Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 

 

INTRODUÇÃO

A instalação dos pomares cítricos ocorre, na maioria das vezes, através da utilização de mudas enxertadas. Esse método de propagação apresenta diversas vantagens, tais como precocidade e uniformidade de produção, uniformidade na qualidade dos frutos, facilidade na colheita e nos tratos culturais, utilização de "cavalos" que apresentam adaptação a diferentes tipos de solos, resistência maior a moléstias e seca. Por outro lado, a vulnerabilidade das plantas cítricas à enfermidades causadas por patógenos como, por exemplo, a tristeza, a exocorte e a xiloporose, assim como, doenças de causa ainda desconhecida (declínio), pode ter sua causa nos diferentes agrupamentos de enxertos e porta-enxertos hoje existentes (Santos et al., 1988; Pompeu Junior, 1991).

A produção de mudas por outros métodos de propagação vegetativa, tais como o enraizamento de estacas, surge como uma alternativa para diversas fruteiras cultivadas. Embora esse método resulte em vantagens como alternativa ao problema do declínio (Villas Boas et al., 1988), precocidade de produção e conservação das características genéticas da variedade original, apresenta as seguintes características indesejáveis, no caso específico das plantas cítricas: susceptibilidade à gomose e inadaptação da planta às condições edafo-climáticas (Pompeu Junior, 1991). Além disso, deve-se ressaltar que este método de propagação exige instalações e equipamentos mais sofisticados como, por exemplo, câmara de nebulização e substratos diferenciados para enraizamento das estacas.

Alguns fatores influenciam a eficiência do enraizamento do material vegetativo, destacando-se o vigor e idade da planta-mãe, idade e posição dos ramos, nutrição da planta-matriz, época de coleta da estaca, temperatura do solo e do ambiente, umidade relativa e arejamento do meio de propagação, relação carboidrato/nitrogênio, correlação entre teor de amido na estaca e formação de calo, presença de inibidores endógenos e substâncias reguladoras de crescimento (Ferri, 1997).

Muitas espécies de Citrus e gêneros afins podem ser propagados por estacas. Estacas retiradas de clones velhos enraizam mais lentamente que as de clones novos. Limões, limas e cidras tendem a enraizar mais facilmente que tangerinas, além de que, estacas de outras espécies cítricas como, por exemplo, Citrus sinensis, são muito difíceis de enraizar, sendo necessária a utilização de reguladores de crescimento (Platt & Opitz, 1973). Entretanto, o efeito dos hormônios não é uniforme para todas as espécies do gênero Citrus (Sabbah et al., 1991).

Investigações a respeito do enraizamento de estacas de citros são escassas. Entretanto, um dos primeiros estudos realizados sobre esse assunto já comprovou a influência significativa de reguladores de crescimento no enraizamento. O ácido 3-indolacético, em concentrações variadas, promoveu o enraizamento de estacas de pomeleiro e laranjeira. Materiais vegetativos provenientes de limoeiros e cidreiras enraizaram sem o auxílio de reguladores de crescimento, mas o número de raízes foi considerado maior nas estacas tratadas (Biale & Halma, 1938).

O ácido indolacético (IAA) a 0,02% por 24 horas promoveu um aumento na porcentagem de estacas enraizadas e no número de raízes por estaca em limão `Vila-franca', limão `Rugoso', citrange `Morton', pomelos `Conner' e `Marsh', laranja `Azeda', laranja doce `Homosassa', laranja `Bergamota', tangerina `Suen-kat' e tangerina `Cleopatra' (Cooper & Knowlton, 1940).

Ensaios para avaliação do enraizamento de estacas sem folhas de três variedades de citros, incluindo a lima ácida `Tahiti', foram realizados utilizando-se dosagens de ácido indolbutírico (IBA), ácido naftalenoacético (NAA) e 2,4-Diclorofenoxiacético (2,4-D), em diferentes tempos de imersão. Os resultados indicaram que o enraizamento de estacas de lima ácida `Tahiti' foi mais eficiente com o uso dos seguintes reguladores de crescimento, respectivas dosagens e tempos de imersão: IBA - 2000 ppm por 20 segundos; IBA - 10000 ppm por 5 segundos; NAA - 500 ppm por 10 minutos; NAA - 10000 ppm por 5 segundos; 2,4-D - 100 ppm por 10 minutos (Santos et al., 1988). Ensaios mais recentes, envolvendo 12 espécies cítricas também evidenciaram a influência de reguladores de crescimento no enraizamento de estacas; NAA, a 1000 ppm e IBA a 3000 ppm, produziram raízes longas, espessas e em maior quantidade no enraizamento (Sabbah et al., 1991).

