Ecoturismo e desenvolvimento sustentável

A gestão responsável e sustentada dos recursos naturais e o respeito à preservação da identidade cultural de populações nativas têm servido às vezes de instrumento de contenção dos anseios e necessidades desenvolvimentistas de muitos países.

O simples reconhecimento de que algumas práticas adotadas na expansão das fronteiras em busca do crescimento econômico são nocivas ao meio ambiente e ao homem, não é suficiente. É preciso aceitar o desafio de promover mudanças nas políticas de desenvolvimento e encontrar alternativas para os modelos até agora adotados.

Encontrar alternativas de desenvolvimento que tragam melhoria da qualidade de vida das populações locais aliadas à preservação do patrimônio ambiental e cultural tem sido um desafio para todos os envolvidos nesse processo. Aliar desenvolvimento e sustentabilidade dos recursos não é uma tarefa fácil de se executar.

Entre as diversas atividades econômicas que hoje se vislumbra como alternativa de desenvolvimento sustentável para comunidades inseridas em um contexto de necessidade de desenvolvimento em ambientes frágeis está a atividade do ecoturismo, tendo em vista ser uma atividade econômica que se caracteriza por promover o uso sustentável dos recursos buscando a consciência ambiental envolvendo no processo as populações locais.

Este trabalho tem por objetivo refletir sobre a importância do ecoturismo como alternativa de desenvolvimento sustentável para pequenas comunidades. Identificar quais são os benefícios que podem trazer às populações envolvidas sem esquecer dos impactos negativos que poderão causar se não houver um planejamento correto para a sua implantação.

O turismo é uma das atividades sócio-econômicas de maior importância em vários paises do mundo, chegando até a ser a de maior ênfase em muitos deles. As estimativas atuais são de que o turismo gera uma receita anual de US$ 3,4 trilhões, ou seja, 10,9% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial (Wearing e Neil, 2001).

Esse crescimento tem implicações significativas para os países em desenvolvimento. Atualmente, as receitas obtidas do turismo representam mais de 10% da receita total em 47 países em desenvolvimento e mais de 50% do valor auferido com exportações em 17 países (Wearing e Neil, 2001).

Por essas razões o turismo é muito valorizado por diversos países e, muitas vezes, desempenha um papel importante nas estratégias de desenvolvimento. O turismo é bastante promovido, e os seus representantes são cortejados pelos governos devido ao seu significativo potencial de sustentar o câmbio e os empregos locais.

Este crescente fluxo turístico torna imperativa a adoção de ferramentas de preparação e controle da atividade nos pólos receptores de forma a maximizar os pontos positivos que a atividade irá gerar na localidade e ao mesmo tempo minimizar os impactos negativos que esta atividade normalmente provoca na população autóctone. É baseado nisto que, diversos estudiosos vem se preocupando em tornar pública a importância da preservação e do planejamento, de forma concreta e permanente.

O turismo é uma atividade que se bem planejada e desenvolvida pode trazer às populações locais benefícios amplos, como oportunidade de diversificação e consolidação econômica, geração de empregos, conservação ambiental, valorização da cultura, conservação e/ou recuperação do patrimônio histórico, recuperação da auto-estima, entre outros (WWF, 2003).

De todos os tipos de turismo praticados no mundo nenhum cresceu tanto nos últimos anos como o "ecoturismo". O número de ecoturistas que habitualmente visitam áreas naturais – em especial, áreas naturais protegidas ou unidades de conservação – aumentou vertiginosamente em todo o mundo.

Do ponto de vista mercadológico, o ecoturismo é um segmento que tem obtido um crescimento considerável, ao longo dos últimos anos. Para os empresários do segmento, a estimativa é de que o crescimento do ecoturismo se situe em 20% ao ano. O faturamento anual do ecoturismo, a nível mundial, é estimado em US$ 260 bilhões, do qual o Brasil se apropriaria com cerca de US$ 70 milhões.

A Organização Mundial do Turismo (OMT) estima que 10% das pessoas que viajam pelo mundo são ecoturistas. No Brasil, pressupõe-se que o ecoturismo alcance meio milhão de turistas, por ano.

No Amazonas, Estado brasileiro que se destaca como pólo de ecoturismo, os turistas estrangeiros ainda são predominantes. Entretanto, calcula-se que a participação do turista nacional, na região, antes em torno de 10% do total, tenha triplicado, nos três últimos anos.

