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Sabias são as compilações de Gütschow (2008, p. 01) ao afirmar que:
No sistema de controle concentrado de constitucionalidade, uma vez proposta a respectiva ação, o Supremo Tribunal Federal não estará adstrito apenas aos fundamentos jurídicos nela alegados. A Corte Constitucional analisará a norma de maneira abrangente, fazendo o cotejo desta com o texto de toda a Carta Magna, o que, por sua vez, impedirá o ingresso de nova ação contra a mesma lei, mesmo que por fundamento constitucional diverso e/ou proposta por outro legitimado. Esse é o entendimento adotado no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o qual toma por base o caráter de esgotamento da análise acerca da constitucionalidade da lei ou ato normativo feita pelo tribunal, que abarca os preceitos constitucionais como um todo, independentemente destes terem ou não sido adotados como fundamento da ação.
Esta posição é tão rigorosa que nem mesmo se, em decorrência do exercício do poder constituinte reformador, superviesse uma emenda constitucional - ulterior à decisão pela constitucionalidade - que tornasse inconstitucional aquela norma, seria possível uma nova ação. A solução dada é que essa norma seria considerada revogada tacitamente pelo novo ordenamento jurídico constitucional.
Como já referido anteriormente, segundo a posição majoritária adotada pelo Supremo Tribunal Federal, não há inconstitucionalidade superveniente, o que ocorrerá é a revogação da lei em virtude da aplicação do brocardo lex posteriori derogat priori (Gütschow, 2008). Acrescenta-se, a título ilustrativo, o arresto da Suprema Corte apontado por Alvear (2005, p. 04) que ratifica esta afirmação:
"CONSTITUIÇÃO - LEI ANTERIOR QUE A CONTRARIE - REVOGAÇÃO - INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - IMPOSSIBILIDADE - 1. A lei ou é constitucional ou não é lei. Lei inconstitucional é uma contradição em si. A lei é constitucional quando fiel à Constituição; inconstitucional na medida em que a desrespeita, dispondo sobre o que lhe era vedado. O vício da inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição vigente ao tempo de sua elaboração. Lei anterior não pode ser inconstitucional em relação à Constituição superveniente; nem o legislador poderia infringir Constituição futura. A Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores com ela conflitantes: revoga-as. Pelo fato de ser superior, a Constituição não deixa de produzir efeitos revogatórios. Seria ilógico que a lei fundamental, por ser suprema, não revogasse, ao ser promulgada, leis ordinárias. A lei maior valeria menos que a lei ordinária. 2. Reafirmação da antiga jurisprudência do STF, mais que cinqüentenária. 3. Ação direta de que se não conhece por impossibilidade jurídica do pedido". (STF - ADI 2 - DF - T.P. - Rel. Min. Paulo Brossard - DJU 21.11.1997).
Em contraponto a este entendimento, há outra corrente, porém minoritária. Esta, por sua vez, defende que existe a possibilidade de se fazer um controle de constitucionalidade do direito pré-constitucional, o qual tem como principal adepto o Ministro Sepúlveda Pertence.
Em que pese a prevalência da tese pela inadmissão da teoria da inconstitucionalidade superveniente na atual jurisprudência do Supremo, existem posicionamentos doutrinários em sentido oposto que a consagram. Com efeito, em consonância com este, admite-se a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo quando o vício se manifestar posteriormente a uma alteração da Norma Fundamental, decorrer de uma renovação da interpretação do texto da Carta Magna ou em virtude de mudanças nas circunstâncias de fato. Nessas hipóteses, seria possível a declaração de inconstitucionalidade por meio de ação direta, através de controle concentrado.
No entanto, o posicionamento que prevalece no Supremo Tribunal Federal, não admite a inconstitucionalidade superveniente em hipótese alguma. Consoante Gütschow (2008, p. 02):
o [...] tribunal segue a linha de que esta não ocorre, nem mesmo quando é promulgada uma nova Constituição. O que pode acontecer, igualmente ao que já se falou, é a recepção da norma editada anteriormente à nova CF, quando aquela estiver materialmente de acordo com esta; ou, a contrário senso, a sua revogação, quando esta padecer do vício da inconstitucionalidade material. Observe-se que a apreciação da constitucionalidade formal de norma anterior é incabível. Assim, já decidiu o STF[4] [5] de 1988 não necessitam atender a este requisito para serem consideradas constitucionais. Foi o que ocorreu, por exemplo, com o Código Tributário Nacional e com a Lei nº 4.320/64, ambos editados antes da Carta Magna e por esta recepcionados com força de lei complementar.
Assim sendo, em virtude da posição dominante na Suprema Corte, considera-se impossível o reconhecimento de inconstitucionalidade superveniente no Brasil, não podendo, assim, ser objeto de Ações Direta de Inconstitucionalidade e Declaratória de Constitucionalidade normas editadas anteriormente à nova ordem constitucional, independentemente de ter sido esta estabelecida pelo poder constituinte originário ou reformador (Gütschow, 2008).
