas vezes, de forma acrítica, transformaram-se em distribuidoras de saber, repetindo os mesmos modelos.
E, diante da intensidade de adventos tecnológicos postos à disposição da Comunidade Científica, de um modo geral, notadamente por veículos globais como a internet, não é preciso um hercúleo esforço intelectivo para perceber que a tendência em modelos periféricos seja a defasagem (a volatização do modelo repetido é fenômeno que ocorre de forma cada vez mais rápida neste sistema global), a recomendar que, em rápido período de tempo, as instituições periféricas terão que se adaptar ou tenderão a desaparecer (daí a necessidade premente de se buscar o fomento e estímulo da pesquisa e produção científica, como forma, até mesmo, de se permanecer no mercado).
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