De acordo com Costa (2003) para atender a essa demanda, muitos lugares semi-isolados, desabitados ou habitados apenas por umas poucas pessoas, foram rapidamente "civilizados" – ocupados por pousadas, bares, restaurantes e um comércio amplo e variado, que a partir de então passou a vender os produtos "típicos" do local.

O aparecimento do ecoturismo e o seu acelerado crescimento têm suas raízes na insatisfação gerada pelo turismo convencional de massa muito criticado pelo fato de dominar a atividade dentro de uma região, de sua orientação não-local, e o fato de que muito pouco do dinheiro gasto ali efetivamente permanece no local e gera mais recursos, associada ao crescimento mundial da consciência ambiental, contribuindo para aumentar a demanda por experiências mais autênticas, baseadas na natureza e em aspectos culturais, tendo como destino paises em desenvolvimento, possibilitando, inclusive, uma alternativa econômica a outras práticas como, por exemplo, a extração de madeira ou mono-cultura (soja, cana de açúcar, etc).

Devido às muitas formas em que as atividades do ecoturismo são oferecidas por uma grande diversidade de operadores, praticadas por uma variedade ainda maior de tipos de turistas ainda não há um consenso sobre o seu significado. É um termo amplo e vago, sendo para alguns, um subconjunto de atividades turísticas baseadas na natureza; para outros, é um nicho de mercado.

Apesar de que a origem do termo ecoturismo seja controversa e não muito clara, especula-se que foi W. Hetzer que o utilizou pela primeira vez em 1965.

Nos anos 70 e 80 outras referências foram feitas ao ecoturismo, onde o termo "ecotours" foi utilizado no Canadá para identificar roteiros interpretados de um corredor turístico ao longo da rodovia-cênica Trans-Canadá.

Mais recentemente, em 2002, como parte das atividades do Ano Internacional do Ecoturismo, aconteceu a Conferência Mundial do Ecoturismo, em Quebec, com o objetivo de discutir políticas, práticas, impactos (sociais, econômicos e ambientais) e elaborar um conjunto de conclusões e recomendações para o planejamento, desenvolvimento, gestão, marketing e monitoramento de atividades ecoturísticas, com vistas a garantir sua sustentabilidade em longo prazo.

No Brasil, no âmbito governamental, o ecoturismo é discutido desde 1985, quando a EMBRATUR iniciou o projeto "Turismo Ecológico". A primeira iniciativa de ordenar a atividade ocorreu em 1987 com a criação da Comissão Técnica Nacional, constituída por técnicos do IBAMA e da EMBRATUR, para monitorar o Projeto de Turismo Ecológico, em resposta às práticas existentes à época - pouco organizadas e nada sustentáveis.

Entretanto, nem os esforços governamentais, nem os privados foram suficientes para ultrapassar as barreiras, algumas até hoje existentes, entre a teoria - principalmente em relação aos modelos nacionais - e a prática do ecoturismo.

Inclui-se entre essas barreiras a ausência de consenso sobre a conceituação do segmento - inclusive, como ocorre internacionalmente -, a falta de critérios, regulamentações e incentivos que orientem empresários, investidores e o próprio governo, no estímulo e no uso do potencial dos patrimônios naturais e culturais, ao mesmo tempo em que promova a sua conservação.

De um modo geral, tem-se concebido o ecoturismo como uma atividade que põe o homem em contato com a natureza e com seus semelhantes; que favorece a interação humana: como um fator importante na formação da cultura moderna.

O documento "Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo" que estabelece os conceitos pertinentes ao segmento de ecoturismo, no Brasil, bem como a definição dos critérios de exploração sustentável do potencial constituído por nossas belezas naturais e valores culturais define ecoturismo como sendo:

"Segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva a sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem estar das populações envolvidas" (EMBRATUR, 1994).

Fennel (2002) conceitua ecoturismo como sendo:

"Uma forma sustentável de turismo baseado nos recursos naturais, que focaliza principalmente a experiência e o aprendizado sobre a natureza: é gerido eticamente para manter um baixo impacto, é não predatório e localmente orientado (controle, benefícios e escala). Ocorre tipicamente em áreas naturais, e deve contribuir para a conservação ou preservação destas".