A formação de mudas de laranjeira `Valência' a partir de estaquia sob nebulização também foi testada empregando-se estacas cilíndricas e triangulares nas concentrações de 0, 1500, 3000, 4500 e 6000 ppm, na forma de pó. Concluiu-se que estacas cilíndricas se apresentam superiores às triangulares para a formação de calos, e, que havia maior formação de raízes aos oito meses, independente dos tratamentos (Rossal et al., 1994).

A multiplicação da lima ácida `Tahiti' através da estaquia já é utilizada com sucesso para a formação de pomares dessa variedade cítrica no sul da Flórida, Estados Unidos. Uma das principais características desses pomares é o sistema radicular fasciculado e superficial das plantas (Crane et al., 1993).

O presente trabalho de pesquisa avaliou o efeito de diferentes dosagens e tempos de exposição de dois reguladores de crescimento na eficiência do enraizamento de estacas de lima ácida `Tahiti'(Citrus latifolia Tanaka) e duas variedades de laranja doce (Citrus sinensis L. Osbeck).

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi desenvolvido na Universidade de São Paulo, na área experimental do Departamento de Horticultura da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" (ESALQ), no município de Piracicaba, Estado de São Paulo. Os ensaios foram instalados em câmara de nebulização intermitente, utilizando-se bandejas de poliestireno espandido (modelo 72) e vermiculita de granulometria média como substrato. As variedades cítricas utilizadas nos experimentos foram a lima ácida `Tahiti' (Citrus latifolia Tanaka), a laranja `Pêra' (Citrus sinensis L. Osbeck) e a laranja `Valência' (Citrus sinensis L. Osbeck). Estacas de lima ácida `Tahiti' foram coletadas em pomar da Fazenda Areão, da ESALQ, em Piracicaba. Estacas das duas variedades de laranja doce foram coletadas de uma coleção de cultivares de citros do Departamento de Horticultura, da ESALQ. Ensaios preliminares definiram como melhor tipo de estaca, aquelas de ponteiro, semi-lenhosas (semi-duras), arredondadas, com 10 cm de comprimento, sem as três últimas folhas basais. Os reguladores de crescimento empregados nos tratamentos de todos os ensaios foram o ácido alfa-naftaleno-acético (NAA) e o ácido indol-butírico (IBA) em diferentes combinações e tempos de imersão.

O primeiro ensaio de enraizamento envolveu apenas a variedade lima ácida `Tahiti'. Os reguladores de crescimento, respectivas concentrações e tempos de imersão das estacas foram os seguintes: 1) IBA, 500 ppm, 10 minutos; 2) IBA, 1000 ppm, 5 minutos; 3) IBA, 2000 ppm, 2 minutos; 4) IBA, 4000 ppm, 20 segundos; 5) IBA, 8000 ppm, 10 segundos; 6) NAA, 500 ppm, 10 minutos; 7) NAA, 1000 ppm, 5 minutos; 8) NAA, 2000 ppm, 2 minutos; 9) NAA , 4000 ppm, 20 segundos; 10) NAA, 8000 ppm, 10 segundos; 11) IBA + NAA, 1000 ppm, 10 minutos; 12) água destilada, 10 minutos. O delineamento experimental empregado foi o do tipo blocos casualizados, contendo 12 tratamentos e 4 repetições, com 20 estacas por parcela, totalizando 960 estacas.

Considerando-se os resultados obtidos, outros dois experimentos de enraizamento foram conduzidos para a comparação dos resultados em relação a outras espécies cítricas. Dessa forma, um segundo ensaio foi conduzido utilizando-se lima ácida `Tahiti' e laranja `Pêra' como variedades estudadas. Os reguladores de crescimento, respectivas concentrações e tempos de imersão das estacas, para cada espécie, foram os seguintes: 1) água destilada, 10 minutos; 2) IBA + NAA, 1000 ppm, 10 minutos; 3) IBA, 1000 ppm, 5 minutos; 4) IBA, 2000 ppm, 2 minutos; 5) NAA, 1000 ppm, 5 minutos; 6) NAA, 2000 ppm, 2 minutos. Nesta segunda etapa, o delineamento estatístico empregado também foi o de blocos casualizados, contendo 6 tratamentos por espécie, 4 repetições, com 20 estacas por parcela, totalizando 480 estacas de lima ácida `Tahiti' e 480 estacas de laranja `Pêra'.

