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Na passagem de um SC a outro cabem leis de transformação da mecânica clássica ou transformação clássica. Três idéias são importantes nesse caso:
Essas conclusões consistem no princípio de relatividade de Galileu, e é válido para os fenômenos mecânicos. A questão importante é saber se esse princípio é válido para os problemas não mecânicos, como os eletromagnéticos. Experiências simples envolvendo um SC unido ao seu meio e outro que se move uniformemente através do espaço podem indicar que as ondas sonoras movendo-se em dois SC uniformemente um em relação ao outro se ligam pela transformação clássica.
Um tipo semelhante de experiência indica que a velocidade da luz não varia independentemente da fonte da luz estar ou não em movimento. Essa observação coloca um fim a idéia de éter que seria carregado pelo movimento da onda luminosa, assim como a velocidade do som varia em dias calmos e em dias de vento. É exatamente esse o ponto visado pela experiência Michelson-Morley. Essas observações mostram que a transformação clássica perde o sentido diante do caráter constante da velocidade da luz. Mais tarde, Lorents descobre experimentalmente as equações de transformação válidas nesse novo contexto, ainda que estivesse preso à idéia de éter como uma realidade física capaz de produzir forças e que possuía propriedades mecânicas como massa, energia e momento. As equações de transformação foram obtidas por Lorents e Poincaré, antes de Einstein postular a sua teoria especial da relatividade que se traduz numa outra grande síntese teórica como a de Newton.
As relações entre tempo e distância partem de dois novos postulados:
Este é o princípio da teoria da relatividade especial. Embora suas idéias básicas pareçam arbitrárias, elas são facilmente demonstráveis com a ajuda da matemática. Assim, deixa-se de lado a idéia de um tempo absoluto fluindo do mesmo modo para todos os observadores em todos os sistemas de coordenadas. O tempo e a distância se alteram pois pode ser mostrado que um relógio em parece mudar de ritmo e uma régua parece mudar de comprimento para um observador em movimento. Essas observações dependem da transformação de Lorents, e conformam uma teoria mais geral que a da transformação de Galileu e a da mecânica clássica. Assim, a Física clássica é válida no seu campo, quando as velocidades são pequenas e as alterações de tempo e a comprimento, diminutos. Deve-se dizer, entretanto, que mesmo nos casos especiais a transformação clássica importa em pequenos erros de medição que se somam uns aos outros.
Podemos exemplificar o que foi dito quando se percebe que a força que atua sobre um certo corpo é a mesma para a mesma alteração de velocidade no mesmo tempo, mas que isso não tem validade para a lei das grandes velocidades, pois se a velocidade é grande, são necessárias forças extremamente potentes para aumentá-la. Quanto mais próximo da velocidade da luz estiver uma velocidade, se torna mais difícil aumentá-la, pois a velocidade limite no universo é a velocidade da luz. Por outro lado, para a teoria da relatividade, um corpo ou uma massa em repouso resiste mais fortemente a uma alteração se a massa for maior, mas também se a velocidade for maior. A massa inercial está relacionada com a velocidade e um corpo é infinitamente resistente quando sua velocidade se aproxima da velocidade da luz. Para Einstein toda energia resiste à alteração do movimento; e a energia se comporta como a matéria. Massa e energia são sinônimos, o Sol e as estrelas radiantes perdem massa pela emissão de radiação. Assim, temos apenas uma massa-energia presente no universo.
Einstein assim aprecia a teoria da relatividade que sintetiza:
"A influência da teoria da relatividade vai muito além do problema do qual ela surgiu. Remove as dificuldades e contradições da teoria de campo, formula leis mecânicas mais gerais; substituem duas leis de conservação por apenas uma; alteram nosso conceito clássico de tempo absoluto. Sua validez não está restrita a um domínio da Física: a teoria forma uma estrutura geral que abrange todos os fenômenos da Física"
O tempo passa a ser visto com Einstein como um contínuo espaço-tempo representando acontecimentos em lugares e instantes diferentes, que poderiam ser imaginados num diagrama das três dimensões e do tempo. A Física clássica preferiu representar o movimento como acontecimentos no espaço, mas a teoria da relatividade preferiu uma representação no espaço-tempo. Essas duas representações são equivalentes do ponto de vista da Física clássica, pois ela conhece apenas um tempo absoluto para todos os observadores. No caso da teoria da relatividade a coordenada do tempo e a coordenada do espaço serão diferentes em dois sistemas de coordenadas e a alteração na coordenada do tempo será muito distinta se a velocidade entre esses dois sistemas for próxima da velocidade da luz. Para a Física relativista o mundo dos acontecimentos pode ser descrito por uma representação estática projetada sobre o fundo de um contínuo espaço-tempo de quatro dimensões. Finalmente, a nova Física deixa de lado a idéia de um sistema inercial. Antes, percebe o universo onde há apenas movimento relativo. Tudo no universo se move e podemos apreender esse movimento tomando uma ou outra referência. Como diz Einstein, a Física moderna é mais simples do que a antiga, porque simplifica a representação do mundo externo e abarca mais fácil, embora choque nosso conhecimento anterior. Assim, ela reflete nas nossas mentes a "harmonia do universo".
