Partes: 1, 2, 3, 4, 5

3.2.1 O Brasil no Contexto do Mercado Pesqueiro

Em 1985, no auge da exploração da lagosta, o Brasil batia o seu próprio recorde na produção de pescado, com cerca de um milhão de toneladas. De lá até os dias atuais, com o declínio da produção lagosteira, que foi explorada ao máximo sem nenhum planejamento estratégico ou cuidado preservacional por parte do empresariado, e sem nenhum ou quase nenhum controle por parte das autoridades pesqueira responsáveis, a produção nacional entrou em declínio.

Além do fato da super exploração dos estoques lagosteiros e dos de outras espécies de maneira geral, a atividade pesqueira entrou em declínio no Brasil, também pelo atraso tecnológico de sua frota, pela desatualização de sua legislação e pela falta de políticas específicas para o setor, incluindo uma política creditícia que apóie, principalmente, o incremento da aqüicultura.

Como já havia sido dito em tópico anterior, nas últimas décadas a produção brasileira de pesca extrativa, ficou estagnada em cerca de 600.000 toneladas anuais. Por outro lado à produção aquícola saltou de 13 mil toneladas em 1990 para 119.750 toneladas em 1999, ou seja, aqüicultura brasileira cresceu mais de 900% em um período de nove anos.

Com uma produção total de pescado, de 774.750 toneladas (FAO, 2000), o Brasil ocupa hoje a 26ª posição no ranking dos países produtores e a 20ª posição quando se trata apenas da produção aquícola. O que demonstra que a aqüicultura brasileira vem se fortalecendo e começando a querer ocupar lugar de destaque no cenário mundial.

Porém, em se tratando do potencial brasileiro para o desenvolvimento da aqüicultura, esse valor pode ser considerado irrisório. Para se ter uma idéia desse potencial, vejamos a seguinte análise:

Se apenas 0,5% da área dos dez maiores reservatórios de água do país (que totalizam algo em torno de 1.510.100 ha) fosse destinada à aqüicultura em tanques-rede, possuindo uma produção de cerca de 150 Kg/m3/ano, o Brasil pularia de sua 26º posição para a segunda no ranking mundial na produção de pescado, estando a aqüicultura representando aproximadamente 95% da produção. (ROCHA, 1997)

Prosseguindo, agora através da análise da Fishtec Consultores Associados,

A despeito de todo o seu potencial produtivo o Brasil importou, em 1997, cerca de 190 mil toneladas de pescado, resultando em um déficit estimado em US$ 390 milhões. Cabe ressaltar que estas 190 mil toneladas se referem a peixes processados e industrializados, que uma vez transformados em seu equivalente em peso vivo chegam a quase 400 mil toneladas, ou seja, 66% da produção nacional. Grosso modo, pode-se dizer que no Brasil a cada três quilos de pescado consumido um é importado.

Tal análise acima, aponta a inépcia pela qual ainda passa a aqüicultura brasileira, perdendo (na verdade, deixando de ganhar) divisas e deixando de gerar renda e emprego para milhares de pessoas que moram em regiões propícias para o desenvolvimento da atividade. Mundialmente, estima-se que sejam empregados das atividades relacionadas à aqüicultura e a pesca, cerca de 40 milhões de pessoas (FAO, 2000). No Brasil, segundo a Fishtec Consultores Associados, este número é de 85.000 empregos diretos provenientes apenas da aqüicultura.

Porém, conforme Rocha (1997), Apenas a título de exemplo do potencial brasileiro para a absorção de mão de obra pela aqüicultura, somente a região Nordeste tem potencialidade para explorar de 1,0 a 1,5 milhões de hectares, com piscicultura criando 500 a 700 mil empregos diretos, com um faturamento estimado em R$ 6 a 9 bilhões/ano, e isto, segundo o próprio autor, sendo extremamente conservador na avaliação.

Outro exemplo que comprova a inépcia que ainda caracteriza a atual situação brasileira em termos de desenvolvimento da aqüicultura, provém da comparação com a extraordinária expansão que vem registrando a indústria do camarão cultivado em todo o mundo, especialmente em alguns países Asiáticos e Latinos Americanos.

De acordo com Rosemberri citado por Rocha (1997), em 1996, houve um total aproximado de um milhão e cem mil hectares de viveiros e uma produção de 693.000 toneladas de camarões. A maior parte dessa produção veio da Ásia e da América Latina. A participação do Brasil na composição das cifras precedentes foi simplesmente insignificante: 3.484 hectares de viveiros e 3.500 toneladas de camarão, apesar de contar, especialmente nas Regiões Norte e Nordeste, com uma excepcional rede de infra-estrutura básica e parâmetros naturais equiparáveis ou mesmo superiores aos das regiões mais produtivas do mundo.

Os números brasileiros na carcinicultura cresceram significativamente de 1996 até o ano de 2001. Segundo números da ABCC, passou-se de 3.484 hectares para 8.500 hectares e de uma produção de 3.500 toneladas para 40.000 toneladas, no decorrer desses cinco anos. O crescimento pode até ter sido surpreendente, mais os números continuam pífios diante do contexto mundial.

Rocha (1996) adverte que,

Para que o Brasil, em especial a sua região Nordeste, alcance o desenvolvimento precedentemente referido, faz-se necessário, a exemplo do que ocorreu em todos os países aonde esta atividade vem se desenvolvendo, uma urgente revisão na sua legislação ambiental, notadamente com relação ao manejo dos manguezais, de modo que haja uma racional compatibilização entre a produção biológica e a preservação desses ecossistemas.

