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Toxicidade de produtos fitossanitários utilizados no controle de leptopharsa heveae para f (página 2)

Júlio Marcos Melges Walder

 

INTRODUÇÃO

O Manejo Integrado de Pragas (MIP) encoraja a diminuição da utilização de pesticidas químicos e fornece várias opções de se controlar a praga harmoniosamente, fazendo com que esta permaneça em baixos níveis populacionais e assim não causem danos econômicos à cultura (PAPACEK & SMITH, 1994).O controle biológico está entre as opções preconizadas pelo MIP, utilizando agentes biológicos; tais como predadores, parasitóides e entomopatógenos.Muitas vezes, os fungos para serem utilizados no controle microbiano como inseticidas biológicos, não estão disponíveis em grandes quantidades e faz-se necessário o uso de produtos fitossanitários para reduzir a população de Leptopharsa heveae.O impacto da aplicação desses pesticidas sobre os entomopatógenos pode variar em função da espécie e linhagem do patógeno, da natureza química dos produtos e das concentrações utilizadas. Esses produtos podem atuar inibindo o crescimento vegetativo, a conidiogênese e a esporulação dos microrganismos, e até causando mutações genéticas, as quais podem levar a diminuição da virulência à determinada praga.Sendo assim, é necessária a utilização de produtos seletivos que não afetem o equilíbrio entre as pragas e seus predadores, parasitos e patógenos, responsáveis pelo controle biológico natural, que mantém as pragas em níveis populacionais aceitáveis (ALVES, 1998). Portanto, torna-se necessário a aplicação racional de produtos químicos que venham a favorecer as formas alternativas de controle de pragas, baseando-se na preservação dos inimigos naturais existentes no agroecossistema.Diversas formulações foram avaliadas quanto ao efeito tóxico sobre Bacillus thuringiensis, Metarhizium anisopliae e Aspergillus sp. por ALVES (1978). O efeito de alguns produtos químicos sobre Atractium flammeum, Hirsutella thompsonii, Verticillium lecanii e Aschersonia aleyrodis foram estudados por ALVES et al.(1993) os quais concluíram que Torque 500 SC, Danimen 300 CE e Morestan 50 SC foram os mais seletivos aos fungos estudados.A variabilidade genética natural entre isolados de uma mesma espécie de fungo entomopatogênicos é bastante conhecida e relatada. Esta variabilidade também ocorre para a sensibilidade a produtos químicos.Assim, TODOVORA (1998) procurou explicar as diferentes respostas de Beauveria bassiana com um mesmo produto químico.ALVES et al. (1998) apresentaram diversas tabelas de compatibilidade e demonstraram que a toxicidade de um produto pode estar relacionada com sua concentração e tipo de formulação em que o princípio ativo foi preparado. Existem produtos que são muito tóxicos mesmo em concentrações muito reduzidas.Assim, a simples utilização de produtos fitossanitários compatíveis a esses entomopatógenos representa uma estratégia prática e econômica que contribui para a proteção dos entomopatógenos e equilíbrio do ambiente.

O objetivo desse trabalho é conhecer o efeito tóxico de algumas formulações de produtos fitossanitários utilizados na heveicultura para controle de L. heveae, aos fungos entomopatogênicos selecionados para controle do inseto, e assim elaborar com segurança uma estratégia eficiente de manejo ecológico dessa praga.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram avaliados os efeitos tóxicos "in vitro" de diversos pesticidas químicos utilizados na cultura da seringueira sobre isolados dos fungos Beauveria brongniartii (619), V. lecanii (972), M. anisopliae (1144 e 1189), Paecilomyces fumosoroseus (1200), Sporotrix insectorum (1229) e B. bassiana (1196). Esses fungos foram selecionados, em condições de laboratório, para controle de L. heveae.Os produtos foram adicionados em concentrações pré estabelecidas (Tabela 1), em meio de cultura BDA (Batata-Dextrose-Ágar), quando este ainda encontrava- se em estado líquido, sob a temperatura de aproximadamente 50ºC. Após a solidificação do meio em placa de Petri, foi feita a inoculação dos microrganismos com alça de platina, em três pontos por placa, eqüidistantes entre si, para evitar o contato entre as colônias. Foram feitas 9 inoculações por tratamento, sendo consideradas na avaliação as cinco colônias mais uniformes.Ao final de um período de 10 dias, as placas foram retiradas da incubação (câmara tipo BOD, com temperatura 26 ± 0,5°C, fotofase de 12 horas e umidade relativa de 70 ± 10%), avaliando-se o efeito tóxico pela observação do crescimento vegetativo e da produção de conídios das colônias dos fungos na superfície do meio de cultura. Primeiramente, foi avaliado o diâmetro médio das colônias utilizando uma régua para medição. Para a avaliação da produção, as colônias foram recortadas junto com o meio de cultura e transferidas para tubos de vidro com água destilada estéril. Os conídios foram retirados com auxílio de uma espátula de borracha sendo preparadas uma série de diluições sucessivas para a obtenção de uma suspensão que permitiu a contagem dos conídios por meio de câmara de Neubauer.

