A violência é um tema com muitas faces e presente em maior ou menor grau em quase todas as sociedades nacionais. Ela foi tema de todos os autores clássicos que, como Marx e Weber, enfatizaram sua importância na construção do capitalismo europeu. Aqui nos limitamos à abordagem de Freud feita, como se sabe, pelo estudo do complexo de Édipo e os sentimentos primários que ele origina na vida de crianças desde bebê até a morte do ser humano. Essa discussão serve de base para estudarmos, à guisa de resenha, dois livros recentes e bem sucedidos que lidaram com o problema da violência a partir dessa contribuição da psicanálise.
Palavras-chave: violência; Freud; psicanálise.
Abstract
Violence is a matter with many faces and it is present to different extent in almost all classes of society. It was treated by classical authors such as Marx and Weber who emphasized the importance of violence in constructing the european capitalism system. We restrict our approach to Freud analysis, which is connected with Oedipus complex and primary feelings that come from its influence and that affect human beings from their childhood until their death. This discussion inspired us to study two lately published and successful books connected with the violence problem from the psychoanalytic point of view.
Key-words: violence; Freud; psychoanalyze.
Este texto procura investigar a questão da violência nos dias de hoje através do exame de dois romances bastante bem sucedidos do ponto de vista da crítica e do público, a saber, Partículas Elementares, de Michel Houellebecq, Editora Sulina, Porto Alegre, 1999, publicado na França em 1998, e Nem Tudo Começa com um Beijo, de Jorge Araújo e Pedro Sousa Pereira, Editora Agir, Rio de Janeiro, 2006. Esta estratégia de abordar um problema tão difícil como a violência através de textos literários foi recomendada por Michel Foucault.
A agressividade humana que está subjacente a todos os aspectos da violência contemporânea foi estudada por Freud e seus discípulos no contexto do complexo de Édipo, cuja resolução por parte de cada ser humano origina a forma e a intensidade, tanto do amor quanto da agressividade. Um dos melhores estudiosos aí foi Melanie Klein, cujo trabalho teórico e terapêutico esteve vinculado a crianças bastante problemáticas. No livro de Melanie Klein e Joan Riviere, Amor, Ódio e Reparação, Imago Editora e Editora da Universidade de São Paulo, publicado em 1937 e, no Brasil, em 1975 (Segunda Edição), as autoras estudam os sentimentos básicos ou primários do homem, fome e amor, ou seja, o instinto de autopreservação e o instinto sexual.
Em qualquer situação humana a agressividade se constitui num elemento radical e básico na psicologia humana. Segundo Joan Riviere, nós também experimentamos e manifestamos sentimentos como o mau humor, o egoísmo, a mesquinhez, a voracidade, a inveja e a hostilidade tanto em nós quanto nos outros. Uma parte do nosso tempo e energia é gasto no esforço de superar e diminuir a infelicidade que tem origem nesses sentimentos.
Ao mesmo tempo, os impulsos agressivos, cruéis e egoísticos ligam-se intimamente a prazer e gratificação e podem ser acompanhados por sentimentos de fascinação ou de excitação. Esse prazer, que pode estar associado a emoções agressivas explica até certo ponto por que são tão difíceis de controlar. Nos diversos aspectos da atividade e nos prazeres, o instinto de autopreservação e o de amor só podem alcançar satisfação desde que ligados a uma certa dose de agressividade, que está presente como parte essencial desses dois instintos.
Embora saibamos da existência de sentimentos agressivos em nós mesmos e nos outros, isso não nos agrada e inconscientemente subestimamos sua importância. A maior fonte do sentimento de perda e sofrimento que está ligado a sentimentos hostis, é um desejo insatisfeito que, se for suficientemente forte provoca uma sensação de perda e sofrimento despertando agressividade da mesma forma que um ataque externo faria. Há uma situação na vida que deve ser realçada por que nela todos se sentem dependentes, é representada por relacionamentos amorosos. Neles o desejo sempre nos prende a outra pessoa. Ainda segundo Joan Riviere, "Nossa dependência dos outros é obviamente uma condição de nossa vida sob todos os seus aspectos: de autopreservação sexual ou de busca de prazer. E isto significa que, na vida, é necessário uma certa dose de participação, de espera, de desprendimento. Entretanto, embora significando uma conquista para a segurança coletiva, isto pode representar também uma perda da segurança individual. Portanto, esses relacionamentos dependentes tendem, por si mesmos a despertar resistência e emoções agressivas"
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