Porém, conforme sustenta o mestre Gilmar Mendes (2008), não se pode dizer o mesmo em relação à argüição de descumprimento de preceito fundamental, hipótese em que o entendimento adotado pelo Supremo é de que caberá ação declaratória de preceito fundamental mesmo que tenha como objeto norma anterior à atual constituição, obedecendo, de qualquer modo, o seu caráter subsidiário, o qual se traduz no fato desta somente poder ser admitida quando não houver outro meio eficiente para evitar ou reparar a lesão a preceito fundamental da atual norma constitucional. E Gütschow (2008, p. 02) conclui que:
Da mesma forma, a própria Lei nº 9.882/99[6], a qual disciplina o procedimento a ser adotado na ADPF apesar de não o fazer para a ADPF autônoma, prevista em seu artigo 1º, admite expressamente a ADPF incidental de lei ou ato normativo anterior à CF, no parágrafo único, inciso I, do mesmo dispositivo legal.
AVELAR, Matheus Rocha. Breves anotações sobre controle da constitucionalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, nº. 684, 20 de maio de 2005. Disponível no site: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6750> (Acesso em: 24/06/2008);
CARDOSO, Fernando Henrique. LEI No 9.882, DE 3 DE DEZEMBRO DE 1999. Disponível no site: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9882.htm> (Acesso em: 30/06/2008);
CORREA, Nerijohnson F. Federalismo Fiscal. Publicado em 07 de dezembro de 2007. Disponível no site: <http://www.neri-nerif.blogspot.com/> (Acesso em: 30/06/2008);
GÜTSCHOW, Bruno Alexandre. Breve panorama sobre o instituto da inconstitucionalidade superveniente e sua aplicação no direito constitucional brasileiro. Clubjus, Brasília-DF: 08 de abril de 2008. Disponível no site: <http://www.clubjus.com.br/?content=2.17064> (Acesso em: 23/06/2008);
MENDES, Gilmar Ferreira. Os diferentes tipos de inconstitucionalidade. Material da 2ª aula da Disciplina Controle de Constitucionalidade, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Constitucional - UNISUL-IDP-REDE LFG, 2008;
Pereira, Administrativo
Gisele. Leite, Jorge. Controle de Constitucionalidade. Disponível no site: <Link> (Acesso em: 18/06/2008);
PINHO. Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007;
SOUKHA. Soukha, uma Árvore, um Pomar, o meu País. Disponível no site: <http://soukha.blogspot.com/2007/04/impossvel-para-um-homem-aprender-aquilo.html> (Acesso em: 30/06/2008);
SOUSA, Ageu Cordeiro de; CAMPOS, Alinaldo Guedes et al. Controle de constitucionalidade: STF vs. Senado Federal: a quem cabe a última palavra? (um estudo crítico do art. 52, X da Constituição de 1988). Jus Navigandi, Teresina, ano 8, nº. 270, 3 abr. 2004. Disponível no site: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5038> (Acesso em: 23/06/2008);
VADE MECUM - obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. Constituição Federal. 5ª ed. atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva, 2008.
Autora:
Eliana Descovi Pacheco
elianadescovi[arroba]yahoo.com.br
Graduada em Direito pela Universidade de Cruz Alta/RS (UNICRUZ) e Especializanda em Direito Constitucional pela Universidade Comum do Sul de Santa Catarina (UNISUL) em parceria com a Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes.
Autorizo a publicação.
[1] Denota Pinho (2007, p. 35) que o controle concentrado "[...] só é exercido por um Tribunal Superior do país ou por uma Corte Constitucional [...]", como ocorre atualmente na Alemanha.
[2] Segundo Sousa, Campos, et al (2004, p. 05): "A origem histórica do controle de constitucionalidade difuso deu-se em 1803, no clássico caso Marbury vs. Madison, relatado pela Suprema Corte estadunidense, no qual abriu-se a possibilidade de qualquer órgão do Poder Judiciário deixar de aplicar, num caso concreto, lei e demais atos dos poderes constituídos, incompatíveis com a Constituição" e corroborando com este entendimento Pinho (2007, p. 35) afirma que: "[...]. Qualquer juiz ou tribunal pode declarar a inconstitucionalidade da lei no caso em exame[...]", conforme já ocorre nos Estados Unidos.
[3] Vade Mecum (2008, p. 37): "Art 97. Somente pelo voto da maioria absoluta se seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público."
[4] Esta sigla quer dizer "Supremo Tribunal Federal".
[5] CF no texto acima equivale ao vocábulo "Constituição Federal".
[6] Esta lei dispõe sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1o , do art. 102, da Constituição Federal de 1988 (CARDOSO, 1999).
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