Heterocedasticidade entre estados para produção de leite em vacas da raça Holandesa, usando métodos Bayesianos via amostrador de Gibbs



Artigo original: "R. Bras. Zootec., Abr 2006, vol.35, no.2, p.405-414. ISSN 1516-3598"

1. Resumo

Registros de produção de leite ajustados para 305 dias de lactação (PL305) em vacas da raça Holandesa que pariram entre 1980 e 1993 foram utilizados para investigar a existência de heterogeneidade de variância e a interação genótipo × ambiente. Supondo-se variâncias heterogêneas, as PL305 nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul foram tratadas como características diferentes. Admitindo-se homogeneidade de variância, a PL305 foi analisada segundo um modelo unicaracter. Os componentes de (co)variância e os parâmetros genéticos foram estimados utilizando-se métodos Bayesianos, via amostrador de Gibbs (GS), sob um modelo animal que incluiu os efeitos fixos de estação de parto, grupo genético, ordem de parição e classes rebanho-ano de parto e os efeitos genéticos aditivos e de ambiente permanente. A monitoração de convergência das distribuições das cadeias foi realizada pelo método de Heidelberg & Welch (1983). As estimativas dos componentes de variância e de herdabilidade foram obtidas com grande precisão na análise unicaracter. A média e o desvio-padrão (DP) a posteriori da herdabilidade foram 0,278±0,012. Na análise multicaracter, as estimativas mais precisas da (co)variância genética foram as obtidas em São Paulo e Paraná. As médias e os desvios-padrão a posteriori de herdabilidade para Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, foram 0,280±0,021, 0,233±0,015, 0,280±0,012, 0,393±0,026 e 0,382±0,022, respectivamente. A baixa magnitude das correlações genéticas entre os estados (0,070 a 0,364) sugere a existência da interação genótipo × ambiente, logo, as PL305 em cada estado devem ser tratadas como características diferentes. O maior valor de correlação genética foi encontrado em São Paulo e Paraná. As variâncias genética e residual para PL305 foram significativamente diferentes entre a maioria dos estados.

Palavras-chave: componentes de variância, convergência, herdabilidade, inferência Bayesiana, interação genótipo × ambiente

2. Abstract

Adjusted for 305 days milk yield records of Holstein cows calving from 1980 to 1993 in the states of MG, SP, PR, SC, and RS were used to investigate heterogeneity of variance and to evaluate the genotype by environment interaction. Milk production from each State was considered as a different trait and variances were assumed heterogeneous. Milk production was also analyzed using a single-trait model assuming homogeneity of variance. (Co)variance components and genetic parameters were estimated by Bayesian inference, via Gibbs sampler (GS), using a model which included season of calving, genetic group, herd-year of calving and parity as fixed effects and animal additive genetic, permanent environmental and residual as random effects. Convergence of the GS chain to the stationary distribution was diagnosed using the method described by Heidelberg & Welch (1983). The posterior precision of the variance components and the heritability were high in the single-trait analysis. Posterior mean and standard deviation (SD) of heritability of milk yield were 0,278±0,012. For the multiple-trait analysis, posterior precisions of the (co)variance components were larger for SP and PR states. Posterior means and standard errors of heritability for MG, SP, PR, SC, and RS were 0.280±0.021, 0.233±0.015, 0.280±0.012, 0.393±0.026, and 0.382±0.022, respectively. Genetic correlations for milk yield between the five states were very low and ranged from 0.070 to 0.364, suggesting the presence of genotype by environment interaction. Differences in genetic and residual variances of milk yield among the states indicate it would be necessary to account for heterogeneous variances in genetic evaluations.

Key Words: Bayesian inference, convergence criterion, heritability, variance components, genotype × environment interaction

3. Introdução

O progresso genético nos sistemas de produção animal exige avaliações genéticas acuradas dos animais, seguidas da seleção dos melhores indivíduos que serão pais da próxima geração. Na maioria dos programas de melhoramento de gado de leite, a seleção é baseada na Melhor Predição Linear Não-Viesada (BLUP) do valor genético, obtida pela metodologia de modelos mistos. Embora tenha havido ganho genético substancial nos sistemas que utilizam esta metodologia, este ganho não é igual ao teoricamente possível. De acordo com DeStefano (1994), uma razão para que o atual progresso genético alcançado nos rebanhos não seja igual ao teoricamente esperado é que as pressuposições nas quais as atuais avaliações genéticas se baseiam têm sido violadas. Entre estas premissas, encontra-se a homogeneidade de variância.

Vários estudos comprovam a existência de heterogeneidade de variâncias genética, residual, fenotípica e de ambiente permanente para características de produção, em relação à região, ao nível de produção e ao rebanho, entre outros fatores (Hill et al., 1983; Famula, 1989; Boldman & Freeman, 1990; Costa, 1999). Portanto, nesses casos, a premissa de homocedasticidade das variâncias não tem sustentação e admiti-las nos modelos pode implicar na introdução de viés nas avaliações dos animais.

