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4. Material e métodos

Realizaram-se três experimentos nos anos: 1996/1997 (I), 1999/2000 (II) e 2000/2001 (III), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul em Eldorado do Sul. O solo da área experimental, de acordo com a Embrapa (1999), pertence à unidade de mapeamento São Jerônimo, classificado como Argissolo Vermelho distrófico típico.

O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso, com quatro repetições. Os tratamentos constaram de cinco cultivares de hábito de crescimento determinado, sendo duas de ciclo precoce (FT-Saray e IAS 5), uma de ciclo médio (IAS 4), uma de ciclo semitardio (FT-Abyara) e uma de ciclo tardio (FEPAGRO RS-10), na população de 30 a 40 plantas m-2. As unidades experimentais foram formadas por quatro linhas de 5 m de comprimento, com espaçamento entre linhas de 0,4 m.

O experimento I foi conduzido em sistema convencional e os experimentos II e III em semeadura direta, com cobertura de aveia preta (3.800 kg ha-1) e aveia mais ervilhaca (5.800 kg ha-1), respectivamente. A semeadura foi efetuada dentro da época preferencial para o cultivo da soja, manualmente, no experimento I e com semeadora de parcelas, nos experimentos II e III. As sementes foram tratadas com fungicida específico e receberam inoculação de Bradyrhizobium japonicum. Foi realizada suplementação hídrica no experimento I, por meio de aspersores fixos. Nos experimentos II e III, não se utilizou suplementação hídrica.

A fim de coletar dados para o cálculo da estimativa do potencial de rendimento, foram utilizadas cinco plantas no experimento I e dez nos experimentos II e III, marcadas em seqüência na linha, no início do ciclo da cultura, estádio V4 – quarto nó –, segundo Costa & Marchezan (1982).

Realizou-se o cálculo da estimativa do potencial de rendimento (PR) da soja, durante a ontogenia, com base nas estruturas reprodutivas. Foram utilizados cinco métodos, visando estimar o rendimento que seria obtido se todas as estruturas reprodutivas (flores e legumes) presentes em R2 (florescimento) e R5 (início do enchimento de grãos) chegassem à maturação (R8), produzindo grãos. Nesse caso, considera-se que não haveria limitações de assimilados (fonte) para suprir essa demanda (flores e legumes).

Os métodos propostos são apresentados a seguir. O método A utilizou dados obtidos durante o ciclo da cultura e na maturação, como número de flores em R2 e R5, número de legumes em R5, porcentagem de legumes com zero, um, dois e três grãos em R8 e peso de 100 grãos de legumes com um, dois e três grãos em R8. O método B utilizou os mesmos dados do método A, excluindo flores em R5 e porcentagem de legumes com zero grãos em R8.

Para o método C, foram coletados dados de flores e legumes, em R2 e R5, e de número de grãos por legume e peso de 100 grãos, característicos de cada cultivar, além de dados disponíveis na literatura (Menezes et al., 1997; Reunião de Pesquisa de Soja da Região Sul, 1997).

O método D utilizou dados coletados em R2 e R5 e valores médios de peso de 100 grãos e número de grãos por legume para todas as cultivares, obtidos na literatura (Menezes et al., 1997; Embrapa, 1997).

Para o método E, coletaram-se dados em R2 e R5, e dados de porcentagem de legumes com um, dois e três grãos, de peso de 100 grãos característicos de cada cultivar e dados disponíveis na literatura (Menezes et al., 1997).

Os cálculos do PR foram efetuados a partir dos dados referentes às características das cultivares, obtidos nas recomendações técnicas da cultura da soja (Embrapa, 1997), relativos ao peso de 100 grãos e porcentagem de legumes com um, dois e três grãos, obtidos por Menezes et al. (1997).