Para a classificação de toxicidade da formulação foi utilizado o modelo proposto por ALVES et al. (1998).

Onde:

T: valor corrigido do crescimento vegetativo e da esporulação para classificação do produto;CV: porcentagem de crescimento vegetativo com relação à testemunha;ESP: porcentagem de esporulação com relação à testemunha.

A partir dos valores calculados de T, procedeu-se a comparação com os limites estabelecidos por ALVES et al., 1998 (Tabela 2).

Tabela 1 - Produtos fitossanitários utilizados nos ensaios de compatibilidade com os fungos entomopatogênicos selecionados para controle de Leptopharsa heveae

Produto Comercial*

Ingrediente Ativo

Concentração

Classe

Grupo

Decis 25 CE

Deltametrina

0,2 L/ha

Inseticida

Piretróide

Dipterex 500

Triclorfon

0,9 L/ha

Inseticida

Organosfosforado

Nuvacron

Monocrotofós

0,4 L/ha

Inseticida/ acaricida

Organosfosforado

Marshal 200 SC

Carbosulfan

0,15 L/ha

Acaricida

Carbamato

Stron

Metamidofós

1,0 L/ha

Inseticida/acaricida

Organofosforado

Karate 50 CE

Lambdacyhalothrin

0,45 L/ha

Inseticida

Piretróide

*Esses produtos não são registrados para o controle de Leptopharsa heveae e nem para a cultura da seringueira. Foram escolhidos por serem utilizados na prática para o controle desse inseto e de ácaros em várias regiões heveícolas (Andrei, 1999).

Tabela 2 - Classificação da toxicidade de produtos químicos sobre fungos entomopatogênicos.-

Valor de T

Classificação do Produto

0 a 30

Muito tóxico

31 a 45

Tóxico

46 a 60

Moderadamente tóxico

>60

Compatível

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As formulações de deltametrina (Decis) e monocrotofós (Nuvacron) foram compatíveis com B. brongniartii (619) (Tabela 3). A maioria das combinações, com exceção da formulação de Decis foi compatível com V. lecanii (972). O fungo M. anisopliae (1144) foi muito sensível para todas as formulações. Já outro isolado de M. anisopliae (1189) não foi suscetível com às formulações dos produtos triclorfon, carbosulfan e metamidofós, o que mostra a variabilidade genética de uma mesma espécie de fungo. As formulações de monocrotofós e metamidofós foram compatíveis com B. bassiana (1196), P. fumosoroseus (1200) e S. insectorum (1229). A formulação de carbosulfan foi compatível com B. bassiana (1196) e S. insectorum (1229) e a formulação de triclorfon não afetou P. fumosoroseus (1200) (Tabela 3).

Tabela 3 - Valores T e classificação da toxicidade dos produtos fitossanitários aos isolados de fungos selecionados para controle de Leptopharsa heveae (Piracicaba-SP, 2001).