E prossegue (ibidem),

A máxima da preservação pela preservação a qualquer custo, presentemente adotada pelo Brasil, tem demonstrado que esse não é o caminho correto, uma vez que embora o Brasil detenha a maior reserva de manguezais do mundo (2.500.000 ha), a sua produção de pescados tem sido declinante nos últimos 10 (dez) anos, cujos números já apontam para uma queda de 35%, além do que, a produção de cultivo na sua faixa costeira, é de apenas 5.000 ton., cujo principal representante é o camarão marinho. Enquanto isso, o Equador que explora 130.000 ha com o cultivo de camarão, já utilizou 30% da sua reserva de mangue, que hoje é de apenas 120.000 ha, e, adicionalmente captura de 12 a 15 bilhões de pós-larvas selvagens/ano, a sua pesca extrativa de camarão cresceu 60% nos últimos 20 (vinte) anos. Diferentemente do Brasil, que a despeito da manutenção de integridade do seu manguezal e da proibição de captura de pós-larvas selvagens, teve uma redução de 50% na sua produção extrativa de camarões nos últimos 6 (seis) anos.

Ainda de acordo com Rocha (Idem), pela incontestabilidade desses números e pela difícil conjuntura do setor pesqueiro tradicional brasileiro, vê-se que é chegado o momento de se promover uma criteriosa revisão na atual legislação ambiental, no sentido de permitir a utilização de parte da vegetação de manguezais, especialmente no tocante ao reaproveitamento dos antigos viveiros de peixes e salinas desativadas, bem como das áreas que interligam os terrenos de "apicuns" e "salgados" aos mananciais d’água, desde que não ultrapasse a 10% da área total do empreendimento aquícola.

Alguns autores como Rocha, citado acima, acham que para incrementar a produção aquícola brasileira, é necessária uma maior liberação das áreas de manguezais, para aumentar a produção. Porém, como já foi salientado, na Tailândia, com a utilização dos manguezais para o cultivo de peixes e camarões, a produtividade acabou ficando abaixo da conseguida no próprio ambiente natural (VALENTI, 2000).

Desse modo, o desenvolvimento de uma atividade orientada e inerente ao habitat natural dos pescadores artesanais, como forma de criar alternativas para a produção e geração de emprego e renda, se constitui da mais alta importância para a sócio-economia dessas regiões. Mas não é possível se deixar de lado, o aspecto ambiental, inclusive buscando exemplos em outros países que desenvolvem a atividade, como é o caso da Tailândia, já citado, e o do Equador, cuja produção e produtividade vem decrescendo nos últimos anos, devido a problemas fito-sanitários, e tem provocado milhares de desemprego e afetado, inclusive, a economia nacional.

Portanto, é preciso levar em consideração o fato de que as atividades da aqüicultura marinha, ou maricultura, representam uma espetacular alternativa para a manutenção das comunidades de pescadores artesanais adjacentes nos seus habitats naturais, evitando-se o êxodo dessas populações para os grandes centros urbanos, que nos últimos anos vem aumentando o cinturão da miséria na periferia das grandes cidades brasileiras. Porém é necessário que estas atividades estejam consorciadas com o fator ambiental.

Do mesmo modo, a piscicultura de águas interiores, envolvendo o cultivo de tilápia, carpas e tambaquis, em associação com o camarão de água doce, representa uma alternativa de grande viabilidade para a melhoria da rentabilidade de inúmeras propriedades rurais do Nordeste, especialmente pelo fato de que o desenvolvimento dessa atividade, permite uma integração com os demais meios de produção, gerando adicionalmente emprego e renda, bem como, contribuindo para manutenção do homem no campo. Mas da mesma forma que na aqüicultura de águas oceânicas, é necessário se pensar de forma mais sistêmica, para se evitar erros graves no futuro.

3.2.2 Situação da aqüicultura no Nordeste

Dentre os fatores que possibilitam a exploração de cultivos aquícolas em uma determinada área, estão os fatores naturais. Sob essa condição, há que se dizer que a região Nordeste do Brasil possui características que a potencializa a ser uma das regiões mais produtivas do mundo. Dentre estes fatores naturais, destacam-se:

  • A Temperatura: o Nordeste apresenta uma faixa de temperatura que varia entre 23 a 27º C, durante todo o ano e com uma amplitude térmica da ordem de 10º C. Oscilações estas, perfeitamente toleráveis para as espécies icticas tropicais, mais comercializáveis. De acordo com Molle & Cadier apud Magalhães Filho (2000, p.39), os peixes tropicais precisam de temperaturas entre 22 e 30º, condições essas encontradas nos açudes da região que possuem temperaturas entre 27-28º C, baixando de 2 a 3º nos reservatórios mais profundos.
  • A Insolação: conforme Mendes (1996), a região Nordeste apresenta uma média anual de luz solar da ordem de 2.800 horas por ano, devido à baixa latitude e a baixa nebulosidade. Tal fenômeno favorece "a sintetização (a partir da luz, do gás carbônico e outras substâncias) de matérias orgânicas como proteínas, vitaminas, óleos, que direta ou indiretamente chegam aos peixes, constituindo a base da sua alimentação". (MAGALHÃES FILHO, 2000. p.39-40)
  • A Salinidade: Magalhães Filho (op. cit.) aponta que determinada concentração de sais pode tornar a água imprópria para o consumo humano ou mesmo para banho. No entanto, para algumas espécies aquáticas, como a tilápia do Nilo, por exemplo, mesmo a uma condutividade de 15.000 a 20.000 micromhos (a partir de 1.000 micromhos já afeta a sobrevivência de alguns organismos) é possível a sua sobrevivência. Tal característica, portanto, pode servir para o aproveitamento de solos salinizados (que alteram a alcalinidade da água) no desenvolvimento da aqüicultura.

