Estudo transversal de base populacional investigou determinantes de sobrepeso em crianças de 12 a 59 meses em Porto Alegre (n = 2.660). Razões de chance (RC) de sobrepeso, definido por peso/altura > 2 escores-z do padrão NCHS, foram estimadas para condições sócio-econômicas e demográficas, ambiente social imediato e eventos de saúde da criança. A prevalência de sobrepeso foi 6,5%. No modelo multivariado, a chance de sobrepeso na criança associou-se positivamente à escolaridade materna (escolaridade > 12 anos, RC = 2,36; IC95%: 1,21-4,60; 9-11 anos, RC = 2,07; IC95%: 1,16-3,70) e à renda familiar per capita > 2 salários mínimos (RC = 1,86; IC95%: 1,13-3,08) e negativamente ao trabalho materno remunerado (RC = 0,72; IC95%: 0,52-0,99). A chance foi maior para os nascidos grandes para idade gestacional (RC = 2,29; IC95%: 1,36-3,85) e menor para os nascidos pequenos (RC = 0,57; IC95%: 0,33-0,99), comparados aos nascidos com peso adequado. Escolaridade paterna, qualificação profissional dos pais e idade materna ao nascimento da criança evidenciaram efeito somente no modelo bruto. São necessários programas para prevenir sobrepeso em crianças, com especial atenção às famílias e crianças em maior risco.
Palavras-chave: Sobrepeso; Saúde Infantil; Condições Sociais; Fatores de Risco
Risk factors for overweight were investigated in a cross-sectional survey of children aged 12-59 months in the Southern Brazilian city of Porto Alegre (n = 2,660). Odds ratios (OR) for overweight, defined by weight/height > 2 z-scores of the NCHS standards, were estimated for socioeconomic and demographic conditions, social environment, and childhood health events. Prevalence of overweight was 6.5%. In the multivariate model, the odds of overweight were positively associated with maternal education (schooling > 12 years, OR = 2.36; 95%CI: 1.21-4.60; 9-11 years, OR = 2.07; 95%CI: 1.16-3.70) and family income per capita > 2 times the minimum wage (OR = 1.86; 95%CI: 1.13-3.08) and negatively associated with maternal work (OR = 0.72; 95%CI: 0.52-0.99). Odds were higher for children born large-for-gestational-age (OR = 2.29; 95%CI: 1.36-3.85) and lower for children born small (OR = 0.57; 95%CI: 0.33-0.99), as compared to those born with adequate birth weight for gestational age. Paternal schooling, parental occupation, and maternal age at the child's birth were associated with overweight in the unadjusted model only. Programs are needed to prevent overweight during childhood, with special attention to families and children at increased risk.
Key words: Overweight; Child Health; Social Conditions; Risk Factors
O excesso de peso em crianças tem sido relacionado a desordens psicológicas e orgânicas, como diminuição da auto-estima, dificuldade de adaptação social (Gortmaker et al., 1993), hipertensão, cardiomiopatia, pancreatite, problemas ortopédicos e respiratórios (Must, 1996), e estresse devido ao estigma de pessoa fraca ou indisciplinada (Canadian Task Force on the Periodic Health Examination, 1994). Além disso, a obesidade na infância tem sido associada à obesidade na vida adulta (Whitaker et al, 1997), sendo críticos o período pré-natal, o de adiposidade redundante (6-6,5 anos) e a adolescência (Dietz, 1994). Adiposidade redundante antes dos 5,5 anos aumenta o risco de obesidade em adolescentes e adultos (Rolland-Cachera et al., 1987), havendo evidência de que pré-escolares obesos têm o dobro de risco de tornarem-se adultos obesos (Serdula et al., 1993).
Estudos de base populacional investigando sobrepeso ou obesidade em crianças são raros, e seus resultados são preocupantes. A prevalência de sobrepeso foi 16% entre crianças inglesas de dois anos (Reilly & Dorosty, 1999a), 25% entre as de 5 a 11 anos (Duran-Tauleria et al., 1995) e 22% entre as de seis anos (Reilly & Dorosty, 1999b). A prevalência de sobrepeso em crianças americanas de 6 a 11 anos foi de 13,7% (CDC, 1997). No Brasil, a Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989 estimou que 4,8% dos menores de dez anos (Engstrom & Anjos, 1996) e 4,6% das crianças entre 1 a 4 anos tinham sobrepeso (Monteiro et al., 1995).
Os poucos estudos que mediram a prevalência de sobrepeso na mesma população sugerem que aquela está aumentando. Em 1960, estimou-se que 15% das crianças americanas de 6 a 11 anos eram obesas e que, em 1991, este número aumentou para 22% (Troiano et al., 1995); em menores de cinco anos de baixa renda, a prevalência de sobrepeso parece ter aumentado de 18,6%, em 1983, para 21,6%, em 1995 (Mei et al., 1998). Estudo no Sul do Brasil estimou que a prevalência de obesidade em crianças de aproximadamente um ano aumentou de 4,0%, em 1982, para 6,7%, em 1993 (Post et al., 1996).
A determinação de sobrepeso na infância tem sido atribuída a fatores genéticos e ambientais (Diamond Jr., 1998), como hábitos alimentares e estilo de vida (Canadian Task Force on the Periodic Health Examination, 1994), que podem relacionar-se às condições sócio-econômicas da família. Em países desenvolvidos, alguns estudos sugerem que a prevalência de sobrepeso é maior entre crianças com piores condições sócio-econômicas (Gerald et al., 1994; Müller et al., 1999; Strauss & Knight, 1999), embora também tenha sido observada menor prevalência quando a educação materna era baixa (Duran-Tauleria et al., 1995). Já no Brasil e em outros países em desenvolvimento, estudos tendem a evidenciar associação entre sobrepeso na criança e melhores condições sócio-econômicas familiares, indicadas por escolaridade dos pais, qualificação profissional, trabalho materno, renda familiar e utilidades domésticas, como telefone (Al-Isa & Moussa, 1999; Engstrom & Anjos, 1996; Ho et al., 1991; Kain et al., 1998; Monteiro & Conde, 2000; Victora et al., 1988).
Outros determinantes de sobrepeso também têm sido analisados. Alguns estudos relatam que a prevalência de sobrepeso na criança é maior quando a criança é o primeiro filho (Al-Isa & Moussa, 1999; Kain et al., 1998), vive somente com o pai ou com a mãe (Duran-Tauleria et al., 1995), a idade materna ao nascimento da criança é menor ou igual a vinte anos, moram mais de três crianças no domicílio (Rasmussen & Johansson, 1998) e o peso ao nascimento é maior do que 3.500 gramas (Alegría et al., 1988; Duran-Tauleria et al., 1995; Takahashi et al., 1999; Victora et al., 1988). Em contrapartida, crianças com retardo de crescimento intra-uterino precoce têm maior probabilidade de tornarem-se obesas (Strauss, 1997). A prevalência de obesidade parece ser menor quanto maior o número de crianças na família (Duran-Tauleria et al., 1995).
O presente estudo analisa a associação das condições sócio-econômicas e outros fatores com o sobrepeso em crianças entre 12 e 59 meses.
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