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Matéria orgânica em um Latossolo submetido a diferentes sistemas de produção de milho (página 2)

Milton Marchiori Júnior e Wanderley José de Melo

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado na área experimental da Fazenda de Ensino e Pesquisa da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, da UNESP, Campus de Jaboticabal (SP), localizada a uma altitude de 610 m e com as seguintes coordenadas geográficas: 21 ° 15 ' 22 " S e 48 ° 15 ' 18 " W. O clima é do tipo Cwa, segundo a classificação de Koppen, isto é, subtropical, temperado, seco no inverno, temperatura média máxima superior a 22 °C e pluviosidade entre 100 mm (no inverno) e 1.500 mm (no verão). O solo é um Latossolo Roxo, fase argilosa, cujas características químicas antes da instalação do experimento encontram-se no quadro 1.

Histórico da área

No ano agrícola 1992/93, foi feita a calagem com 2 t ha-1 de calcário dolomítico, seguindo-se incorporação por meio de gradagem e uma subsolagem para eliminar camada de compactação. A cultura do milho (híbrido BRASKALB 678) foi semeada em espaçamento de 0,90 x 0,15 m, com adubação no sulco de 120 kg ha-1 da fórmula 2-20-10. A cobertura nitrogenada e potássica foi feita com 480 kg ha-1 de sulfato de amônio e 94 kg ha-1 de cloreto de potássio (Raij et al., 1985). O controle de plantas invasoras foi realizado mecanicamente.

Instalação dos tratamentos nos anos subse-qüentes

Nas parcelas destinadas à semeadura convencional, foram feitas uma aração com arado de discos e duas gradagens com grade niveladora hidráulica. Foi realizado o controle de plantas daninhas com cultivador mecânico. Nas parcelas destinadas à semeadura direta, utilizou-se herbicida sistêmico (Glifosate na dose de 3,5 L ha-1) sempre 15 a 20 dias antes da semeadura de verão para o controle das ervas daninhas estabelecidas na área durante o período de pousio e herbicida de contato (Paraquat na dose 3,0 L ha-1) antes da instalação da cultura de inverno. Utilizou-se semeadora adapatada para o sistema plantio direto, a qual revolve o solo somente na linha de semeadura, enquanto o controle de plantas daninhas foi realizado com aplicação de herbicidas, pós-inicial ou pós-média, seletivos (para o milho ou soja), dependendo das condições do ambiente no momento da aplicação (Quadro 2).

Em todos os anos, o milho e, ou, a soja foi semeado entre os meses de outubro e a primeira quinzena de dezembro, dependendo das condições de umidade adequadas e numa profundidade entre 0,05 e 0,08 m aproximadamente, já que o experimento foi realizado em condição de sequeiro.

O experimento foi instalado em delineamento de blocos ao acaso, em parcelas subdivididas, com sete tratamentos (Quadro 2) e quatro repetições. Os tratamentos corresponderam às parcelas e as três profundidades de amostragem (0-0,05, 0,05-0,10 e 0,10-0,20 m) às subparcelas.

Amostragem de solo

As amostras de solo foram retiradas com trados modelo Holandês, aos 60 dias da emergência das plântulas, no momento da diagnose foliar do milho, coletando-se uma subamostra na linha e uma na entrelinha (cinco linhas por parcela), que foram juntadas, homogeneizadas, colocadas em sacos de polietileno e transferidas rapidamente para um isopor com gelo. O mesmo procedimento foi adotado para todas as profundidades amostradas (0-0,05, 0,05-0,10 e 0,10-0,20 m). O material coletado foi levado para o laboratório, onde parte das amostras foi passada em peneira de 2,0 mm de malha e armazenada em câmara fria para avaliar os teores de carbono da biomassa microbiana. O restante de cada amostra foi colocado em bandejas e seco ao ar por três dias. Após a secagem, as amostras foram destorroadas, passadas em peneira de 2 mm (TFSA) e armazenadas em sacos de polietileno até à realização das demais análises químicas e bioquímicas.

Análises químicas nas amostras de terra

O teor de carbono orgânico nas amostras de terra foi determinado pelo método proposto por Tiurin (oxidação via úmida), conforme descrito em Dabin (1976), cujo princípio é a oxidação do carbono orgânico por via úmida, pelo dicromato de potássio em meio de ácido sulfúrico concentrado.