Soma-se a isso, o fato que os açudes nordestinos (com base apenas nos açudes controlados pelo DNOSC) figuram entre os de maior produtividade no mundo, com uma média de 125 Kg/hectare/ano, inferior apenas a produtividade dos Lagos George e Nakivali na África, com produtividade de 137 e 230 Kg/hectare/ano, respectivamente (PAIVA apud MAGALHÃES FILHO, 2000)

Além desse fator encontrado nos açudes da região, a mesma possui, entre outras potencialidades, 300.000 hectares disponíveis para o cultivo de camarão marinho, que podem, segundo Rocha apud Valenti (2000), produzir um milhão de toneladas por ano, gerando US$ 6 bilhões de receitas anuais e criando 1,5 milhões de empregos diretos e indiretos, modificando por inteiro a situação sócio-econômica da região.

3.3 Impactos da aqüicultura

Como qualquer outra atividade produtiva, a aqüicultura, quer queira, quer não, acaba por provocar aquilo que se conhece por impacto ambiental.

E por impacto ambiental, conforme Tauk (1995), entende-se como sendo a alteração no meio ou em algum de seus componentes por determinada ação ou atividade. Estas alterações precisam ser quantificadas, pois apresentam variações relativas, podendo ser positivas ou negativas, grandes ou pequenas.

De acordo com o artigo 1º da Resolução CONAMA nº 001, de 23 de janeiro de 1986, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente, a qualidade dos recursos ambientais.

Diante da definição dada pela resolução do CONAMA, e como bem observa Arana (1999), o conceito de impacto ambiental não se refere unicamente ao meio ambiente biológico, engloba na verdade, o resultado do efeito das atividades humanas tanto a nível biológico como a nível físico e sócio-econômico, pois pela própria Resolução nº 001 (em seu Artigo 6º), para se efetuar um Estudo de Impacto Ambiental dos empreendimentos humanos, deve-se levar em consideração a completa descrição e análise do meio físico (solo, subsolo, ar, água, clima), biológico (ecossistemas naturais, fauna, flora) e sócio-econômico (uso do solo, da água, perfil das comunidades envolvidas).

Ainda conforme Arana (op. cit., p.62), vê-se a seguir exemplos de impactos negativos:

Um impacto ambiental em termos físicos seria aquele em que a paisagem é modificada, como sucede, por exemplo, quando se degrada um determinado solo ou montanha durante a extração de minérios. O impacto ambiental em termos biológicos é aquele em que a biota sofre algum tipo de modificação, como é o caso de um desmatamento ou mortalidade da fauna etérea quando um rio é contaminado por substâncias químicas. Por último, um impacto em termos antrópicos se verifica quando é o próprio ser humano quem sofre as conseqüências de uma determinada atividade, também humana.

Para o caso da aqüicultura, os três níveis acima citados podem ser impactados antes, durante e depois da instalação dos empreendimentos de cultivo. Entretanto, os impactos de tipo biológico e antrópico são os que se verificam com mais intensidade. No caso de um eventual desmatamento de uma área de mangue para fins de carcinicultura, o impacto biológico é brutal, já que as inúmeras espécies que ali habitam e procriam simplesmente perdem seu espaço vital. Com o tempo, este impacto difunde-se via interface bioantrópica (sócio-econômica) até atingir o homem, tal como acontece com os pescadores artesanais ao verem suas áreas de extração transformadas em viveiros de cultivo de camarão, muitas vezes de propriedade privada.[grifo nosso]

De maneira similar ao que ocorre na agricultura, a aqüicultura é uma forma dos homens modificarem e manipularem as relações tróficas que ocorrem na natureza, de modo a obterem vantagens para si próprios na produção de alimentos.

Também da mesma forma que se vê na agricultura, na aqüicultura procura-se simplificar a complexidade do sistema, o que geralmente implica em uma prática de monocultura, que acaba por empobrecer a biodiversidade local, fazendo com que os sistemas aquáticos percam a sua capacidade de regeneração.

Além do empobrecimento da biodiversidade local, pelo fato de se alterar o meio físico e biológico para uma prática de monocultura, tal prática monoculturista também acaba por provocar, em contrapartida, graves conseqüências a pratica aquícola, como por exemplo, com a deteriorização do pool genético e a consangüinidade.

No que se refere a pool genético e a consangüinidade, Perez (apud ARANA, 1999, p.164), afirma que,

...uma das conseqüências observadas nos cultivos de organismos aquáticos é a perda da variabilidade genética devido ao pequeno número de progenitores empregados. Isto pode levar a depressão endogâmica por homocigosidade para alelos prejudiciais. Se estas espécies são intencional ou inadvertidamente liberadas, e se chegar a acontecer um encontro com populações da sua mesma espécie, a reprodução destas com as silvestres pode reduzir o pool genético natural, diminuindo a variabilidade genética dos estoques silvestres. Isto pode prejudicar a habilidade das espécies nativas para se adaptar às mudanças ambientais. A principal conseqüência da consangüinidade é a formação de homozigotos. Neste caso, os indivíduos apresentam menor crescimento, fecundidade e viabilidade.

O desenvolvimento da aqüicultura tem provocado também uma série de outros impactos no meio ambiente, envolvendo de maneira sistêmica os três níveis (físico, biológico e sócio-econômico) já citados.

Um outro exemplo de impacto negativo pode ser dado através do efeito na qualidade da água devido à criação do camarão marinho. A intensificação da criação do camarão gera um crescente e acentuado consumo de drogas terapêuticas e antibióticos, além de provocar um incremento de nutrientes e matéria orgânica no meio ambiente (eutrofização). Tais resíduos podem afetar a qualidade da água de rios, riachos ou córregos, devido à descarga de efluentes provenientes dos tanques de criação.

Segundo Valenti (2000), com o uso indiscriminado de antibióticos na criação, o despejo de seus resíduos no meio aquático pode acabar por criar resistência a certos patógenos humanos. É o caso do cólera (Víbrio colera). Certas bactérias do gênero Víbrio, mais comuns no ambiente marinho, podem adquirir resistência aos antibióticos usados na carcinicultura (clorofenicol, por exemplo), tornando mais difícil o tratamento nos seres humanos.

