Interação reprodutor x rebanho na produção de leite da raça holandesa no Brasil



Artigo original: "Rev. Bras. Zootec., Jun 2001, vol.30, no.3, suppl.1, p.992-999. ISSN 1516-3598" 

1. Resumo

Registros de produção de leite de vacas da raça Holandesa foram utilizados na verificação da efetividade da inclusão da interação reprodutor x rebanho no modelo estatístico para estimação de componentes de variâncias, como uma forma de ajustamento para heterogeneidade de variância entre rebanhos. Com base no desvio-padrão fenotípico da produção de leite, ajustada a 305 dias de lactação e à idade adulta da vaca, os rebanhos foram estratificados em três classes: alto (>1375 kg), médio (1165 a 1375 kg) e baixo (<1165 kg) desvios-padrão fenotípicos. Componentes de variância em análise de características múltiplas, em que se considerou a produção de leite ajustada a 305 dias de lactação e à idade adulta em cada classe de desvio-padrão fenotípico como característica diferente, foram estimados pela máxima verossimilhança restrita, utilizando-se dois modelos animais que diferiam apenas na ausência e na presença da interação reprodutor x rebanho. O teste da razão de verossimilhança foi utilizado na verificação da efetividade da inclusão da interação no modelo. As médias e os componentes de variância para a produção de leite, de modo geral, aumentaram da classe de baixo para a classe de alto desvio-padrão fenotípico. As estimativas de componentes de variância, obtidas pelo modelo que incluía a interação reprodutor x rebanho, foram ligeiramente menores do que as dos modelos sem interação, exceto na variância residual, cujas estimativas, nos dois modelos, foram bastante próximas. As estimativas de herdabilidade para a produção de leite ajustada a 305 dias de lactação e à idade adulta, obtidas pelos dois modelos para uma mesma classe de desvio-padrão foram próximas, oscilando de 0,251 a 0,362 e de 0,244 a 0,342, para os modelos sem e com a interação reprodutor x rebanho, respectivamente. As correlações genéticas, para produção de leite, entre as classes de desvios-padrão fenotípicos foram todas próximas da unidade. As proporções da variância fenotípica da produção de leite, devido à variância da interação reprodutor x rebanho, oscilaram de 2,2 a 4,4%, e o logaritmo natural da função de verossimilhança aumentou significativamente, quando se incluiu a interação reprodutor x rebanho no modelo.

Palavras-chave: componentes de variância, interação reprodutor x rebanho, produção de leite

Sire-by-herd interaction for milk yield of Holstein cows in Brazil

2. Abstract

Milk yield adjusted for 305 days and for age of Holtein cows were used to verify the effectiveness of including sire-by-herd interaction in the model of analysis as an adjustment factor for heterogeneous variances between herds. The herds were classified in three classes of phenotypic standard deviation: high, medium and low. Variance component estimates were obtained by Restricted Maximum Likelihood methodology, for classes of phenotypic standard deviation, considering each one as a different trait, using a multiple trait analysis. Two different animal models were used, either fitting or not fitting sire-by-herd interaction effect.The effectiveness of including this interation in the model was tested by Likelihood ratio test. Averages and variance components for milk yield increased from low to high phenotypic standard deviation classes. Variance component estimates were smaller, when sire-by-herd interaction was fitted, however, residual variance components were similar for both models. Heritability estimates for milk yield obtained by fitting or not fitting the interaction term in the model, were similar. Genetic correlation between classes of phenotypic standard deviation were close to unity. The proportion of the phenotypic variance due to sire-by-herd interaction variance fluctuated from 2.2 to 4.4 percent. The logarithms of the likelihood functions were higher when fitting a sire-by-herd interaction than for the model not including the interaction, for all classes.

Key Words: variance components, sire by herd interaction, milk yield

 

3. Introdução

A expressão fenotípica do genótipo requer ação do ambiente, ao passo que qualquer influência do ambiente só pode ser medida quando há alteração na expressão do genótipo. Assim, variações genéticas e de ambientes influenciam o desempenho do animal (DICKERSON, 1962).

A interação genótipo x ambiente implica que o melhor genótipo em um ambiente poderia não o ser em outro; como exemplo, uma raça com alta produção de leite em clima temperado, pode não apresentar a mesma superioridade em clima tropical (FALCONER, 1989).

PACKER (1985) relatou que a expressão fenotípica de determinado animal, submetido a um ambiente específico, seria conseqüência, além dos genes responsáveis pela expressão da característica, da ação de genes relacionados com a adaptação do animal ao ambiente ao qual este está submetido. A expressão fenotípica dos genes ligados diretamente à expressão da característica poderia ficar comprometida quando ocorressem alterações nas condições de ambiente, em razão da ausência da expressão de alelos de genes responsáveis pela adaptabilidade do animal ao novo ambiente.