Para avaliar a qualidade da matéria orgânica nas amostras de terra, utilizou-se o método de extração e de fracionamento das matérias húmicas com hidróxido de sódio, descrito em Dabin (1971) e modificado por Duarte (1994), em que a matéria orgânica do solo é fracionada qualitativamente por meio da solubilidade em meio alcalino e ácido, determinando-se os teores de carbono total nas frações obtidas. O início da extração foi realizado com água, obtendo-se a fração solúvel neste meio (FSA); a adição de um agente alcalino origina uma fração solúvel em álcali, denominada matérias húmicas (MH) e um resíduo chamado de humina (HN). Quando acidificada, a fração MH produz uma fração insolúvel em meio ácido, denominada ácidos húmicos (AH), e uma fração solúvel neste meio, conhecida como ácidos fúlvicos (AF). A determinação do C orgânico nas frações FSA, MH, AH, AF e HN seguiu o mesmo princípio já descrito para a determinação do C orgânico nas amostras de terra, exceto pelo fato de que, nas frações da matéria orgânica, excluindo-se a HN, utilizou-se volume de solução do extrato obtido no fracionamento. O teor de C total no AF foi obtido pela diferença entre C total na MH e no AH e, na fração HN, pela diferença entre o teor de C total na TSE e na MH + FSA.

Os dados obtidos foram analisados estatistica-mente pelo Teste F, aplicando-se o Teste de Tukey para comparação de médias (1 e 5 %), com desdobra-mento dos graus de liberdade nos casos em que houve interação significativa (Pimentel Gomes, 1978).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Carbono orgânico nas amostras de solo

Os valores de carbono orgânico (CO) no solo não apresentaram diferenças significativas entre os sistemas de manejo do solo (Quadro 3). Os menores valores de CO na camada de 0,10-0,20 m foram obtidos nos tratamentos C-Mi-P, D-Mi-Mu e D-Mi-Gu, significativamente inferiores aos observados nas camadas superiores. 

 É possível que o revolvimento do solo no tratamento C-Mi-P, homogeneizando as camadas superficiais pelas operações de preparo, tenha contribuído para tal comportamento do carbono. Entretanto, nos tratamentos com uso de leguminosas no inverno (D-Mi-Mu e D-Mi-Gu), este comportamento provavelmente se deva à presença de maior quantidade de material orgânico adicionado pelas raízes destas plantas, já que a técnica de plantio direto, adotada nestes tratamentos, não permite o revolvimento do solo. Segundo Sanches (1995), citado por Mafra et al. (1998), o desenvolvimento do sistema radicular das plantas de adubo verde pode contribuir, de forma significativa, com os teores de CO na camada de até 0,10 m de profundidade.

O tratamento D-Mi-P mostrou valor maior na camada de 0-0,05 m, diferindo significativamente das camadas mais profundas. O não-revolvimento do solo contribui para a concentração CO na camada superficial do solo (Hernani et al., 1999) e os valores menores, observados nas camadas inferiores, poderiam ser explicados por uma quantidade possivelmente reduzida de raízes neste tratamento, já que não houve cultivo de planta para adubação verde no inverno. Segundo Corazza et al. (1999), os resíduos culturais depositados na superfície do solo em períodos mais longos no sistema plantio direto promovem aumento do teor de C nas camadas superficiais, o que também é complementado pela decomposição de raízes.

Souza (1996) encontrou resultados semelhantes, mas indicando ser pouco provável que o sistema plantio direto cause mudanças significativas nos teores de carbono do solo em períodos de quatro anos no estado de São Paulo. Entretanto, o uso do sistema plantio direto por períodos acima de dez anos tende a manter ou até aumentar o conteúdo de carbono no solo. Corazza et al. (1999), avaliando o comportamento do solo como fonte de C-CO2, encontraram, que após o período de 12 anos, o solo de áreas manejadas sob sistemas não perturbados (reflorestamento de eucalipto, pastagem cultivada e plantio direto) funcionou como depósito de C-CO2 da atmosfera, uma vez que o balanço de carbono nestes sistemas foi maior que o observado na área sob vegetação típica do cerrado (situação original do local).