Um outro risco do uso de antibióticos ou de drogas terapêuticas, vem da conseqüência da própria manipulação, pelo contato prolongado com essas substâncias. Um exemplo é a anemia aplástica irreversível, provocada pelo clorofenicol, doença que é fatal em 70% dos casos.

Macintosh e Phillips citados por Arana (1999, p.67), apresentam um quadro com os principais materiais de dejeto produzidos pelos cultivos intensivo e semi-intensivo do camarão marinho:

Quadro 2 - Principais materiais de dejetos produzidos pelos cultivos do camarão marinho

POLUENTE

EFEITO PRIMÁRIO

EFEITO SECUNDÁRIO

Alimento não consumido e metabolitos dissolvidos

 

 

 

Drogas Terapêuticas e químicos

 

 

 

 

Antibióticos

Incremento da carga de nutrientes e redução do O Incremento do sedimento

 

 

Impacto ecotoxicológico

 

 

 

 

Incremento da resistência ao antibiótico de vários organismos

Mudanças ambientais, redução da capacidade de carga do estanque e poluição das fontes de água

 

Mortalidade e efeito sub-letal nos organismos, trocas na qualidade de água, poluição das fontes

 

Problemas no tratamento de enfermidades bacterianas.

Resíduos em produtos comercializados

Fonte: Macintosh e Phillips apud Arana (1999)

Em um outro trabalho científico, publicado na revista "Aquaculture", o autor, Pierre Kestmont (apud Arana, 1999), resumiu em nove (09), os impactos negativos que a aqüicultura de forma geral, exerce sobre o meio biológico:

  1. Modificação da vazão e da temperatura da água
  2. Aumento da concentração de nitrogênio, fósforo, sólidos em suspensão, demanda química e bioquímica de oxigênio
  3. Diminuição da concentração de oxigênio dissolvido
  4. Contaminação com produtos químicos e antibióticos
  5. Geração de sedimentos ricos em matéria orgânica
  6. Excessiva floração de algas em águas eutrofizadas
  7. Modificação do índice biótico (comunidades de invertebrados) e do índice de integridade biótica (população de peixes)
  8. Poluição e erosão genética
  9. Aumento do risco de disseminação de doenças

Quanto aos impactos da aqüicultura na dimensão sócio-econômica, Arana (op. cit. p. 80) relaciona algumas vantagens e desvantagens da atividade:

Quadro 3 - Vantagens e desvantagens da aqüicultura na dimensão sócio-econômica

DIMENSÃO

VANTAGENS

DESVANTAGENS

Econômica

 

 

 

 

Captação de divisas

Favorecimento da terceirização

Aumento da arrecadação de impostos

Demanda intensiva de capital

Alto risco de falência

 

 

 

Social

Criação de empregos

Produção de proteínas

Exploração salarial

Conflitos pelo uso do espaço

Depauperização das comunidades que dependem do mangue

Competição das espécies com o homem pela proteína (válida para espécies onívoras e carnívoras)

Fonte: Arana, 1999 (com adaptações).

Valenti (2000) reforça o quadro acima, ao afirmar que apesar do impacto positivo em termos de aumento da oferta de emprego pela atividade aquícola, o custo deste emprego (US$ 10.000 por unidade) é comparativamente mais baixo do que o de outros setores da economia. Um emprego no setor químico chega a custar US$ 220.000, no turismo US$ 66.000 e na agricultura irrigada US$ 26.500. No entanto, os salários pagos são bem mais abaixo do que as outras categorias citadas.

Quanto a conflitos pelo uso do espaço territorial, muitas vezes ocorre a ocupação de terras agricultáveis para transformá-la em viveiros de aqüicultura, fazendo com que, muitas vezes, traga desemprego e fome à população local, haja vista que a atividade se concentra nas mãos de grandes e médios produtores. Há que se ressaltar no entanto, que no Brasil, de acordo com Rocha (2001), no setor da carcinicultura, 47% das propriedades está nas mãos de pequenos proprietários.

Entretanto, mesmo esses pequenos proprietários, acabam provocando impactos como: salinização do solo, destruição de manguezais e deteriorização de ecossistemas frágeis.

Falou-se até o momento dos efeitos que a aqüicultura causa ao meio ambiente. Porém, em se tratando de aqüicultura, o estrago causado ao meio, se volta rapidamente contra o causador, ou seja, contra a própria atividade aquícola. Pois, para a obtenção de uma boa produção é necessário um ambiente saudável. Uma água eutrofizada pode prejudicar toda uma produção camaroneira, inviabilizando o cultivo.

3.4 Aqüicultura sustentável

No momento em que esse trabalho levanta a idéia de um novo modelo de desenvolvimento, priorizando as idéias de um desenvolvimento sustentável, podemos definir a aqüicultura sustentável como aquela produza organismos aquáticos por meio da eficiência econômica, da prudência ecológica e da equidade social, garantindo, no entanto, que tal modelo de produção continue a ser viável por longo prazo, ou seja, sirva às gerações futuras.

Em um busca pela Internet, é possível encontrar-se algumas definições para aqüicultura sustentável:

Aqüicultura sustentável é a produção viável, durável e ética de organismos aquáticos, explorando e conservando os recursos naturais, com a finalidade de atender às essencialidades presentes e futuras de todos.

... a aqüicultura sustentável deve ser entendida como a produção viável de organismos aquáticos ao longo do tempo (PILLAY, 1996). Este modelo está baseado em três conceitos básicos: eficiência econômica, prudência ecológica e equidade social (VINATEA, 1998).

Entretanto, apesar de cada vez mais, em todos os países, se estar buscando a sustentabilidade da aqüicultura, Arana (1999, p.185 e 186) adverte:

Embora existam casos concretos de aqüicultura sustentável, ela ainda não tem sido posta em prática em escala global, ou porque o conceito de sustentabilidade é relativamente novo na opinião pública, sendo que, ao que parece, ainda não se conseguiu entender direito o seu significado e importância ou que o modelo econômico vigente não permitiu a sua expansão.