Outro ponto importante na discussão da relatividade refere-se à lei da inércia, postulada por Galileu e adotada como a primeira lei de movimento da mecânica de Newton. Ela supõe um corpo movendo-se para sempre sem atrito e sem a ação de qualquer força externa. Um sistema de coordenadas inercial, portanto, um corpo em movimento sobre o qual não atue força alguma se moverá uniformemente para sempre, sem ser limitado no tempo e no espaço. Einstein coloca limites a essa Lei supondo um elevador no topo de um arranha-céu imenso cujo cabo se rompe fazendo o elevador cair livremente em direção ao solo. Imaginemos também que um observador dentro do elevador retira um lenço e um relógio no bolso deixando-os cair. Como é visto o movimento desses corpos? Para alguém que se encontre do lado de fora e está olhando pela janela do elevador, tanto o lenço como o relógio caem em direção ao solo com a mesma aceleração, visto que a aceleração de um corpo em queda não depende de sua massa e, logo, existe uma igualdade entre a massa gravitacional e a massa inercial.
O elevador com suas paredes, seu teto e seu piso também está caindo com a mesma aceleração, logo, para o observador que se encontra no elevador, o relógio e o lenço permanecem onde estavam quando os havia largado. Comparando a Física clássica com a relativista podemos dizer que a primeira vale para o observador dentro do elevador, no qual todos os corpos se comportam de acordo com a Lei da Inércia, até que o elevador colida com o chão. Existe portanto um campo gravitacional que não é percebido dentro do elevador, mas que existe por causa da equivalência entre as massas gravitacional e inercial. A inclusão da gravidade como um outro elemento a ser relacionado com o contínuo espaço-tempo marca passagem da chamada relatividade restrita ou especial para a relatividade geral. Ela vale inclusive para um raio de luz que tem energia e portanto massa, sendo, dessa forma, atraída pelo campo gravitacional, já que, mais uma vez, as massas inercial e gravitacional são equivalentes. Um raio de luz se curvará em um campo gravitacional como qualquer corpo. Como assinala Einstein,
"As nossas experiências idealizadas mostram como o problema da teoria da relatividade generalizada está estreitamente ligado ao da gravitação, e porque a equivalência entre massas gravitacional e inercial é tão essencial nesse sentido. É claro que a solução do problema gravitacional na teoria da teoria da relatividade generalizada deve diferir da solução newtoniana. As leis da gravitação devem, como todas as leis da natureza, ser formuladas para todos os SC (sistemas de coordenadas) possíveis, enquanto as leis da mecânica clássica, conforme formuladas por Newton, são válidas apenas nos SC inerciais".
Einstein tenta resolver esse problema fazendo uma conexão entre a teoria da relatividade generalizada e a Geometria. Ele trabalhou arduamente com matemáticos aplicados à Geometria não euclidiana, pensando num espaço que depende dos corpos e numa gravidade ligada à conformação desse espaço. Essa é uma tentativa de resolver o problema da gravitação. O problema de verificar empiricamente os resultados conceituais e matemáticos da Física relativista é bastante difícil e não está, na altura em que Einstein escrevia, definitivamente resolvido, mas havia boas indicações derivadas de observações astronômicas como o já conhecido desvio do movimento do planeta Mercúrio da elipse, dada sua proximidade do Sol, quanto da importância dessa Física para o conhecimento das partículas e da estrutura da matéria.
É interessante que, segundo nosso autor, a maior parte da energia está concentrada na matéria, mas o campo que envolve uma partícula também representa uma energia. Nesse sentido, matéria é o local onde a concentração de energia é grande, e campo, onde é pequena, e matéria e energia não se separam de modo muito distinto. A teoria da relatividade dá muito mais importância ao conceito de campo que a Física clássica, mas ainda não se havia formulado uma Física de campo pura, que postulasse um contínuo campo-matéria. Este foi o problema deixado por Einstein aos físicos do futuro.