Segundo Carvalho (2003) o ecoturismo é uma atividade que busca valorizar as premissas ambientais, sociais, culturais e econômicas conhecidas de todos nós, e inclui a interpretação ambiental como um fator importante durante a experiência turística.

Segundo Swarbrooke (2000) o ecoturismo é visto como:

    • Um turismo em pequena escala;
    • Mais ativo do que outras formas de turismo;
    • Uma modalidade de turismo na qual a existência de uma infra-estrutura de turismo sofisticada é um dado menos relevante;
    • Empreendido por turistas esclarecidos e bem educados, conscientes das questões relacionadas a sustentabilidade, além de ávidos por aprender mais sobre estes temas;
    • Menos espoliativo das culturas e da natureza locais do que as formas "tradicionais" de turismo.

Isto é o que diferencia o ecoturismo de outras formas de se fazer turismo. Pode-se dizer que o ecoturismo é mais um conceito de viagem do que um produto de turismo, pois traz consigo uma filosofia de vida que tem como princípio orientador de sua prática a preservação do patrimônio histórico, cultural, natural e humano. É um turismo diferenciado, de pessoas cujo objetivo é interagir com o ambiente e com as comunidades envolvidas em tal ambiente. Quando se fala em ecoturismo, está-se referindo à sustentabilidade, à autenticidade e originalidade dos meios visitados.

Além dessas perspectivas, o ecoturismo pode cumprir um papel importante no equilíbrio da balança comercial, com o ingresso de novas divisas, por meio do aumento no fluxo de turistas estrangeiros e da atração de investimentos para a construção de equipamentos turísticos.

O ecoturismo poderá constituir-se em um dos alicerces na tentativa de alcançar um modelo sustentável de desenvolvimento, desde que ocorra em áreas naturais, beneficiando o meio ambiente e as comunidades visitadas e que promova o aprendizado, respeito e consciência sobre aspectos ambientais e culturais, gerando harmonia e equilíbrio entre os seguintes fatores: resultados econômicos, mínimos impactos ambientais e culturais, e satisfação do cliente (ecoturista) e da comunidade.

Quando bem praticado, pode ser uma alternativa sustentável de exploração e conservação dos recursos naturais dos destinos selecionados, oferece experiências únicas e autênticas ao turista, proporcionando uma vivência real como novas culturas e ambientes, além de oferecer ao mercado oportunidades de pequenas iniciativas locais, valorizando a especialização em determinados segmentos.

A atividade ecoturística deve valorizar ao máximo as comunidades locais de entorno de alguma região com atributos ecoturísticos. Para os ecoturistas é muito importante o nível de envolvimento da comunidade local nas atividades ligadas à sua visita. O que se quer é que os habitantes do entorno ou residentes em determinada área com atributos ecoturísticos sejam os mais beneficiados com a atividade.

O que se busca é que os habitantes locais tenham na atividade uma forma de sustento e preferencialmente complementar às já existentes. Sejam como guias, como proprietários de pousadas, donos de restaurantes, cozinheiros, motoristas, artesãos, etc... Enfim, a mão-de-obra utilizada na infra-estrutura de determinado destino ou produto ecoturístico, deverá absorver ao máximo a mão-de-obra local, e, de preferência, de tal forma que esta seja uma atividade complementar às já existentes.

O ecoturismo tem o potencial de criar apoio para os objetivos de conservação, tanto na comunidade local quanto entre os visitantes, pelo estabelecimento e pela sustentação de vínculos entre a indústria do turismo, as comunidades locais e as áreas de proteção.

Como os benefícios sociais e ambientais são essencialmente interdependentes, os benefícios sociais, advindos para as comunidades como resultado do ecoturismo, podem acarretar o crescimento global dos padrões de vida, devido ao estímulo econômico gerado pela maior visitação ao local. Igualmente, os benéficos ambientais surgem quando as comunidades são induzidas a proteger os ambientes naturais para sustentar o turismo economicamente viável.

Há um consenso por parte de estudiosos sobre os benefícios econômicos, sociais e ambientais do ecoturismo: diversificação da economia regional (micros e pequenos negócios); geração local de empregos; fixação da população no interior; melhorias na infra-estrutura de transporte, comunicação e saneamento; criação de alternativas de arrecadação para as Unidades de Conservação; diminuição de impacto sobre o patrimônio natural e cultural; diminuição de impacto no plano estético-paisagístico; e melhoria nos equipamentos das áreas protegidas.

