Do delito de dano e de sua aplicação ao direito penal informático

Enviado por Túlio Lima Vianna


1. Prolegômenos

O crime de dano está previsto no art. 163 do Código Penal Brasileiro e sua aplicação na proteção dos dados informáticos têm sido muito discutida em congressos e seminários dedicados ao estudo do Direito Informático no Brasil.

O busílis encontra-se na palavra coisa, utilizada pelo legislador de 1940 para designar o objeto material do delito de dano.

Argumenta-se que, em respeito ao princípio constitucional da legalidade - que veda a analogia como instrumento da criação de tipos - não se poderia considerar típico um dano a dados informáticos.

Assim, se um agente formatasse um disco rígido sem a autorização de seu legítimo proprietário, com o único intuito de lhe causar um prejuízo, não haveria crime de dano, pois nenhuma "coisa" foi destruída, inutilizada ou deteriorada.

A hipótese reveste-se de grande importância, pois, em suma, esta é a conduta de quem cria e divulga vírus de computador, prática que tem causado grandes prejuízos não só às grandes corporações, mas também a usuários individuais que, muita vez, perdem todas as suas informações armazenadas sobre a forma de dados em seu computador.

Procuraremos demonstrar neste trabalho que é perfeitamente possível a tipificação das citadas condutas como crime de dano sem que haja qualquer ofensa ao princípio constitucional da legalidade.

2. Analogia e interpretação extensiva.

Em princípio, cabe-nos determinar se o entendimento do dado informático como coisa é uma atividade interpretativa ou integrativa da lei penal.

A interpretação não se confunde com a integração, pois, enquanto esta visa preencher as lacunas existentes na lei [1], aquela objetiva tão-somente o correto entendimento da intentio legis.

Assim, a analogia não é uma atividade interpretativa, mas sim um instrumento de integração das normas, pois preenche com hipóteses semelhantes as lacunas legais.

No dizer de Heleno Cláudio FRAGOSO:

"A analogia distingue-se da interpretação, porque constitui um processo de integração da ordem legal, e não meio de esclarecer o conteúdo da norma. Através da analogia aplica-se a lei a hipótese por ela não prevista, invocando-se substancialmente, o chamado argumento a pari ratione. Há aplicação analógica quando a norma se estende a caso não previsto, mas semelhante, em relação ao qual existem as mesmas razões que fundamentam a disposição legal. A analogia distingue-se da interpretação extensiva, porque nesta não falta a vontade da lei, mas tão-somente a expressão verbal que a ela corresponda." (FRAGOSO, 1985. p. 87)

Se na integração o intérprete acrescenta à norma elementos previamente não existentes, na interpretação extensiva, ele tão-somente revela a intentio legis já existente, porém não expressa verbalmente de forma adequada.

"A interpretação extensiva é perfeitamente admissível em relação à lei penal, ao contrário do que afirmavam autores antigos. Nestes casos não falta a disciplina normativa do fato, mas, apenas, uma correta expressão verbal. Há interpretação extensiva quando se aplica o chamado argumento a fortiori, que são casos nos quais a vontade da lei se aplica com maior razão. É a hipótese do argumento a maiori ad minus (o que é válido para o mais, deve necessariamente prevalecer para o menos) e do argumento a minori ad maius (o que é vedado ao menos é necessariamente no mais). Exemplo deste último argumento: se o Código Penal incrimina a bigamia, logicamente também pune o fato de contrair alguém mais de dois casamentos (Manzini)." (FRAGOSO, 1985. p. 86)

Destarte, se advogássemos a tese de que o art. 163 do CP pudesse ser interpretado como: "destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia ou dados informáticos" , estaríamos defendendo a analogia.

Se, porém, admitirmos que os dados informáticos são "coisas" , não haverá analogia, mas sim interpretação extensiva, pois a intentio legis é evitar um dano patrimonial, seja ele praticado em objetos tangíveis ou não.

Não se está, pois, acrescentando novo conteúdo à lei, mas sim evidenciando um novo significado da palavra "coisa" impossível de ter sido previsto pelo legislador de 1940, mas certamente contido na norma.

 


Página seguinte 



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.