Vejamos os momentos principais do desenvolvimento da Física desde Newton até a Física relativista. Seguimos aqui as Notas Autobiográficas de Einstein. Partindo de seus predecessores, a partir dos conceitos de massa e de força, Newton construiu a Física clássica pelo desenvolvimento do método matemático adequado especialmente das equações diferenciais parciais. Assim, a Física clássica pôde abranger a teoria da propagação do som, os fundamentos da hidrodinâmica e a mecânica das massas distintas, chegando mesmo a elaborar uma teoria mecânica da luz; a teoria cinética dos gases; a independência do calor específico dos gases não atômicos; do peso atômico; a derivação da equação do estado de um gás e sua relação com o calor específico; a teoria cinética da dissociação dos gases e a importante relação quantitativa entre viscosidade, condução do calor e difusão dos gases, que permitiu medir a grandeza absoluta do átomo. Assim, a mecânica era a base da Física e das hipóteses acerca do átomo, que também impulsionou a Química. Finalmente, foi muito importante o fato de a teoria estatística da mecânica clássica ter deduzido as leis básicas da termodinâmica. É fácil ver que essa Física mecânica e materialista pôde abranger toda a Física e toda ciência natural do seu tempo.
Ainda seguindo Einstein, essa crença de que a mecânica é a base final e definitiva do pensamento físico levou mesmo Maxwell a tentar basear sua teoria do eletromagnetismo na mecânica, embora essa fosse uma visão equivocada como cientistas posteriores mostraram, a partir de Ernest Mach.
Em primeiro lugar, a incorporação das ondas ópticas no quadro da mecânica estava destinada a criar sérias dúvidas. A luz era vista como uma onda num corpo elástico, o éter, o que implicava que este devia ser um meio capaz de impregnar tudo pelo fato das ondas luminosas serem transversais, assemelhando-se a um corpo sólido mas compressível. O éter deveria existir como um invólucro ao lado da matéria, sem oferecer resistência alguma ao movimento dos corpos. O processo de emissão e absorção de radiação, a refração dos corpos transparentes são alguns exemplos de interações entre o éter e a matéria ponderável cuja dificuldade de explicação impediu que essa fosse tentada. As forças eletromagnéticas, por outro lado, necessitam da introdução de massas elétricas que atuam entre si embora sem possuir inércia. O conceito de inércia começa pois a ser posto em xeque.
Mas Faraday e Maxwell marcam o fim da mecânica newtoniana como base de toda Física. A eletrodinâmica que eles criaram, confirmada por Hertz, mostrou ondas no espaço vazio que consistem em campos eletromagnéticos. Neste ponto existem dois tipos de elementos conceituais, pontos materiais com forças a certa distância entre eles e de outro lado o campo contínuo, num estágio intermediário da Física. As tentativas de dar um sentido mecânico ao eletromagnetismo foram aos poucos sendo abandonadas.
As idéias de Maxwell foram, na verdade, revolucionárias, ao criar o conceito de campo, substituindo a ação à distância de massas. Como anota Einstein:
"A incorporação da óptica à teoria do eletromagnetismo, ao lado da relação entre a velocidade da luz e o sistema magnético e elétrico absoluto de unidades, bem como a relação entre o índice de refração e a constante dielétrica, a relação quantitativa entre o coeficiente e o reflexo de um corpo e sua condutividade metálica - tudo isso era como uma revelação. Sem contar a transição para uma teoria de campo, isto é, a expressão das leis elementares através de equações diferenciais, faltava a Maxwell apenas um simples passo hipotético, a introdução da corrente elétrica de deslocamento no vácuo e na dieletricidade e seu efeito magnético, uma inovação quase preordenada pelas propriedades formais das equações diferenciais".
A dificuldade dessa teoria é que a matéria aparecia como portadora do campo e não do espaço, o que implicava a noção de que ela deveria ter velocidade e isso se aplicava também ao éter. Lorentz acertou a teoria da forma seguinte: segundo Hertz, a princípio um campo existe apenas no espaço vazio. A matéria constituída de átomos é a única sede das cargas elétricas; entre as partículas materiais há um vazio, a sede do ponto eletromagnético, produzido pela posição e velocidade da carga localizada nas partículas da matéria. Essas cargas criam o campo, o qual, por seu lado, exerce força sobre as cargas da partículas, determinando assim seu movimento. A ação a distância é substituída pelo campo, o qual descreve também a radiação. Pode-se incluir a gravitação com expansão das leis de campo, de Maxwell. Lorentz trabalhou com a única solução possível no seu tempo, mas marcou uma base fundamental para uma nova Física. A partir daí, temos o desenvolvimento da teoria dos Quanta e a teoria relativista como colocamos na parte inicial desse texto.