O manejo do solo, envolvendo o cultivo convencional com revolvimento, semeadura de milho no verão e pousio no inverno (C-Mi-P), apresentou o menor valor de CO na camada de 0,10-0,20 m, tendo as camadas superiores apresentado valores significativamente mais elevados. É provável que o revolvimento do solo, homogeneizando as camadas superficiais, principalmente pela operação de gradagem, que é sempre realizada duas vezes antes da semeadura, tenha contribuído para a ocorrência deste efeito. Bayer et al. (2000), estudando os efeitos de tipos de cultivos e sistemas de culturas, também observaram menores valores de CO na camada superficial do solo cultivado em sistema convencional, comparados a valores detectados nos sistemas que mantiveram os restos culturais na superfície.

Quando foi utilizada semeadura direta, incluindo mucuna-preta e feijão-guandu no inverno (D-Mi-Mu e D-Mi-Gu), observou-se comportamento semelhante, porém com valores maiores, provavelmente em decorrência do sistema radicular destas plantas, que se desenvolvem e passam a contribuir com os teores de CO nas camadas de 0-0,05 e 0,05-0,10 m (Sanchez, 1995, citado por Mafra et al., 1998).

O teor mais elevado de CO foi encontrado na camada de 0-0,05 m, quando se realizou o cultivo do milho em sistema de semeadura direta com feijão-guandu no inverno (D-Mi-Gu), cuja diferença em relação às camadas mais profundas foi estatisticamente significativa. O tratamento D-Mi-P também apresentou valores significativamente maiores na camada de 0-0,05 m, fato que pode ser explicado pelo não-revolvimento do solo, já que não houve cultivo de inverno neste tratamento.

Machado et al. (1981), Reicosky et al. (1995), Bayer & Bertol (1999), dentre outros, verificaram diminuição nos teores de matéria orgânica das camadas superficiais do solo, quando utilizaram sistemas de cultivo com revolvimento do solo e incorporação dos resíduos orgânicos da cultura. Hernani et al. (1999), estudando efeitos de sistemas de preparo do solo sobre a perda de nutrientes e matéria orgânica por escoamento superficial, verificaram perdas de 216 kg ha-1 ano-1 de matéria orgânica com o uso de aração e duas gradagens e sugeriram que a melhor maneira para evitar tais perdas é a adoção de sistemas de cultivo que minimizem o revolvimento do solo, como a semeadura direta e o cultivo mínimo.

Extração e fracionamento da matéria orgânica

A análise estatística dos dados obtidos para carbono solúvel em água (C-SA) (Figura 1) mostrou existir diferenças significativas entre tratamentos e profundidades de amostragem. O tratamento C-Mi-P foi o que apresentou o menor valor de C-SA na camada de 0,05-0,10 m, diferindo do manejo conven-cional com milho em rotação com soja (C-Mi-P-So). 

O C-SA reflete o estádio inicial de degradação dos resíduos orgânicos incorporados ao solo, em que materiais insolúveis sofrem hidrólise, dando origem a intermediários solúveis em água, como aminoácidos, mono e dissacarídeos, dentre muitos outros. O baixo teor de C-SA pode significar dificuldade no ataque inicial pelas enzimas advindas dos microrganismos ou que o estádio de síntese das enzimas já se encontra em estádio mais avançado.

O teor de C-SA no manejo convencional com milho em rotação com soja (D-Mi-P-So) na camada de 0,05-0,10 m também diferiu significativamente das profundidades de 0-0,05 e 0,10-0,20 m. Comportamento semelhante foi observado no tratamento com semeadura direta de milho e cultivo de crotalária no inverno, que foi significativamente superior à camada de 0,05-0,10 m.

A presença de valor elevado de C-SA na camada de 0,05-0,10 m do tratamento C-Mi-P-So possivelmente deveu-se à presença de resíduos de soja, associados ao revolvimento do solo, que permitiu seu íntimo contato com os organismos, favorecendo o desenvolvimento de uma população microbiana mais diversificada e a solubilização de compostos que contêm carbono com maior facilidade (Reicosky et al., 1995; Bayer & Bertol, 1999). No entanto, no tratamento D-Mi-Cr, onde não há o revolvimento do solo, as raízes e seus exsudados é que parecem ter causado o efeito aditivo nos teores de C-SA.

