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Estudo in vivo de um sistema de liberação de drogas constituído por hidroxiapatita e cisplatina (página 2)

Milton Marchiori Júnior e Wanderley José de Melo

 

Os implantes teste eram compostos por uma mistura de cerâmica sintética de hidroxiapatita (75%), cisplatina (12,5%), hidroxipropilmetilcelulose - HPMC (11,5%) e estearato de magnésio (1%), cada implante teste continha 2,5 mg do princípio ativo, o que correspondia a cerca de 65mg/m2, levando em consideração o peso médio do lote. Os implantes controle apresentavam constituição semelhante, porém não continham a cisplatina. Todos os constituintes apresentavam-se na forma de pó que, após mistura homogênea foram separados em porções de 400mg e submetidos à compactação mecânica direta em moldes cilíndricos de 8 mm de diâmetro por 4 mm de espessura (Figura 3).

Os animais implantados foram observados e pesados diariamente durante 14 dias de pós-implantação (PI). Também foi determinado os volumes de água e ração ingeridos por cada grupo.

Durante o PI os animais foram submetidos à eutanásia nos dias 1, 3, 4, 5, 6, 7 e 14 para coleta de amostras teciduais (hepáticas, renal e muscular periférica à implantação) e de sangue total. De alguns animais foram separados um dos rins e segmentos intestinais para histopatologia.

As amostras para detecção da droga foram liofilizadas, digeridas em solução nitroperclórica e diluídas em água bidestilada. A leitura da concentração do metal platina foi realizada em espectrofotômetro de emissão por plasma. A conversão da quantidade de platina para cisplatina foi calculada por meio de estequiometria. O teste de Tukey foi aplicado para comparação entre as concentrações médias de cisplatina nos diferentes tecidos.

RESULTADOS

Os animais teste apresentaram como sinais indicativos de toxicidade ao tratamento: anorexia (100%); diarréia (80%); epistaxe (13%), necrose muscular no leito de implantação (6%). Vinte e sete animais (45%) morreram antes do período estabelecido para a eutanásia, sendo que os óbitos concentraram-se entre o 4o e 6o dia de P.I. As alterações de peso, bem como o perfil de ingestão hídrica e alimentar dos grupos testados estão apresentadas nas Figuras 4, 5 e 6.

À necrópsia dos animais observou-se a dissolução precoce dos implantes, provavelmente facilitando a difusão da droga (Figuras 7 e 8).

A análise histológica dos cortes de rins dos ratos tratados com a droga evidenciou degeneração das células tubulares, núcleos picnóticos e delimitação citoplasmática pouco evidente. A histologia dos segmentos intestinais mostrou lesões nas porções apicais das vilosidades e eliminação do revestimento intestinal para o lúmen do órgão.

As concentrações médias teciduais e sérica da droga são apresentadas pelas Figuras 9 e 10.

DISCUSSÃO

Os efeitos colaterais inespecíficos apresentados pelos animais teste foram considerados comuns ao tratamento com drogas antineoplásicas1. A necrose tecidual no sítio de implantação foi atribuída à ação irritante de altas concentrações da droga, uma vez que somente os animais teste desenvolveram necrose muscular periférica à implantação, embora a cisplatina não seja considerada um agente irritante1.

O quadro de anorexia observado nos animais teste foi severo nos primeiros dias de P.I. A ação de drogas antineoplásicas podem causar transformações atróficas da musculatura, mucosa do estômago e intestino delgado, levando ao retardamento do processo digestivo e a alterações de apetite, responsáveis pela sensação de plenitude gástrica ocasionada com pequenas porções de alimento1, além disso a cisplatina é uma das drogas quimioterápicas de maior potencial emético8, embora não possa ser confirmada a ocorrência de náusea nos animais tratados.

A histopatologia de segmentos intestinais destes animais revelou lesões do revestimento intestinal, o que, provavelmente, dificultou a absorção de nutrientes e desencadeou o quadro de diarréia.

A alta concentração de platina nos rins dos animais tratados confirma a distribuição preferencial dos metabólitos da cisplatina em relação a outros tecidos corpóreos9, A histopatologia renal destes animais evidencia lesões predominantemente tubulares nas células renais, porém o exato mecanismo de ação causador de injúria celular ainda não está esclarecido9. Ainda, a ocorrência do aumento de ingestão de água, a partir da segunda semana de tratamento, observada somente nos animais teste é muito sugestiva de um quadro de moléstia tubular renal, principal causa da maioria dos casos de poliúria e polidipsia10.

