Artigo original: "Revista: PEDIATRIA MODERNA - Edição: Mar/Abr 06 V 42 N 2"
Objetivo: Avaliar quantitativa e qualitativamente o consumo alimentar de adolescentes com sobrepeso e obesidade, estudantes de escolas pública e privada do Município de Cotia. Casuística e métodos: Estudo transversal com 67 estudantes (55,2% do sexo feminino) de 10 a 18 anos, que preencheram um registro de consumo alimentar de três dias alternados e responderam a uma pergunta fechada sobre a prática de dieta para perda de peso. Utilizou-se o software Nutwin para obter valores de energia e macronutrientes, analisando-os segundo DRIs/2002. Para avaliação qualitativa foram determinadas refeições padrão e freqüências de alimentos. Resultados: População homogênea quanto ao sexo e à escola, sendo 64,2% com consumo abaixo das necessidades energéticas, dos quais 27,9% realizavam dieta para perda de peso, predominando o sexo feminino e a escola privada. Quanto aos macronutrientes, 85,1%, 62,7% e 98,5% apresentaram valores dentro da faixa de recomendação para carboidrato, lipídeo e proteína, respectivamente. A refeição menos praticada foi o desjejum. Notou-se substituição do almoço e do jantar por lanches, salgados e pizzas. Durante o período escolar, 58,2% dos adolescentes consumiram alimentos da cantina, sendo a maioria da escola pública. Conclusão: A alimentação dos adolescentes é desequilibrada quantitativamente, principalmente quanto à energia, e qualitativamente, como um todo, devendo-se intervir precocemente por meio de educação nutricional, visando sua saúde futura.
A adolescência é considerada uma fase vulnerável em termos nutricionais, principalmente pelo fato de haver maior demanda de nutrientes relacionada ao aumento dramático no crescimento e desenvolvimento físicos, mudança de estilo de vida e hábitos alimentares inadequados, afetando a ingestão e a necessidade de nutrientes. Além disso, a participação em esportes, a gravidez, o desenvolvimento de distúrbios da alimentação, a realização excessiva de dietas, o uso de álcool e de drogas são situações comuns na vida dos adolescentes, podendo comprometer mais ainda o seu estado nutricional (Mahan & Scott-Stump, 2002).
As intensas transformações físicas, psíquicas e sociais ocorridas nesta fase acabam por influenciar o comportamento alimentar. Assim, o adolescente se torna suscetível às preferências alimentares, que podem acarretar hábitos inadequados e deficiências nutricionais (Gama, 1999).
Os hábitos alimentares se criam na ocasião em que o adolescente valoriza cada vez mais a sua independência e se torna responsável pelo seu próprio consumo alimentar. Nota-se que ele tende a estabelecer associação negativa com os alimentos saudáveis e positiva com os alimentos de baixo valor nutriticional (Jacobson, 1998; Oliveira & Escrivão, 2001).
Segundo Fisberg et al. (2000), os principais problemas detectados na alimentação dos adolescentes são:
· Omissão de refeições, principalmente o café da manhã, o que pode levar a um menor rendimento escolar;
Substituição das principais refeições (almoço e jantar) por lanches, principalmente quando este é o hábito familiar;
· Alta ingestão de refrigerantes (aproximadamente um litro por dia);
· Alimentos com alta densidade calórica (normalmente salgados fritos, bolachas recheadas, chocolate e alto consumo de balas, diariamente);
· Baixa ingestão de frutas e hortaliças.
Sabe-se que, durante o período de pico de velocidade de crescimento, os adolescentes freqüentemente precisam consumir maiores quantidades de alimentos, sendo capazes de utilizá-los com alta concentração de energia. Entretanto, eles precisam ser mais cuidadosos com a freqüência da alimentação quando o crescimento tiver cessado. O hábito de alimentar-se em excesso, adotado durante a adolescência, pode finalmente contribuir para uma série de doenças debilitantes, assim como para o sobrepeso e a obesidade (Mahan & Scott-Stump, 2002).
Segundo Dietz (1997), a adolescência pode ser um dos períodos críticos do desenvolvimento em que mudanças fisiológicas aumentam o risco de obesidade e de sua persistência futura, pois durante a puberdade se estabelece o padrão de gordura corporal, caracterizado pelo aumento da quantidade e redistribuição de gordura. Pode-se dizer que os fatores causais da obesidade estão ligados ao excesso de energia proveniente do consumo de alimentos ricos em carboidratos e gorduras, ao reduzido gasto, devido ao sedentarismo, ou às alterações na regulação deste balanço energético (Oliveira & Escrivão, 2001; Monteiro et al., 1995).
No decorrer dos últimos decênios a atividade física em adolescentes diminuiu, enquanto o consumo de alimentos permaneceu, tendo como conseqüência inevitável o aumento da predominância do sobrepeso e da obesidade (Jacobson, 1998).
Segundo estimativas do IBGE (2001), o número de pessoas obesas está em 60 milhões, sendo que em algumas capitais está havendo um crescente aumento da prevalência de sobrepeso e obesidade em escolares de 6 a 18 anos (Cintra, Oliveira & Fisberg, 2001).
Atualmente, a obesidade constitui problema de difícil solução. Verifica-se que cerca de 80% dos adolescentes obesos tornam-se adultos obesos. Na infância e principalmente durante a adolescência a obesidade deve ser encarada com muita seriedade, pois é nessa fase que realmente se pode ajudar o paciente a corrigir eventuais falhas. Entretanto, os programas terapêuticos realistas, educacionais e completos são raros. Dessa forma, o adolescente obeso permanecerá provavelmente obeso pelo resto da vida (Sichieri, 1999; Saito, 1994; Mahan & Scott-Stump, 2002).
Os distúrbios nutricionais já em idades precoces estão geralmente associados ao aparecimento e desenvolvimento de fatores de risco que podem predispor os adultos à maior incidência de distúrbios metabólicos e funcionais. Hábitos alimentares inadequados na adolescência podem ser fatores de risco para a presença de doenças crônicas não transmissíveis, tanto na vida atual como na futura (Guedes & Guedes, 1998; Mendes et al., 2001).
Após estudo com 320 adolescentes obesos do município de São Paulo, observou-se um risco aumentado de morbimortalidade para certas moléstias, como doença cardiovascular, diabetes, hipertensão arterial, dislipidemia e alguns tipos de câncer (Oliveira & Escrivão, 2001). Nos últimos anos se verifica um aumento significativo de doenças associadas à obesidade em escolares mais jovens, com maior número de crianças e adolescentes apresentando complicações cardiovasculares em idades mais precoces (Fisberg, 2004).
A prevenção primária para o controle da obesidade está no controle alimentar na adolescência. Atitudes propostas para o controle objetivo da obesidade devem ser orientadas para conscientização global da população, com medidas para corrigir distúrbios alimentares que podem predispor ao desencadeamento da doença (Silva & Palhares, 1999).
Visto que a obesidade é uma alteração nutricional em ascensão no mundo moderno, com sérias repercussões na saúde, na vida adulta, torna-se fundamental conhecer o consumo alimentar de adolescentes com sobrepeso e obesidade, com o intuito de incentivar hábitos e estilo de vida que propiciem saúde, alimentação e nutrição adequadas.
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