Tratamentos

Valor T

Classificação

B. brongniarti

619 + deltametrina (Decis)

88

Compatível

619 + monocrotofós (Nuvacron)

144

Compatível

619 + triclorfon (Dipterex)

35

Tóxico

619 + carbosulfan (Marshal)

37

Tóxico

619 + metamidofós (Stron)

35

Tóxico

619 + lambdacyhalothrin (Karate)

12

Muito tóxico

V. lecanii

972 + deltametrina (Decis)

33

Tóxico

972 + monocrotofós (Nuvacron)

61

Compatível

972 + triclorfon (Dipterex)

62

Compatível

972 + carbosulfan (Marshal)

77

Compatível

972 + metamidofós (Stron)

84

Compatível

972 + lambdacyhalothrin (Karate)

122

Compatível

M. anisopliae

1144 + deltametrina (Decis)

15

Muito tóxico

1144 + monocrotofós (Nuvacron)

18

Muito tóxico

1144 + triclorfon (Dipterex)

24

Muito tóxico

1144 + carbosulfan (Marshal)

19

Muito tóxico

1144 + metamidofós (Stron)

24

Muito tóxico

1144 + lambdacyhalothrin (Karate)

16

Muito tóxico

M. anisopliae

1189 + deltametrina (Decis)

42

Tóxico

1189 + monocrotofós (Nuvacron)

49

Moderadamente tóxico

1189 + triclorfon (Dipterex)

137

Compatível

1189 + carbosulfan (Marshal)

96

Compatível

1189 + metamidofós (Stron)

93

Compatível

1189 + lambdacyhalothrin (Karate)

56

Moderadamente tóxico

B. bassiana

1196 + deltametrina (Decis)

32

Tóxico

1196 + monocrotofós (Nuvacron)

71

Compatível

1196 + triclorfon (Dipterex)

12

Muito tóxico

1196 + carbosulfan (Marshal)

100

Compatível

1196 + metamidofós (Stron)

131

Compatível

1196 + lambdacyhalothrin (Karate)

22

Muito tóxico

P. fumosoroseus

1200 + deltametrina (Decis)

44

Tóxico

1200 + monocrotofós (Nuvacron)

157

Compatível

1200 + triclorfon (Dipterex)

180

Compatível

1200 + carbosulfan (Marshal)

39

Tóxico

1200 + metamidofós (Stron)

75

Compatível

1200 + lambdacyhalothrin (Karate)

53

Moderadamente tóxico

S. insectorum

1229 + deltametrina (Decis)

32

Tóxico

1229 + monocrotofós (Nuvacron)

111

Compatível

1229 + triclorfon (Dipterex)

46

Moderadamente tóxico

1229 + carbosulfan (Marshal)

87

Compatível

1229 + metamidofós (Stron)

168

Compatível

1229 + lambdacyhalothrin (Karate)