STANTON et al. (1991) apresentaram duas situações em que diferenças nas respostas à seleção seriam verificadas em ambientes diferentes, caracterizando a interação genótipo x ambiente. A primeira situação seria atribuída a casos em que bases genéticas diferentes estariam atuando em diferentes ambientes; nesse caso, a correlação genética entre a expressão fenotípica nos dois ambientes seria, substancialmente, menor que 1,0. Outra situação que caracteriza a interação genótipo x ambiente seria resultante da heterogeneidade de variância genética e ambiental, como no caso das avaliações de características simples, em que os reprodutores teriam a mesma classificação em cada ambiente, mas as diferenças na resposta à seleção das filhas e nos valores genéticos dos touros seriam menores no ambiente com menor variabilidade.

A semelhança entre filhas de um touro em um mesmo rebanho reflete tanto a interação genótipo x ambiente como a covariância ambiental entre o desempenho de meio-irmãs paternas, companheiras de rebanho (MEYER, 1987; BANOS e SHOOK, 1990; e COSTA, 1999). BERESKIN e LUSH (1965), NORMAN (1974) e MEYER (1987) relataram que a covariância ambiental entre meio-irmãs paternas tem origem em fatores biológicos, de manejo e estatísticos, como falha na remoção do efeito de rebanho, de ano-estação de parto da vaca ou de algum outro fator fixo, resultando em um modelo inadequado à avaliação genética. Fatores de ajustamento para efeitos fixos também podem ser inapropriados a rebanhos com manejo específicos. O tratamento diferenciado dado a filhas de um mesmo reprodutor também causa correlação ambiental entre meio-irmãs paternas, visto que filhas de determinado reprodutor são submetidas a um ambiente mais favorável, o que provoca superestimação dos seus valores genéticos.

A interação reprodutor x rebanho pode ser observada quando diferenças entre progênies de um mesmo reprodutor não são as mesmas em diferentes rebanhos, sendo a heterogeneidade de variância responsável por parte destas.

Variâncias heterogêneas entre rebanhos e aumento da variância, de acordo com o aumento dos níveis de produção dos rebanhos, regiões ou países, têm sido verificados por vários autores, como HILL et al.(1983); MEYER (1987); BOLDMAN e FREMAN (1990); DONG e MAO (1990); STANTON et al. (1991); DODENHOF e SWALVE (1997); COSTA (1998); TORRES (1998); e ENGHEL et al. (1999).

Quando a heterogeneidade de variância é desprezada, embora esteja presente, a produção das filhas de determinado reprodutor será ponderada na proporção dos desvios-padrão dos rebanhos nos quais essas filhas foram criadas. O resultado é que as produções das filhas, oriundas de rebanhos com maiores variâncias, influenciarão mais a avaliação de reprodutores do que a de filhas oriundas de rebanhos com menores variâncias. No caso de as filhas dos diversos reprodutores serem distribuídas, uniformemente, entre os rebanhos com variação diferente, nenhum vício seria observado. Entretanto, se as estimativas de herdabilidades também diferissem entre os rebanhos, a acurácia das avaliações genéticas dos animais seria reduzida, em razão de não serem consideradas essas diferenças (TORRES, 1998).

Ao analisar dados de primeira lactação de novilhas de diferentes grupos genéticos da raça Holandesa, MEYER (1987) considerou os conceitos de interação reprodutor x rebanho e de covariância ambiental comum a todas as filhas de um reprodutor em um rebanho, como estatisticamente equivalentes. Ao utilizar três modelos de reprodutor, em que o primeiro não considerava nenhum efeito de interação, o segundo considerava o efeito da interação reprodutor x rebanho e o terceiro modelo considerava o efeito da interação reprodutor x rebano-ano-estação de parto. A autora verificou que com este último modelo, a interação obteve maior proporção da variância fenotípica em relação ao modelo que incluía a interação reprodutor x rebanho, sugerindo que em procedimentos de avaliações genéticas de reprodutores, ao ignorar-se a covariância ambiental entre vacas na mesma subclasse, a confiabilidade das provas dos reprodutores poderia ser superestimada e que avaliações genéticas de reprodutores, baseadas em registros de filhas em poucos rebanhos, deveriam ser consideradas com cautela.

MRODE et al. (1994) utilizaram dados de produção de leite, gordura e proteína no Reino Unido, referentes às primeiras cinco lactações de 40.066 registros de vacas da raça Holandesa, 17.674 registros de vacas da raça Shorthorn, 7.245 registros de vacas da raça Jersey, 19.994 registros de vacas da raça Ayrshire e 16.850 registros de vacas da raça Guernsey. Ao utilizarem o modelo animal, verificaram que a proporção da variação total da produção de leite, resultante do componente de variância referente à interação reprodutor x rebanho, variou de 0,024 a 0,063 e de 0,02 a 0,04, nas primeiras e em todas as lactações, respectivamente. Esses autores concluíram que a interação reprodutor x rebanho é importante e deve ser considerada na avaliação genética de reprodutores para minimizar vícios.

COSTA (1999), em trabalho de revisão, reportou que a estimativa da variância, referente à interação reprodutor x rebanho, tem representado cerca de 1 a 4% da variação total da produção de leite.

Este estudo objetivou estimar componentes de variância para a produção de leite referente ao efeito da interação reprodutor x rebanho e verificar a influencia da inclusão desta interação no modelo de análise, como fator de ajustamento para a heterogeneidade de variâncias ambiental em bovinos da raça Holandesa no Brasil.


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