É bom deixar claro que, para se chegar a ter uma aquicultura sustentável, é necessário saber primeiro a meta que se deseja alcançar com esta nova tendência tecnológica para, só depois empreender o processo de desenvolvimento da atividade.

MacAllister (citado por Arana, 1999, p.194-196), apresenta a seguir, uma série de critérios a serem considerados na avaliação de projetos que aspiram ao desenvolvimento sustentável.

Quadro 4 - Critérios a serem considerados na avaliação

de projetos que aspiram ao desenvolvimento sustentável

CRITÉRIO

SOCIECONÔMICO

A FAVOR

CONTRA

Quem usufrui dos benefícios?

Os pobres

Classe média, ricos

Necessidade de capital

Pouca

Muita

Retorno para o trabalhador/família

Auto-emprego

Baixos salários

Operado por

Indivíduo, família, cooperativa, comunidade

Empresa privada

Gênero

Benefícia homem, mulher, criança

Explora/Descuida mulher, criança

Distúrbio cultural ou de costumes

Nenhum

Pouco, muito

Condições de trabalho

Alta qualidade

Baixa qualidade

Qualidade nutricional/ alimentação natural

Maior ou igual

Maior

Alimento para

Os pobres

Os ricos

Efeitos na saúde pública

Baixo

Alto

Quem toma as decisões

A comunidade local após amplo debate e discussão

Governo, ONGs, companhias de consultoria

ASPECTOS DE ORDEM MUNDIAL

Produção de alimentos para

Países pobres

Países ricos

Taxa de benefícios

Alto para países pobres

Alto para países ricos

Bens e insumos de

Países pobres

Países ricos

Importação e tecnologia estrangeira

Nenhum

Pouca, muita

Necessidade de sementes

Países pobres

Países ricos

ESTÉTICO

Área de cultivo

Bonito

Feio

AMBIENTAL

Método de cultivo

Policultivo

Monocultivo

Relação com o ambiente natural

Pouco ou nenhum deslocamento

Substitui um pelo outro

Usado como desculpa para não restaurar o ambiente natural

Não

Sim

Usa cepas genéticas artificiais

Não

Sim

Risco de fuga de cepas seletas na natureza

Não

Sim

Estoque de cultivo

Nativo

Exótico

Risco para espécies nativas (doença, hibridação, extinção)

Nenhum

Pouco, muito

Controle de doenças, predadores, competidores

Meios biológicos

Meios químicos

Fertilização

Orgânica

Inorgânica

Descarga no meio ambiente (física, química, orgânica)

Baixa

Alta

Susceptibilidade as doenças e ao estresse

Baixa

Alta

Efeito da instalação sobre os predadores selvagens

Exclusão natural de aves e mamíferos

Uso de armas de fogo

Fonte- MacAllister, apud Arana, 1999, p.194-196.

 

No Brasil, onde a aqüicultura ainda não experimentou um franco processo de desenvolvimento, é fundamental que seja realizada uma análise minuciosa de todos os modelos e propostas existentes a fim de se optar pelo caminho que melhor se adapte à nossa realidade conjuntural. Como vimos nas páginas anteriores, existem diversos paradigmas ideológicos capazes de orientar o desenvolvimento da aqüicultura no Brasil, isto é, neoliberalismo, desenvolvimento sustentável de Brundtland, ecodesenvolvimento e desenvolvimento viável. Portanto, a pergunta a ser feita neste caso é: que modelo à aqüicultura brasileira deverá seguir para atingir a condição de sustentável?

3.5 Conduta para uma pesca responsável e sustentável

Viu-se anteriormente, que a aqüicultura vem surgindo como uma alternativa à pesca de captura que já não consegue extrair o suficiente dos oceanos e das águas continentais para suprir as necessidades alimentares da população humana. Entretanto essa primeira, traz também uma série de impactos negativos que inviabilizam sua adoção por completo, e que é preciso se estabelecer critérios que a tornem sustentável, antes que se passe a utiliza-la indiscriminadamente.

Foi visto também, nesses tópicos passados, que por muitos anos se visualizou nos oceanos, uma fonte inesgotável de alimentação para o homem. Mesmo nos dias atuais, muitos ainda são àqueles que pensam (ou não se preocupam) ser infinita a renovação da produção pesqueira.

No entanto, a realidade, como já foi dito, é que a produção mundial de produtos pesqueiros está estacionária e, em muitos casos, até regrediu significativamente.

Parte deste problema se deve a poluição dos mares e até por fenômenos climáticos, como "El Niño" e "La Niña", que provocam efeitos sobre a química e a biologia dos oceanos. A outra parte do problema, e provavelmente a maior, provém da grande desordem da atividade e de uma exploração irracional dos recursos pesqueiros.

Sobre a irracionalidade da exploração, ocorrida principalmente, pela desordem da atividade de pesca, Freitas (2001) nos dá o seguinte parecer,

A sobre-exploração de muitas espécies em particular as de maior valor comercial, tem conduzido ao seu esgotamento ou desaparecimento levando os pescadores à captura de outras espécies menos interessantes, numa cadeia infindável de destruição que, apoiada em tecnologias auxiliares de captura cada vez mais eficazes, tem vindo a acelerar o ritmo da destruição. Existe, contudo algo de paradoxal ou contraditório neste comportamento, mas perfeitamente esperado e conhecido.

Se numa primeira fase, o nível muito elevado do esforço conduz a grandes capturas gerando níveis de rendimento elevado e crescente, numa segunda fase, por depleção, gera rendimentos marginalmente decrescentes. Isto é, níveis cada vez maiores de esforço produzem resultados adicionais cada vez mais pequenos ou mesmo negativos a partir de certo momento. Os pescadores aplicam esforços cada vez maiores com rendimentos cada vez menores até à exaustão completa dos stocks e dos mares a longo prazo.