O terceiro experimento envolveu as variedades lima ácida `Tahiti' e laranja `Valência'. Os reguladores de crescimento, respectivas concentrações e tempos de imersão das estacas, para cada espécie, foram os seguintes: 1) Laranja `Valência', água destilada, 10 minutos; 2) Laranja `Valência, IBA + NAA, 1000 ppm, 10 minutos; 3) Laranja `Valência', IBA, 1000 ppm, 5 minutos; 4) Laranja `Valência', IBA, 2000 ppm, 2 minutos; 5) Laranja `Valência', NAA, 1000 ppm, 5 minutos; 6) Laranja `Valência', NAA, 2000 ppm, 2 minutos; 7) Lima ácida `Tahiti', água destilada, 10 minutos. O delineamento estatístico empregado foi também do tipo blocos casualizados, contendo 6 tratamentos para a laranja e um tratamento para a lima ácida, 4 repetições, com 20 estacas por parcela, totalizando 480 estacas de `Valência' e 80 estacas de lima ácida `Tahiti'.

A avaliação dos tratamentos foi realizada 90 dias após a instalação de cada ensaio através da coleta dos seguintes dados biométricos: número médio de raízes/estaca enraizada (NMR), porcentagem de enraizamento (PE), porcentagem de formação de calos (PC), comprimento médio da maior raiz (CMMR), e número médio de folhas/estaca enraizada (NMF). Os resultados experimentais foram submetidos à análise da variância e as médias, comparadas pelo teste de tukey ao nível de 0,05 de probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados experimentais do primeiro ensaio estão reunidos na TABELA 1. Nota-se que o enraizamento médio das estacas de lima ácida `Tahiti' foi de no mínimo 73%, e em média aproximadamente 83%, independentemente do tratamento. Esses dados concordam com pesquisas anteriores que também mostraram a grande eficiência do enraizamento de estacas de limão (Biale & Halma, 1938; Cooper & Knowlton, 1940; Santos et al., 1988; Crane et al., 1993). Os resultados do ensaio também mostraram não haver diferença significativa para porcentagem de enraizamento, considerando-se os diferentes tratamentos (reguladores de crescimento e tempos de imersão), discordando dos ensaios de Santos et al. (1988) e Sabbah et al. (1991). Os parâmetros PC, NMR, CMMR, NMF também não apresentaram diferenças significativas para todos os tratamentos estudados.

Os ensaios comparativos de enraizamento de estacas de lima ácida `Tahiti' e laranjas doces também confirmaram os resultados de estudos anteriores. O ensaio comparativo entre lima ácida `Tahiti' e laranja `Pêra' comprovou mais uma vez a facilidade daquela espécie em enraizar (46 %, em média) (TABELA 2). Por outro lado laranja `Pêra' apresentou baixa PE (0,7 %, em média), fato já observado para outras espécies de laranja doce (Platt & Optiz, 1973; Young & Sauls, 1979; Sabbah et al., 1991). Da mesma forma como observado no ensaio preliminar, não ocorreram diferenças significativas entre os diversos tratamentos com reguladores de crescimento e tempos de imersão, para todos os parâmetros estudados.

Os dados de PE, NMR, CMMR, e NMF para o terceiro ensaio não são apresentados, pois a laranja `Valência' não enraizou (somente formou calos). Neste mesmo ensaio, a lima ácida `Tahiti' apresentou enraizamento médio de 47,5%.

Considerando-se que o tempo médio para a obtenção da muda pronta pelo método de estaquia está ao redor de seis meses (em oposição a 18 a 22 meses, por enxertia) e que não há necessidade do emprego de reguladores de crescimento o método pode ser economicamente viável para a propagação da lima ácida `Tahiti'. Ensaios de campo deverão confirmar ou não a viabilidade técnica de implantação de pomares não enxertados dessa espécie cítrica.