Segundo Duarte (1994), na adubação com leguminosas, além da massa verde produzida pela parte aérea, são importantes a quantidade de raízes produzidas e sua distribuição nas diferentes profundidades do solo. Kuo et al. (1997) verificaram que coberturas de inverno alteram significativamente o conteúdo de polissacarídeos, destacando a contribuição das leguminosas. Tal contribuição destas plantas pode estar associada à maior velocidade de decomposição das leguminosas, comparadas a espécies gramíneas. Broder & Wagner (1988), ao estudar a decomposição de resíduos de milho, trigo e soja, verificaram que a leguminosa foi a que teve maior taxa de decaimento, perdendo 68 % da matéria orgânica total após 32 dias, comparados com 42 % para o milho e 47 % para o trigo.

O maior valor de carbono como matéria húmica (C-MH), na camada de 0-0,05 m, foi observado no tratamento C-Mi-P-So, estatisticamente superior aos valores encontrados para os sistemas de produção D-Mi-P, D-Mi-Mu e D-Mi-Cr (Figura 2). 

 

Este comportamento parece estar associado ao revolvimento do solo, juntamente com a presença de resíduos da soja. Contradizendo este resultado, Demétrio et al. (1998), estudando os efeitos da adição de diferentes resíduos de culturas ao solo sobre o carbono e o nitrogênio das frações da matéria orgânica, não conseguiram observar alteração nos teores de carbono existente nas substâncias húmicas, mas detectaram elevação significativa nos teores de carbono como humina. Essa diferença reflete o estádio em que se encontra o processo de humificação.

As diferenças entre as profundidades de amostragem foram observadas nos tratamentos D-Mi-P, C-Mi-P-So e D-Mi-P-So. Os teores de C-MH concentraram-se na camada de 0-0,05 m, exceto para os tratamentos D-Mi-P-So e D-Mi-P, cujo valor diferiu significativamente somente entre as camadas de 0-0,05 e 0,05-0,10 m.

No tratamento onde se envolveu a semeadura direta de milho, em monocultura, somente 10 % das substâncias húmicas se encontravam na forma de ácido fúlvico, indicando um estádio mais avançado de estabilização do material pela humificação. Outra hipótese que explicaria este comportamento seria a migração de ácidos fúlvicos para as camadas mais profundas do solo, reduzindo os valores de C-MH na camada superficial, já que o C-AF (Figura 3) aumentou no sentido das camadas mais profundas e reduziu os valores de C-AH no mesmo sentido (Figura 4). 

Os valores de C-MH encontrados nos tratamentos C-Mi-P-So e D-Mi-P-So, na camada de 0-0,05 m, possivelmente são reflexos do cultivo da cultura do milho em rotação com a soja. A introdução da leguminosa no sistema de semeadura, tanto direta como convencional, causou maiores valores de C-MH na camada de 0-0,05 m, menores nas camadas de 0,05-0,10 m e valores mais equilibrados entre AF e AH, compondo uma ou outra fração 40 e 60 % do C-MH.

Os valores encontrados para carbono como ácido fúlvico (C-AF), na camada de 0-0,05 m, revelaram que o tratamento D-Mi-P foi significativamente menor que os tratamentos D-Mi-Gu, C-Mi-P-So, D-Mi-P-So e C-Mi-P. Comparando os tipos de sistemas de produção na profundidade de 0,05-0,10 m, detectou-se diferença significativa entre os tratamentos D-Mi-P-So e D-Mi-Cr, que apresentou o maior valor para esta camada. Para a profundidade de 0,10-0,20 m, não se detectou efeito significativo de tratamento.

No sistema de cultivos com revolvimento do solo e rotação milho-soja (C-Mi-P-So), características do solo, tais como: porosidade irregular, camadas mais adensadas e movimentação de ar e água desuniformes, são menos favoráveis ao desenvolvimento dos processos biológicos que nele ocorrem. Estas características do sistema parecem estar envolvidas com o comportamento do carbono como matérias húmicas, uma vez que as duas gradagens antes da semeadura podem promover uma compactação na camada entre 0,05-0,10 m de profundidade, o que justificaria a presença de maior valor na camada de 0-0,05 m, redução na camada mais compactada (0,05-0,10 m) e nova elevação na camada mais profunda (0,10-0,20 m).