Tal assertiva acima demonstra a aplicação da Lei dos Rendimentos Decrescentes (ou Lei das Proporções Variáveis) à exploração pesqueira, diante das possibilidades limitadas de regeneração dos estoques explorados.

No Brasil, a sobre-exploração dos estoques pesqueiros comerciais é, da mesma forma que em diversos outros países exploradores da pesca, absurda e irracional. Jorge Pablo Castello, professor do Departamento de Oceanografia da Fundação Universidade do Rio Grande (FURG), afirma que "de um modo geral, essa queda de produtividade é decorrente da falta de administração do acesso a esses recursos, o que permite a sobre-exploração e a degradação do ambiente. Em vez de se reconhecer os limites dos ecossistemas, busca-se reverter a menor produtividade com o emprego de tecnologias mais avançadas de exploração. Quem paga é o ambiente".

Vários são os exemplos nacionais e internacionais, relacionados à drástica diminuição dos cardumes. Tais exemplos apontam para o fato de que os mares já não estão agüentando a intensa e ininterrupta retirada de suas espécies. Está-se assistindo a um lento desastre da atividade pesqueira em decorrência da agonia vivida pela fauna aquática, ocasionada pela irracionalidade humana.

Dessa forma, pode-se dizer que, a ordenação da exploração pesqueira deve estar centrada tanto nos níveis econômicos, sociais e culturais, como também nos níveis biológicos e ambientais.

E, além disso, para que a pesca se possa se transformar numa atividade sustentável, isto é, para que a pesca venha a se desenvolver produtivamente, sem agir contra a existência mesma das espécies ictiológicas, comerciais ou não, e garantir a reprodução das cadeias biológicas, torna-se necessário introduzir esquemas de ordenamento da atividade. Esse ordenamento pode contemplar as seguintes medidas e ações (SILVA, 2001):

• determinação de volumes racionais de captura;

• equilíbrio do número de embarcações que podem participar da atividade;

• estabelecimento de época e regiões geográficas para a implementação do "defeso" (periódico ou permanente);

• controle da deterioração ou da contaminação ambiental (marinha ou fluvial);

• atribuição da atividade somente aos verdadeiros pescadores, ou seja, àqueles que sabem como, quando e onde pescar;

• impedimento aos pescadores que pescam de improviso e que, por isso mesmo, depredam o meio ambiente, oferecendo-lhes opções de sobrevivência em outras atividades produtivas;

• estabelecimento de novos esquemas de desenvolvimento dentro da atividade, como por exemplo, dando maior valor agregado ao produto e recebendo mais pelo mesmo volume;

• seleção de outras áreas de pesca de modo que as atuais possam descansar e se recuperar;

• esforço para introduzir no mercado espécies diferentes das tradicionais, que serão igualmente nutritivas e saborosas, para dar tempo de recuperação das espécies que usualmente são as mais procuradas.

A sustentabilidade da pesca depende de um estudo profundo, envolvendo diferentes especialistas, de modo que o conjunto de ações planejadas cheguem aos objetivos pretendidos.

A sustentabilidade da pesca passa, ainda, por dois temas marcantes no cotidiano pesqueiro. Trata-se dos Direitos de Propriedade e a Ordenação ou Organização Pesqueira.

De acordo com a FAO (2000), desde os anos cinqüenta, os economistas que se ocupam dos estudos sobre a organização das pescas de captura, tem reconhecido que os regulamentos sobre o acesso aos recursos pesqueiros, criam incentivos e respostas participativas nas comunidades envolvidas, e podem exercer um efeito fundamental de longo prazo, nas questões pesqueiras.

Na maioria das pescarias, estratégia errada de regulamentação do acesso dos pescadores às populações ictiológicas, pode levar a situações em que o nível de esforços de pesca acaba por desperdiçar os recursos da sociedade, provocando a sobre-explotação das espécies.

Parte da solução do problema da organização pesqueira consiste em estabelecer direitos apropriados de acesso as espécies aquáticas. Entretanto, esse direito de acesso, acaba interferindo na questão do direito de propriedade.

Ainda de acordo com a FAO (op. cit.), o conceito básico de propriedade e os direitos associados a essa propriedade, envolvem questões bastante sensíveis. Os denominados "direitos de propriedade", são um conjunto de direitos que conferem tanto privilégios como responsabilidades. Por conseguinte, o estabelecimento de direitos de propriedade relacionados às questões pesqueiras, implica na definição e especificação dos direitos, privilégios e responsabilidades para todos os envolvidos direta ou indiretamente com a pesca.

Porém, para complicar mais a questão, as referências aos direitos de propriedade relativa ao setor pesqueiro, podem estar relacionadas a várias situações, tais como: direitos de propriedade mediante a concessão de licenças ou outras formas de limitação de acesso. Outras formas de direitos podem ser criadas especificando o uso dos recursos pesqueiros para determinadas comunidades, ou ainda criando-se direitos para o uso de determinado território ou mesmo direitos de uso de determinadas populações de pesca. E, se podem criar ainda, outros direitos de propriedade mediante sistema de quotas para a pesca, aonde essa cotas podem ser transferíveis ou não.

Como se pôde ver, as questões relacionadas com os direitos de propriedade no setor pesqueiro, são de uma grande amplitude e envolvem vários aspectos. São na verdade uma fusão das instituições legislativas, jurídicas, econômicas, sociais, culturais, biológicas e políticas, presentes em cada país ou região.

No que diz respeito ao uso do espaço físico da pesca, por exemplo, nos Estados Unidos e na Austrália, os recursos naturais pesqueiros são recursos públicos. Em outros países, como Japão e Taiwan, há casos em que o direito de propriedade sobre os recursos pesqueiros, pertencem as comunidades locais.