Entretanto é consenso também entre os estudiosos que o ecoturismo não é só benefício, existindo também os impactos negativos que se não forem constantemente monitorados e avaliados podem ser tão devastadores quanto os causados pelo turismo convencional de massa como o maior consumo de recursos naturais, crescimento do lixo, perda de valores tradicionais, aumento do custo de vida e adensamento urbano.

O ecoturismo como qualquer outra atividade econômica, pode produzir impactos - positivos ou negativos – sociais, econômicos e ambienteis. Mas esses impactos são decorrentes do modo como se planeja, implanta e monitora. Um planejamento turístico deve maximentar os benefícios sócio-econômicos e minimizar os custos, visando o bem estar da comunidade receptora e a rentabilidade dos empreendimentos do setor.

O desenvolvimento do ecoturismo deve considerar os seguintes aspectos:

    • Promover e desenvolver o turismo, em bases cultural e ecologicamente sustentável;
    • Promover e incentivar investimentos em conservação dos recursos naturais e culturais utilizados;
    • Fazer com que a conservação beneficie, materialmente, comunidades envolvidas, pois, somente servindo de fonte de renda alternativa, estas se tornarão aliadas de ações conservadoristas;
    • Ser operado de acordo com critérios de mínimo impacto, de modo a ser uma ferramenta de proteção e conservação ambiental e cultural;
    • Educar e motivar as pessoas para que percebam a importância de se conservar a cultura e a natureza.

O desenvolvimento sustentável é um modelo discutido amplamente, entretanto existe a carência de alternativas que viabilizem sua efetiva implementação. Carentes de recursos as pequenas comunidades precisam encontrar a sua vocação levando-as ao desenvolvimento sustentável proporcionando melhores condições de vida aos seus habitantes.

Pelas suas características o ecoturismo é efetivamente uma alternativa de desenvolvimento sustentável para pequenas localidades. No Brasil temos exemplos de comunidades que se desenvolveram a partir desta atividade. Bonito, no Estado do Mato Grosso, Brotas em São Paulo, Presidente Figueiredo, no Amazonas, são exemplos de comunidades que a partir do ecoturismo aumentaram a qualidade de vida de seus habitantes.

Entretanto em função de seus impactos positivos e negativos deve ser muito bem planejado, para que os benefícios sejam maximizados reduzindo-se ao máximo os impactos negativos resultantes desta atividade.

A participação da comunidade em parceria com a iniciativa privada e o governo é fundamental para desenvolver um plano de ecoturismo que atenda as suas necessidades gerando emprego e renda, melhorando a infra-estrutura de serviços básicos, ao mesmo tempo em que desenvolva a consciência dos envolvidos neste processo pela preservação ambiental, fator primordial para a manutenção da atividade.

Para concluir é importante que fique bem claro que o ecoturismo não é a salvação, mas sim uma alternativa para as pequenas comunidades carentes de melhores condições de vida em um ambiente frágil, em que a preservação da natureza seja propulsora de desenvolvimento proporcionando aumento da qualidade de vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARVALHO, Vininha F. 2003. Origem e desenvolvimento do ecoturismo no Brasil. (on line). Acessado em 24 de julho de 2004. Disponível na Internet em www.ecoviagem.com.br/ecoartigos/def_ecoartigos.asp?codigo=6707

EMBRATUR. Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo. Brasília, 1994.

SWARBROOKE, J. 2000. Turismo sustentável: turismo cultural, ecoturismo e ética. Vol. 5 – São Paulo: Aleph.

WEARING, Stephen e NEIL, John. 2001. Ecoturismo: impactos. Potencialidades e possibilidades. São Paulo: Editora Manole.

WWF-BRASIL. 2003. Sociedade e ecoturismo: na trilha do desenvolvimento sustentável. São Paulo: Vitae Civilis e WWF-Brasil.

 

 

 

JOÃO BOSCO BIASE DE OLIVEIRA

tenbiase[arroba]msn.com

tenbiase[arroba]yahoo.com.br

GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS (Universidade Federal do Amazonas)

ESPECIALIZAÇÃO EM ESTUDOS AMAZÔNICOS (Universidade Nacional de Colômbia)

MESTRANDO EM ESTUDOS AMAZÔNICOS (Universidade Nacional de Colômbia)

TABATINGA-AM, 19 DE SETEMBRO DE 2005


 
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