O PR no florescimento pleno (R2) e no início do enchimento de grãos (R5) foi obtido por meio das fórmulas apresentadas a seguir, usando como exemplo o PR em R2:

Método A: PR = {[(0) . (FR2 . %L0GR8) . (P1GL0G)] + [(1). (FR2 . %L1GR8) . (P1GL1G)] + [(2) . (FR2 . %L2GR8) . (P1GL2G)] + [(3) . (FR2 . %L3GR8) . (P1GL3G)]} /10

Método B: PR = {[(1) . (FR2 . %L1GR8) . (P1GL1G)] + [(2). (FR2 . %L2GR8) . (P1GL2G)] + [(3) . (FR2 . %L3GR8) . (P1GL3G)]} /10

Método C: PR = [(G/LC) . (FR2) . (P1GC)] . 10

Método D: PR = (G/L) . (FR2) . (P1G) . 10

Método E: PR = {[(1) . (FR2 . %L1GR8) . (P1GC)] + [(2) . (FR2 . %L2GR8) . (P1GC)] + [(3) . (FR2 . %L3GR8). (P1GC)]} /10

em que PR é o potencial de rendimento no florescimento (kg ha-1); FR2 é o número de flores m-2 em R2; %L1GR8, %L2GR8, %L3GR8 são as porcentagens de legumes com um, dois ou três grãos em R8; P1GL1G, P1GL2G, P1GL3G são os pesos de um grão de legumes (g) com um, dois ou três grãos, respectivamente, a 13% de umidade (estimado pelo peso de 100 grãos de legumes com um grão); G/LC é o número de grãos por legume, característico da cultivar; P1GC é o peso de um grão (g) a 13% de umidade (estimado pelo peso de 100 grãos), característico da cultivar; G/L é o número de grãos por legume das cinco cultivares; P1G é o peso de um grão (g) a 13% de umidade (estimado pelo peso de 100 grãos) das cinco cultivares. Foram realizados alguns ajustes nas fórmulas (como a divisão por dez) a fim de expressar os resultados em kg ha-1.

A análise estatística foi realizada, primeiramente, com a análise individual dos três anos de experimento. Fez-se a análise de variância pelo teste F, bem como, análise de correlação (utilizando-se o teste t) entre os resultados de PR dos diferentes métodos, rendimento em R8 da amostra (R8a) e rendimento em R8 obtido na área útil da parcela (R8p), nos três anos de realização do experimento. O aplicativo computacional utilizado para as análises foi o SAS (1987).

 

5. Resultados e discussão

Os resultados mostraram que o maior PR, em R2, foi de 14.246 kg ha-1 e em R5, de 12.179 kg ha-1, na média das cultivares. O maior potencial na média dos métodos foi obtido em 2000/2001 para R2 (13.390 kg ha-1) e em 1999/2000, para R5 (11.135 kg ha-1). Os valores estimados pelos métodos foram bastante similares, com variação de 8,7% em R2 e 13,9% em R5, entre o menor e maior valor, na média dos três anos. Observou-se também que o método E, que usa dados da literatura, apresentou os maiores valores estimados (numericamente), tanto em R2 quanto em R5, na média dos três anos (Tabela 1).

As análises realizadas entre os métodos de cálculo mostraram alta associação entre os mesmos, tanto em R2 como em R5, em todos os anos. No entanto, nenhum método usado apresentou correlação significativa com o rendimento da amostra e da área útil da parcela (Tabelas 2 e 3).

O método A foi utilizado como padrão, para fazer o acompanhamento da cultura durante todo o ciclo. Constatou-se que os outros métodos apresentaram comportamento similar, evidenciado pelas correlações e valores numéricos apresentados nas Tabelas 1, 2 e 3.

O método A é de difícil aplicação prática para avaliar lavouras, principalmente por usar dados de R8. No entanto, o método é bastante adequado para a pesquisa, por seu grau de detalhamento e possibilidade de acompanhamento dos componentes do rendimento.

O método B descarta flores em R5, por terem maior probabilidade de aborto e perderem a competição por assimilados com legumes e grãos, que têm maior força de demanda. Legumes sem grãos, em R8, foram eliminados por apresentarem grande variação (dentro de um mesmo tratamento) e serem de difícil quantificação, por conta da elevada perda na colheita e no manuseio das amostras. Os resultados obtidos com este método demonstraram que estas estruturas não trazem maior precisão na estimativa, pois, sem sua quantificação, obtêm-se resultados semelhantes aos de outros métodos (Tabela 1).

O método C, tido como próprio para utilização em lavouras, e por não necessitar de dados de R8, pode proporcionar uma estimativa em tempo real do potencial de rendimento, pois usa dados coletados em R2 e R5, além de dados disponíveis na literatura.

O método D buscou representar diretamente os valores de flores e legumes presentes durante a ontogenia.