A teoria da relatividade, segundo Einstein, é mais geral que a Física dos Quanta e o eletromagnetismo, sendo uma teoria quase completa. Seu impacto foi enorme em áreas como a Astrofísica, abrindo horizontes para o estudo do espaço cósmico e de seus elementos, bem como de sua composição e de sua dinâmica. Todo um conjunto de corpos como buracos negros, os vários tipos de estrelas, sua composição gasosa, etc, foram abertos para os astrônomos e para viagens através de sondas pelo espaço sideral. Da mesma forma Einstein abriu um grande espaço na Física de partículas, onde a relação entre massa, energia e espaço é muito intensa. Ele foi por isso um dos descobridores da energia nuclear, cuja viabilidade percebeu ao escrever a fórmula E=mc2 ou energia é igual a massa vezes a constante velocidade da luz ao quadrado.
Esta energia transtornou o século XX tanto do ponto de vista elétrico como bélico e ainda hoje é uma questão em aberto na relação entre os países, como se pode ver nas relações atuais entre os Estados Unidos, o Irã e a Coréia do Norte. A Física relativista tem um papel importante do ponto de vista tecnológico, seja na construção de relógios atômicos como na engenharia aeroespacial. A Física dos Quanta, para a qual Einstein contribuiu decisivamente com a idéia de descontinuidade da matéria e da energia também alcançou áreas como a Biologia e a Química, por exemplo através da estrutura do DNA que tornou a Biologia uma ciência muito mais madura nos anos 60 com Watson e Crick.
Em áreas onde não se pode ver uma influência direta da teoria, temos, entretanto, convergências entre as formas de pensar de outras disciplinas. É notável o debate matemático nas primeiras décadas no século XX e que foi crucial para o desenvolvimento das idéias de Einstein entre, por exemplo, Poincaré, Gödel, André Weil, e os geômetras não euclidianos. Esse debate metodológico e lógico tornou possível as idéias centrais de campo, relações entre massa, espaço, tempo, gravitação e energia. Como se percebe ao longo de grande parte da história da física, problemas matemáticos se tornam ao mesmo tempo problemas físicos e vice-versa.
Mas uma área mais remota como a Economia também foi alcançada por uma família de idéias semelhantes. Pensamos logo em Lord Keynes, cuja principal obra chama-se, não à toa, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. Keynes desejava livrar-se do equilíbrio presente tanto nos modelos de equilíbrio geral e mesmo nos de equilíbrio parcial. Sua construção envolvia a determinação da renda e do emprego pelo gasto efetivo principalmente em investimento e, subordinadamente, ao consumo. Nessa construção Keynes elabora uma complexa teoria financeira e monetária e esboça uma teoria dos determinantes do investimento que fazem a renda totalmente autônoma da idéia de equilíbrio. Na verdade a renda e o capitalismo são vistos como perigosamente instáveis, razão pela qual precisa ser amparado por políticas fiscais e monetárias decisivas.
O equilíbrio nas antigas teorias era garantido por conceitos como utilidade do consumidor e do produtor, funções de produção, funções articuladas de oferta e demanda, que diziam respeito seja a um mercado particular, seja ao conjunto da economia. A forma como eram construídas essas funções tornavam o dinheiro dispensável, um mero véu que encobria relações reais ou entre coisas. Ao mesmo tempo tornavam o equilíbrio de pleno emprego e a renda máxima de uma dada estrutura econômica fatores aos quais tendia todo sistema econômico. Do ponto de vista keynesiano o fato de o dinheiro ser um meio de entesouramento e não apenas de troca inverteu a antiga ótica. O equilíbrio de pleno emprego torna-se ilusório, já que a economia deve ser pensada sem esse conceito de equilíbrio, embora o pleno emprego deva ser uma meta a ser buscada de modo permanente, o que origina uma ética inerente ao grande pensador.
A economia convencional, inspirando-se na Mecânica Clássica pressupunha equilíbrio de forças entre os agentes e repouso na situação de pleno emprego. Keynes rompe com esse conceito de estática, fundando uma teoria da dinâmica econômica e percebendo portanto uma nova temporalidade na economia. Isso fica claro quando se pensa nos determinantes do gasto.
Assim, tal como Einstein, Keynes foi um pensador da cultura, da sua época, um pacifista intransigente e um filósofo sobre a sua época e a disciplina em que se engajou.
Bibliografia
1: Albert Einstein e Leopold Infeld- A evolução da Física 3º edição, Zahar Editores, Rio, 1976.
2: Albert Einstein- Notas Autobiográficas- Nova Fronteira, Rio, 1982.
3: Albert Einstein- Como Vejo o Mundo- Nova Fronteira, Rio, 1981.
4: Mario Luiz Possas- Dinâmica e Concorrência Capitalista: Uma interpretação a partir de Marx- Hucitec, Unicamp,1989.
5: J.M.Keynes- A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, Rio, Atlas, 1982.
Igor Zanoni Constant Carneiro Leão
igorzaleao[arroba]yahoo.com.br
Professor doutor do Departamento de Economa da Universidade Federal do Paraná,Brasil
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