As estacas enraizadas de lima ácida `Tahiti', resultantes dos ensaios de enraizamento foram colocadas em saquinhos plásticos, tutoradas e transplantadas para o campo quando apresentaram em torno de 40-60cm de altura. O pomar, constituído de 170 plantas, está instalado na área do Departamento de Horticultura da ESALQ, em espaçamento 5x3m. Avaliações posteriores, comparando as mesmas plantas com mudas de lima ácida `Tahiti' enxertadas permitirão uma avaliação mais ampla no referente ao seu comportamento vegetativo e produtivo. Espera-se que as mudas de lima ácida `Tahiti' obtidas por enraizamento de estacas apresentem menor porte do que aquelas enxertadas, permitindo redução do espaçamento, aumento de produção por área e facilidade nos tratos culturais.

CONCLUSÕES

- O enraizamento de estacas semi-lenhosas de lima ácida `Tahiti' é elevado, podendo chegar a 96%, sob nebulização. O emprego de reguladores de crescimento é desnecessário.

- O enraizamento de estacas de laranja doce (laranja `Pêra' e laranja `Valência) é baixo, mesmo com o emprego de reguladores de crescimento.

- A obtenção de mudas de lima ácida `Tahiti' por enraizamento de estacas é um método de propagação rápido e eficiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • BIALE, J.B.; HALMA, F.F. The use of heteroauxin in rooting of subtropicals. Proceedings of the American Society for Horticultural Science, v.35, p.443-447, 1938.
  • COOPER, W.C.; KNOWLTON, K.R. The effect of synthetic growth substances on the rooting of subtropical fruit plants. Proceedings of the American Society for Horticultural Science, v.37, p.1093-1098, 1940.
  • CRANE, J.H.; CAMPBELL, R.J.; BALERDI, C.F. Effect of huricane Andrew on Tropical fruit trees. Proceedings of the Florida State Horticultural Society, v.106, p.139-144, 1993.
  • FERRI, C.P. Enraizamento de estacas de citros. Revista Brasileira de Fruticultura, n.1, p.113-121, 1997.
  • PLATT, R.G.; OPTIZ, K.W. The propagation of citrus In: W. REUTHER (Ed.) The Citrus Industry. Berkeley: University of California, 1973. v.3, cap.1, p.1-47.
  • POMPEU JUNIOR, J. Porta-enxertos. In: RODRIGUEZ, O.; VIÉGAS, F.; POMPEU JUNIOR, J.; AMARO, A.A. Citricultura Brasileira. Campinas: Fundação Cargill, 1991. v.1, p.265-280.
  • ROSSAL, P.A.L.; KERSTEN, E.; MACHADO, A.A. Propagação da laranjeira (Citrus sinensis) por enraizamento de estacas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE FRUTICULTURA, 13., Salvador, 1994. Resumos. Salvador: Sociedade Brasileira de Fruticultura, 1994. v.2, p.423.
  • SABBAH, S.M.; GROSSER, J.W.; CHANDLER, J.L.; LOUZADA, E.S. The effect of growth regulators on the rooting of stem cuttings of Citrus, related genera and intergenetic somatic hybrids. Proceedings of the Florida State Horticultural Society, n.104, p.188-191, 1991.
  • SANTOS, R.F.A.; BOAS, R.M.F.A.; SALIBE, A.A. Estudos sobre enraizamento de estacas de citros com aplicação de agentes de efeito hormonal. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE FRUTICULTURA, 9., Campinas, 1987. Anais. Campinas: Sociedade Brasileira de Fruticultura, 1988. v.2, p. 387-393.
  • VILLAS BOAS, R.M.F.; SANTOS, R.F. dos; SALIBE, A.A. Enraizamento de diferentes espécies de citros. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE FRUTICULTURA, 9., Campinas, 1987. Anais. Campinas: Sociedade Brasileira de Fruticultura, 1988. p.367-373.
  • YOUNG, M.J.; SAULS, J. Propagation of fruit crops. Gainesville: University of Florida/ Institute of Food and Agricultural Sciences/ Florida Coopertative Extension Service, 1979. (Circular, 456)

Patricia Prati1,4; Francisco de Assis Alves Mourão Filho2,4,*; Carlos Tadeu dos Santos Dias3; João Alexio Scarpare Filho2
ctsdias[arroba]carpa.ciagri.usp.br
1Graduanda em Tecnologia Agroindustrial-ESALQ/USP.
2Depto. de Produção Vegetal-ESALQ/USP, C.P. 9, CEP: 13418-900 - Piracicaba, SP.
3Depto. de Ciências Exatas, ESALQ/USP, C.P. 9, CEP: 13418-900 - Piracicaba, SP.
4Bolsista do CNPq.



 Página anterior Voltar ao início do trabalhoPágina seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.