Porém uma das maiores dificuldades em se examinar as questões relativas aos direitos de propriedade na pesca, diz respeito à falta de comunicação. Encontram-se freqüentemente dificuldades, porque a expressão "direitos de propriedade" significa coisas diferentes para pessoas diferentes, e podem se referir a conjunto muito diversos de direitos, privilégios e responsabilidades. Assim sendo, antes que se comece qualquer trabalho no intuito de regulamentar o setor pesqueiro, seja ele nacional, estadual ou mesmo local, é necessário convocar as partes interessadas a debater sobre os seus direitos.

Seguindo ainda com algumas recomendações da FAO (2000), sugere-se que para se elaborar quaisquer soluções possíveis quanto aos direitos de propriedade do setor pesqueiro, deve-se definir os seguintes atributos:

  • a exclusividade dos participantes das pescarias
  • a durabilidade dos direitos conferidos
  • a autenticidade ou a qualidade do título conferido aos direitos
  • a transferibilidade ou não dos direitos
  • a divisibilidade dos direitos assinalados
  • a flexibilidade associada ao uso dos direitos

Dessa forma, as questões fundamentais dos sistemas de direitos de propriedade do setor pesqueiro, passam por uma boa estratégia de:

  • Como se definir direitos de propriedade, ou seja, quem tem direito de utilizar os recursos de uma pescaria, e que parte de uma pescaria pode ser utilizada e como e quando utiliza-la;
  • Como se conferir e manter os direitos de propriedade; e
  • Como se criar incentivos aos interessados, em virtude do acordo que assinam, poder trazer maiores e melhores vantagens potenciais a todos, de forma a reforçar os objetivos do setor.

Porém é necessário que se reconheça e aceite que, não existe uma única estratégia de organização pesqueira que resolva todos os problemas da pesca. O setor necessita de uma combinação de instrumentos de organização disponíveis e dos direitos a eles associados para que se possa encontrar as melhores soluções possíveis.

4. A EXPLORAÇÃO DA ARTEMIA SALINA: A REALIDADE VIVENCIADA

Este capítulo traz o relato das pesquisas bibliográficas e de campo, e das observações e questionários aplicados no desenrolar desse trabalho cientifico.

Segundo os dados colhidos, a Artemia salina (Artemia sp), provavelmente surgiu na região, por volta do fim dos anos setenta e, conforme os dizeres do Sr. Antônio Soares Filho, trazidas por americanos, mas que ele não sabe informar exatamente com que finalidade.

Já para o pesquisador Paulo Alberto Bento Carneiro, da ABCC, a artemia deve ter sido trazida com a intenção de se averiguar a sua ação na melhoria da qualidade do sal, já que ela é um filtrador biológico, ou mesmo para servir de alimento para camarões, em algumas fazendas de municípios vizinhos, e que depois, pode ter chegado a Grossos, pela ação de alguns pássaros.

O fato é que, independentemente da época da aparição da Artemia na região, em 1990, um pescador de nome Antônio Soares Filho, percebeu a importância econômica da espécie, e começou a capturá-la e vende-la para produtores de camarões locais e de fora do estado.

Aos poucos o Sr. Antônio foi juntando recursos suficientes, e cerca de dois anos depois, passou não mais a pescar, mas sim a comprar a produção de diversos amigos de pesca e repassá-las aos interessados na compra da artemia.

Em 1998, já bastante engajado na comercialização da artemia, o Sr. Antonio abriu a empresa A. Ferreira de Melo - ME, cujo nome de fantasia é "Bio-artemia Cultivo e Beneficiamento", e continuou a financiar e a comprar a produção de mais de sessenta pescadores envolvidos com a captura da espécie.

Mais recentemente, o proprietário da Bio-artemia, possuidor de um terreno de cinco hectares, o cedeu por empréstimo a ABCC, para a realização de pesquisas relacionadas ao cultivo da artemia, de onde se espera, dentro de mais alguns anos, se chegar a conclusões que atestem ou não, a viabilidade da produção em viveiros.

Atualmente, o processo de produção da artemia em Grossos, ocorre quase que exclusivamente (com exceção dos viveiros existentes no terreno citado acima) de forma extrativista, nos tanques destinados à produção de sal marinho das diversas salinas espalhadas pelo município, se estendendo, porém, a outros municípios do estado, tais como: Mossoró, Areia Branca, Tibau e até Macau.

Antes, porém, de se falar do processo de exploração da artemia, mostrar-se-á em que ambiente ocorre esse processo, através do diagnóstico situacional do município de Grossos no Estado do Rio Grande do Norte.

4.1 Diagnóstico situacional do município de Grossos

Grande parte do que se escreve abaixo, sobre o diagnóstico situacional do município de Grossos-RN, foi extraído do relatório feito em abril do ano de 2001, pela empresa TERRA – Assessoria e Consultoria Ambiental Ltda, e entregue a prefeitura municipal, e, também, do documento intitulado "Informativo Municipal" de responsabilidade do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (IDEMA), órgão ligado a Secretária de Planejamento e Finanças do Governo do Estado do Rio Grande do Norte, datado de 1999.

Pesquisou-se também em diversos sites que traziam informações sobre o município, dentre eles o site do IBGE, e ainda informações obtidas através de conversas informais com moradores da localidade e com autoridades públicas municipais.

4.1.1 Aspectos Históricos do Município de Grossos – RN

De acordo com o informativo municipal, do IDEMA (1999), o nome GROSSOS provém de uma ilha coberta de um Capim Grosso e Áspero (PASPALUM), abundante no local, e que servia de alimento para o gado.

Segundo Moradores do lugar, criadores de Areia Branca e localidades vizinhas, vinham explorar o capim nas várzeas de Grossos. Sempre se dirigindo ao local como o "Grosso". Nas palavras do Sr. Joaquim (morador), os antigos diziam: "Vamos pegar capim no Grosso". E assim convencionou-se chamar "grosso", Ilha de Grossos, Serra de Grossos e por fim Grossos.