O método E objetivou verificar se dados relatados na literatura seriam similares aos obtidos no presente estudo e, de certa forma, avaliar o comportamento das cultivares em situações distintas (Tabela 1).

Os componentes do número de flores m-2, em R2, e número de estruturas m-2 (flores + legumes), em R5, mostraram correlações positivas e significativas com PR, nos três anos avaliados. Os demais componentes não apresentaram fortes correlações com PR, a não ser em alguns anos e, geralmente, negativas (Tabelas 4 e 5).

As características avaliadas tiveram pouca associação com o rendimento em R8 (da amostra e da parcela). Somente o peso de 100 grãos, durante o ano 2001, mostrou relação consistente com o rendimento da parcela, embora não suficiente para indicar esta característica como altamente determinante do PR em R2 (Tabela 4).

Os resultados evidenciam que os métodos propostos são importantes, quando utilizados para comparar situações distintas (lavouras, práticas de manejo e tratamentos experimentais), mas têm pouca precisão na predição de rendimentos.

Trabalhos que utilizaram o método A, realizados por Ventimiglia et al. (1999), Pires et al. (2000), Navarro Junior & Costa (2002), Maehler et al. (2003) e Rambo et al. (2004), obtiveram PR máximo de 22.200 kg ha-1 em R2 e 14.976 kg ha-1 em R5 (em tratamentos isolados), trabalhando com diferentes níveis de fertilidade, irrigação, espaçamentos entre linhas, populações de plantas e cultivares.

Segundo Ventimiglia et al. (1999), a deficiência de fósforo no solo diminuiu o PR nos estádios reprodutivos iniciais, pela menor produção de flores e maior aborto destas estruturas, continuando a se manifestar com menor produção de legumes e maior abscisão destes.

Para Pires et al. (2000), tanto a população quanto o espaçamento entre linhas afetam o PR durante a ontogenia. Com uso de espaçamento reduzido (20 cm), é possível reduzir a perda de potencial a partir de R5 (em comparação a 40 cm), resultando em maior rendimento em R8. No entanto, o uso de população de 40 plantas m-2, embora aumente o potencial durante a ontogenia, não garante maior rendimento em R8, em relação a 30 plantas m-2.

Navarro Junior & Costa (2002) demonstraram, também, variação no PR entre cultivares de soja durante a ontogenia. No entanto, como mostrado neste trabalho, a maior produção de flores não garante rendimento elevado em R8; o fato de a cultivar apresentar alta produção de flores não identifica uma cultivar eficiente na fixação destas flores.

A irrigação é outra prática que aumenta o PR, pela maior produção e fixação de flores e legumes. Cultivares como BRS 137 apresentam maior potencial que BRS 138 em R2, decorrente do menor aborto de flores e abscisão de legumes, o que resulta em maior rendimento em R8 (Maehler et al., 2003).

Verifica-se, nas Tabelas 2 e 3 que os métodos têm baixa correlação com o rendimento em R8, pois sabe-se que existem inúmeros fatores que afetam as estruturas reprodutivas, após a determinação do potencial.

No entanto, a estimativa do PR, neste trabalho, deve ser analisada de acordo com os conceitos propostos, que reforçam a teoria da quantificação do potencial em tempo real, para a aplicação de práticas de manejo, capazes de minimizar sua perda.

Dentro desse contexto, a capacidade preditiva da estimativa fica em segundo plano, pois muitos fatores podem afetar este potencial depois de sua quantificação. Entretanto, alguns trabalhos demonstram que diferenças proporcionadas por práticas de manejo diferenciadas, no PR estimado em R2, R4 e R5, em algumas situações, são mantidas até a maturação, resultando em maior rendimento de grãos (Ventimiglia et al., 1999; Pires et al., 2000; Maehler et al., 2003).

6. Conclusões

1. Os métodos estudados são importantes ferramentas para o manejo, quando utilizados na comparação do potencial de rendimento durante a ontogenia.

2. Os métodos avaliados apresentam semelhanças nas estimativas do potencial de rendimento.

3. As características avaliadas são importantes, para comparar o potencial de rendimento, durante a ontogenia, mas não apresentam associação com o rendimento de grãos em R8.

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João Leonardo Fernandes PiresI; José Antonio CostaII; Lisandro RamboII; Felipe Gutheil FerreiraII - lisandro.rambo[arroba]syngenta.com

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