Comparando as concentrações teciduais e sérica da droga encontradas neste trabalho, em relação a outro estudo realizado utilizando a hidroxiapatita como veículo da cisplatina6, observamos que as concentrações da droga no tecido muscular mostraram-se bastante altas durante todo o período estudado, uma vez que estas amostras eram provenientes do leito de implantação. As concentrações hepáticas foram as mais baixas, uma vez que a cisplatina não sofre retenção importante neste tecido1. As médias séricas evidenciaram quão rápido os implantes liberaram a droga, embora a intenção de adicionar o HPMC e o estearato de magnésio à formulação dos implantes tenha sido para retardar a dissolução. O polímero HPMC teria a função de transformar o comprimido em um composto gelatinoso sólido, retendo a droga por maior tempo. O estearato de magnésio, um componente de característica hidrofóbica, foi adicionado para evitar o arraste precoce da droga.

CONCLUSÕES

Os implantes de hidroxiapatita e cisplatina utilizados neste experimento não foram capazes de reter a cisplatina por um período mais prolongado, uma vez que a detecção da droga foi precoce nos tecidos estudados, além da ocorrência de efeitos colaterais observados nos animais teste. As mortes ocorridas no grupo teste foram consideradas como conseqüentes à intoxicação fatal pelo tratamento ou ainda pelo agravamento dos efeitos colaterais.

REFERÊNCIAS

1. Bonassa EMA. Conceitos gerais em quimioterapia antineoplásica: In: Bonassa EMA Enfermagem em quimioterapia. 2ed. São Paulo: Atheneu; 2001. p 3-20.

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3. Hahn KA, Richardson RC, Blevins WE, Lenz SD, Knapp DW. Intramedullary cisplatin chemotherapy: experience in four dogs with osteosarcoma. J Small Anim Pract 1996;37:187-92.
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4. Los G, Mutsaers HA, Vijgh WJF, Baldew GS, Graaf PW, McVie JG. Direct diffusion of cis-diamminedichloroplatinum (II) in intraperitoneal rat tumors after intraperitoneal chemotherapy: a comparison with systemic chemotherapy. Cancer Res 1989;49:3380-4.
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5. Los G, Kop W, Deurloo MJM. Antitumour response and nephrotoxicity following intraperitonial administration of a slow release of cisplatin to rats bearing cancers restricted to the peritoneal cavity. Br J Cancer 1991;64:90-2.

6. Uchida A, Shinto Y, Araki N, Ono K. Slow release of anticancer drugs from porous calcium hydroxyapatite ceramic. J Orthop Res 1992;10(1):70-4.

7. Straw RC, Withrow SJ, Douple EB, Brekke JH, Cooper MF, Schwarz PD, Greco DS, Powers BE. Effects of cis-diamminedichloroplatinum. II released from D,L,-polilactic acid implanted adjacent to cortical allografts in dogs. J Orthop Res 1994;12(6):871-7.

8. Couto GC. Management of complications of cancer chemotherapy. Vet Clin North Am Small Anim Pract 1990;20(4):1037-53.
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9. Walker RJ, Duggin GG. Cellular mechanisms of drug nephrotoxicity. In: Seldin DW, Giebisch G. The kidney: physiology and pathophysiology. 2ed. New York: Raven Press; 1992. p 3571-5.

10. Atkins CE. Poliúria e polidpsia. In: Ettinger S.J. Tratado de medicina interna veterinária. 3ed. São Paulo: Editora Manole; 1992. p 143-52.

Sobral RA, Daleck CR, Melo WJ. In vivo study drug release system of hydroxyapatite and cisplatin. Acta Cir Bras [serial online] 2001 Jul-Sept;16(3). Available from: http://www.scielo.br/acb.

Fontes de financiamento: FAPESP

Renata Afonso Sobral2; Carlos Roberto Daleck3; Wanderley José de Melo4
wjmelo[arroba]fcav.unesp.br

1. Trabalho realizado no Hospital Veterinário da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias - FCAV- UNESP, Campus de Jaboticabal - SP e financiado pela FAPESP; Tese de Mestrado apresentada à FCAV/Jaboticabal.
2. Professora Assistente da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Metodista de São Paulo - UMESP.
3. Professor Doutor do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias Veterinárias de Jaboticabal-UNESP.
4. Professor Titular do Departamento de Tecnologia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal-UNESP.



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