A região foi disputada pelo governo do Ceará, sendo que em 17 de julho de 1920, com a brilhante defesa do jurista e a época, senador da República, Rui Barbosa, o Rio Grande do Norte assumiu definitivamente os direitos sobre a hoje conhecida localidade de Grossos.

A localidade, porém, só se transformou em município, no dia 11 de Dezembro de 1953, através da Lei nº 1.025, tendo sido desmembrado de Areia Branca. Atualmente o mesmo é regido pela Lei Orgânica Municipal Nº 009/90 de 04 de Abril de 1990.

      1. Aspectos Físicos e Geográficos

Figura 3 – Vista área de cidade de Grossos

Área

Grossos ocupava uma área de 257Km2, sendo que desta, 170,9 Km2 passou a fazer parte da cidade de Tibau antiga comunidade rural e recentemente emancipada. Hoje Possui uma área de 138,9 Km2, o que corresponde a 0,26% da superfície estadual (IDEMA, 1999).

O município de Grossos encontra-se, segundo as Cartas Geográficas, a 4º58’47’’ de latitude sul e a 37º09’17" de longitude oeste, ficando a 5m de altitude do nível do mar ver em anexo, mapas do município). Localizado na Micro-Região "Mossoroense", limita-se ao Norte com o Oceano Atlântico e o município de Tibau; ao Sul com os municípios de Mossoró e Areia Branca; a Leste com Areia Branca; e, a Oeste com Mossoró e Tibau. (ver Anexo I e II)

O acesso à cidade pode ser feito através da RN-012, rodovia estadual que liga o município à cidade de Mossoró, ou ainda com Fortaleza pela BR 101 a 280Km e Natal pela BR 304 que fica a 320Km. O transporte ainda pode ser feito por via marítima através de barcos e balsas ligando Grossos a cidade de Areia Branca.

No litoral encontram-se as praias de Pernambuquinho, Barra, Alagamar e Areias Alvas. As comunidades rurais de Areias Alvas, Córrego, Valência e Barra preenchem o quadro de belezas naturais que o município possui, com dunas, salinas artesanais e naturais, a Prainha do Aristim, o Estuário do Rio Mossoró e manguezais, além de monumentos históricos, sítios arqueológicos e o segundo maior cajueiro natural do mundo, características estas que estão sendo aproveitadas para a exploração do turismo ecológico e sustentável.

A maioria das propriedades do município são minifúndios familiares. No entanto existem alguns latifúndios inexplorados.

Morfologia

Sua superfície é diversificada, uma vez que apresenta elevações de terras como dunas, morros e serras, nenhuma delas passando dos cem (100) metros de altitude. De acordo com o IDEMA (op. cit.) os solos predominantes são o latossolo vermelho e o amarelo eutrófico, com fertilidade de média a alta, textura média e fortemente drenado, apresentando aptidão para culturas de ciclo longo, como o caso de algodão arbóreo, sisal, caju e coco. Entretanto é possível encontrar nas zonas rurais o cultivo de algumas culturas agrícolas tradicionais, como o milho, o feijão, a mandioca (macaxeira). Seu subsolo é rico em lençóis d’água, que podem ser utilizados para a irrigação dessas culturas.

Hidrografia

Seu rio principal é o Mossoró, que nasce na Serra da Queimada e deságua no Oceano Atlântico, dividindo, em sua foz, os municípios de Grossos e Areia Branca. A região conta também com lagoas naturais que no período de inverno ficam cheias servindo, durante o período de estiagem, na agricultura e na pesca de subsistência e na plantação de capim para o gado. São elas: Lagoa do Marreco, Lagoa do Carão, Lagoa Salgada, Lagoa João Lourenço, Lagoa da Onça e Lagoa de Tibau.

Clima

O clima de Grossos é preponderantemente tropical semi-árido (Bw’h – segundo classificação de Köppen). Possui temperatura média anual de 27,3ºC e precipitações pluviométricas de 879,2mm. Seu período chuvoso vai de Fevereiro a maio. Durante a noite, cai uma brisa leve suavizando o clima quente que se faz durante o dia. Normalmente o céu aparece sempre estrelado, sendo a região considerada como um excelente ponto de observação astronômica.

População

A população grossense é resultado de um processo de imigração de iniciou a partir do século XVII, com pessoas vindo do Sertão Nordestino, principalmente do Estado do Ceará, em busca de condições mais favoráveis de sobrevivência. Dessa imigração houve cruzamentos entre brancos, negros e índios que deu origem a forma miscigenada de sua população. Esta se desenvolveu em torno da economia pesqueira, agropecuária e principalmente salineira.

Segundo o censo de 2000, Grossos possuía uma população de 8.255 habitantes, onde destes 6.368 residiam na Zona Urbana e 1.987 Zona Rural, e apresentava a seguinte estrutura etária:

    • Zona Urbana:

Menos de 01 ano – 157

De 1 a 05 anos - 570

De 5 a 15 anos – 1.175

De 15 a 45 anos - 3.181

De 45 a 65 anos - 918

Maiores de 65 anos – 367

    • Zona Rural

Menos de 01 ano – 47

De 1 a 05 anos - 172

De 5 a 15 anos – 422

De 15 a 45 anos - 993

De 45 a 65 anos - 287

Maiores de 65 anos – 66

Vegetação

Sua principal vegetação é a Caatinga, formada por cactos, oiticica, juazeiros, algarobas, espinheiros etc. Ao longo do Rio Mossoró encontra-se vasta extensão de mangues, hoje ameaçada pela exploração indiscriminada de suas áreas. Possuem uma variedade de arvores e plantas rasteiras de varias espécies como: salsa, mata-cabra, velames, paspalum (capim grosso), canapum, umburanas, quixabeiras, carnaubeiras etc.

Figura 4 - Manguezal invadido pelas salinas.

Partes: 1, 2, 3, 4, 5

 
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