Isto ocorreria porque o ácido fúlvico (AF), que constituiu mais de 40 % da MH, é solúvel tanto em meio ácido como em meio alcalino e pode migrar para as camadas inferiores, o que é dificultado quando a camada de 0,05-0,10 m se torna mais densa, retardando o caminhamento da solução através dela para a camada de 0,10-0,20 m. Assim, este composto ficaria retido, em sua maior parte, na camada de 0-0,05 m; o valor, também mais elevado na camada de 0,10-0,20 m se justificaria pela transformação dos resíduos nela colocados pelo revolvimento do solo.

A ocorrência de valores significativamente menores no tratamento D-Mi-P também poderia ser justificada por este caminho. O não-revolvimento do solo neste sistema de produção minimizaria o adensamento na camada de 0,05-0,10 m, facilitando a migração do AF para as camadas inferiores. Outra hipótese seria a passagem mais rápida de AF para ácidos húmicos (AH), no sistema de produção D-Mi-P, já que os valores de AH são mais elevados na camada de 0-0,05 m e diminuem com a profundidade, neste tratamento. Embora de forma mais discreta, esta interconversão entre as matérias húmicas parece ter ocorrido, também nos tratamentos D-Mi-Mu e D-Mi-Gu, nas camadas de 0-0,05 m e 0,05-0,10 m.

Segundo Pizauro Jr. & Melo (1995), a predominância de uma ou outra fração indica o estádio de mineralização da matéria orgânica e a incorporação de N à estrutura húmica. No tratamento D-Mi-P, o efeito observado para AF e AH parece indicar um estádio mais avançado de mineralização da matéria orgânica, justificável pela maior relação C/N no AF e menor no AH, mostrando maior incorporação de N nas frações mais estáveis das substâncias húmicas do solo.

O manejo do solo com semeadura direta de milho, em rotação com soja, apresentou valor de C-AF significativamente superior ao encontrado na camada de 0,05-0,10 m, o mesmo não ocorrendo em relação à camada de 0,10-0,20 m. A adição de material com maior teor de N na superfície, pelos resíduos da soja, parece ter favorecido a atividade microbiana e, conseqüentemente, a degradação mais rápida em favor da formação de ácido fúlvico, de menor peso molecular.

Os diferentes sistemas de produção de milho analisados não afetaram, de modo significativo, o teor C-AH (Figura 4). Em relação à profundidade, o C-AH apresentou comportamento inverso ao do C-AF, diminuindo de forma significativa com o aumento da profundidade nos tratamentos C-Mi-P, D-Mi-P e D-Mi-Mu. Isto parece indicar que a fração AH é menos móvel no solo, concentrando-se nas camadas superiores. Com efeito, trata-se de uma fração insolúvel em meio ácido, característica freqüente em regiões de solos tropicais e subtropicais.

A quantidade de material orgânico que chega à superfície do solo no tratamento D-Mi-P deve-se aos restos culturais do milho e de eventuais plantas daninhas que se desenvolvem no inverno, durante o período de pousio. As gramíneas, em geral, revelam alta relação C/N, são ricas em celulose, hemicelulose e lignina, sendo, por isso, importantes na rotação de culturas. A adição dos resíduos da cultura do milho à superfície introduz não só materiais de fácil decomposição, mas também compostos como a lignina, de estrutura relativamente estável e de difícil degradação microbiológica (Brady, 1989). Esta estabilidade favorece a formação de húmus, sendo a lignina o principal precursor de compostos aromáticos das substâncias húmicas do solo (Tate III, 1987).

A maior parte do CO do solo foi encontrada na forma de humina (C-HN). Para este estudo, os valores observados estão de acordo com os encontrados por vários autores (Nascimento et al., 1988; Pizauro & Melo, 1994; Sikora & Yakovchenko, 1996), que também detectaram valores de humina representando de 50 a 78 % do CO total do solo.