25

Muito tóxico

MOINO JR. et al. (1989) avaliaram a ação de produtos fitossanitários utilizados na cultura do citros sobre V. lecanii, B. bassiana e M. anisopliae, sendo que, em alguns tratamentos, ocorreu a diminuição do diâmetro médio das colônias, sem alteração no número de conídios produzidos. Esse comportamento pode ser explicado pela presença na formulação de substâncias nutritivas que estimularam a esporulação dos entomopatógenos.É importante que na classificação quanto a toxicidade leve-se em consideração, além do diâmetro da colônia, o número de conídios. Na mistura do fungo M. anisopliae (1144) e Decis na concentração de 200 mL/ha, ocorreram modificações morfológicas na colônia do fungo.Produtos que proporcionaram crescimento radial das colônias de V. lecanii (972), P. fumosoroseus (1200) e S. insectorum (1229), semelhantes à testemunha, foram classificados como tóxicos considerando o valor de T em função desse valor considerar o número de conídios produzidos.Os produtos fitossanitários podem ser comercializados em diversas formulações, como é o caso de monocrotofós produzido por várias empresas.Numa pesquisa feita por ANDERSON & ROBERTS (1983), sobre o efeito de formulações sobre B. bassiana, os autores mostraram que os inseticidas formulados como concentrados emulsionáveis foram associados com a inibição da germinação dos conídios, ao contrário das formulações pós molháveis e "flowables"que não causaram inibição e, em alguns casos, favoreceram o crescimento desse patógeno.Dois experimentos foram conduzidos por BATISTA FILHO et al. (1996) para avaliar a eficiência de fipronil contra Cosmopolites sordidus e a sua compatibilidade com B. bassiana. No primeiro experimento, somente fipronil foi eficiente contra adultos de C. sordidus. No segundo experimento conduzido em laboratório, os autores concluíram que o fipronil não afetou a viabilidade e a produção de conídios apesar de ter afetado o diâmetro de colônias. As formulações de endosulfan, monocrotofós e deltametrina afetaram B. thuringiensis, B. bassiana, M. anisopliae e S. insectorum. (BATISTA FILHO et al., 2000).A ação dos produtos fitossanitários sobre os entomopatógenos pode variar em função da espécie e linhagem do patógeno, da natureza química dos produtos e das dosagens utilizadas, em alguns casos podem até mesmo causar mutações genéticas nesses entomopatógenos. Esse fato pode levar a formação de mutantes do fungo em condições de campo. Os benefícios e prejuízos decorrentes dessas mutações para o controle microbiano e ambiente são difícieis de serem avaliados, merecendo estudos futuros (ALVES et al., 1998).Diversos trabalhos, in vitro, foram realizados visando detectar o efeito de produtos fitossanitários sobre fungos entomopatogênicos (RARAMAJE et al., 1967; IGNOFFO et al., 1975; ALVES et al., 1993; LOPEZ & CARBONELL, 1999). No entanto, ainda faltam pesquisas referentes a essa interação em condições de campo, já que esses trabalhos são difícies de serem realizados em função do grande número de parâmetros que devem ser considerados.A compatibilidade com óleos e adjuvantes, visam o desenvolvimento de formulações que mantenham viáveis os fungos por períodos longos. Estudando estratos naturais, DEVI & PRASAD (1996) concluíram que nenhum desses produtos foi detrimental ao fungo.Com o mesmo objetivo, TANZINI et al. (2001) estudaram a compatibilidade de doze tensoativos com B. bassiana e M. anisopliae, tendo classificado esses produtos quanto a sua toxicidade para esses fungos.Ainda de acordo com ALVES et al. (1998) os estudos in vitro têm a vantagem de expor ao máximo o microrganismo à ação do produto químico, fato que não ocorre em condições de campo, onde vários fatores servem de obstáculo a essa exposição, protegendo o entomopatógeno. Assim, constatada a inocuidade de um agrotóxico em laboratório, não há dúvidas sobre a sua seletividade em condições de campo.A atividade química do produto e os vários modos de ação do entomopatógeno tornam o controle associado mais efetivo. Assim, é possível reduzir as concentrações convencionalmente utilizadas dos produtos fitossanitários, sem a diminuição da eficiência do controle.

Com finalidades práticas, ALVES (1986) e ALVES et al. (1998) publicaram diversas tabelas de compatibilidade entre produtos químicos e entomopatógenos, abrangendo os fungos entomopatogênicos de maior importância no controle microbiano de insetos. Os resultados obtidos nesse experimento complementam esses dados na área de manejo ecológico das pragas da seringueira.

CONCLUSÕES

- Os produtos Decis 25 CE (0,2 L/ha) e Nuvacron (0,4L/ ha) são compatíveis com Beauveria brongniartii (619).- O fungo Verticillium lecanii (972) foi compatível com Nuvacron, Dipterex 500 (0,9 L/ha), Marshal 200 SC (0,15 L/ha), Stron (1,0 L/ha) e Karatê 50 CE (0,45 L/ha).- Todas as formulações testadas são muito tóxicas para Metarhizium anisopliae (1144).- O fungo M. anisopliae (1189) foi compatível com os produtos Dipterex, Marshal e Stron.- Nuvaron e Stron são compatíveis com B. bassiana (1196), Paecilomyces fumosoroseus (1200) e Sporothrix insectorum (1229).- Marshal foi compatível com B. bassiana (1196) e S. insectorum (1229).

- Dipterex não afetou P. fumosoroseus (1200).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Nota

*Esses produtos não são registrados para o controle de Leptopharsa heveae e nem para a cultura da seringueira. Foram escolhidos por serem utilizados na prática para o controle desse inseto e de ácaros em várias regiões heveícolas (ANDREI, 1999).

Recebido em 13/2/02 // Aceito em 27/12/02

M.R. Tanzini (1,2); S. B. Alves (1), A. Setten (1)
sebalves[arroba]esalq.usp.br

1. Departamento de Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola – ESALQ/USP, CP 9, CEP 13418-900, Piracicaba, SP, Brasil. E-mail: mrtanzin[arroba]esalq.usp.br.
2. Bolsista da FAPESP.



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