Um problema de grande relevância, quanto à heterogeneidade de variância na avaliação genética de bovinos leiteiros, está no fato de que os animais acima da média, nos rebanhos que apresentam maior variação podem ter seus valores genéticos superestimados (Brotherstone & Hill, 1986; Everett et al., 1982). Portanto, grande parte dos reprodutores e das matrizes pode ser selecionada de rebanhos que apresentam maior variabilidade. A avaliação de reprodutores pode constituir-se em problema se os touros não são usados homogeneamente entre rebanhos.

A maioria dos estudos sobre a presença de heterogeneidade de variância relata que as variâncias genética e ambiental aumentam com a elevação da produção média de leite no rebanho (Mirande & Van Vleck, 1985; De Veer & Van Vleck, 1987; Boldman & Freeman, 1990), afetando diretamente as estimativas de coeficientes de herdabilidade. Vários estudos em rebanhos da raça Holandesa mostraram tendência de aumento nas herdabilidades com o acréscimo na média de produção (Hill et al., 1983; Boldman & Freeman, 1990; Dong & Mao, 1990; Valencia et al., 1998).

Para estimar os componentes de (co)variância, De Veer & Van Vleck (1987) estratificaram os dados de produção de leite em três níveis (baixo, médio e alto), considerados três características. Entretanto, segundo Famula (1989), a determinação da existência de heterogeneidade de variância entre grupos de rebanhos, baseada na estratificação dos dados pela produção média de leite do rebanho, equivale a selecionar pelas médias dos rebanhos, o que possibilita estimativas viesadas das variâncias genética e residual.

Henderson (1984) relatou que suas equações de modelos mistos (EMM) podem ser modificadas para considerar as variâncias genéticas ou residuais que diferem entre ambientes. Uma abordagem é a modelagem para características múltiplas, em que o valor genético em cada rebanho ou os dados estratificados por produções são tratados como características distintas.

Os preditores BLUP para os efeitos aleatórios, resultantes das EMM, podem convenientemente considerar as diferenças de variâncias dentro das subclasses. Porém, esse método pode exigir a estimação de grande número de componentes de variância, com pouca informação contribuindo para cada componente. Nessas situações, os métodos de verossimilhança que dependem de uma justificativa assimptótica podem falhar em prover estimativas suficientemente acuradas (Gianola, 1986; Weigel et al., 1993).

Falconer (1952) introduziu o conceito de uma correlação genética entre o desempenho em dois ambientes como sendo duas características diferentes e utilizou a razão entre as respostas indireta e direta à seleção para determinar o melhor ambiente para seleção. Robertson et al. (1960) identificou a necessidade de se reconhecer se a herdabilidade difere entre ambientes e se a classificação dos touros é afetada por essas diferenças.

Hill et al. (1983) estimaram parâmetros genéticos para produção de leite em rebanhos da raça Holandesa. Os rebanhos foram divididos em dois grupos, de acordo com os níveis de produção (baixa e alta). As estimativas de herdabilidade nos rebanhos de baixa e alta produção de leite foram 0,24 e 0,30, respectivamente. As correlações genéticas entre os níveis de alta e baixa produção foram próximas da unidade e as vacas de maiores méritos foram encontradas nos rebanhos de maiores variâncias. No Brasil, Torres et al. (1999) analisaram registros de primeira lactação de vacas Holandesas, os quais foram estratificados em rebanhos conforme o desvio-padrão fenotípico e submetidos às transformações logarítmica, raiz quadrada, padronização e divisão pelo desvio-padrão fenotípico (DPF) da classe analisada. As estimativas de herdabilidade nas escalas original, logarítmica, raiz quadrada e padronizada e a divisão pelo DPF foram 0,27; 0,34; 0,30; 0,27 e 0,27, respectivamente, para classe de desvio-padrão baixo. Os valores correspondentes para classes de desvios-padrão médio e alto foram 0,35; 0,40; 0,37; 0,35 e 0,35 e 0,30; 0,36; 0,32; 0,30 e 0,30, respectivamente. Costa (1999) investigou a heterogeneidade de variância para produções de leite e gordura em vacas da raça Holandesa utilizando registros de primeira lactação ajustada para 305 dias e para idade adulta. A estimativa de herdabilidade para produção de leite dos rebanhos pertencentes à classe de baixo desvio-padrão fenotípico foi superior à estimada para os rebanhos da classe de alto desvio-padrão (0,30 e 0,22, respectivamente).

No Brasil, os rebanhos de vacas da raça Holandesa estão situados, em sua maioria, nas Regiões Sul e Sudeste, de modo que diferentes condições de clima, alimentação e manejo podem ser fontes de heterogeneidade de variância e/ou interação genótipo × ambiente. Assim, os objetivos neste trabalho foram obter estimativas de componentes de (co)variância e parâmetros genéticos para produção de leite, estimar a magnitude das correlações genéticas entre os estados e investigar a existência da heterogeneidade de variância da produção de leite entre os estados.


Página seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.