O C-HN é a forma mais estável da matéria orgânica do solo. Os valores mais elevados na camada superficial no tratamento D-Mi-Gu (Quadro 4) podem ter ocorrido pelo fato de a atividade microbiana se concentrar nesta camada, ocorrendo maior continuidade no processo de degradação do material orgânico e sua estabilização no solo, o que é dificultado nas camadas mais profundas. O C-HN também diminuiu significativamente com a profundidade. 

Nos tratamentos onde a humina se concentrou nas camadas de 0-0,05 e 0,05-0,10 m, fatores como o revolvimento do solo (C-Mi-P), a presença de maior quantidade de resíduos facilmente decomponíveis na superfície e a presença de maior quantidade de raízes até à profundidade de 0,10 m (D-Mi-Mu e D-Mi-Gu), parecem ter exercido efeitos supressivos nos teores de carbono presente na forma humificada mais estável.

A coerência dos resultados fundamenta-se na própria teoria de formação do húmus no solo. O processo é muito complexo, mas as evidências de intermediação por microrganismos em grande parte das reações que ocorrem durante sua síntese são amplamente discutidas na literatura. Alguns autores (Schnitzer et al., 1973; Martin et al., 1974; Ludemann et al., 1982) compararam compostos húmicos sintetizados microbiologicamente e os ácidos húmicos nativos do solo e verificaram a similaridades entre ambos em relação à estrutura química.

Segundo Tate III (1987), o fator significativo nestes estudos é que os microrganismos produzem não somente os precursores químicos necessários à formação de substâncias húmicas (especialmente melaninas), mas também sintetizam enzimas capazes de catalisar a polimerização de moléculas mais simples. Sjoblad & Bollag (1981), citados por Tate III (1987), demonstraram a existência de peroxidases e fenol-oxidases (laccase), catalisando reações de ligações oxidativas de anéis aromáticos simples, na síntese de ácidos húmicos.

A explicação para o comportamento do tratamento D-Mi-Gu, que apresentou o maior teor de C-HN, parece estar ligada ao discutido acima. A adição de 4,64 t ha-1 de matéria seca (Souza & Melo, 2000), a maior parte advinda do feijão-guandu, provavelmente favoreceu o processo de humificação. Os seus resíduos, compostos por tecidos de decomposição relativamente rápida, incrementaram a atividade microbiana do solo decorrente da presença de nitrogênio da cultura de inverno, associada a resíduos culturais do milho do verão anterior. Esse processo teria desencadeado a produção de enzimas que contribuíram para a síntese e polimerização de precursores da humina (Tate III, 1987; Brady, 1989). Na prática, o maior valor de C na forma de humina implica, em última instância, maior retenção de umidade, melhor estruturação do solo e maior retenção de cátions, características de extrema importância quando se trata de estudo e desenvolvimento de sistemas sustentáveis de produção agrícola.

CONCLUSÕES

1. Os cultivos em sistemas plantio direto com pousio e cultivo de mucuna preta e feijão guandu no inverno favoreceram a elevação dos teores de CO e humina nas camadas superficiais do solo.

2. O cultivo de leguminosas em sucessão (Crotalaria juncea) no sistema plantio direto e rotação (soja) no sistema de cultivo convencional propiciaram maiores valores de carbono na fração solúvel em água.

3. A rotação milho-soja, tanto em sistema de cultivo convencional como em semeadura direta, favoreceu a concentração de C-MH nas camadas superficiais do solo.

4. Os sistemas plantio direto de milho em monocultura e sucessão com leguminosas (mucuna preta e feijão guandu) parecem ter favorecido dois processos: a migração de AF para as camadas mais profundas, reduzindo os teores de MH na camada superficial do solo, e interconversão de AF e AH mais rápida.

LITERATURA CITADA

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1. Parte do trabalho de Tese de Mestrado do primeiro autor.

W. J. O. SouzaI; W. J. MeloI
I
wjmelo[arroba]fcav.unesp.br

IDoutorando na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista – FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof. Paulo Donato Castellane, s/n, CEP 14870-000 Jaboticabal (SP) E-mail: wilson[arroba]suprematag.com.br
IIProfessor Titular do Departamento de Tecnologia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP. E-mail:
wjmelo[arroba]fcav.unesp.br



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